Acórdão nº579/2017
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA
Processo Nº149.129.2013-4
Recursos HIE/VOL/CRF Nº702/2014
TRIBUNAL PLENO
1ªRecorrente:GERÊNCIA EXEC.DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS.
2ªRecorrente:FRIGORÍFICO JAHU LTDA.
1ªRecorrida:FRIGORÍFICO JAHU LTDA.
2ªRecorrida:GERÊNCIA EXEC.DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS.
Preparadora:RECEBEDORIA DE RENDAS DE JOÃO PESSOA.
Autuante(s):ARLEIDE Mª DA SILVA BARBOSA E CARLOS G.GABÍNIO
Relatora: CONSª.MARIA DAS GRAÇAS D.DE OLIVEIRA LIMA.
ICMS DIFERIDO. FALTA DE RECOLHIMENTO. APURAÇÃO DO RESULTADO INDUSTRIAL. OMISSÃO DE SAÍDAS. CONFIRMAÇÃO. NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO NÃO REGISTRADAS. OMISSÃO DE SAÍDAS PRETÉRITAS TRIBUTÁVEIS. CONCORRÊNCIA EM PARTE. FALTA DE PROVAS CAPAZES DE ELIDIR OS EFEITOS DA PRESUNÇÃO QUANTO AO REMANESCENTE DAS NOTAS FISCAIS NÃO LANÇADAS. AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE. MANTIDA QUANTO AOS VALORES A DECISÃO RECORRIDA. RECURSO HIERÁRQUICO DESPROVIDO E VOLUNTÁRIO PARCIALMENTE PROVIDO.
- Reputa-se regular o lançamento de ofício baseado na acusação de falta de recolhimento do ICMS Diferido, incidente sobre as operações de vendas/compra de mercadorias efetuadas a produtores não inscritos no CCICMS estadual, diante da falta de comprovação do cumprimento da referida obrigação tributária principal.
- Segundo a técnica denominada “Resultado Industrial”, os custos da empresa na produção de bens devem ser iguais ou inferiores às vendas, de modo que, a ocorrência de saídas tributáveis menores que o custo da produção, cede lugar á caracterização de que houve a prática irregular de omissão de pagamento do imposto devido, mormente quando não provada a ocorrência de equívocos da Fiscalização.
- Excluída parte das notas fiscais objeto do lançamento de ofício consistente na acusação de omissão de saídas tributáveis pretéritas, constatada mediante falta do seu lançamento nos livros próprios, em face da concorrência que se caracterizou com a infração de omissão de saídas tributáveis identificada no procedimento de Apuração do Resultado Industrial, que têm por base os mesmos exercícios. Mantida a delação sobre o remanescente das notas fiscais não registradas, devido a não comprovação da improcedência da presunção relativa legalmente estabelecida.
- Impossibilidade da aplicação da carga tributária reduzida quanto às as acusações referentes ao ICMS Diferido e não pago e à diferença tributária que evidencia omissão de saídas tributáveis.
Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...
A C O R D A M os membros do Tribunal Pleno de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, à unanimidade, e de acordo com o voto da relatora, pelo recebimento dos recursos hierárquico, por regular, e voluntário, por regular e tempestivo, e quanto ao mérito, pelo desprovimento do primeiroe parcial provimento do segundo,para alterar quanto aos valores, a decisão proferida pela primeira instância, que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00001807/2013-20, de fls. 3 e 4, lavrado em 30 de outubro de 2013, contra a empresa FRIGORÍFICO JAHU LTDA., inscrita no CCICMS sob nº 16.160.426-9,devidamente qualificada nos autos, obrigando-a ao recolhimento do ICMS no valor de R$ 3.547.385,08 (três milhões, quinhentos e quarenta e sete mil, trezentos e oitenta e cinco reais e oito centavos) por infringência aos arts. 9º, § 2º, 158, I e 160, I, c/c os arts. 645, §§ 1º e 2°, e 646, todos do RICMS-PB, aprovado pelo Decreto nº 18.930/97, e multa por infração na importância de R$ 3.360.956,86 (três milhões, trezentos e sessenta mil, novecentos e cinquenta e seis reais e oitenta e seis centavos), nos termos do art. 82, inciso II, alínea “e”, e inciso V, alínea “f”, da Lei nº 6.379/96, com as alterações advindas Lei nº 10.008/2013, perfazendo o crédito tributário o montante de R$ 6.908.341,94 (seis milhões, novecentos e oito mil, trezentos e quarenta e um reais e noventa e quatro centavos).
Em tempo, cancelo, por irregular, o montante de R$ 369.416,88 (trezentos e sessenta e nove mil, quatrocentos e dezesseis reais e oitenta e oito centavos), dividido entre valores iguais de ICMS de multa por infração, pelos fundamentos acima expendidos.
Desobrigado do Recurso Hierárquico, na expressão do art. 84, parágrafo único, IV, da Lei nº 10.094/13.
P.R.I.
Tribunal Pleno, Sala das Sessões Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em 29 de novembro de 2017.
Maria das Graças Donato de Oliveira Lima
Conselheira Relatora
Gianni Cunha da Silveira Cavalcante
Presidente
Participaram do presente julgamento os Conselheiros do Tribunal Pleno, PETRÔNIO RODRIGUES LIMA, JOÃO LINCOLN DINIZ BORGES, THÁIS GUIMARÃES TEIXEIRA, AUREA LUCIA DOS SANTOS SOARES VILAR (Suplente), NAYLA COELI DA COSTA BRITO CARVALHO, DOMÊNICA COUTINHO DE SOUZA FURTADO,(Ausência da Conselheira) DORICLÉCIA DO NASCIMENTO LIMA PEREIRA.
Assessora Jurídica
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RELATÓRIO |
Submetidos a exame nesta Corte de Justiça Fiscal os recursos hierárquico evoluntário,interpostos contra decisão monocrática que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 9300008.09.00001807/2013-20 (fls. 3 e 4), lavrado em 30 de outubro de 2013, de acordo com o qual a empresa acima citada, FRIGORÍFICO JAHU LTDA., é acusada das irregularidades fiscais assim descritas no referido libelo basilar:
- DIFERIMENTO – FALTA DE PAGAMENTO DO IMPOSTO DIFERIDO – Contrariando dispositivos legais, o contribuinte adquiriu mercadorias com imposto diferido e não efetuou o seu recolhimento na operação subsequente.
Nota Explicativa – Valor decorrente da falta de recolhimento do ICMS diferido por ocasião da emissão de notas fiscais de entradas de camarões in natura, adquiridos junto a produtores não inscritos, nos termos do art. 9º, § 2º e do art. 10, inciso XIII, todos do RICMS/PB, cujas saídas subsequentes ocorreram em até 90 (noventa) dias a partir da entrada da mercadoria, fato constatado por esta Fiscalização e declarado pelo contribuinte, conforme declaração e demonstrativo em anexo, que ficam sendo parte integrante do presente auto de infração.
- FALTA DE LANÇAMENTO DE N. F. DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS PRÓPRIOS – Aquisição de mercadorias com recursos advindos de omissões de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto devido, constatada pela falta de registro de notas fiscais nos livros próprios.
Nota Explicativa – Falta de
lançamento na escrita fiscal/contábil (livro Registro de Entradas e Livro Diário), de notas fiscais de aquisições de mercadorias, nos termos do art. 646 do RICMS/PB, conforme demonstrativo em anexo, que fica sendo parte integrante do presente auto de infração.
- OMISSÃO DE SAÍDAS DE PRODUTOS TRIBUTÁVEIS. Contrariando dispositivos legais, o contribuinte omitiu saídas de produtos tributáveis, culminando na falta de recolhimento do ICMS, evidenciada pelas vendas abaixo do preço de custo dos produtos acabados.
Nota Explicativa: Custo de produção apurado conforme demonstrativo em anexo, elaborado a partir dos valores registrados na escrita fiscal e respectivos documentos fornecidos pelo contribuinte, que ficam sendo parte integrante do presente auto de infração.
Por considerar infringido o art. 9º, § 2º, bem como os arts. 158, I e 160, I, c/c os arts. 645, §§ 1º e 2º, e 646, todos do RICMS/PB, a Fiscalização procedeu ao lançamento de ofício em tela, exigindo o ICMS no valor de R$ 3.732.093,52, e também sugerindo a multa por infração no importe de R$ 3.545.665,30, com fundamento nos arts. 82, II, “e” e V, “f” da Lei nº 6. 379/96, perfazendo, ambos os valores, um crédito tributário no montante de R$ 7.277.758,82.
Documentos instrutórios constam às fls. 5 a 81: Termo de Início de Fiscalização, instrumento procuratório, demonstrativos dos procedimentos de apuração das faltas aplicados no exame fiscal (Demonstrativo do Resultado Industrial/2010/2011/2012, Quadro Demonstrativo do ICMS Diferido a Recolher, nos quais se inclui a chave da acesso às correspondentes notas fiscais de entradas, declaração, cópia de notas fiscais de aquisição referidas no Quadro Demonstrativo atinente ao ICMS Diferido, Quadro Demonstrativo das Notas Fiscais de Aquisições de Mercadorias não Registradas nos Livros Próprios, cópia de informações colhidas no sistema ATF, desta Secretaria de Estado da Receita, à respeito de notas fiscais de saídas emitidas por terceiros para o contribuinte autuado, cópia de DANFE’S referentes a notas ficais destinadas à autuada, e Termo de Encerramento de Fiscalização).
