ACÓRDÃO Nº.423/2018
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA
PROCESSO Nº0175252013-0
SEGUNDA CÂMARA DE JULGAMENTO
Recorrente:MERCANTIL SANTO ANTONIO LTDA
Recorrida:GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS-GEJUP
Repartição Preparadora:SUBGERÊNCIA DA RECEBEDORIA DE RENDAS DA GERÊNCIA REGIONAL DA 2ª REGIÃO
Autuante:ANTONIO ANDRADE LIMA
Relatora:CONS.ª MAIRA CATÃO DA CUNHA CAVALCANTI SIMÕES
CRÉDITO INEXISTENTE – DOCUMENTOS FISCAIS EMITIDOS POR EMPRESA DO SIMPLES NACIONAL – NULIDADE POR VÍCIO MATERIAL – OMISSÃO DE SAÍDAS PRETÉRITAS – NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO NÃO LANÇADAS EM LIVRO PRÓPRIO – DENÚNCIA CONFIGURADA – AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE – RECURSO VOLUNTÁRIO DESPROVIDO.
A aquisição de mercadorias oriundas de fornecedores optantes do Simples Nacional somente possibilita o direito ao crédito do ICMS, por parte de seu adquirente, quando estritamente observada a legislação de regência. A ausência de demonstrativos probatórios que subsidiem a denúncia de aproveitamento de créditos de ICMS inexistentes configura cerceamento de defesa, por ofensa ao contraditório e à ampla defesa, bem como do devido processo legal, nos termos do art.5º, LIV e LV da Constituição Federal/88. A falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios configura a existência de compra efetuada com receita de origem não comprovada, impondo lançamento tributário de ofício, em virtude da presunção legal preconizada no artigo 646 do RICMS/PB. Aplicação da lei mais benéfica ao contribuinte, nos termos do art. 106, I, alínea “c”, do CTN.
Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...
A C O R D A M os membros da Segunda Câmara de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, à unanimidade, e de acordo com o voto da relatora, pelo recebimento do recurso voluntário, por regular e tempestivo, e, quanto ao mérito, pelo seu desprovimento, para reformar a sentença monocrática que julgou parcialmente procedente, o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.0000219/2013-79, lavrado em 28/02/2013, contra a empresa MERCANTIL SANTO ANTONIO LTDA., inscrição estadual nº 16.074.339-7, já qualificada nos autos, declarando devido o crédito tributário no valor de R$ 34.848,54 (trinta e quatro mil, oitocentos e quarenta e oito reais e cinquenta e quatro centavos), sendo R$ 17.424,77 (dezessete mil, quatrocentos e vinte e quatro reais e setenta e sete centavos) de ICMS, por infringência aos arts. 158, I; 160, I; c/fulcro no art. 646 todos do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto nº 18.930/97, e R$ 17.424,77 (dezessete mil, quatrocentos e vinte e quatro reais e setenta e sete centavos) a título de multa por infração, nos termos do art. 82, V, “f” da Lei nº 6.379/06, redação dada pela Lei nº 10.008/13 de 06 de junho de 2013.
Por fim, mantem cancelado o valor de R$ 25.148,72 (vinte e cinco mil, cento e quarenta e oito reais e setenta e dois centavos), sendo R$ 7.723,95 (sete mil, setecentos e vinte e três reais e noventa e cinco centavos) por vício material da primeira denúncia, consubstanciado no cerceamento de defesa do contribuinte, e R$ 17.424,77 (dezessete mil, quatrocentos e vinte e quatro reais e setenta e sete centavos) em decorrência da aplicação da lei mais benigna para a penalidade aplicada à segunda denúncia.
P.R.I
Segunda Câmara de Julgamento, Sala das Sessões Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em 24 de agosto de 2018.
MAIRA CATÃO DA CUNHA CAVALCANTI SIMÕES
Conselheira Relatora
GIANNI CUNHA DA SILVEIRA CAVALCANTE
Presidente
Participaram do presente julgamento os membros da Segunda Câmara, DAYSE ANNYEDJA GONÇALVES CHAVES, PETRONIO RODRIGUES LIMA e SIDNEY WATSON FAGUNDES DA SILVA
Assessor Jurídico
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RELATÓRIO |
Trata-se de recurso voluntário, interposto nos termos do art. 77 da Lei nº 10.094/13, contra decisão proferida em primeira instância, que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000219/2013-79, lavrado em 28/02/2013, fls. 3 e 4, contra a empresa MERCANTIL SANTO ANTONIO LTDA, (CCICMS: 16.074.339-7), no qual constam as seguintes acusações, ipsis litteris:
CRÉDITO INEXISTENTE >> Contrariando dispositivos legais, o contribuinte utilizou crédito(s) de ICMS sem amparo documental, resultando na falta de recolhimento do imposto estadual.
