Acórdão nº125/2018
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA
Processo Nº001.929.2015-4
Recurso VOL/CRF Nº343/3016
TRIBUNAL PLENO
Recorrente:SAPÉ AUTO POSTO LTDA.
Recorrida:GERÊNCIA EXEC.DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS-GEJUP
Preparadora:COLETORIA ESTADUAL DE SANTA RITA.
Autuante:HÉLIO GOMES CAVALCANTI FILHO.
Relatora:CONSª.MARIA DAS GRAÇAS D. O. LIMA.
FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO INTERNA E INTERESTADUAL NOS LIVROS PRÓPRIOS. OMISSÃO DE SAÍDAS TRIBUTÁVEIS. PRELIMINAR DE EXCLUSÃO DA CO-RESPONSABILIDADE DOS SÓCIOS. INDEFERIMENTO. CONTRIBUINTE DO SEGUIMENTO NO COMÉRCIO VAREJISTA DE COMBUSTÍVEIS AUTOMOTORES, CUJAS OPERAÇÕES MAIS EXPRESSIVAS SE REGULAM PELO REGIME DA SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. TÉCNICA FISCAL IMPRÓPRIA À VERIFICAÇÃO DA SUA REGULARIDADE QUANTO À OBRIGAÇÃO PRINCIPAL. VÍCIO MATERIAL CONFIGURADO. NULIDADE DO AUTO DE INFRAÇÃO. REFORMADA A DECISÃO RECORRIDA. PROVIMENTO DO RECURSO VOLUNTÁRIO.
- Rejeita-se a preliminar de exclusão dos sócios da recorrente do rol dos co-responsáveis/interessados, tendo em vista a necessidade da sua manutenção para posterior análise da responsabilidade tributária pela infração. - A falta de lançamento de notas fiscais de aquisição de mercadorias nos livros próprios configura a existência de compras efetuadas com receitas de origem não comprovada, presumidamente auferidas mediante omissão de saídas pretéritas tributáveis. Todavia, tal presunção, ínsita no art. 646 do RICMS/PB, não se mostra aplicável nos casos de contribuinte em exercício no seguimento do comércio varejista de combustíveis para automotores, cujas operações de maior predominância nessa atividade se regulam pelo regime da substituição tributária. Adite-se a esse fato a circunstância de que a comercialização pela recorrente também se opera com outros produtos que, apesar de natureza distinta, estão igualmente adstritos ao referido regime de tributação antecipada, o que determina a nulidade lançamento de ofício, por vício material, visto que a denúncia tem suporte na aplicação de técnica imprópria à aferição da situação do contribuinte, quanto ao cumprimento da obrigação principal.
Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...
A C O R D A M os membros do Tribunal Pleno de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, à unanimidade, e de acordo com o voto da relatora, pelo recebimento do recurso voluntário, por regular e tempestivo,e, quanto ao mérito, pelo seu provimento, para alterar a sentença exarada na instância monocrática, e julgar nulo o Auto de Infração de Estabelecimento n.º 93300008.09.00000033/2015-81 (fls. 3 - 6), lavrado em 9 de janeiro de 2015, contra a empresa SAPÉ AUTO POSTO LTDA., inscrita no CCICMS sob nº 16.124.767-9, devidamente qualificada nos autos, eximindo-a de quaisquer ônus oriundo do presente contencioso.
Fica ressalvada a possibilidade da realização de novo feito fiscal relacionado ao exercício de 2013, observando-se, para tanto, o prazo decadencial previsto no art. 173, I do CTN.
Intimações de praxe devem incluir a remessa para a pessoa e endereço indicados na folha 2.606 da peça recursal.
Desobrigado do Recurso Hierárquico, na expressão do art. 84, parágrafo único, IV, da Lei nº 10.094/13.
P.R.I.
Tribunal Pleno, Sala das Sessões Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em 16 de março de 2018.