Regularmente cientificada do resultado da ação fiscal, conforme atesta o comprovante de ciência e entrega do auto infracional, assinado por seu receptor, em 6/11/2013, a autuada apresenta defesa tempestiva (fls. 84 – 124), fazendo-o por intermédio de advogado regularmente habilitado nos autos, segundo o instrumento procuratório de fl. 132, requerendo, inicialmente, a nulidade do lançamento de ofício atinente à acusação de omissão de saídas baseada no levantamento do custo da produção, referente aos exercícios de 2010, 2011 e 2012, ao argumento de que esta está fulcrada em presunção prevista em dispositivo inaplicável à hipótese, além da sua imprestabilidade como instrumento apropriado a lastrear tal acusação, seja porque não leva em conta que a venda abaixo do custo pode espelhar unicamente a efetiva obtenção de prejuízo, seja por não considerar elementos intrínsecos a esse tipo de atividade, p. ex., as perdas produtivas, o rendimento dos insumos, etc., seja porque também não observa a existência de contabilidade regular da empresa, para o efeito de verificação de erros nos lançamentos contábeis.
Na questão de mérito, alega as razões da sua discordância quanto às acusações constantes do auto infracional e pugna pela sua improcedência ou, caso assim não seja entendido, pede que se promova a adequação do lançamento, com a adoção da alíquota aplicável às operações autuadas – primeira e terceira delação - tal como descrito no TARE, cuja cópia anexa às fls. 207 – 310.
Junta demais documentos às fls. 126 – 210.
Mediante contestação, de fls. 215 – 229, os autuantes requerem a manutenção parcial do auto de infração, após efetuar ajustes no procedimento fiscal que detectou falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios e rebaterem as demais alegações recursais.
Anexa documentos às fls. 230 – 262.
Conclusos os autos à Gerência de Julgamento de Processos Fiscais, após a informação de não haver antecedentes fiscais da denunciada (fl. 264), estes aportaram na Gerência Executiva de julgamento de Processos Fiscais, onde foram distribuídos ao julgador fiscal, Anísio Costa Neto, que concluiu pela Parcial Procedência do auto de infração, consoante a sentença exarada às fls. 267 – 279, de modo que o crédito tributário ficou restrito ao total de R$ 7.128.426,44, sendo R$ 3.657.427,33, de ICMS, e R$ 3.470.999,11, de multa por infração.
Na sequência, procedeu-se à interposição de recurso hierárquico e a regular ciência da decisão monocrática à autuada (consoante atestam os documentos de fls. 281 - 282), a qual interpõe recurso voluntário (fls. 286 – 329), fazendo-se representar por advogado (procuração, de fl. 337), alegando fatos que, em síntese, consistem no seguinte:
Falta de pagamento do ICMS Diferido - Exercícios de 2010 e 2011.
- o ICMS calculado sobre as suas saídas de camarão foi pago sem que tenha sido promovido o aproveitamento de crédito sobre as respectivas entradas, o imposto devido sobre as operações, entradas e saídas, afigura-se pago, não se cogitando de que haja de proceder a novo recolhimento, a título de ICMS Diferido ou qualquer outro que seja;
- isto porque sobre o valor de suas saídas, a indústria aplica a alíquota do ICMS pertinente, lançando o resultado a débito do imposto em sua escrita fiscal e recolhendo-o integralmente ao final do período de apuração, sem descontar crédito algum das operações anteriores (saída do produtor rural), cujo crédito a indústria teria direito em razão dessas operações anteriores, exatamente o imposto devido pelo produtor rural e que, em razão do diferimento, tem de ser recolhido pela indústria, de modo que, nesse cenário, a fim de desincumbir-se de sua obrigação de pagar o imposto da operação anterior, basta que, em sua escrita, a indústria não se credite dele;
- isto feito, está recolhido tanto o imposto devido sobre as saídas da indústria (operação própria) quanto aquele devido sobre as saídas praticadas pelo produtor rural (substituído), nada mais sendo devido;
- caso se exija o recolhimento do ICMS a título de diferimento, ter-se-á que o Estado auferirá ICMS superior ao devido, eis que o imposto terá incidido de forma cumulativa;
Falta de lançamento de Nota Fiscal de Aquisição nos livros próprios – Exercícios e 2009, 2010, 2011 e 2012.
- a hipótese prevista no art. 646, IV do RICMS/PB não se configurou na prática, seja por que as Notas Fiscais nº 1.396 e 1.460 constam registradas no livro Diário, conforme demonstram as próprias cópias das páginas desse livro, seja porque existe prova de que os recursos utilizados para fazer frente a essas aquisições foram provenientes do caixa escritural da empresa;
- as mercadorias constantes nas Notas Fiscais nº 1.081, 352 e 1.237 não foram adquiridas pela recorrente, conforme se depreende da carta de correção, mediante as quais procedeu-se à retificação do destinatário;
- o emitente dessas notas fiscais – de nºs 1.081 e 1.237 - reconheceu ter descrito o nome da recorrente como destinatária por equívoco, tanto que formalizaram junto à SER/PB requerimento de correção, inclusive das GIM’s do período de emissão das referidas notas fiscais, conforme documentos acostados à impugnação, os quais não foram aceitos como prova do fato, pelo julgador singular, que afirmou, de forma aleatória, que as cartas de correção foram apresentadas “em hipóteses não permitidas na pela legislação”, sem esclarecer de forma minimamente concreta que irregularidades são essas que a tornariam imprestáveis a tal finalidade e, além disso, é certo que o d. julgador não é a autoridade competente para apreciar a regularidade das cartas de correção e, de resto não indicou qual a decisão tomada a respeito pelo órgão que detém a competência para tanto;
- quanto às Notas Fiscais nºs 38, 50, 272, 328, 4, 410, 690, 1.195, 1.230, 24 e 92 não foi provada sequer a existência do fato cuja legislação autoriza a presunção de omissão e saídas pretéritas tributáveis, pois a autoridade fiscal não demonstrou que (a) sequer existam as nota ficais de aquisição supostamente não escrituradas, (b) tendo sido emitidas, o foram em face da recorrente e (c) que da sua emissão tenha efetivamente decorrido a entrada de mercadorias não contabilizadas no estabelecimento da recorrente, visto que a acusação tem como prova do fato apenas uma singela lista de números de notas fiscais.
Omissão de saídas tributáveis – Vendas abaixo do custo dos produtos acabados. Exercícios de 2010, 2011 e 2012.
Requer a nulidade do lançamento de ofício consistente na acusação em tela, aos fundamentos que sinteticamente seguem:
- o Decreto nº 33.047/2012, de 22/6/2012, que deu nova redação ao art. 645, § 1º do RICMS/PB, não traduz mera retroação de quaisquer procedimentos de apuração do imposto, consoante entendeu o julgador singular, visto que a norma em questão estabelece presunção quanto ao próprio núcleo da regra matriz de incidência tributária e isso não tem de “formal” ou “procedimental”, de modo que não tem amparo no art. 144, § 1º do CTN, para o fim de ser utilizada para alcançar fatos geradores ocorridos antes da sua vigência;
- as conclusões do levantamento procedido pela Fiscalização são meramente subsidiárias às demais aferições que efetivamente se prestam a essa finalidade, de modo que, nos termos da dicção do art. 645, caput, do RICMS/PB, quando este diz que “constituem elementos subsidiários para o cálculo da produção e correspondente pagamento do imposto...”, a apuração dos custos da produção não é procedimento que, sozinho, a despeito de quaisquer outras aferições, tenha aptidão de confirmar a ocorrência de saídas não tributadas, pois nessa situação o contribuinte pode estar, na prática, financiando seus custos com recursos hauridos no mercado bancário ou com lucro decorrente de atividades diversas da industrial ou, ainda, com rendimentos de aplicações financeiras;
- nesse cenário não é legítimo que se opte por uma conclusão em detrimento de outra sem que nenhuma outra análise complementar tenha sido feita em benefício da tese que se decidiu adotar, tanto a Fiscalização como a decisão “a quo”;
- o levantamento se revela imprestável por também não haver levado em conta elementos extrínsecos à atividade produtiva, a ex. das perdas produtivas, o rendimento dos insumos, etc., e, ainda, por não ter demonstrado a existência de erros nos lançamentos contábeis, a despeito de se tratar de empresa possuidora de escrita contábil regular.