NOTA EXPLICATIVA:
FOI VERIFICADO QUE A EMPRESA AUTUADA SE APROPRIOU DE CRÉDITO FISCAL ORIUNDO DE AQUISIÇÕES DE MERCADORIAS A EMPRESAS OPTANTES PELO SIMPLES NACIONAL, CONFORME PLANILHA QUE INTEGRA O RESPECTIVO PROCESSO ADMINISTRATIVO TRIBUTÁRIO, GERANDO, ASSIM, O ICMS ORA INDICADO, AFORA ACRÉSCIMOS LEGAIS.
FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS PRÓPRIOS >> Aquisição de mercadorias com recursos advindos de omissões de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto devido, constatada pela falta de registro de notas fiscais nos livros próprios.
NOTA EXPLICATIVA:
FOI VISTA A FALTA DE LANÇAMENTO DE 51 NOTAS FISCAIS DE ENTRADAS DURANTE OS MESES DE JANEIRO/2008 A DEZEMBRO DE 2009 E JANEIRO, JUNHO E DEZEMBRO DE 2010 JÁ CONFORME RELAÇÃO QUE INTEGRA O RESPECTIVO PROCESSO ADMINISTRATIVO TRIBUTÁRIO, GERANDO, ASSIM, A COBRANÇA DA IMPORTÂNCIA ORA INDICADA.
Foram dados como infringidos os artigos 72, 73 c/c 77, arts. 158, I, e 160, I, c/c art. 646 todos do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto nº 18.930/97, com proposição da penalidade prevista no art. 82, V, “f” e “h” da Lei nº 6.379/96, pelo que foi apurado um crédito tributário no valor de R$ 59.998,26 (cinquenta e nove mil, novecentos e noventa e oito reais e vinte e seis centavos) sendo R$ 19.999,42 (dezenove mil, novecentos e noventa e nove reais e quarenta e dois centavos), de ICMS e R$ 39.998,84 (trinta e nove mil, novecentos e noventa e oito reais e oitenta e quatro centavos) a título de multa por infração.
Num breve relato dos fatos, tem-se que, em 14/03/2013 o contribuinte foi cientificado do Auto de Infração, às fls. 04. Sua defesa administrativa foi apresentada na data de 15/04/2013, através da qual alega, sinteticamente, que todas as notas fiscais foram emitidas, porém, não chegaram na empresa. A maioria das operações foram anuladas por nota fiscal de entrada, pelo próprio emitente, que a empresa não foi comunicada e não foram enviados tais documentos.
Alega, ainda, que entrou em contato com os fornecedores e que na ocasião foi pedido um prazo para o envio desses documentos.
Por fim, a empresa juntou aos autos um pedido de prazo de 20 dias para serem juntados tais documentos ao processo.
Em 23 de Abril de 2014, houve ato processual de saneamento, de fls. 40, para que a Repartição Preparadora providenciasse o seguinte: i) Notificar o autuante para anexar aos autos o demonstrativo probatório da denúncia de Crédito Inexistente posta no auto de infração, em face do mesmo se constituir em elemento essencial para decisão e julgamento; ii) Inserir no sistema ATF a ciência do contribuinte ao Auto de Infração.
Sem informação de antecedentes fiscais, os autos foram conclusos (fl. 65) e enviados para a Gerência Executiva de Julgamentos de Processos Fiscais – GEJUP, onde foi distribuído para a julgador fiscal, Francisco Nociti, que decidiu pela parcial procedência do feito fiscal, com fixação do crédito tributário em R$ 34.849,54 (trinta e quatro mil, oitocentos e quarenta e nove reais e cinquenta e quatro centavos) sendo, R$ 17.424,77 (dezessete mil, quatrocentos e vinte e quatro reais e setenta e sete centavos) de ICMS por infringência aos artigos 158, I; 160, I, c/c fulcro no art. 646 todos do RICMS e R$ 17.424,77 (dezessete mil, quatrocentos e vinte e quatro reais e setenta e sete centavos) a título de multa por infração, nos termos do art. 82, inciso V, “f” da Lei 6.379/96. Ao tempo que cancelou, por indevido, o montante de R$ 25.148,72 (vinte e cinco mil, cento e quarenta e oito reais e setenta e dois centavos) em decorrência da aplicação da lei mais benigna para a penalidade.