Maria das Graças Donato de Oliveira Lima
Conselheira Relatora
Gianni Cunha da Silveira Cavalcante
Presidente
Participaram do presente julgamento os Conselheiros do Tribunal Pleno, PETRÔNIO RODRIGUES LIMA, DORICLÉCIA DO NASCIMENTO LIMA PEREIRA, MARIA DAS GRAÇAS DONATO DE OLIVEIRA LIMA, JOÃO LINCOLN DINIZ BORGES, THÁIS GUIMARÃES TEIXEIRA, NAYLA COELI DA COSTA BRITO CARVALHO, e Ausência justificada da DOMÊNICA COUTINHO DE SOUZA FURTADO.
Assessora Jurídica
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RELATÓRIO |
Em análise, neste egrégio Conselho de Recursos Fiscais, o recurso voluntário interposto contra a decisão monocrática que julgou procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000033/2015-81 (fls. 3 - 6), lavrado em 9 de janeiro de 2015, mediante o qual a autuada acima identificada, SAPÉ AUTO POSTO LTDA., é acusada da irregularidade que adiante transcrevo:
- FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS PRÓPRIOS. Aquisição de mercadorias com recursos advindos de omissões de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis sem pagamento do imposto devido, constatada pela falta de registro de notas fiscais nos livros próprios”.
De acordo com a referida peça acusatória, a irregularidade teria acontecido durante os exercícios de 2010, 2011, 2012 e 2013.
Por considerar infringidos os arts. 158, I, e 160, I, c/c o art. 646, todos do RICMS/PB, o autuante procedeu ao lançamento de ofício, exigindo o ICMS no valor total de R$ 2.937.547,59, ao mesmo tempo em que sugeriu a aplicação da penalidade pecuniária em igual quantia - R$ 2.937.547,59 -, nos termos do art. 82, V, “f”, da Lei nº 6.379/96, perfazendo, ambas as quantias, o crédito tributário total de R$ 5.875.095,18.
Documentos instrutórios constam às fls. 7 – 170.
Regularmente cientificada do resultado da ação fiscal, em 26/2/2015 conforme atesta o comprovante de ciência e entrega da 1ª via do auto infracional, assinado por seu receptor, a autuada apresenta defesa tempestiva (fls. 173 - 182), alegando fatos que, em síntese, consistem nos seguintes:
- é possuidora de um estabelecimento comercial, onde são realizadas atividades de comércio varejista de combustíveis, lubrificantes e produtos de conveniência;
- a denúncia não deveria se manter, dado que a maioria das notas fiscais se refere a mercadorias sujeitas ao regime da substituição tributária, conforme DANFE’s anexos, cujo imposto foi retido na fonte, dando-se por encerrada a fase de tributação;
- da mesma forma a penalidade aplicada não tem razão e ser, visto que não teria ocorrido o fato gerador relativo à autuação;
- a intenção do legislador ao criar a norma do art. 646 do RICMS/PB “foi a de cobrar do contribuinte, que omitiu o registro na contabilidade da entrada de mercadoria por ele adquirida (independentemente de sua destinação), o ICMS incidente nas saídas omitidas, cuja receita foi utilizada para aquisição subseqüente de mercadorias”;
- também precisa-se relatar as aquisições de usos e consumo, referentes à manutenção de bombas e tanque de combustível, bem como os ativos imobiliozados”, que não representam dispêndio de numerário;
Ao final, argumenta a inconstitucionalidade da multa aplicada, porquanto, na sua ótica, assume natureza confiscatória, e admite a falta em relação a algumas notas fiscais, razão por que seria devedora de R$ 11.275,56 de ICMS, em teria recolhido esse montante aos cofres públicos.
Após a prestação de informação sobre existir antecedentes fiscais da acusada (fl. 2.576), porém se caracterização de reincidência, os autos conclusos (fl. 2.577) e remetidos à Gerência Executiva de Julgamento de Processos Fiscais, foram distribuídos à julgadora fiscal, Gílvia Dantas Macedo, que decidiu pela procedência do auto de infração, por concluir, a referida autoridade julgadora, pela exatidão e legitimidade dos valores correspondentes à exação fiscal, conforme sentença de fls. 2.580 – 2.584).
