Acórdão nº 111/2017
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA
Processo nº 070.842.2012-7
Recursos HIE/VOL/CRF Nº 789/2014
1ª Recorrente:GERÊNCIA EXEC. DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS.
1ª Recorrida:MEDEIROS E MARQUES ELETROMÓVEIS LTDA.
2ª Recorrente:MEDEIROS E MARQUES ELETROMÓVEIS LTDA.
2ª Recorrida:GERÊNCIA EXEC. DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS.
Preparadora:COLETORIA ESTADUAL DE POMBAL.
Autuante(s):RANIERE ANTONIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA.
Relator(a):CONSª. MARIA DAS GRAÇAS D. OLIVEIRA LIMA.
OMISSÃO DE SAÍDAS TRIBUTÁVEIS. LEVANTAMENTO DA CONTA MERCADORIAS. CONFIRMAÇÃO. LEVANTAMENTO FINANCEIRO. AJUSTES. CONFIRMAÇÃO PARCIAL. PENALIDADE. LEI POSTERIOR MAIS BENIGNA. APLICAÇÃO. AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE. REFORMADA QUANTO AOS VALORES A DECISÃO RECORRIDA. RECURSO HIERÁRQUICO DESPROVIDO E VOLUNTÁRIO PARCIALMENTE PROVIDO.
Confirmada a regularidade da exigência do ICMS oriundo da delação que tem suporte no Levantamento da Conta Mercadorias, em face da inexistência de comprovação da incorreta tomada de valores ou da não ocorrência da repercussão fiscal apresentada.
Ajustes que consistem na dedução do prejuízo bruto com mercadorias não tributáveis, apontado no Levantamento da Conta Mercadorias, do mesmo exercício de um dos Levantamentos Financeiros, determinaram a sucumbência de uma parte deste procedimento, que serviu de suporte a correspondente delação fiscal. Mantido o resultado do Financeiro do exercício remanescente, em decorrência da ausência de provas capazes de excluir o resultado do procedimento de apuração da falta.
Redução do valor da penalidade, em decorrência do advento de lei posterior mais benigna que a vigente ao tempo da prática delituosa.
Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...
A C O R D A M os membros da 1ª Câmara de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, à unanimidade, e de acordo com o voto da relatora, pelo recebimento dos recursos hierárquico, por regular, e voluntário, por regular e tempestivo, e, quanto ao mérito pelo desprovimento do primeiro e parcial provimento do segundo, para reformar, quanto aos valores, a sentença exarada na instância monocrática, que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento n.º 93300008.09.00001210/2012-02 (fl. 3), lavrado em 18/6/2012, contra MEDEIROS E MARQUES ELETROMÓVEIS LTDA., contribuinte inscrito no CCICMS, sob nº 16.164.259-4, devidamente qualificado nos autos, e declarar devido o crédito tributário no montante de R$ 90.934,58 (noventa mil, novecentos e trinta e quatro reais e cinquenta e oito centavos), sendo R$ 45.467,29 (quarenta e cinco mil, quatrocentos e sessenta e sete reais e vinte e nove centavos), de ICMS, por infringência aos arts. 158, I e 160, I c/c os arts. 643, § 4º, I e II, e 646, parágrafo único, do RICMS/PB, e R$ 45.467,29 (quarenta e cinco mil, quatrocentos e sessenta e sete reais e vinte e nove centavos), de multa por infração, nos termos do artigos 82, V, “a” e “f”, da Lei nº 6.379/96, com nova redação dada pela Lei Estadual nº 10.008, de 5/6/2013.
Em tempo, cancelo, por irregular, o valor de R$ 50.934,58 (cinquenta mil, novecentos e trinta e quatro reais e cinquenta e oito centavos), sendo R$ 1.786,09 (um mil, setecentos e oitenta e seis reais e nove centavos), de ICMS, e R$ 49.039,47 (quarenta e nove mil, trinta e nove reais e quarenta e sete centavos), de multa por infração, pelos motivos acima expendidos.
Desobrigado do Recurso Hierárquico, na expressão do art. 84, parágrafo único, IV, da Lei nº 10.094/13.
P.R.I.