Subsidiariamente, a recorrente pugna pela improcedência do lançamento compulsório que denuncia a prática infracional acima referida, em decorrência dos seguintes fundamentos que aduz à sua peça recursal:
- no levantamento fiscal o autor do feito incorreu em equívoco por haver computado no custo da produção as entradas de matérias-primas que após sua aquisição foram remetidas para industrialização por outros sujeitos, atividade essa que caracteriza comportamento essencialmente comercial (devido ao repasse, sem industrialização, logo após à compra), de sorte que, feita a correção do equívoco, evidencia-se que em todos os períodos fiscalizados a diferença identificada pela Fiscalização se inverte, ou seja, os valores das saídas de mercadorias revelam-se superiores aos do custo da produção, de modo que, apesar do entendimento restritivo da decisão “a quo” (quando ao mesmo tempo diz que não foram apresentados documentos necessários `aprova do volume de remessa e, em seguida, rejeita a diligência fiscal requerida com objetivo de produzir a prova do fato em questão), a recorrente acosta ao recurso cópias de todas as notas fiscais de remessa para industrialização, cujo expurgo confirma a alegação recursal.
Erro da identificação da alíquota aplicável – Primeira e terceira acusações.
Afirma a recorrente que relativamente a essas acusações a Fiscalização adotou alíquota distinta da que de deveria ter sido aplicada, pois nos anos de 2010 a 2012, vigia o Termo de Acordo de Regime Especial – TARE, junto ao Estado da Paraíba, de acordo com o qual a carga tributária de ICMS Normal devida sobre suas operações, internas e interestaduais, haveria de corresponder a 3% (três por cento) do seu respectivo valor, de forma que a seu ver, a alíquota aplicável há de ser a prevista no mencionado TARE, que produziu efeitos entre maio de 2010 a maio de 2013 e não contém cláusulas que restrinjam sua aplicabilidade ao recolhimento espontâneo do imposto, o que de logo requer.
Com essas razões, reapresenta seus pleitos de reforma de decisão singular, no sentido de (a) reconhecer as nulidades manejadas, cancelando-se o lançamento fiscal, ou (b) a improcedência do auto infracional, nos termos descritos nos demais itens.
Subsidiariamente, requer (c) a adequação do lançamento aos termos da alíquota efetivamente aplicável às operações autuadas, cancelando-se o excesso decorrente.
Junta documentos às fls. 328 a 586.
Aportados nesta Casa, os autos foram distribuídos a esta relatoria, segundo critério regimentalmente previsto, para o fim de apreciação e julgamento.
Após exame dos elementos que instruem os autos, requisitei diligência aos autuantes, mediante o despacho de fls. 588 – 589, os quais deram atendimento por meio dos esclarecimentos de fls. 591 – 608, onde requerem a manutenção parcial do auto de infração, aos fundamentos infra:
- é devido o pagamento do ICMS Diferido, lançado no auto infracional, no valor de R$ 372.856,47, diante da constatação de que a saída de camarão in natura adquirido pela recorrente ocorre em prazo médio de 60 dias, mas nunca inferior a 90 dias, sendo, pois, regular a exação fiscal baseada na diferença apontada no quadro demonstrativo, de fls. 11 e 12, nos autos;
- relativamente à acusação alicerçada nas notas fiscais de aquisição não lançadas nos livros próprios, tem-se que:
a) entre as provas apresentadas pela recorrente não consta do livro Diário qualquer lançamento ou mesmo referência ao número deste, da página e do livro Diário em que porventura possa existir o registro contábil das notas fiscais de numeração 1.396 e 1.460, e as cópias acostadas, às fls. 340 – 346, correspondem a lançamentos do livro Diário do exercício de 2011, enquanto as notas em questão foram emitidas em 17/7/2009 e 24/8/2009, respectivamente, ambas do exercício de 2009, portanto, devem ser mantidas na exação fiscal;
b) quanto às cartas de correções apresentadas pela recorrente, objetivando excluir da exigência fiscal as notas fiscais de numeração 1.081, 352 e 1.237, ao argumento de ter ocorrido erro que consistiria no fato de tê-la indicado como destinatária das mercadorias, nenhum valor fiscal possuem, visto que implicam em mudança do destinatário, o que não encontra suporte no art. 160, § 7º, do RICMS/PB, e além disso os livros fiscais (cópias) apresentados às fls. 180 – 200 foram emitidos em 2013 (vide versão do programa gerador, ao final da página), assim como as GIM´s Retificadoras, cuja data de entrega é posterior à lavratura do auto de infração ora questionado (grifo constante no original) e, por fim, quanto à N. Fiscal n. 352, nenhuma prova foi apresentada, que se limitou a alegar que as mercadorias não foram adquiridas, apesar de os registros constantes nesta Secretaria indicarem o contrário;
c) não procede o argumento de que a acusação referente às N. Fiscais de numeração 38, 50, 272, 328, 04, 410, 690, 1.195, 1.230, 24 e 92, conte vício de nulidade por não terem sido apresentadas cópias dos citados documentos, visto que antes mesmo da lavratura do auto de infração esta Fiscalização forneceu à empresa cópia dessa documentação e, além disso, as cópias de tais notas encontram-se anexadas aos autos, às fls. 65, 66, 67, 68, 69, 70, 71, 73, 74, 75 e 76;
d) por essas razões deve ser confirmada a exclusão do valor correspondente apenas às N. Fiscais de nºs 0065, 107, 3.286 e 32.749, e mantida a exigência do ICMS no valor de R$ 112.709,56, nos termos do demonstrativo que se anexa.
No que concerne à infração de omissão de saídas evidenciadas pelas vendas baixo do custo dos produtos acabados, a Fiscalização informa que:
- a técnica da Apuração do Resultado Industrial possui entendimento pacífico nos órgãos de julgamento de processos administrativos tributários desta Secretaria, contando com inúmeras decisões deste eg. Conselho de Recursos Fiscais, no sentido da legitimidade na aplicação dos dispositivos regulamentares que a norteiam;
- no procedimento de apuração da falta deduzimos as saídas de matéria-prima, ocorridas no período, sendo R$ 17.369,92, no exercício de 2010, R$ 176.271,25, no exercício de 2011, e R$ 137.959,95, no exercício de 2012, conforme pode ser constatado nos demonstrativos de fls. 8, 9 e 10;
- relativamente às saídas a título de “remessa para industrialização por encomenda”, os produtos consignados nas respectivas notas fiscais não eram matéria-prima, visto que tinham sido submetidos a processo de industrialização por parte da autuada e transformadas em novo produto (antes mesmo de sua saída a título de remessa), passando a ter nova denominação (camarão sem cabeça, camarão descascado, camarão eviscerado, camarão tail-on, etc.), novo código de produto, nova aparência, nova apresentação, nova embalagem, etc., conforme constatamos in loco demonstramos mediante documentos fiscais que juntamos a título de exemplo, às fls. 232 – 260, de modo que essas saídas se tratam de produto acabado (produto final) e não podem ser expurgadas das entradas de matéria-prima;
- caso fosse aceita a tese de deduzir do montante da matéria-prima as “Remessas para Industrialização por Encomenda”, CFOP 6901, teríamos que, em contrapartida, acrescentar ao demonstrativo do Resultado Industrial os valores existentes na escrita fiscal, a título de “Retorno de Mercadoria Remetida para Industrialização por Encomenda”, CFOP 2902, pois sabemos que, para cada operação de remessa, quando praticada de forma lícita, compreende um posterior retorno, tendo ocorrido que nos períodos fiscalizados os retornos foram inferiores às remessas, totalizando uma diferença a menor de R$ 789.358,74;
- oportuno destacar que os valores das saídas a título de “Remessa para Industrialização” (sem incidência do ICMS) superam em mais de vinte milhões de reais o total dos valores faturados a título de “Vendas e Transferências” de produtos acabados, ou seja, o total das vendas e transferências de produtos acabados não se iguala sequer aos valores das saídas registradas a título de remessa para industrialização, cuja única explicação para essa anomalia é que os produtos industrializados pela autuada foram transferidos para outros Estados, acobertados por nota fiscais emitidas a título de “Remessa para Industrialização por Encomenda”, sem pagamento do imposto e, posteriormente, retornados apenas simbolicamente a este Estado, ficando a “omissão e saídas de produtos tributáveis” evidenciada após a “Apuração do Resultado Industrial”, conforme demonstrativos de fls. 8. 9 e 10.
Relativamente ao argumento recursal sobre erro na alíquota aplicável, em verdade tem-se o seguinte:
- o Regime Especial concedido mediante o Processo nº 065550.2009-1, Parecer nº 2010.01.00.00301, cassado desde 1º/11/2012, estabelecia que a sistemática para redução da carga tributária para 3% compreendia a observância de algumas obrigações, tratando-se, pois de benefício que se dava por meio do lançamento, no livro Registro de Apuração do ICMS, de crédito presumido de ICMS calculado por ocasião da “Apuração Mensal do ICMS Normal”, não há fundamentação racional que possibilite a aplicação de crédito presumido para dedução do ICMS apontado em Auto de Infração, ainda mais quando as infrações se reportam à falta de recolhimento de ICMS Diferido e de diferença de ICMS decorrente de omissão de saídas tributáveis.