Cientificada em 25 de setembro de 2017 da decisão proferida pela instância prima e inconformada com os termos da sentença, a defesa apresentou, em 25 de outubro de 2017, recurso voluntário tempestivo ao Conselho de Recursos Fiscais do Estado da Paraíba, através do qual reitera, integralmente, os argumentos da peça de impugnação apreciada pela GEJUP.
Remetidos, a este Colegiado, os autos foram distribuídos a esta relatoria.
Este é o relatório.
VOTO |
A questão em análise versa sobre as denúncias no Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.0000219/2013-79, lavrado em 28/02/2013, por meio das quais a empresa MERCANTIL SANTO ANTONIO LTDA fora autuada por ter utilizado crédito de ICMS sem amparo documental, bem como ter adquirido mercadorias com recursos advindos de omissões de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis, constatada pela falta de registro de notas fiscais nos livros próprios.
A primeira imputação feita pelo Agente Fiscal cinge-se à discussão a respeito da possibilidade de o contribuinte, adquirente de mercadorias, de apropriar-se de crédito de ICMS quando da aquisição de mercadorias advindas de fornecedores/remetente optante da sistemática do Simples Nacional.
Quanto a essa questão, devem ser observados os artigos 3º ao 5º, do Decreto de n° 28.576, de 14 de setembro de 2007, que dispõe sobre procedimentos relativos à aplicabilidade da Lei complementar n° 123/2006, que trata do Simples Nacional. Assim Vejamos:
Art. 3° Não farão jus à apropriação e nem transferirão créditos relativos ao ICMS às microempresas e as empresas de pequeno porte optantes do Simples Nacional, inclusive as que:
I – migrarem automaticamente do Simples Federal para o Simples Nacional;
II - tiverem o seu ingresso no Simples Nacional deferido durante o mês de julho de 2007.
Art. 4° O contribuinte que, no período de 1° de julho de 2007 até a data da confirmação de seu ingresso no Simples Nacional, tiver emitido documento fiscal com destaque do ICMS deverá comunicar, no prazo de 30 (trinta) dias contados da confirmação de seu ingresso no Simples Nacional, a cada destinatário contribuinte do ICMS, sua condição de optante do Simples Nacional.
Nova redação dada ao art. 5º pelo inciso III do art. 1º do Decreto nº 31.503/10 (DOE de 11.08.10).
Art. 5º A partir de 1º de janeiro de 2009, as pessoas jurídicas e aquelas a elas equiparadas pela legislação tributária, não optantes pelo Simples Nacional, terão direito ao crédito fiscal correspondente ao ICMS incidente sobre as suas aquisições de mercadorias de ME ou de EPP optante pelo Simples Nacional, desde que destinadas à comercialização ou industrialização e observado, como limite, o ICMS efetivamente devido pelas optantes pelo Simples Nacional em relação a essas aquisições. (grifei)
Nova redação dada ao § 1º do art. 5º pelo art. 1º do Decreto nº 33.982/13 (DOE de 01.06.13).
§ 1º A ME ou EPP optante pelo Simples Nacional que emitir nota fiscal com direito ao crédito de que trata o § 1º do art. 23 da Lei Complementar nº 123/06, consignará no campo destinado às informações complementares ou, em sua falta, no corpo da nota fiscal, por qualquer meio gráfico indelével, a expressão:
“PERMITE O APROVEITAMENTO DO CRÉDITO FISCAL DE ICMS NO VALOR DE R$ ...; CORRESPONDENTE À ALÍQUOTA DE ...%, NOS TERMOS DO § 1º DO ART. 23 DA LC Nº 123/06”.
§ 2º A alíquota aplicável, para efeito do crédito, corresponderá:
Nova redação dada ao inciso I do § 2º do art. 5º pelo art. 1º do Decreto nº 33.982/13 (DOE de 01.06.13).