Primeira Câmara, Sala das Sessões, Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em 31 de março de 2017.
Maria das Graças Donato de Oliveira Lima
Consª. Relatora
Gianni Cunha da Silveira Cavalcante
Presidente
Participaram do presente julgamento os Conselheiros da 1ª Câmara, GILVIA DANTAS MACEDO, THAIS GUIMARÃES TEIXEIRA e NAYLA COELI DA COSTA BRITO CARVALHO.
Assessora Jurídica
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RELATÓRIO |
Em análise, neste egrégio Conselho de Recursos Fiscais, os recursos hierárquico e voluntário, interpostos contra a decisão monocrática que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00001210/2002-02, lavrado em 18 de junho de 2012, segundo o qual, a autuada, MEDEIROS E MARQUES ELETROMÓVEIS LTDA., é acusada das irregularidades que adiante transcrevo:
- OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – CONTA MERCADORIAS – Contrariando dispositivos legais, o contribuinte omitiu saídas de mercadorias tributáveis, resultando na falta de recolhimento do ICMS. Irregularidade esta detectada através de levantamento da Conta Mercadorias.
- OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – LEVANTAMENTO FINANCEIRO – O contribuinte omitiu saídas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto devido, tendo em vista a constatação de que os pagamentos efetuados superaram as receitas auferidas. Irregularidade esta detectada através de Levantamento Financeiro.
Por considerar infringidos os arts. 158, I, e 160, I, c/c os arts. 643, § 4º, II, e 646, todos do RICMS/PB, o autuante procedeu ao lançamento de ofício, exigindo o ICMS no valor total de R$ 47.253,38, ao mesmo tempo em que sugeriu a aplicação da penalidade pecuniária na quantia de R$ 94.506,76, nos termos dos arts. 82, V, “a” e “f” da Lei nº 6.379/96, perfazendo, ambas as quantias, o crédito tributário total de R$ 141.760,14.
Documentos instrutórios constam nas fls. 4 a 45.
Consoante o lançamento em tela, os exercícios objeto das denuncias consistem de 2009 (C. Mercadorias), 2010 e 2011 (Lev. Financeiro).
Regularmente cientificada do resultado da ação fiscal, mediante o Aviso de Recebimento, de fl. 46, recepcionado em 6/7/2012, conforme observação e assinatura do respectivo receptor na própria peça, autuada apresentou reclamação tempestiva, em 1/8/2012 (data exibida na etiqueta de protocolo), através da qual suscita que lhe seja imputado novo dispositivo legal da infração, considerando como base legal a cobrança do ICMS com base na legislação do Simples Nacional, bem como que seja desconsiderado o Levantamento Financeiro, por falta de informações contábeis, a fim de que lhe sejam aplicados os preceitos do art. 643, § 4º, II do RICMS/PB, ou, ainda, que se promova o redirecionamento do dispositivo da penalidade para o preceito do art. 87, I da Res. CGSN nº 94/2011, tendo em vista os fatos que sinteticamente consistem no seguinte:
- trata-se de microempresa optante do Simples Nacional que recebeu via Correios apenas uma via do lançamento de ofício, desacompanhada de qualquer demonstrativo ou planilha que esclarecesse o conteúdo da autuação, impossibilitando a sua defesa;
- apesar da fruição do tratamento tributário privilegiado, advindo do Simples Nacional, durante todo o período da ação fiscal o Fiscal de tributos não utilizou as alíquotas próprias do Simples Nacional;
- as acusações de omissões de receitas de mercadorias tributáveis deveriam ter enquadramento legal na legislação do SN;
- com base nos atributos da confiabilidade e veracidade e na ausência da escrita contábil estar-se-ia fora do alcance da técnica de fiscalização o Demonstrativo Financeiro, havendo de prosperar o arbitramento do lucro, ancorado no art. 643, § 4º, II do RICMS/PB.
Em contestação, a Fiscalização refuta a preliminar suscitada, asseverando que, distintamente da concepção da reclamante, os levantamentos fiscais estão devidamente demonstrados nos autos e os autos processuais foram encaminhados à repartição do domicílio fiscal da impugnante e lá permaneceu à sua disposição durante todo o prazo regimental.