Com essas razões, pugna pela manutenção parcial do auto de infração, cujo crédito tributário, após as correções efetuadas, passou a se constituir do valor de R$ 7.128.426,47, sendo R$ 3.657.427,35, de ICMS, e R$ 3.470.999,12, de multa por infração.
Às fls. 610 - 612, deu-se juntada aos requerimentos para realização e sustentação oral da recorrente e para adiamento do julgamento do recurso em tela. Na sequência, em razão do pleito para a efetivação de sustentação, solicitei à Assessoria Jurídica desta Casa parecer sobre a matéria, tendo em vista a disposição dos arts. 77 e 80 da Lei nº 10.094/2013, ao que a referida autoridade deu atendimento, mediante pronunciamento de fls. 617 – 621, onde opina, ao final, pela legalidade do procedimento administrativo tributário.
Anexado, ainda, aos autos, às fls. 623 – 633, mediante o Termo de Juntada, de fl. 622, lavrado em 28/11/2017, documento no qual a recorrente se manifesta acerca da informação fiscal apresentada (fls. 591 – 605) à propósito da diligência solicitada no despacho de fl. 588.
Este é o relatório.
VOTO |
Trata-se de questão sobre acusações de (a) falta de pagamento do ICMS Diferido por ocasião da emissão de notas fiscais de aquisição de matéria prima junto a produtores rurais não inscritos, (b) falta de pagamento do ICMS em razão e omissão de saídas tributáveis pretéritas, detectadas mediante falta de registro de notas fiscais de aquisição nos livros próprios, e (c) omissão de saídas de produtos tributáveis evidenciada mediante Apuração do Resultado Industrial, que apontou vendas abaixo do custo dos produtos acabados.
Desprende-se dos autos que se trata de estabelecimento cadastrado no CCICMS deste Estado como indústria, exercendo a atividade na “Fabricação de conservas de peixes, crustáceos e moluscos”, conforme informação nos sistema ATF, desta Secretaria de Estado da Receita.
Inicialmente, cumpre registrar que o Recurso Voluntário atende ao pressuposto da tempestividade, visto que interposto no prazo de 30 dias após a ciência da decisão singular (art. 77 da Lei Estadual nº 10.094/2013). Por consequência, dá-se seu recebimento e conhecimento, para, ao final decidir.
Antes, porém, de adentrar a questão de fundo da causa, insta declarar a regularidade formal do auto de infração, visto que este atende aos requisitos do art. 142 do CTN.
MÉRITO
FALTA DE PAGAMENTO DO ICMS DIFERIDO – exercícios de 2010 e 2011.
A questão em voga retrata a irregularidade consistente no fato de que o contribuinte, ora recorrente, teria deixado de recolher o ICMS – Diferido, referente a aquisições de mercadorias (camarão in natura), efetuada a produtores não inscritos no CCICMS, cujas saídas subsequentes ocorreram em até 90 (noventa dias) a partir da entrada das mercadorias.
Portanto, trata-se de diferimento do imposto, que consiste no deslocamento da obrigação do pagamento para uma etapa posterior. A doutrina acerca do diferimento é vasta em conceituar o instituto. Segundo, José Eduardo Soares de Melo, o diferimento “Constitui uma técnica impositiva de deslocamento da exigência do tributo para momento posterior à ocorrência do originário fato gerador, com a imputação da responsabilidade de seu recolhimento a terceiro.”[1]
Na lição de Celso Ribeiro Bastos, temos “O diferimento é o não recolhimento do ICMS em determinada operação ficando adiado para etapa posterior. Por esta técnica, o pagamento do imposto incidente sobre a saída de determinada mercadoria (no caso do ICMS) é transferido para as etapas posteriores de sua circulação."
Como se vê, a matéria é clara, tanto no campo legal e doutrinário, ao disciplinar o diferimento como uma ficção jurídica que promove o deslocamento da exigibilidade tributária nascida pela ocorrência do fato gerador para um momento ou etapa seguinte, não negando, portanto a subsunção do fato concreto à hipótese de incidência e sua consequente obrigação tributária principal.
A legislação tributária da Paraíba (Lei n° 6.379/96) trata a matéria com clareza de definição dos efeitos tributários do diferimento, e o Regulamento do ICMS, reproduz, na íntegra, a redação que se faz em seu artigo 9º, in verbis:
Art. 9º Dar-se-á o diferimento, quando o lançamento e pagamento do imposto incidente sobre determinada operação ou prestação forem adiados para uma etapa posterior, atribuindo-se a responsabilidade pelo imposto diferido ao adquirente ou destinatário da mercadoria ou usuário do serviço, na qualidade de sujeito passivo por substituição, vinculado à etapa posterior.
§ 1º (...)
§ 2º - Ocorrido o momento final previsto para o diferimento, será exigido o imposto diferido, independentemente de qualquer circunstância superveniente e ainda que a operação final do diferimento não esteja sujeita ao pagamento do imposto ou, por qualquer evento, essa operação tenha ficado impossibilitada de se efetivar, ressalvada as hipóteses previstas nos §§ 1º, 11 e 12 do art. 10.
Art. 10. O pagamento do imposto será diferido:
XIII – nas operações internas com lagosta, camarão e pescado, realizadas entre produtores ou pescadores e estabelecimento beneficiadores, industriais ou comerciais, para o momento em que acorrerem as saídas nas operações subsequentes, observado o disposto no § 12.
(...)
§ 12 – Nas operações de que tratam os incisos X e XIII, quando a saída for destinada ao exterior do País, fica dispensado o recolhimento do imposto”.
A falta apurada no procedimento fiscal encontra-se evidenciada nos demonstrativos, de fls. 11 – 58: Quadro Demonstrativo do ICMS Diferido a Recolher, declaração sobre o prazo médio das saídas do produto adquirido a produtores e cópia das notas fiscais de entradas, emitidas pela recorrente. Esta procura excluir a acusação, ao fundamento de que a manutenção da exação fiscal se caracterizaria cumulativa, eis que o imposto fora recolhido no momento da saída da mercadoria do seu estabelecimento (operação própria), sem que tenha havido o creditamento sobre as respectivas entradas, não se cogitando a seu ver, de proceder a novo recolhimento, a título de ICMS Diferido.
Todavia, a tese da recorrente não encontra amparo em virtude das seguintes situações:
- O ICMS Diferido não se confunde com o ICMS da operação própria; enquanto este incide sobre operação de saída do estabelecimento que a adquiriu, seja para revenda ou para industrialização/beneficiamento (etapa posterior), aquele é resultante da incidência do imposto sobre a operação da venda da mercadoria por produtor não inscrito no CCICMS, neste Estado (etapa anterior da circulação).
- Feitos esses esclarecimentos, ressalte-se, por relevante, que à época dos fatos geradores em questão, a recorrente dispunha de um Regime Especial de Tributação que lhe concedia o benefício ao recolhimento do ICMS calculado sobre carga tributária de 3%, estabelecendo-o sob a modalidade de crédito presumido apenas quanto ao “ICMS Normal a recolher”, calculado sobre “o valor das saídas internas e interestaduais de camarão por ela beneficiado e classificado na NCM-SH / NBM sob os números 0306.13, 0306.13.10, 0306.13.90, 0306.13.91 ou 0306.13.99” (Cláusula primeira, do citado diploma legal) – G.n.
- O não creditamento do ICMS incidente sobre a operação anterior (venda/compra de camarão do produtor), o qual é enfatizado pela recorrente, não consiste mera renúncia ou beneplácito desta em relação ao Estado, pois se trata, isto sim, de vedação prevista no próprio instrumento concessor do benefício fiscal de crédito presumido, quando estabelece que “Fica vedado o aproveitamento de quaisquer créditos fiscais relativos às aquisições de insumos e demais produtos inerentes ao desenvolvimento da atividade de beneficiamento, bem como na aquisição das mercadorias contempladas pelo tratamento tributário previsto neste Regime Especial”.
Diante do que, infere-se que o recolhimento do ICMS Diferido deve ser integralmente efetuado com base na alíquota interna de 17%, sem direito a creditamento do imposto pago nestes termos. Além disso, destaque-se outro fato que, embora não expressamente afirmado pela recorrente, o benefício fiscal concedido mediante o Regime Especial, acima referido, não se estende ao ICMS Diferido, pelas razões acima explicitadas.
Embora não tenha sido objeto da afirmação textual da recorrente, conforme já observado em linhas acima, é importante destacar que o Regime Especial de Tributação em referência não dispensa tratamento único entre as duas operações ocorridas. Dito de outro modo, a operação de saída de produtos com carga tributária reduzida é disciplinada sob a forma de crédito presumido de ICMS, de modo que o imposto mensal decorrente dessas saídas (etapa subseqüente) resulte na carga tributária de 3% (operação subsequente), porém não dispensando o pagamento do ICMS – Diferido (etapa anterior) e que se encerra no momento da entrada do produto no estabelecimento adquirente, cumprindo, a este, o recolhimento desse imposto no momento da operação subsequente, conforme interpretação dos dispositivos normativos concessores do citado benefício fiscal.