I - ao produto da alíquota efetiva multiplicado pelo percentual previsto na coluna “ICMS” nos Anexos I ou II da Lei Complementar nº 123/06, para a faixa de receita bruta a que a empresa optante estiver sujeita no mês anterior ao da operação, na forma da Seção VIII do Capítulo II do Titulo I da Resolução CGSN nº 140/18;
Nova redação dada ao inciso II do § 2º do art. 5º pela alínea “a” do inciso II do art. 1º do Decreto nº 38.500/18 – DOE de 01.08.18.
OBS: efeitos a partir de 01.08.18.
II - ao produto da alíquota efetiva multiplicado pelo percentual de ICMS referente à primeira faixa prevista nos Anexos I e II da Lei Complementar nº 123/06, na hipótese de a operação ocorrer no mês de início de atividade da ME ou EPP optante pelo Simples Nacional.
§ 3º No caso em que este Estado conceda redução nos termos do § 20 do art. 18 da Lei Complementar nº 123/06, a alíquota de que trata o § 2º deste artigo, será aquela considerando a respectiva redução.
§ 4º O aproveitamento do crédito de que trata este artigo não se aplica quando:
I - a ME ou EPP estiver sujeita à tributação do ICMS no Simples Nacional por valores fixos mensais;
II - a ME ou EPP não informar no documento fiscal a alíquota prevista para a operação, na forma do § 1º deste artigo;
III - a operação ou prestação não for tributada pelo ICMS;
IV - a ME ou EPP considerar, por opção, que a base de cálculo sobre a qual serão calculados os valores devidos no Simples Nacional será a receita recebida no mês (regime de caixa), na forma da Seção IV do Capítulo II do Título I da Resolução CGSN nº 140/18.
§ 5º Na hipótese de utilização de crédito fiscal de forma indevida ou a maior, ou ainda em período anterior ao estabelecido no caput deste artigo, o destinatário da operação estornará o crédito respectivo, independentemente de prévia comunicação, sem prejuízo de eventuais sanções ao emitente nos termos da Legislação do Simples Nacional.
Nesse prumo, não se enquadrando o contribuinte nas normas acima transcritas, não lhe será reconhecido o direito subjetivo ao aproveitamento do referido crédito de ICMS. Utilizando-se de crédito inexistente, o contribuinte incorre em ofensa aos artigos 72, 73 e 77, todos do RICMS/PB, como corretamente apontou o Agente Fiscal. Vejamos o que prescrevem estes dispositivos.
Art. 72. Para fins de compensação do imposto devido, constitui crédito fiscal o valor do imposto relativo:
I - à entrada de mercadorias, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo imobilizado, ou ao recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação, observado o disposto no § 1º deste artigo e § 4º do art. 85; ( Lei nº 11.031/17);
II - ao efetivamente recolhido a título de substituição tributária de operações anteriores e ao correspondente às entradas de mercadorias cujo imposto tenha sido retido pelo remetente, sempre que:
a) o contribuinte receber mercadoria não incluída no regime de substituição tributária, mas que, por qualquer circunstância, tiver sofrido cobrança antecipada do imposto;
b) não sendo o adquirente considerado contribuinte substituído, receber, com imposto pago por antecipação, mercadorias sujeitas ao regime de substituição tributária;
III - à repetição de indébito, quando autorizado por decisão final de autoridade competente;
IV - às mercadorias recebidas para emprego na prestação de serviços, na hipótese dos incisos IV e V do art. 2º;
V - ao ICMS destacado e ao retido, quando o estabelecimento industrial receber mercadoria sujeita a substituição tributária para utilização em processo industrial de produto cuja saída seja tributada;
VI – às mercadorias recebidas com substituição tributária, por estabelecimento industrial, na forma do art.76;
VII – ao efetivamente recolhido a título de substituição tributária nas operações interestaduais com açúcar (Protocolos ICMS 33/91 e 41/91);
§1º Na utilização dos créditos de que trata esta Seção, observar-se-á o seguinte (Lei nº 7.334/03):
I – somente darão direito de crédito as mercadorias destinadas ao uso ou consumo do estabelecimento, nele entradas a partir de 1º de janeiro de 2020;
II – somente dará direito a crédito a entrada de energia elétrica no estabelecimento:
(...)
III – somente darão direito de crédito as mercadorias destinadas ao ativo permanente do estabelecimento, nele entradas a partir de 16 de setembro de 1996;
IV – somente dará direito a crédito o recebimento de serviços de comunicação utilizados pelo estabelecimento:
(...)