Acresce que os valores alocados nos levantamentos têm origem na escrita fiscal e demais documentos disponibilizados pela própria defendente, que lhe informou não ser possuidora de Livro Caixa.
Informa que os empréstimos bancários tomados junto ao BNB foram devidamente considerados no Levantamento Financeiro, dos exercícios de 2010 e 2011, e que a autuada não apresentou nenhuma duplicata a pagar no exercício seguinte, de modo que, em assim sendo, a soma dos desembolsos foi superior à receita, nos exercícios considerados.
Por fim, aduz que as penalidades aplicadas observam a legislação de regência e pede a manutenção do resultado da ação fiscal.
Após a prestação de informação sobre a inexistência de antecedentes fiscais da autuada (fl. 64), os autos foram conclusos e remetidos à GEJUP, onde foram distribuídos ao julgador fiscal, Christian Vilar de Queiroz, que decidiu pela parcial procedência do auto de infração, inicialmente rejeitando as preliminares suscitadas na defesa e, no mérito, mantendo a exação fiscal relativa ao ICMS nos valores originais, sugeridos no auto infracional, ao fundamento da falta de provas das alegações defensuais. Por outro lado, promoveu a redução da penalidade original, ao fundamento da disciplina emanada do art. 106, II, “c” do CTN e da Lei Estadual n 10.008/2013, tudo conforme se depreende da respectiva ementa, infra:
“OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS. CONTA MERACDORIAS E LEVANTAMENTO FINANCEIRO. FALTA DE PROVAS MATERIAIS. CONFIGURADAS AS ACUSAÇÕES. CORREÇÃO DA PENALIDADE.
Diante da ausência de contraprova nos autos, confirma-se a infração de omissão de saídas de mercadorias tributáveis, detectada através da auditoria da Conta Mercadorias e do Levantamento Financeiro. Mesmo que o contribuinte esteja enquadrado no Regime de Tributação do Simples Nacional, devem incidir as alíquotas e percentuais de multa estabelecidos na legislação tributária estadual do ICMS, haja vista que a referida infração está excetuada quanto à aplicação da legislação específica do Simples Nacional. Redução da multa em decorrência da Lei nº 10.008/2013”.
Diante do que o crédito tributário ficou restrito ao valore de R$ 94.506,76, distribuído em iguais valores de ICMS e de multa infracional, consoante sentença exarada às fls. 69 a 79.
Interposto o recurso hierárquico (fl. 80) e, cientificada da decisão monocrática, em 28/8/2014 (fls. 81 e 82), a autuada tempestivamente interpõe recurso voluntário, na data de 10/9/2014 (fls. 83 a 86), alegando, em síntese, que o procedimento da Fiscalização atropela por inteiro a norma jurídica, por penalizar o contribuinte ao tomar como base da denúncia o levantamento que apresenta a diferença tributável de maior valor, dentre as detectadas nos Levantamentos Financeiro e da Conta Mercadorias.
Defende a recorrente, que no exercício de 2009, caso fosse aplicado o método do movimento financeiro, inexistiria diferença de ICMS a pagar, visto que “as origens superam as aplicações no período, ao passo que nos exercícios de 2010 e 2011, cuja base da acusação consiste no resultado do Levantamento Financeiro, tivesse sido considerado o Levantamento da Conta Mercadorias como substrato da delação, seria exigido um crédito tributário bem menor.
Admite ser facultado à Fiscalização adotar o levantamento (fluxo do caixa) do montante das operações realizadas pelo contribuinte, com base em elementos ponderáveis, aptos a produzir o efeito contábil, fiscal e jurídico que delas emanam e, em consequência, esta existência descaracteriza o levantamento da Conta Mercadorias, o que não ocorreu no caso dos exercícios de 2010 e 2011.
Com base nessas assertivas, alega não haver como prosperar a ação fiscal arrimada no Financeiro, na ausência de documentação idônea para tal fato, devendo, por isso, prevalecer a metodologia da Conta Mercadorias.
Com essas razões, pugna pelo provimento do recurso para que seja declarado improcedente o lançamento de ofício baseado no Levantamento Financeiro, passando a considerar o Levantamento da Conta Mercadorias.