Neste contexto, infere-se que a tributação ali determinada, isto é, no Regime Especial, acoberta, apenas, as operações de saídas da produção industrial (operação posterior) resultante da atividade desenvolvida com os produtos adquiridos a produtores não inscritos (operação anterior), o que não dispensa o pagamento ICMS diferido, porque este não se confunde com o ICMS Normal incidente nas operações de saída de camarão beneficiado e classificado nas NCM-SH/NBM, indicadas no respectivo diploma legal concessor.
Em questão semelhante este Colegiado entendeu pela regularidade da cobrança do imposto, consoante se infere da ementa do Acórdão nº 414/2016, abaixo transcrita:
“ICMS IMPORTAÇÃO. DIFERIMENTO. FALTA DE PAGAMENTO DO IMPOSTO. FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO. FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS PELA SISTEMÁTICA PREVISTA EM REGIME ESPECIAL. PROCEDÊNCIA. VENDAS SEM EMISSÃO DE DOCUMENTAÇÃO FISCAL. DILIGÊNCIA. PARCIAL PROCEDÊNCIA. AJUSTES DENÚNCIA COMPROVADA. DIFERIMENTO. AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE. RECURSO VOLUNTÁRIO PARCIALMENTE PROVIDO.
A existência de diferimento do pagamento do ICMS-Importação para o momento da saída do produto do estabelecimento atribui ao sujeito passivo a obrigação de recolhimento do valor do imposto, quando ocorrido o momento final previsto para o diferimento, independentemente de qualquer circunstância superveniente, ainda que a operação final não esteja sujeita ao pagamento do imposto ou contemple tratamento tributário diferenciado. Comprovação de que o ICMS Importação diferido não foi recolhido, não se aplicando dispensa do pagamento quando a legislação não contemplava a hipótese de desoneração para o período auditado.
A falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios configura a existência de compras efetuadas com receita de origem não comprovada, impondo o lançamento tributário de ofício, em face da presunção legal de que trata o artigo 646 do RICMS/PB.
Mantida a acusação lastrada em procedimento fiscal que atestou o descumprimento da sistemática de apuração do ICMS-Normal, de acordo com as disposições previstas nos Regimes Especiais da qual a empresa é signatária. O conteúdo probatório acostado aos autos pela fiscalização contém todos os elementos essenciais para que a recorrente exercitasse o seu direito ao contraditório e à ampla defesa.
O Levantamento Quantitativo de Mercadorias revela uma técnica legítima de que se vale a Fiscalização na aferição da regularidade fiscal do contribuinte, a qual consiste no comparativo das entradas, saídas e estoques, inicial e final, de mercadorias, em determinado período. No caso, o reexame fiscal efetuado mediante a realização de diligência atendida pelo sujeito passivo, no fito de corrigir equívocos alegados na peça recursal, promoveu redução no valor do ICMS originalmente lançado.” - Recurso Vol. CRF nº 173/2015, rel. Cons. João Lincoln Diniz Borges. (Grifo não constante do original).
Por todo exposto, confirmo a decisão singular que manteve o lançamento de ofício sobre o ICMS Diferido, cujo pagamento não restou comprovado pela recorrente, não obstante a emissão das notas fiscais de entrada da mercadoria e a disposição ínsita no § 2º do art. 9º do RICMS/PB, acima transcrito.
Vendas abaixo do custo dos produtos acabados – Apuração do Resultado Industrial – Omissão de saídas tributáveis – Exercícios de 2010, 2011 e 2012.
A técnica de auditoria utilizada pela Fiscalização diz respeito à apuração do Resultado Industrial, que se presta para evidenciar a ocorrência de diferença entre o custo de fabricação e os valores de saídas dos produtos acabados, tem suporte legal no art. 645, §§ 1º e 2º do RICMS/PB, infra:
“Art. 645 - Constituem elementos subsidiários para o cálculo da produção e correspondente pagamento do imposto dos estabelecimentos industriais o valor e quantidade de matérias-primas, produtos intermediários e embalagens adquiridos e empregados na industrialização e acondicionamento dos produtos, a mão-de-obra empregada, os gastos gerais de fabricação e os demais componentes do custo de produção, assim como as variações dos estoques.(g.n)
§ 1º - Apurada qualquer falta no confronto da produção, resultante do cálculo dos elementos constantes deste artigo com a registrada pelo estabelecimento, exigir-se-á o imposto correspondente. “(g.n)
§ 2º Para a exigência do imposto a que se refere o parágrafo anterior, ter-se-á em conta que o valor das saídas será pelo menos igual ao custo dos produtos vendidos.”
A disposição acima transcrita, quando esta diz que os elementos que indica são subsidiários para o cálculo da produção e correspondente pagamento do imposto, não deve ser interpretada isoladamente, sob pena de se compreender que a sua apuração não constitui procedimento que, sozinho, possua aptidão para confirmar a ocorrência de saídas não tributadas.
A exegese da disposição que oferece suporte ao procedimento de “Apuração do Resultado Industrial” deve ser interpretada conjuntamente com as disposições ínsitas nos §§ 1º e 2º, do mencionado dispositivo legal.
Nesse norte, entende-se, por óbvio, que a característica da subsidiariedade desses elementos – valor e quantidade de matérias-primas, produtos intermediários e embalagens adquiridos e empregados na industrialização e acondicionamento dos produtos, a mão-de-obra empregada, os gastos gerais de fabricação e os demais componentes do custo de produção, assim como as variações dos estoques – tem seu referencial de contrapartida nas saídas registradas, todavia, por previsão do próprio dispositivo legal, a falta apurada no confronto da produção, resultante do cálculo dos elementos constantes no “caput” do artigo (elementos subsidiários), com a registrada pelo estabelecimento (elemento principal), “exigir-se-á o imposto correspondente”.
Portanto, caso as saídas registradas não se apresentem pelo menos igual ao custo dos produtos vendidos (apurado mediante os elementos subsidiários do cálculo da produção), a própria legislação determina que se proceda a exigência do imposto correspondente. Isto devido à capacidade de instrumento para confirmação da produção, que é conferida pela própria norma a esses elementos, ditos subsidiários.
Eis o sentido da expressão “subsidiários” dos elementos relacionados no caput do art. 645, do RICMS/PB, os quais, destaque-se, por relevante, são extraídos da própria contabilidade do contribuinte, advindo da sua origem a aptidão para atribuir legitimidade ao levantamento.
Em resumo, os dados componentes da estrutura do levantamento que apura a situação fiscal do contribuinte que exerce a atividade da fabricação de bens são extraídos dos registros da sua própria contabilidade e, portanto, consoante ilação da norma ínsita no art. 645 e seus parágrafos, ganham legitimidade para serem utilizados para tal finalidade.
Diante do que, não tem suporte o argumento recursal que nega à Apuração do Resultado Industrial, construída com base nos elementos indicados no caput do art. 645, regulamentado, legitimidade para, por si só, retratar a situação fiscal do contribuinte.
Também não tem suporte o argumento da recorrente, mediante o qual esta pretende a nulidade do lançamento de ofício baseado no levantamento em exame, ao fundamento de que o Decreto n. 33.047, de 22/6/2012, que conferiu nova redação ao art. 645, §§ 1º e 2º do RICMS/PB, não pode retroagir para alcançar fatos pretéritos, visto não se tratar, a seu ver, de situação condizente com as hipóteses do art. 144, § 1º do CTN.
O exame sobre tal questão, trazida pela recorrente, é manifestamente desnecessário, no meu sentir, para o deslinde da questão.
Com efeito, o dispositivo legal vigente à época dos fatos geradores referentes aos exercícios de 2010 e 2011, isto é, aqueles cuja eclosão precedera o advento do Decreto n. 33.047/2012, que alterou a redação dada ao § 2º do art. 645, acima citado, respalda a acusação fiscal em exame. Vejamos o porquê.
Consoante a interpretação das regras combinadas dos §§ 1º e 2º, regulamentado, quando estes dizem que “apurada qualquer falta no confronto da produção [resultante do cálculo dos elementos constantes deste artigo] com a registrada pelo estabelecimento, exigir-se-á o imposto correspondente” (§ 1º), e que “para a exigência do imposto [...] ter-se-á em conta que o valor das saídas será pelo menos igual ao custo dos produtos vendidos”, significa afirmar que a diferença a maior no custo dos produtos em cotejo com as vendas escrituradas é representativa de valores de ICMS, cujo recolhimento não se verificou porque oriundo de fatos geradores omitidos nos registros fiscais/contábeis do estabelecimento fiscalizado.
E não poderia ser outra a conclusão emergente da norma positivada, uma vez que, considerando que o ICMS é um imposto que incide sobre as saídas de mercadorias, tem-se como corolário inarredável que o valor do ICMS não pago porque omitido, cuja detecção se fez mediante a apuração que leva em conta os elementos estabelecidos no caput do art. 645, do RICMS/PB, é representativo de saídas de produtos acabados, isto é, de vendas omitidas dos registros fiscais/contábeis do estabelecimento. É dizer que o valor do imposto objeto da exigência prevista nos §§ 1º e 2º do art. 645, regulamentado, advém de saídas não constantes dos registros fiscais/contábeis do estabelecimento industrial, portanto, saídas omitidas.