Art. 73. Fica ainda assegurado o direito ao crédito quando as mercadorias, anteriormente oneradas pelo imposto, forem objeto de:
I - devolução por consumidor final, na forma e nos prazos previstos no art. 88;
II - retorno, por não terem sido negociadas no comércio ambulante e por não ter ocorrido a tradição real, conforme disposto no art. 89.
(...)
Art. 77. O direito de crédito, para efeito de compensação com débito do imposto, reconhecido ao estabelecimento que tenha recebido as mercadorias ou para o qual tenham sido prestados os serviços, está condicionado à idoneidade da documentação e, se for o caso, à escrituração nos prazos e condições estabelecidos neste Regulamento.
Não obstante, observa-se dos autos, ainda em relação a esta primeira acusação, a ausência de provas da denúncia de Crédito Inexistente, elemento essencial para a constituição do lançamento, sem as quais não há como subsistir o lançamento tributário.
De fato, o Auto de Infração de fls. 03 e 04 encontra-se desacompanhado de demonstrativos capazes de dar sustento à denúncia, em clara afronta ao direito de defesa do contribuinte, que está consubstanciado nos princípios do contraditório e da ampla defesa, bem como do devido processo legal, garantias constitucionais fundamentais, inclusive no processo administrativo, por força do art. 5º, incisos LIV e LV da Constituição Federal:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
Com efeito, intimado, o contribuinte ofereceu tempestivamente impugnação (fls. 31/32) ao Auto de Infração, em 15/04/2013.
Ocorre que, somente após, percebendo a falta de provas que subsidiassem a denúncia, em 09/05/2014, foi o Autuante notificado pela GEJUP (fls. 40/41) para que anexasse aos autos os referidos demonstrativos, que foram acostados pelo Auditor Fiscal às fls. 42/62, documentos estes aos quais o contribuinte não teve acesso.
Dessa maneira, não foi garantido ao contribuinte o exercício do direito subjetivo ao contraditório real em relação aos demonstrativos anexados pela fiscalização, em cristalino cerceamento de defesa.
Sendo tais demonstrativos, como dito, elementares do lançamento de ofício do crédito tributário, especialmente fundado em acusação de aproveitamento de crédito inexistente de ICMS, necessária a reforma da sentença de primeira instância, especificamente neste ponto, para declarar a nulidade do lançamento referente à primeira acusação por ocorrência do vício material.
Dando seguimento, passo à análise da segunda imputação, consistente na omissão de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto devido, nos exercícios de 2008, 2009 e 2010, referentes a compras de mercadorias sem o correspondente registro das Notas Fiscais no Livro de Entradas.
Acompanhando o Auto de Infração, o agente fiscal acostou aos autos a relação de 51 (cinquenta e uma) notas fiscais de aquisições de mercadorias não registradas nos livros próprios, colacionando também planilha com o detalhamento dos cálculos.
Como se sabe, a ocorrência de entradas de mercadorias não contabilizadas acarreta a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto, conforme tipificado no art. 646 do RICMS-PB, abaixo transcrito:
Art. 646. O fato de a escrituração indicar insuficiência de caixa, suprimentos a caixa não comprovados ou a manutenção no passivo, de obrigações já pagas ou inexistentes, bem como a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas ou de declarações de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito, autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis sem pagamento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção. (grifei).
Com efeito, o fato gerador do ICMS se dá de forma indireta, onde a falta do registro de notas fiscais relativas às entradas de mercadorias denota pagamentos realizados com recursos fora do Caixa escritural da empresa, presumindo-se que sejam advindos de saídas de mercadorias tributáveis sem emissão de nota fiscal, contrariando os artigos 158, I e 160, I do RICMS/PB, abaixo reproduzidos:
Art. 158. Os contribuintes, excetuados os produtores agropecuários, emitirão Nota Fiscal, modelos 1 ou 1-A, Anexos 15 e 16:
I - sempre que promoverem saída de mercadorias;
Art. 160. A nota fiscal será emitida:
I - antes de iniciada a saída das mercadorias;
Note-se que, tratando-se de presunção relativa, é possível ao contribuinte que demonstre fato impeditivo, modificativo ou extintivo do crédito fazendário. Sendo assim, com a falta de lançamento das notas fiscais nos livros próprios, é da recorrente o ônus de provar a improcedência da autuação, em razão do que dispõe o parágrafo único do artigo 56 da Lei 10.094/2013, in verbis:
Art. 56. Todos os meios legais, ainda que não especificados nesta Lei, são hábeis para provar a verdade dos fatos em que se funda a ação, a impugnação ou o recurso.