Aportados os autos nesta Casa, estes foram distribuídos a esta relatoria, segundo critério regimentalmente previsto, para o fim de apreciação e julgamento da matéria de que dispõem.
Está relatado.
VOTO |
Em exame, acusações sobre a prática irregular de omissão de saídas tributáveis detectadas mediante Levantamento Financeiro, referente aos exercícios de 2010 e 2011, e através de Levantamento da Conta Mercadorias, correspondente ao exercício de 2009.
Inicialmente, cumpre destacar a regularidade formal do lançamento de ofício referente às acusações baseadas no Levantamento Financeiro e da Conta Mercadorias, visto que atende aos requisitos previstos no art. 142 do CTN.
LEVANTAMENTO DA CONTA MERCADORIAS/Exercício de 2009 – LEVANTAMENTO FINANCEIRO/Exercícios de 2010 e 2011- Omissão de saídas tributáveis.
Trata-se de infração alcançada por técnicas fiscais similares em seu resultado fiscal, ou seja, aplicou-se, no exame fiscal, o Levantamento da Conta Mercadorias, além do Levantamento Financeiro, o primeiro, correspondente ao exercício de 2009, e o segundo, referente aos exercícios de 2010 e 2011, ambos embasados na legislação de regência que disciplina o mecanismo de aferição da regularidade fiscal do contribuinte, nas quais a repercussão tributária, caso apresentem, traduz a existência de saídas de mercadorias tributáveis sem emissão de documentação fiscal, na forma prevista pelos artigos 158, I e 160, I c/c o artigo 643, §§ 3º e 4º, incisos I e II e artigo 646, parágrafo único, todos do RICMS/PB, infra:
“Art. 158. Os contribuintes, excetuados os produtores agropecuários, emitirão Nota Fiscal, modelos 1 ou 1-A, Anexos 15 e 16:
I - sempre que promoverem saída de mercadorias.”
“Art. 160. A nota fiscal será emitida:
I - antes de iniciada a saída das mercadorias”.
“Art. 643. No interesse da Fazenda Estadual, será procedido exame nas escritas fiscal e contábil das pessoas sujeitas à fiscalização, especialmente no que tange à exatidão dos lançamentos e recolhimento do imposto, consoante as operações de cada exercício.
(...)
§ 3º No exame da escrita fiscal de contribuinte que não esteja obrigado ao regime de tributação com base no lucro real e tenha optado por outro sistema de apuração de lucro, nos termos da legislação do Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer Natureza, será exigido livro Caixa, com a escrituração analítica dos recebimentos e pagamentos ocorridos em cada mês.
§ 4º Na hipótese do parágrafo anterior, como mecanismo de aferição no confronto fiscal, será obrigatório:
I - a elaboração de Demonstrativo Financeiro, onde deverão ser evidenciadas todas as receitas e despesas operacionais ou não operacionais, bem como considerada a disponibilidade financeira existente em Caixa e Bancos, devidamente comprovada, no início e o no final do período fiscalizado;
II – o levantamento da Conta Mercadorias, caso em que o montante das vendas deverá ser equivalente ao custo das mercadorias vendidas (CMV) acrescido de valor nunca inferior a 30% (trinta por cento) para qualquer tipo de atividade, devendo tal acréscimo satisfazer as despesas arroladas no Demonstrativo Financeiro de que trata o inciso anterior, deste parágrafo, sendo, ainda, vedada a exclusão do ICMS dos estoques, compras e vendas realizadas, prevalecendo tal exclusão apenas para aqueles que mantenham escrita contábil regular.
§ 5º Na ausência da escrituração do livro Caixa, que trata o § 3º, para que se possa levar a efeito o demonstrativo financeiro referido no parágrafo anterior, os saldos no início e no final do exercício serão considerados inexistentes.”
“Art. 646. O fato de a escrituração indicar insuficiência de caixa, suprimentos à caixa não comprovados ou a manutenção no passivo, de obrigações já pagas ou inexistentes, bem como a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas,autoriza a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis sem pagamento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção.