Eis a ilação dos dispositivos legais acima referidos, os quais conferem regularidade ao lançamento de ofício em análise, tanto sob a perspectiva formal como material. Fosse outra a razão da diferença verificada entre os custos da produção e as saídas registradas, esta certamente teria acento na escrituração fiscal/contábil do contribuinte. Analisada a escrituração pela Fiscalização e não encontrada outra explicação para o fato, tem cabimento a delação de saídas tributáveis omitidas.
Diante do que, não encontra respaldo o argumento mediante o qual a recorrente pretende a nulidade dos lançamentos referentes aos exercícios que antecedem o advento do Decreto n. 33.047 (DOE de 23/6/2012), o qual, diga-se de passagem, sucedeu o Decreto n. 32.718/12 (DOE de 25/1/2012), que, assim como aquele, inseriu no § 2º do art. 645 remissão ao parágrafo único do art. 646, do RICMS/PB.
Ultrapassada essa etapa, passemos ao fundo da causa, cujo deslinde versa sobre a prova dos fatos alegados.
Destarte, conforme determinado na norma acima transcrita, ao se constatar, após a realização do resultado industrial, divergência a maior no confronto da produção com o valor das saídas registradas pelo estabelecimento, deve ser exigido o imposto concernente à diferença verificada, tomando-se por lastro a delação de omissão de saídas, a qual tem fulcro no art. 158, inciso I, art. 160, inciso I, ambos do RICMS-PB, conforme ilação decorrente das normas infra:
“Art. 158. Os contribuintes, excetuados os produtores agropecuários, emitirão Nota Fiscal, modelos 1 ou 1-A, Anexos 15 e 16:
I - sempre que promoverem saída de mercadorias;”
“Art. 160. A nota fiscal será emitida:
I - antes de iniciada a saída das mercadorias;”
Pois bem. Examinando os elementos que instruem o procedimento de apuração da falta, atesta-se que, diferentemente da concepção recursal, as saídas de matéria-prima, nos valores de R$ 17.369,92, R$ 176.271,25 e R$ 137.959,95, verificadas respectivamente nos exercícios de 2010, 2011 e 2012, foram deduzidas das entradas desse produto (matéria prima), consoante se confere nos demonstrativos de fls. 8, 9 e 10. Ressalte-se que se está a falar de saídas de matéria prima, qualquer que seja a sua finalidade, inclusive para industrialização por terceiros, e não saídas de produto beneficiado/industrializado.
Diante do que, inexiste o equívoco invocado pela recorrente.
Por sua vez, as mercadorias referentes às operações de “remessas para industrialização por encomenda”, CFOP 6901, em verdade consistem de produtos resultantes do processo de industrialização, pois se tratam de camarão sem cabeça, camarão descascado ou eviscerado, ou, ainda, tail-on, conforme se atesta mediante essa discriminação, ínsita nas notas fiscais juntadas a título exemplificativo, pela Fiscalização, às fls. 245 – 260, não podendo, por esse fato, isto é, dada à sua caracterização de produto industrializado, serem expurgadas das entradas de matéria-prima, porque, repise-se, de matéria prima não se trata.
De tal modo, é possível afirmar, com razoável grau de certeza, que essas mercadorias se qualificam como produtos resultantes do processo de industrialização, consoante a definição do art. 4º, § 8º do RICMS/PB, que, em linhas gerais, acolhe a definição de produto industrializado, dada pela legislação do IPI, segundo a qual, caracteriza-se como tal o produto resultante de qualquer operação que lhe modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a sua finalidade ou, ainda, o aperfeiçoe para consumo.
Com efeito, os documentos de fls. 245 – 260 não deixam dúvidas que se trata de produto que recebeu beneficiamento, mediante procedimentos que o deixaram na forma acima explicitada, isto é, eviscerado, descascado, etc.
Considerando que esses produtos não se tratam de matéria-prima, assiste razão aos autuantes, quando entenderam que não devem ser deduzidas as operações de “Remessa para Industrialização por Encomenda” das entradas de matéria-prima, como pretende a recorrente, afinal, definitivamente, de matéria prima não se trata.
Observe-se, aliás, que no demonstrativo de fl. 375, elaborado pela recorrente, esta deduz do valor das entradas de matérias-primas o valor correspondente às saídas para industrialização por encomenda referente a produtos por ela beneficiados e, portanto, industrializados, o que se revela uma impropriedade, pelas razões acima citadas.
Todavia, fosse possível esse procedimento, o que de fato não é, dada à natureza do produto objeto da remessa (produto acabado e, não, matéria-prima), ter-se-ia que, no contraponto, efetuar a soma das operações de “Retorno de Mercadorias Remetidas para Industrialização por Encomenda”, o que não consta no demonstrativo produzido pela recorrente. Realce-se que, nas situações em que são cabíveis essas alocações, o que não é o caso, conforme acima explicitado, a não inclusão dos retornos citados pode caracterizar a venda da mercadoria que não retornou da industrialização feita por encomenda.
A fim de fazer valer sua tese, a recorrente promove a juntada de demonstrativo da Apuração do Resultado Industrial, na fl. 375, por ela elaborado. Não obstante, além de não se acostar em elementos probantes, ao menos em dois exercícios o ajuste da empresa revela um contrassenso, pois apresenta uma diferença menos favorável a ela própria, que a apontada no levantamento fiscal.
Esse fato é observado inclusive pelos autuantes, às fls. 591 – 608 -, onde informam:
“... temos que a própria empresa apura, após os ‘novos ajustes’ por ela realizados, RESULTADO INDUSTRIAL NEGATIVO, demonstrando ela mesma, dessa forma, a omissão de saídas tributáveis, nos termos do art. 645 do RICMS/PB, e em valores até mesmo superiores aos obtidos por esta fiscalização...”.
O demonstrativo da Apuração do Resultado Industrial, acima referido, da autoria da recorrente que, em justificação posterior, argumenta se tratar de equívoco dela própria.
Quanto ao argumento recursal de que a técnica fiscal empregada pela Fiscalização como instrumento para lastrear a acusação em tela se manifesta imprestável, ao fundamento de que deve-se levar em conta que um demonstrativo há de considerar os elementos intrínsecos a esse tipo de atividade e, para exemplificar esses elementos invoca as perdas produtivas, o rendimento dos insumos, etc.
Todavia, entendo pela imprestabilidade dessa tese para modificar o resultado do exame fiscal, ante o simples fato de que as perdas são absorvidas pelo custo e passíveis de recuperação pelas vendas. A alegação teria pertinência se se tratasse de técnica fiscal que leva em conta o aspecto quantitativo dos produtos objeto da atividade do contribuinte, o que não é o caso dos autos, pois o levantamento do Resultado Industrial se debruça sobre o aspecto valorativo da produção.
Relativamente ao argumento sobre o rendimento dos insumos, outra vez não encontra suporte a grita da recorrente, porquanto esse elemento da produção tem relevância para a técnica fiscal do “Rendimento Industrial”, o que, por óbvio, também não é o caso.
Ressalte-se, por fim, que é possível a uma empresa operar com a distorção apontada na Apuração do Resultado Industrial, porém dificilmente por períodos prolongados, visto ser o lucro o objetivo da atividade econômica privada, sem o qual se torna impossível a sua sobrevivência. Todavia, inexistente a prova de que a manutenção do negócio não adveio de saídas tributáveis omitidas, como no caso dos autos – onde nada detectou nesse sentido própria a auditoria da Fiscalização nos registros fiscais/contábeis da recorrente - não há como excluir ou modificar, a esse pretexto, o resultado do procedimento fiscal. Afinal, repise-se, a sua composição se baseia em dados obtidos nos lançamentos da escrita fiscal/contábil do contribuinte, como ocorre no caso em tela.
Como forma de corroborar o acerto a Fiscalização na elaboração dos trabalhos da sua autoria, ressalte-se o posicionamento pacífico dos membros deste Colegiado para com matéria semelhante a ora discorrida, nos termos do Acórdão CRF nº 029, infra:
“CUSTO DO PRODUTO VENDIDO (CPV) – Confronto – Receita Operacional
Quando se determinam os custos de produtos vendidos (CPV), através de elementos subsidiários da produção, e se verifica que estes se sobrepõem à receita de vendas, impõe-se a cobrança do ICMS, com fundamento no Art. 645, §§ 1º,2º do RICMS/97, de que o valor das saídas será pelo menos igual ao custo dos produtos vendidos.” – Ação fiscal procedente. (Acórdão nº 00029/2000 – Relator: Cons. Roberto Farias de Araújo) .
Destarte, impõe-se a manutenção do resultado do exame fiscal em referência.
OMISSÃO DE SAÍDAS PRETÉRITAS TRIBUTÁVEIS – Falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios – Exercícios de 2009, 2010, 2011 e 2012.