Promovida a regular ciência da decisão monocrática à autuada (conforme atestam os documentos de fls. 2.586 – 2.593), esta interpõe recurso voluntário a este Conselho de Recursos Fiscais, fazendo-se representar por advogada habilitada nos autos, nos termos do documento de fls. 2.607 e 2.608, inicialmente requerendo a exclusão da responsabilidade pessoal dos sócios da empresa, ao fundamento da ilegitimidade passiva para figurarem como co-responsáveis pelo pagamento do crédito tributário, em decorrência do fato de que não incidiria, neste caso, a previsão do art. 135 do CTN.
No mérito, alega ausência de repercussão tributária na obrigação principal, porquanto a documentação fiscal de entrada, dada como não registrada nos livros fiscais, contempla mercadorias cuja tributação foi alcançada pela substituição tributária com o imposto retido por antecipação, pelo substituto tributário.
Nesse sentido, realça que em uma simples análise das notas fiscais de saída registradas pela empresa se constata a comercialização exclusiva de produtos sujeitos à Substituição Tributária com retenção antecipada do imposto, o que descaracteriza a repercussão tributária do ICMS.
Prosseguindo com sua argumentação, defende que a regra do art. 646, IV, do RICMS/PB promove o raciocínio de que o contribuinte teria intenção de efetuar saída de mercadorias sem nota fiscal e, portanto, sem pagamento do imposto, e de que já teria realizado vendas sem escrituração fiscal, o que resultaria na ausência de caixa para aquisição de novos bens, situações que, que a seu ver, não se aplicam ao caso, devido ao regime de pagamento mediante Substituição Tributária a que estão adstritas as operações que realiza.
Acresce que não vigora o argumento da parte recorrida, segundo a qual é desimportante o regime de tributação das mercadorias objeto dos autos, na medida em que, seja referente a operações anteriores ou presentes a recorrente não poderia, nem quisesse, incorrer na falta de recolhimento, ao passo em que a sujeição passiva foi transferida a terceiro.
Alega, ainda, a existência de efeito confiscatório na penalidade aplicada, dado que evidenciada a sua inconstitucionalidade, na medida em que estão presentes vetores da lógica do princípio da insignificância, como a mínima ofensividade da conduta do agente, a nenhuma periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada, .
Por fim requer a improcedência do auto infracional, bem como a declaração da ilegitimidade passiva dos sócios da empresa para figurarem como co-responsáveis no presente auto de infração, ao fundamento da inaplicabilidade da disposição do art. 135 do CTN, ou, no caso de não ficar assim entendido, roga pela infirmação da multa infracional aplicada.
Solicita, também, que as notificações relacionadas ao auto de infração em exame sejam remetidas para pessoa e endereço indicados ao final da peça recursal, pugna pela realização de sustentação oral e pela produção de provas em Direito admitidas, inclusive pela juntada posterior de documentação necessário à comprovação do alegado.
Junta documentos às fls. 2.609 – 3.733.
Aportados os autos nesta Casa, estes foram distribuídos a esta relatoria, segundo critério regimentalmente previsto, para o fim de apreciação e julgamento.
Em virtude do pedido de sustentação oral, os autos foram remetidos à Procuradoria Geral do Estado, para emissão de Parecer, conforme a previsão do art. 20, X da Portaria GSER nº 75/2017, ocasião em que esta se manifestou nos autos, às fls. 3.736 – 3.741, nos termos do entendimento assim ementado:
“Tributário. Legalidade do procedimento administrativo tributário. Falta de lançamento de notas fiscais de aquisição em livros próprios. Afastada a presunção do art. 646 do RICMS/PB. Autuada submetida ao regime de substituição tributária.”
Está relatado.
VOTO |
A exigência que motivou o presente contencioso fiscal tem origem na conduta da autuada que, de acordo com o libelo basilar, consiste na prática ilegal de omissão de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis, evidenciada mediante o não registro de notas fiscais de aquisição nos livros próprios do seu estabelecimento, nos exercícios de 2010, 2011, 2012 e 2013
Antes, porém, de me debruçar sobre o deslinde propriamente dito da questão, insta declarar a regularidade formal do auto de infração, visto que este atende aos requisitos do art. 142 do CTN.