Parágrafo único - A presunção de que cuida este artigo aplica-se igualmente a qualquer situação em que a soma das despesas, pagamentos de títulos, salários, retiradas, pró-labore, serviços de terceiros, aquisição de bens em geral e outras aplicações do contribuinte seja superior à receita do estabelecimento.”
(Grifos não constantes do original).
Como se deflui da legislação acima transcrita, ambos os Levantamentos, acima referidos, são técnicas de auditagem absolutamente legítimas de que se vale a fiscalização para aferição da movimentação mercantil das empresas, sendo que o Levantamento da Conta Mercadorias deve ser aplicado aos contribuintes que possuem apenas escrita fiscal, como ocorre no caso tela, visto não ter sido demonstrado nos autos a existência de contabilidade regular da autuada.
As diferenças apuradas suportam o lançamento indiciário do ICMS devido, posto que firmam presunção de saídas tributáveis sem o pagamento do imposto correspondente. Porém, como se trata de presunção relativa, admite-se a prova em contrário a cargo do contribuinte, uma vez que este é o possuidor de toda a documentação fiscal do estabelecimento que lhe pertence.
O Levantamento Financeiro, por sua vez, consiste num método de aferição utilizado como uma opção de levantamento de caixa e tem como finalidade verificar se o contribuinte utilizou recursos em volume superior às suas disponibilidades financeiras, situação que, em se configurando, cede lugar a exigência do imposto sobre a diferença entre o montante aplicado e o disponível, diante da sua significação idêntica a da Conta Mercadorias: saídas tributáveis não faturadas.
Para tanto, efetua-se o balanceamento entre as vendas e os dispêndios, considerando-se os valores totais de receitas e despesas, no exercício fiscalizado, bem como os saldos, inicial e final, em banco e caixa, caso o contribuinte seja possuidor de livro Caixa, do contrário, considera-se zero esses saldos correspondentes a essa rubrica. Tal procedimento encontra respaldo no art. 643, § 4º, I, e § 5º, do RICMS/PB, acima transcrito.
Nesse compasso, no valor das receitas e despesas computam-se as aquisições e as vendas de mercadorias independentemente do regime de tributação a que estiverem submetidas, e ainda que o contribuinte também opere com mercadorias isentas ou adstritas a outro regime de tributação, além do normal.
A diferença a maior verificada no valor das despesas autoriza a aplicação de que esta se originou de omissão de saídas tributáveis (Aplicação do parágrafo único do art. 646 do RICMS/PB), a qual é afastada mediante prova irrefutável da inocorrência do fato, erro na montagem do respectivo levantamento ou, ainda, ante a demonstração de que nem todas as saídas omitidas são de mercadorias tributáveis.
Em ambos os casos – Levantamento da Conta Mercadorias/2009 e Levantamento Financeiro/2010/2011 - a recorrente se manifestou contrária, ao argumento de que a Fiscalização atropelara as regras da norma jurídica por haver tomado como critério do lançamento de ofício o procedimento que apontou resultado mais prejudicial ao estabelecimento, penalizando-o desfavoravelmente. Em suma, no seu entender, o critério correto seria o que contempla o levantamento cujo resultado se apresenta mais favorável ao contribuinte.
Todavia, não assiste razão à recorrente. Consoante os dispositivos legais acima transcritos, diante da elaboração de ambos os levantamentos – Financeiro e da Conta Mercadorias -, e que é obrigatória, à Fiscalização compete a eleição, como base para o lançamento de ofício, aquele cujo resultado se apresenta de maior monta, dado à circunstância de que neste está contido o de menor repercussão tributária.
Situação semelhante deu origem ao Acórdão CRF nº 384/77, cuja ementa transcrevo:
“LEVANTAMENTO QUANTITATIVO – Procedimento concomitante com o levantamento dos pagamentos de duplicatas.
Tanto o levantamento quantitativo, como o das duplicatas pagas, buscam verificar a realidade das saídas registradas. Quando realizados com relação ao mesmo período, com resultados em um mesmo sentido, um é suporte do outro, prevalecendo o de maior valor como base para lançamento do ICM” (Rel. Cons. Antonio Airton Gonçalves).