Trata-se de questão de prova a cargo do contribuinte acusado, visto que o fato relatado no auto de infração tem suporte em presunção relativa da sua ocorrência, mas, por ser relativa, admite a prova modificativa ou extintiva do fato, cuja apresentação pode trazer, como consequência, alterações ou sucumbência à ação fiscal. Esse ônus, contudo, cumpre ao autuado, em face da previsão legal que se estampa na legislação de regência.
O caput do art. 646 do RICMS/PB é bastante claro quanto à prova contrária à presunção que se estabelece em favor do Fisco, nos termos abaixo transcritos:
“Art. 646. O fato de a escrituração indicar insuficiência de caixa, suprimentos a caixa não comprovados ou a manutenção no passivo, de obrigações já pagas ou inexistentes, bem como a ocorrência de entradas de mercadorias não contabilizadas ou declarações de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições e administradoras de cartões de crédito, autorizam a presunção de omissões de saídas de mercadorias tributáveis sem pagamento do imposto.”
Dessa forma, considera-se afrontados os arts. 158, I e 160, I, do mencionado diploma legal, que assim estabelece:
“Art. 158. Os contribuintes, excetuados os produtores agropecuários, emitirão Nota Fiscal, modelos 1 ou 1 – A, Anexos 15 e 16:
I - sempre que promoverem saída de mercadorias”.
“Art. 160. A nota fiscal será emitida:
I - antes de iniciada a saída das mercadorias”.
Do exposto, depreende-se que não cabe à fiscalização a prova modificativa ou extintiva do fato objeto da acusação fiscal consistente de omissão de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis constadas por meio de falta de lançamento de notas fiscais de aquisição, mas, sim, à autuada, em consequência da inversão do ônus da prova, que lhe atribui a norma inserta no dispositivo acima transcrito.
Todavia, para satisfazer à norma, a presunção deve repousar sobre fato certo.
Para Leonardo Sperb de Paola (Presunções e Ficções no Direito Tributário. Belo Horizonte: Del Rey, 1997) as presunções relativas constituem “normas sobre provas”, pois que modificam o objeto destas, e não a prova em si mesma considerada. Nesse sentido, o meio de prova propriamente dito é o fato cujo conhecimento se fez de forma direta, sendo “a base do raciocínio presuntivo” (prova em sentido objetivo), enquanto que a presunção representa a expressão da convicção do sujeito sobre a ocorrência do fato indiretamente provado. É a prova em sentido subjetivo.
As presunções relativas legais - ou "juris tantum" – são aquelas em que, a partir do conhecimento direto de determinado fato, infere-se, como conclusão lógica, a existência de outro que, nestes termos, resta indiretamente provado, admitindo-se a produção de prova em sentido contrário, para infirmar a ocorrência do fato indiretamente provado.
É fora de dúvida que o juízo presuntivo de que o fato desconhecido ocorreu após estabelecer-se uma correlação lógica entre ele e o fato efetivamente ocorrido, de forma que é imprescindível a existência de uma relação de causalidade direta entre o fato conhecido e o presuntivo.
Assim, para a formação de um juízo presuntivo sobre a ocorrência de um fato àquele indiretamente ligado há que existir uma “correlação lógica”, precisa e segura entre ambos, de forma que seja razoável se inferir que o fato presumido efetivamente ocorreu.
Assim é que ocorre no caso dos autos, embora a recorrente afirme não haver base para aplicação da presunção inserta no art. 646 do RICMS/PB.
Ora, a interpretação lógico-gramatical, oriunda da dicção da citada norma, quando esta diz “autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou a realização de prestações de serviços tributáveis sem o recolhimento do imposto [...] a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas” é que, uma vez realizando-se compras sem o conhecimento fiscal, presume-se que o objetivo maior é omitir receitas cuja origem não tem comprovação, posto que adquiridas através de vendas sem emissão dos correspondentes documentos fiscais. Por óbvio, receitas não lançadas cobrem despesas igualmente não contabilizadas, tudo ao arrepio da lei.
Portanto, a base do processo lógico em exame repousa em fato conhecido ou fato-base (compras de mercadorias), cujo lançamento se omite e caracteriza despesas não contabilizadas, para encobrir receitas igualmente omitidas porque adquiridas através de saídas – anteriores às aquisições não registradas- de mercadorias sem emissão de documentos fiscais (fato presumido que tem relação direta com o fato conhecido ou fato-base).
Pois bem, o fato conhecido, isto é, as aquisições de mercadorias cujas notas fiscais foram dadas como não registradas, é proveniente de cópia das notas fiscais representadas pelos respectivos DANFE’s e do sistema informatizado, existente nesta Secretaria de Estado, que armazena dados fornecidos pelo próprio contribuinte do ICMS, mediante suas GIM’s (GIM de Terceiros), de fls. 61 - 80. A acusação ganha status de legitimidade quando a escrituração da adquirente não as infirma.
A partir dos dados coletados nessas fontes, ao ser constatada a falta de registro das notas fiscais relativas às aquisições efetuadas, infere-se pela ocorrência de outro fato com o qual guarda correlação lógica de causa e efeito, o fato presuntivo, isto é, as saídas tributáveis omitidas ou sem emissão de notas fiscais, que geraram receitas com as quais foram realizadas as aquisições não escrituradas.
Eis a base da aplicação da presunção inserta na norma do art. 646 do RICMS/PB, efetuada nos autos.
Todavia, relativamente à acusação em exame, no que toca a uma parte das notas fiscais que constituem seu objeto, adoto entendimento diametralmente oposto ao exarado pela instância “a quo”.
Trata-se das notas fiscais de numeração 1.081, 352, 1.237, respectivamente referentes a fevereiro/2010, março/2010 e dezembro/2012, as quais tiveram sua manutenção no lançamento de ofício determinada na referida instância.
O mesmo se diga quanto às notas fiscais de numeração 38 (abril/2011), 50 (abril/2011), 272 (maio/2011), 328 (junho/2011), 04 (junho/2011), 410 (julho/2011), 690 (setembro/2011), 1.195 (fevereiro/2012), 1.230 (março/2012), 24 (março/2012) e 92 (abril/2012).
Nesse particular, entendo que se estabeleceu uma concorrência com a infração de omissão de saídas de produtos tributáveis evidenciada mediante a constatação de vendas de produtos tributáveis abaixo do custo da produção, visto que ambas dizem respeito aos mesmos exercícios, isto é, 2010, 2011 e 2012.
Entende-se pela concorrência de infrações quando representam efeitos de uma mesma causa, apenas detectadas por diferentes processos de apuração. Assim sendo, não podem autorizar lançamentos tributários simultâneos, visto que disto adviria figura do bis in idem, instituto não recepcionado pelo Direito Tributário Brasileiro. Frente a essa configuração a infração de maior monta é continente da menor, que se desfaz na singularidade da origem única, diluindo-se no conteúdo da primeira de que é apenas parte.
Diante do que, considerando que a diferença apresentada no crédito tributário correspondente à acusação de omissão de saídas tributáveis evidenciada no procedimento de Apuração do Resultado Industrial, que apontou a ocorrência de vendas abaixo do custo dos produtos acabados, nos exercícios de 2010, 2011 e 2012 é superior ao montante decorrente da infração de omissão de saídas tributáveis detectada mediante falta de lançamento das notas fiscais de aquisição de numeração acima discriminada e também relacionada aos mesmos exercícios que aquela, isto é, 2010, 2011 e 2012, esta deve ceder lugar àquela que lhe é continente.
Nesse sentido decidiu este Colegiado, por ocasião do julgamento de questão semelhante, que deu lugar ao Acórdão CRF n. 528/2015, cuja ementa transcrevo:
“INFRAÇÕES DIVERSAS. EXISTÊNCIA DE INFRAÇÕES CONCORRENTES ENTRE FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO/RESULTADO INDUSTRIAL/SUPRIMENTO IRREGULAR DE CAIXA. RECOLHIMENTO DE PARTE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE. RECURSO HIERÁRQUICO PARCIALMENTE PROVIDO.
Provado nos autos a existência de infrações concorrentes entre Falta de Lançamento de N. F. de Aquisição, Rendimento Industrial e Suprimento Irregular de Caixa.
Não identificado concorrência entre as acusações: Aquisição de Mercadorias com Receitas omitidas e Vendas sem Emissdão de Nota Fiscal, pela comprovação de produtos diferenciados nas duas acusações, por codificações divergentes, surgindo a necessidade de reconstituição de parte do crédito tributário desconstituído na decisão de primeira instância.
Mantença das demais acusações.
Comprova-se quitação do crédito tributário parcialmente exigido na decisão singular.
Redução da multa por infração para aplicação da Lei n. 10.008/2013.” - Recurso Hie. CRF 282/2011, rel. Cons. Francisco Gomes de Lima Netto. (Grifo não constante do original).
Idêntico desfecho não se confere às Notas Fiscais nºs 1.396 e 1.460, visto que ambas se referem ao exercício de 2009 (período de julho e agosto, respectivamente), que por óbvio não consiste o objeto da acusação de omissão de saídas detectadas mediante o procedimento de Apuração do Resultado Industrial e, portanto, com esta infração não encerra concorrência, de modo que sob esse fundamento não deve ser afastada.