Insta, ainda, reconhecer e declarar tempestividade na interposição do recurso de que se cuida, porquanto esta se verificou dentro do prazo legal previsto no art. 77 da Lei nº 10.094/2013.
Passemos ao exame da causa.
PRELIMINAR
Alega a recorrente a não aplicação da regra prevista no art. 135 do CTN, para o efeito de excluir a co-responsabilidade pela infração dos sócios da empresa, indicados na peça vestibular.
Em verdade, a inclusão do nome dos sócios da empresa recorrente no auto de infração, na qualidade de responsável/interessado, consiste apenas uma medida para que posteriormente, na fase executória da dívida fiscal porventura configurada, possa ser analisada a existência da responsabilidade pessoal do agente, nos caso, das pessoas indicadas na peça vestibular, e tomadas as providências cabíveis.
Ademais, a manutenção do nome dos sócios, como co-responsáveis/interessados, não implica afirmar, a priori, que estes incorreram na regra do dispositivo acima citado.
Pelas razões expostas, rejeito a preliminar.
MÉRITO
No âmbito da legislação do ICMS, no Estado da Paraíba, a falta de lançamento de notas fiscais de aquisição de mercadorias tem efeito muito mais abrangente do que a simples responsabilização pelo descumprimento da obrigação acessória, senão vejamos o que dispões o art. 646 do RICMS/PB:
"Art. 646. O fato de a escrituração indicar insuficiência de caixa, suprimento a caixa não comprovados ou a manutenção no passivo, de obrigações já pagas ou inexistentes, bem como a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas, autoriza a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis sem pagamento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção". (g.n.).
Por imperativo legal, a constatação dessa omissão obriga o auditor fiscal a lançar de ofício o crédito tributário decorrente dessa infração, tendo em vista que a receita originária das saídas omitidas é o resultado da afronta aos arts. 158, I e 160, I, do mencionado diploma legal, in verbis:
“Art. 158. Os contribuintes, excetuados os produtores agropecuários, emitirão Nota Fiscal, modelos 1 ou 1 – A, Anexos 15 e 16:
I - sempre que promoverem saída de mercadorias”.
“Art. 160. A nota fiscal será emitida:
I - antes de iniciada a saída das mercadorias”.
Importante destacar que a falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios é fato bastante a autorizar a aplicação da presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou a realização de serviços tributáveis sem recolhimento do ICMS.
O comando normativo supra, ao garantir o direito à Fazenda Pública de recuperar o ICMS incidente sobre operações pretéritas, este, sim, o objeto da norma ínsita no art. 646, supra, o fez presumindo que todas as saídas pretéritas, absolutamente todas, foram realizadas com mercadorias tributáveis.
Assim, o fato de as notas fiscais de aquisição corresponderem a produtos sujeitos ao regime da Substituição Tributária, cujo imposto é retido antecipadamente na origem, pelo contribuinte substituto tributário, não é excludente da presunção contida no art. 646, regulamentado, uma vez que a exigência dos créditos tributários advindos dessa prática irregularmente adotada pelo contribuinte não está relacionada diretamente às notas fiscais de aquisição não lançadas, mas, sim, a operações pretéritas, cujas receitas não foram oferecidas à tributação, devido à omissão da saída das respectivas mercadorias, e que possibilitaram ao contribuinte adquirir as mercadorias que se encontram descritas nas notas fiscais não registradas nos livros próprios.
Esta presunção, todavia, não é absoluta. Para que se possa aplicar o direito de forma justa, não deve o julgador abster-se de observar os princípios informadores do processo judicial (e também administrativo), dentre os quais destaco o princípio da verdade material e do livre convencimento motivado do julgador.