Com efeito, considerando que caracteriza infração funcional a omissão da Fiscalização que, no exercício de suas atribuições, ao se deparar com uma irregularidade fiscal deixa de promover o correspondente lançamento de ofício, não encontra suporte legal a pretensão da recorrente, afinal é lógico ser de maior alcance fiscal o procedimento de apuração da falta cujo resultado encerra maior monta.
Portanto, os argumentos apresentados pela recorrente não têm o condão de elidir a situação que lhe é adversa.
Diante do exposto, atesta-se regularidade na aplicação da técnica do Levantamento da Conta Mercadorias/2009.
Considerando que a diferença a maior verificada no valor das despesas apontadas no Levantamento Financeiro autoriza a aplicação de que esta se originou de omissão de saídas tributáveis (Aplicação do parágrafo único do art. 646 do RICMS/PB), essa premissa pode ceder mediante prova irrefutável da inocorrência do fato, erro na montagem do respectivo levantamento ou, ainda, ante a demonstração de que nem todas as saídas omitidas são de mercadorias tributáveis.
Nesta última hipótese - demonstração de que nem todas as saídas apontadas no Financeiro como omitidas são de mercadorias tributáveis -, a presunção pode ser excluída no todo ou em parte, caso o Levantamento da Conta Mercadorias, do mesmo exercício, revele a existência de prejuízo bruto com mercadorias não tributáveis, isentas ou com Substituição Tributária.
Isto porque essas circunstâncias são denotativas de vendas sem emissão de nota fiscal, porém sem repercussão na obrigação principal do ICMS, impondo-se, pois, a dedução do valor correspondente da diferença a maior nas despesas, apontada no Levantamento Financeiro, por óbvio, do mesmo exercício, com vistas a evitar “bis in idem” ao tributar operações excluídas da tributação pelo imposto estadual (ICMS Substituição, porque o imposto é pago por antecipação, ou, ainda, porque a própria lei colocou a salvo da tributação por isenção do ICMS ou não incidência do imposto). Afinal, a presunção que se instaura sobre a diferença apurada no Levantamento Financeiro se reporta à omissão de saídas tributáveis (art. 646, parágrafo único, do RICMS/PB), nada mais lógico, justo e legal do que se proceder a dedução do prejuízo bruto com mercadorias não tributáveis, apontado na Conta Mercadorias.
Frente ao cenário acima mencionado, a própria Fiscalização pode promover os citados ajustes no Financeiro ou, caso não o faça, cumpre ao julgador administrativo essa tarefa.
Nesse sentido, decidiu esta egrégia Corte de Julgamento, na ocasião da análise de questão semelhante que deu origem ao acórdão baixo transcrito:
“RECURSO VOLUNTÁRIO PROVIDO EM PARTE. OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS. LEVANTAMENTO FINANCEIRO. OPERAÇÕES ISENTAS E/OU NÃO TRIBUTADAS. PARCIALIDADE. AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE. REFORMA DA DECISÃO RECORRIDA.
A denúncia de saídas de mercadorias tributáveis sem emissão de notas fiscais constatadas mediante levantamento financeiro suscita alteração no valor do crédito tributário correspondente, frente à constatação de que uma parte dessas saídas compreenderam mercadorias não tributáveis ou sujeitas ao regime de pagamento por substituição tributária, impondo, dessa forma, a dedução do valor das operações apontadas no Levantamento da Conta Mercadorias com mercadorias não tributáveis ou com substituição tributária da diferença tributável apurada no Demonstrativo Financeiro. Reforma da decisão recorrida”. (Acórdão nº 318/2013, DOE de 11/10/2013. Rel. Cons. João Lincoln Diniz Borges).
No caso dos autos, apenas o Levantamento da Conta Mercadorias/2010 apresenta prejuízo bruto com mercadorias não tributáveis. Assim sendo, para o fim de se promover a dedução acima comentada, com relação ao resultado da diferença apurada no Financeiro, do mesmo exercício, e que serve de suporte a denúncia correspondente, o prejuízo bruto com mercadorias não tributáveis, apontado na cita Conta Mercadorias, revela que nem todas as saídas apontadas como omitidas no Levantamento Financeiro em referência traduzem a infração de omissão de saídas de mercadorias normalmente tributáveis.