Também não deve sê-lo em decorrência do fato de não constar seu lançamento no livro Diário, de cópia às fls. 340 – 346, nem mesmo referência ao número do lançamento, da página e do livro Diário, que possa conter os registros desses documentos, consoante bem observou a Fiscalização, nos seus comentários, de fl. 595, acrescidos do realce de que as cópias de fls. 340 – 346, acostadas pela autuada, “correspondem a lançamentos do Livro Diário do exercício de 2011 e as notas fiscais em questão, de números 1.396 e 1.460, foram emitidas em 17/7/2009 e 24/8/2009, respectivamente, ambas do exercício de 2009”.
Por tais fundamentos, entendo que devem ser mantidas tais notas fiscais entre os elementos que dão suporte à acusação fiscal em referência.
Portanto, decido pela manutenção parcial do lançamento de ofício em tela, no que se refere ao ICMS devido, no valor R$ 2.667,30.
Erro na identificação da alíquota aplicável – Primeira e terceira acusações.
Quanto ao argumento da recorrente, percebe-se que em verdade esta se reporta à aplicação da carga tributária reduzida de 3% (três por cento), que estabelecia o regime especial (fls. 207 – 210), concedido mediante o Processo nº 065.550.2009-1 (Parecer nº 2010.01.00.00301).
Pois bem. Entendo que não se faz possível dar atendimento à sua pretensão, não pelo fato de sua cassação verificada em 1/12/2012, mas precipuamente porque este estabelecia, entre outras exigências, que o direito ao benefício fiscal, nele previsto, tem como condição a regular escrituração fiscal/contábil (Inteligência emergente da Cláusula Segunda, do referido Regime), o que não se observa no caso em exame, mormente considerando que se trata de ICMS Diferido (sequer contemplado no Regime Especial), cuja falta de recolhimento consiste infração fiscal, assim como de diferença de ICMS decorrente de omissão de saídas tributáveis, como ocorre no objeto de autuação.
Diante dos fundamentos supra e, tendo em vista o Parecer da Assessoria Jurídica, desta Casa, o qual recepciono, o crédito tributário devido passa a se constituir dos seguintes valores:
INFRAÇÃO |
Período Inic. |
Período Fim |
ICMS |
M. POR INFR. |
TOTAL |
OMIS. SAÍDAS PROD. TRIBUT. |
01/01/2010 |
31/12/2010 |
386.697,57 |
386.697,57 |
773.395,14 |
OMIS. SAÍDAS PROD. TRIBUT. |
01/01/2011 |
31/12/2011 |
1.070.827,25 |
1.070.827,25 |
2.141.654,50 |
OMIS. SAÍDAS PROD. TRIBUT. |
01/01/2012 |
31/12/2012 |
1.714.336,49 |
1.714.336,49 |
3.428.672,98 |
DIFERIMENTO - F. PAG. IMPOSTO DIFERIDO |
01/10/2010 |
31/10/2010 |
26.283,54 |
13.141,77 |
39.425,31 |
DIFERIMENTO - F. PAG. IMPOSTO DIFERIDO |
01/11/2010 |
30/11/2010 |
34.014,72 |
17.007,36 |
51.022,08 |
DIFERIMENTO - F. PAG. IMPOSTO DIFERIDO |
01/12/2010 |
31/12/2010 |
12.885,35 |
6.442,68 |
19.328,03 |
DIFERIMENTO - F. PAG. IMPOSTO DIFERIDO |
01/01/2011 |
31/01/2011 |
13.711,32 |
6.855,66 |
20.566,98 |
DIFERIMENTO - F. PAG. IMPOSTO DIFERIDO |
01/02/2011 |
28/02/2011 |
20.563,96 |
10.281,98 |
30.845,94 |
DIFERIMENTO - F. PAG. IMPOSTO DIFERIDO |
01/03/2011 |
31/03/2011 |
67.434,77 |
33.717,39 |
101.152,16 |
DIFERIMENTO - F. PAG. IMPOSTO DIFERIDO |
01/04/2011 |
30/04/2011 |
105.035,72 |
52.517,86 |
157.553,58 |
DIFERIMENTO - F. PAG. IMPOSTO DIFERIDO |
01/05/2011 |
31/05/2011 |
52.412,11 |
26.206,06 |
78.618,17 |
DIFERIMENTO - F. PAG. IMPOSTO DIFERIDO |
01/06/2011 |
30/06/2011 |
40.514,98 |
20.257,49 |
60.772,47 |
FALTA LANÇ. N.F. DE AQUIS NOS LIV. PRÓP. |
01/07/2009 |
31/07/2009 |
1.020,00 |
1.020,00 |
2.040,00 |
FALTA LANÇ. N.F. DE AQUIS NOS LIV. PRÓP. |
01/08/2009 |
31/08/2009 |
1.647,30 |
1.647,30 |
3.294,60 |
FALTA LANÇ. N.F. DE AQUIS NOS LIV. PRÓP. |
01/02/2010 |
28/02/2010 |
- |
- |
- |
FALTA LANÇ. N.F. DE AQUIS NOS LIV. PRÓP. |
01/03/2011 |
31/03/2011 |
- |
- |
- |
FALTA LANÇ. N.F. DE AQUIS NOS LIV. PRÓP. |
01/04/2011 |
30/04/2011 |
- |
- |
- |
FALTA LANÇ. N.F. DE AQUIS NOS LIV. PRÓP. |
01/05/2011 |
31/05/2011 |
- |
- |
- |
FALTA LANÇ. N.F. DE AQUIS NOS LIV. PRÓP. |
01/06/2011 |
30/06/2011 |
- |
- |
- |
FALTA LANÇ. N.F. DE AQUIS NOS LIV. PRÓP. |
01/07/2011 |
31/07/2011 |
- |
- |
- |
FALTA LANÇ. N.F. DE AQUIS NOS LIV. PRÓP. |
01/09/2011 |
30/09/2011 |
- |
- |
- |
FALTA LANÇ. N.F. DE AQUIS NOS LIV. PRÓP. |
01/02/2012 |
28/02/2012 |
- |
- |
- |
FALTA LANÇ. N.F. DE AQUIS NOS LIV. PRÓP. |
01/12/2012 |
31/12/2012 |
- |
- |
- |
FALTA LANÇ. N.F. DE AQUIS NOS LIV. PRÓP. |
01/03/2012 |
31/03/2012 |
- |
- |
- |
FALTA LANÇ. N.F. DE AQUIS NOS LIV. PRÓP. |
01/04/2012 |
30/04/2012 |
- |
- |
- |
FALTA LANÇ. N.F. DE AQUIS NOS LIV. PRÓP. |
01/08/2012 |
31/08/2012 |
- |
- |
- |
FALTA LANÇ. N.F. DE AQUIS NOS LIV. PRÓP. |
01/12/2011 |
31/12/2011 |
- |
- |
- |
TOTAIS |
3.547.385,08 |
3.360.956,86 |
6.908.341,94 |
EX POSITIS,
V O T O – Pelo recebimento dos recursos hierárquico, por regular, e voluntário, por regular e tempestivo, e quanto ao mérito, pelo desprovimento do primeiroe parcial provimento do segundo,para alterar quanto aos valores, a decisão proferida pela primeira instância, que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00001807/2013-20, de fls. 3 e 4, lavrado em 30 de outubro de 2013, contra a empresa FRIGORÍFICO JAHU LTDA., inscrita no CCICMS sob nº 16.160.426-9,devidamente qualificada nos autos, obrigando-a ao recolhimento do ICMS no valor de R$ 3.547.385,08 (três milhões, quinhentos e quarenta e sete mil, trezentos e oitenta e cinco reais e oito centavos) por infringência aos arts. 9º, § 2º, 158, I e 160, I, c/c os arts. 645, §§ 1º e 2°, e 646, todos do RICMS-PB, aprovado pelo Decreto nº 18.930/97, e multa por infração na importância de R$ 3.360.956,86 (três milhões, trezentos e sessenta mil, novecentos e cinquenta e seis reais e oitenta e seis centavos), nos termos do art. 82, inciso II, alínea “e”, e inciso V, alínea “f”, da Lei nº 6.379/96, com as alterações advindas Lei nº 10.008/2013, perfazendo o crédito tributário o montante de R$ 6.908.341,94 (seis milhões, novecentos e oito mil, trezentos e quarenta e um reais e noventa e quatro centavos).
Em tempo, cancelo, por irregular, o montante de R$ 369.416,88 (trezentos e sessenta e nove mil, quatrocentos e dezesseis reais e oitenta e oito centavos), dividido entre valores iguais de ICMS de multa por infração, pelos fundamentos acima expendidos.
Tribunal Pleno, Sala das Sessões Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em 17 de novembro de 2017.
MARIA DAS GRAÇAS D. DE OLIVEIRA LIMA.
Conselheira Relatora
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