Parágrafo único. O ônus da prova compete a quem esta aproveita.
Por outro lado, foi proposta, no Auto de Infração em análise, a penalidade prevista no artigo 82, V, “f”, da Lei nº 6.379/96, que assim dispõe:
Art. 82 - As multas para as quais se adotará o critério referido no inciso II, do Art. 80, serão as seguintes:
(...)
V - de 200% (duzentos por cento):
f) aos que deixarem de recolher o imposto proveniente de saída de mercadoria, dissimulada por receita de origem não comprovada, inclusive a representada por despesa realizada a descoberto de caixa, pela existência de passivo fictício ou por qualquer forma apurada através de levantamento da escrita contábil;
Em que pese o fato de que o dispositivo supra transcrito era o vigente à época do cometimento da infração, detectou o julgador de primeiro grau a superveniência da Lei nº 10.008/13 de 06 de junho de 2013, que alterou a alínea “f”, do inciso V, do art. 82, da Lei n° 6.379/96, passando a prever penalidade menos severa para o descumprimento da obrigação acessória em comento. Vejamos:
V – de 100% (cem por cento):
(...)
f) aos que deixarem de recolher o imposto proveniente de saída de mercadoria, dissimulada por receita de origem não comprovada, inclusive a representada por despesa realizada a descoberto de caixa, pela existência de passivo fictício ou por qualquer forma apurada através de levantamento da escrita contábil ou do livro Caixa quando o contribuinte não estiver obrigado à escrituração;
Haja vista tratar-se de ato não definitivamente julgado, forçosa a aplicação da lei mais benéfica ao contribuinte, por inteligência do artigo 116, II, “c”, do Código Tributário Nacional. Transcrevo:
Art.116. A lei aplica-se a ato e fato pretérito:
I – em qualquer caso, quando seja expressamente interpretativa, excluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados;
II – tratando-se de ato não definitivamente julgado:
(...)
c) Quando lhe comine penalidade menos severa que a prevista na lei vigente ao tempo de sua prática. (grifo nosso).
Assim, sigo o entendimento do julgador singular, para aplicar, in casu, a penalidade do Art. 82, V, “f”, da Lei nº 6.379/96, com a nova redação, dada pela Lei nº 10.008/13 de 06 de junho de 2013, ratificando o crédito tributário.
Por todo o exposto,
VOTO pelo recebimento do recurso voluntário, por regular e tempestivo, e, quanto ao mérito, pelo seu desprovimento, para reformar a sentença monocrática que julgou parcialmente procedente, o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.0000219/2013-79, lavrado em 28/02/2013, contra a empresa MERCANTIL SANTO ANTONIO LTDA., inscrição estadual nº 16.074.339-7, já qualificada nos autos, declarando devido o crédito tributário no valor de R$ 34.848,54 (trinta e quatro mil, oitocentos e quarenta e oito reais e cinquenta e quatro centavos), sendo R$ 17.424,77 (dezessete mil, quatrocentos e vinte e quatro reais e setenta e sete centavos) de ICMS, por infringência aos arts. 158, I; 160, I; c/fulcro no art. 646 todos do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto nº 18.930/97, e R$ 17.424,77 (dezessete mil, quatrocentos e vinte e quatro reais e setenta e sete centavos) a título de multa por infração, nos termos do art. 82, V, “f” da Lei nº 6.379/06, redação dada pela Lei nº 10.008/13 de 06 de junho de 2013.
Por fim, mantenho cancelado o valor de R$ 25.148,72 (vinte e cinco mil, cento e quarenta e oito reais e setenta e dois centavos), sendo R$ 7.723,95 (sete mil, setecentos e vinte e três reais e noventa e cinco centavos) por vício material da primeira denúncia, consubstanciado no cerceamento de defesa do contribuinte, e R$ 17.424,77 (dezessete mil, quatrocentos e vinte e quatro reais e setenta e sete centavos) em decorrência da aplicação da lei mais benigna para a penalidade aplicada à segunda denúncia.
Segunda Câmara, Sala de Sessões Gildemar Pereira de Macedo, em 24 de agosto de 2018.
MAÍRA CATÃO DA CUNHA CAVALCANTI SIMÕES
Conselheira Relatora
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