A propósito, transcrevo inteligente ensinamento de Leandro Paulsen (Direito Processual Tributário: processo administrativo fiscal e execução fiscal à luz da doutrina e da jurisprudência, 5. Ed. Porto Alegre, Livraria do Advogado), de acordo com o qual “o processo administrativo é regido pelo princípio da verdade material, segundo o qual a autoridade julgadora deverá buscar a realidade dos fatos, conforme ocorrida, e para tal, ao formar sua livre convicção na apreciação dos fatos, poderá julgar conveniente a realização de diligência que considere necessária à complementação da prova ou ao esclarecimento de dúvida relativa aos fatos trazidos no processo”.
Sobre o tema também merecem destaque as palavras de Odete Medauar (Direito Administrativo Moderno. 9. Ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 189): “O princípio da verdade material ou verdade real, vinculado ao princípio da oficialidade, exprime que a Administração deve tomar decisões com base nos fatos tais como se apresentam na realidade, não se satisfazendo com aversão oferecida pelos sujeitos. Para tanto, tem o direito e o dever de carrear para o expediente todos os dados, informações, documentos a respeito da matéria tratada, sem estar jungida aos aspectos considerados pelos sujeitos”.
Pois bem. Procurando se desincumbir a contento da responsabilidade da prova da insubsistência da presunção de saídas omitidas de mercadorias sujeitas à tributação normal, a recorrente alega ausência de repercussão tributária na obrigação principal, porquanto em uma simples análise das notas fiscais de saída registradas pela empresa se constata a comercialização exclusiva de produtos sujeitos à Substituição Tributária com retenção antecipada do imposto e, para comprovar o alegado, junta cópia de notas fiscais de saídas de mercadorias sujeitas ao mencionado regime de tributação antecipada.
Destarte, a solução da lide passa necessariamente pela análise acerca do tratamento tributário a que se submetem as mercadorias objeto da comercialização da recorrente, efetuada nos períodos dos fatos geradores descritos no auto infracional em foco, porquanto a aplicabilidade da presunção legal prevista no art. 646 do RICMNS/PB requer um mínimo de plausibilidade entre a verdade material e o fato denunciado, a fim de que se possa alcançar a liquidez e certeza do crédito tributário. Para tanto, é necessário que a técnica fiscal aplicada seja capaz de reproduzir, com razoável grau de probabilidade, a verdade material dos fatos.
Com efeito, há situações de notória ineficácia na aplicação da técnica fiscal consistente no levantamento das notas fiscais de aquisição não escrituradas nos livros fiscais próprios do contribuinte, para o efeito de se verificar se a obrigação principal foi por este satisfeita. Isto se dá em face do seguimento econômico em que o contribuinte exerce suas atividades.
Em consulta ao Módulo cadastro do Sistema ATF, desta Secretaria de estado da Receita, colhe-se a informação de que a recorrente possui, como atividade econômica afeta ao ICMS, o código 4731-8/00 COMÉRCIO VAREJISTA DE COMBUSTÍVEIS PARA VEÍCULOS AUTOMOTORES (principal).
De fato, os combustíveis que constam na descrição do CNAE 4731-8/00 (combustíveis), por força do Decreto nº 29.537, de 6 de agosto de 2008, vigente à época dos fatos geradores descritos no Auto de Infração em análise, estavam submetidos ao regime da substituição tributária, cabendo ao remetente destas mercadorias a responsabilidade pela retenção e pelo recolhimento do ICMS devido, relativamente às operações subsequentes.
Em geral, os postos revendedores de combustíveis também comercializam outros produtos sujeitos ao regramento da substituição tributária, a exemplo de lubrificantes, óleos, fluidos, etc. É sabido, ainda, que há postos revendedores de combustíveis que também operam com lojas de conveniência sob uma mesma inscrição estadual, as quais, além de comercializarem outros produtos adstritos a esse regime de tributação, a exemplo de cervejas, refrigerantes, cigarros, água mineral, etc., também realizam vendas de produtos sujeitos ao regime normal de apuração do ICMS, embora a recorrente não tenha se manifestado sobre esse fato na sua peça recursal.