Diante do que, promovo a mencionada dedução do Financeiro referente ao exercício de 2010, de modo que a diferença tributável desse exercício passa ao seguinte valor:
LEVANTAMENTO FINANCEIRO/2010 – Calculo do valor do ICMS devido:
Diferença/Lev. Financeiro/2010 R$ 112.308,83
Prej. Bruto/Não Tributáveis/C. Merc./2010 R$ (10.506,42)
Diferença Tributável/B. de Cálculo ICMS R$ 101.802,41
ICMS (17%) R$ 17.306,41
Quanto ao Financeiro do exercício de 2011, nada há a reparar.
Com essas considerações, reformo, quanto aos valores do ICMS devido a decisão singular.
Quanto à penalidade originalmente sugerida, corroboro a decisão singular, haja vista que, após a autuação, um fato superveniente veio em socorro da recorrente. Tratam-se das alterações advindas da Lei nº 10.008/13 (DOE de 06/06/13) com efeitos a partir de 01/09/2013, de modo que as penalidades lançadas de ofício passam a se reger pela regra estatuída na citada Lei, a partir data supra, em face do princípio da retroatividade da lei mais benigna, estabelecido no art. 106, inciso II, alínea “c”, do CTN.
Assim, é cabível a aplicação da multa por infração disciplinada na referida Lei Estadual que estabelece sanção menos severa que a prevista na lei vigente ao tempo da prática do ato delituoso, de forma que as multas por infração sugeridas ao caso em foco passam a ser calculadas com base no percentual de 100%, fixando-se o crédito tributário devido consoante os valores abaixo:
Diante do que, cumpre-me apenas demonstrar os valores do crédito tributário devido, após as correções acima mencionadas:
Infração Período ICMS M. Infr. Total
Omiss. Saíd./C. Merc. 1.1. a 31.12.09 77,10 77,10 154,30
Omiss. Saíd./L. Fin. 1/1. a 31/12/10 17.306,41 17.306,41 34.612,82
Omiss. Saíd./L. Fin. 1/1. a 31/12/11 28.083,78 28.083,78 56.167,56
Total 45.467,29 45.467,29 90.934,58
Com esses fundamentos,
VOTO pelo recebimento dos recursos hierárquico, por regular, e voluntário, por regular e tempestivo, e, quanto ao mérito pelo desprovimento do primeiro e parcial provimento do segundo, para reformar, quanto aos valores, a sentença exarada na instância monocrática, que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento n.º 93300008.09.00001210/2012-02 (fl. 3), lavrado em 18/6/2012, contra MEDEIROS E MARQUES ELETROMÓVEIS LTDA., contribuinte inscrito no CCICMS, sob nº 16.164.259-4, devidamente qualificado nos autos, e declarar devido o crédito tributário no montante de R$ 90.934,58 (noventa mil, novecentos e trinta e quatro reais e cinquenta e oito centavos), sendo R$ 45.467,29 (quarenta e cinco mil, quatrocentos e sessenta e sete reais e vinte e nove centavos), de ICMS, por infringência aos arts. 158, I e 160, I c/c os arts. 643, § 4º, I e II, e 646, parágrafo único, do RICMS/PB, e R$ 45.467,29 (quarenta e cinco mil, quatrocentos e sessenta e sete reais e vinte e nove centavos), de multa por infração, nos termos do artigos 82, V, “a” e “f”, da Lei nº 6.379/96, com nova redação dada pela Lei Estadual nº 10.008, de 5/6/2013.
Em tempo, cancelo, por irregular, o valor de R$ 50.934,58 (cinquenta mil, novecentos e trinta e quatro reais e cinquenta e oito centavos), sendo R$ 1.786,09 (um mil, setecentos e oitenta e seis reais e nove centavos), de ICMS, e R$ 49.039,47 (quarenta e nove mil, trinta e nove reais e quarenta e sete centavos), de multa por infração, pelos motivos acima expendidos.
Primeira Câmara de Julgamento, Sala das Sessões, Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em 31 de março de 2017.
#ARIA DAS GRAÇAS D. DE OLIVEIRA LIMA
Conselheira Relatora
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