Assim, para não incorrer em equívoco, seja onerando indevidamente a recorrente, seja desobrigando-a do recolhimento do crédito tributário efetivamente devido, ao consultar as Notas Fiscais Declaradas por Terceiros em operações internas (documentos da emissão dos próprios remetentes da mercadoria à adquirente) e as notas fiscais eletrônicas, emitidas para a recorrente no período autuado, atesta-se que de fato, a recorrente comercializa produtos sujeitos a ambos os regimes de tributação. Todavia, as operações de aquisição de valores mais expressivos consistem de mercadorias sujeitas à substituição tributária, tanto as que consistem o objeto da atividade principal da recorrente como da sua atividade secundária (5611-2/03 LANCHONTES, CASAS DE CHÁ, DE SUCOS E SIMILARES), haja vista se tratarem de produtos da Souza Cruz S/A., AMBEV, Indaiá do Brasil Águas Minerais Ltda., etc.
Bem verdade que, além das operações com produtos sujeitos à Substituição Tributária há outras com mercadorias, também objeto da atividade secundária da recorrente, que são atreladas ao regime normal de apuração. Estas, porém, com valores e quantidades significativamente inferiores aos da substituição tributária, donde se deflui que suas vendas são predominantemente de produtos sujeitos ao citado regime de pagamento antecipado do imposto.
Frente a estas circunstâncias, é forçoso concluir pela inadequação da técnica fiscal adotada pelo autuante na verificação do cumprimento da obrigação principal pela recorrente, uma vez que se mostrou injustificável a presunção de que todas as saídas omitidas consistiam de mercadorias tributáveis.
Registre-se, por oportuno, que não se está a dizer que a recorrente não tenha omitido saídas pretéritas de mercadorias tributáveis. Em verdade, o que se está a falar aqui é que em face das considerações acima tecidas a técnica fiscal aplicada não oferece suporte à denúncia formalizada no auto infracional.
Neste sentido, transcrevo fragmento do Acórdão 021/2015, o qual teve a Relatoria do Cons. Francis Gomes de Lima Netto, deste Conselho de Recursos Fiscais, que ao decidir questão semelhante assim se pronunciou:
“Constatamos que há outros valores de pequena monta em outras GIM’s, com destaque de ICMS, que representariam vendas com tributação normal, restando provado que as operações da empresa são em maior quantidade de mercadorias sujeitas à substituição tributária, tornando, por consequência procedentes as alegações trazidas à colação pela recorrente.
Na denúncia capitulada na lide em comento, tem-se que a aplicação da presunção juris tantun, disposta legalmente no art. 646, do RICMS/PB, atinge não as operações presentes, não registradas, mas sim outras vendas-saídas pretéritas de mercadorias tributáveis sem que o imposto tenha sido recolhido, visto que suas entradas não foram registradas, o que gera repercussão financeira para a aquisição de mercadorias sem o devido lançamento.
Assim sendo, não tem sustentação à acusação posta no auto de infração em discussão, quando fica provado que a referida exigência foi satisfeita pelo contribuinte substituto, restando provado o equívoco da exigência posta na peça exordial, tendo em vista que se trata de contribuinte que exerça atividade quase que exclusivamente com produtos sujeitos à substituição tributária, cujo ICMS é retido na origem pelo substituto tributário, razão porque não é passível do imposto decorrente de falta de emissão de notas fiscais de saídas, dado que o tributo já fora recolhido na origem e alcança até a última etapa da circulação de mercadorias.”
Também neste sentido a Procuradoria Geral do Estado concluiu pela legalidade formal do lançamento de ofício mediante o Parecer, de fls. 3.736 – 3.741, cuja ementa consta transcrita no relatório supra, assim se manifestou sobre o fato base da acusação, conforme fragmento a seguir:
“Em observância aso levantes constantes do recurso interposto pelo contribuinte, pede-se licença para reafirmar a legalidade do procedimento e, nesse sentido, destacar também que a falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios configura a existência de compra efetuada com receita de origem não comprovada, impondo o lançamento tributário de ofício, em face da presunção legal de que trata o artigo 646 do RICMS/PB, todavia tal presunção não se mostra justificável nos casos em que o contribuinte comercialize, quase que exclusivamente, mercadorias sujeitas ao regime de substituição tributária.”
Considerando o elevado percentual de produtos sujeitos à Substituição Tributária com que opera a recorrente no exercício da sua mercancia, é de se concluir pela ineficácia da aplicação da técnica de fiscalização aplicada pela Fiscalização, no caso dos autos, devido às circunstâncias em referência, as quais se revelam capazes de infligir ao resultado do exame fiscal um distanciamento expressivo da verdade material, conferindo incerteza e iliquidez ao crédito tributário que o tenha como embasamento.
O erro verificado é procedimental, visto que se evidencia na técnica que lhe dá suporte que, em razão da distorção, contaminou a matéria que se pretendeu tributar e, por consequência, calculou um montante indevido do tributo.
Na esteira da Lei Estadual nº 10.013/2013, que neste Estado regula o Processo Administrativo Tributável, tem-se a solução da questão:
“Art. 41. São requisitos do Auto de Infração e da Representação Fiscal:
(...)
V – a descrição da falta com o respectivo montante tributável:
VI – (...)
VII – o valor do tributo lançado de ofício”.
(Grifo não constante do original).
Diante do que, entendo que se caracterizou vício material, visto que atingiu a própria identificação da natureza da infração, e não somente a descrição do fato.
Nessa circunstância, tem lugar a nulidade do auto de infração em tela, afinal, o lançamento de ofício não apresenta elementos suficientes para determinar a matéria objeto da exigência tributária. Aplicação da norma ínsita no inciso III do art. 14 da Lei Estadual nº 10.094/2013, que nos diz:
“Art.14. São nulos:
III – os lançamentos cujos elementos sejam insuficientes para determinar a matéria objeto da exigência tributária e o respectivo sujeito passivo, ressalva, quanto à identificação deste, a hipótese de bens considerados abandonados”. (Grifo não constante do original).
Assim, tendo em vista que é de natureza material o vício que inquina o auto de infração em referência, e que a sua correção somente se faz possível mediante auto de infração específico, este deve ser lavrado dentro do prazo de cinco anos, contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que poderia ter sido efetuado, tendo em vista a salvaguarda do direito de o Estado recuperar os créditos tributários referentes ao exercício de 2013, que porventura lhe sejam devidos.
Isto porque as nulidades decorrentes de vício material não atraem a aplicação do art. 173, II do CTN, uma vez que essa regra é aplicável às nulidades por vício formal, o que não é o caso dos autos, consoante os fundamentos acima expedidos, de modo que somente os créditos tributários relativos ao exercício acima citados são passíveis de recuperação mediante auto infracional específico, excluindo-se os relacionados aos exercícios de 2010, 2011 e 2012, por terem sido fulminados pela decadência ínsita no art. 173, I do CTN.
Pelo exposto,
VOTO pelo recebimento do recurso voluntário, por regular e tempestivo,e, quanto ao mérito, pelo seu provimento, para alterar a sentença exarada na instância monocrática, e julgar nulo o Auto de Infração de Estabelecimento n.º 93300008.09.00000033/2015-81 (fls. 3 - 6), lavrado em 9 de janeiro de 2015, contra a empresa SAPÉ AUTO POSTO LTDA., inscrita no CCICMS sob nº 16.124.767-9, devidamente qualificada nos autos, eximindo-a de quaisquer ônus oriundo do presente contencioso.
Fica ressalvada a possibilidade da realização de novo feito fiscal relacionado ao exercício de 2013, observando-se, para tanto, o prazo decadencial previsto no art. 173, I do CTN.
Intimações de praxe devem incluir a remessa para a pessoa e endereço indicados na folha 2.606 da peça recursal.
Tribunal Pleno, Sala das Sessões, Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em 16 de março de 2018.
MARIA DAS GRAÇAS D. DE OLIVEIRA LIMA
Conselheira Relatora
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