ACÓRDÃO 488/2018
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA
PROCESSO Nº0234572014-0
PRIMEIRA CÂMARA DE JULGAMENTO
Recorrente:GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS-GEJUP
Recorrida:A B CAVALCANTI & CIA LTDA
Repartição Preparadora:SUBGERÊNCIA DA RECEBEDORIA DE RENDAS DA GERÊNCIA REGIONAL DA 1ª REGIÃO
Autuante:FABIO LIRA SANTOS
Relatora:CONS.ª THAIS GUIMARAES TEIXEIRA
PASSIVO INEXISTENTE. OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS. AUTO DE INFRAÇÃO PROCEDENTE. REFORMADA A DECISÃO RECORRIDA. RECURSO HIERÁRQUICO PROVIDO.
A manutenção no passivo de obrigações desprovidas de lastro documental configura o passivo inexistente, autorizando a presunção legal de omissão de saídas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto devido. O contribuinte não acostou aos autos provas elidentes da acusação fiscal.
Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...
A C O R D A M os membros da Primeira Câmara de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, à unanimidade, e de acordo com o voto da relatora, pelo recebimento do recurso hierárquico, por regular e, no mérito, pelo seu provimento, para reformar a sentença prolatada na primeira instância, que julgou nulo por vício formal o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000211/2014-93, lavrado em 17/2/2014, em desfavor da empresa A B CAVALCANTI & CIA LTDA., inscrição estadual n° 16.119.242-4, devidamente qualificada nos autos, considerando-o PROCEDENTE e impondo o ônus decorrente desta ação fiscal para imputar o crédito tributário no valor de R$ 136.057,98 (cento e trinta e seis mil, cinquenta e sete reais e noventa e oito centavos), sendo R$ 68.028,99 (sessenta e oito mil, vinte e oito reais e noventa e nove centavos) de ICMS, por infringência aos artigos 158, I, 160, I, c/c 646, II, todos do RICMS/PB, e R$ 68.028,99 (sessenta e oito mil, vinte e oito reais e noventa e nove centavos), de multa por aplicação do artigo 82, V, “f” da Lei 6.379/96.
P.R.I
Primeira Câmara de Julgamento, Sala das Sessões Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em 14 de Setembro de 2018.
THAIS GUIMARAES TEIXEIRA
Conselheira Relatora
GIANNI CUNHA DA SILVEIRA CAVALCANTE
Presidente
Participaram do presente julgamento os membros da Primeira Câmara de Julgamento, GÍLVIA DANTAS MACEDO, ANÍSIO DE CARVALHO COSTA NETO E MÔNICA OLIVEIRA COELHO DE LEMOS.
Assessor Jurídico
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RELATÓRIO |
Em análise, neste egrégio Conselho de Recursos Fiscais, o recurso hierárquico interposto nos moldes do art. 80 da Lei nº 10.094/2013, contra a decisão monocrática, que julgou nulo o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000211/2014-93 (fls. 2), lavrado em 17 de fevereiro de 2014, que denuncia a empresa, acima identificada, pelo cometimento da irregularidade abaixo transcrita, ipsis litteris:
“PASSIVO INEXISTENTE (OMISSÃO DE SAÍDAS) >> Contrariando dispositivos legais, o contribuinte omitiu saídas pretéritas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto devido, constatado mediante a figura do passivo inexistente.
Nota Explicativa: PASSIVOS ONDE NÃO FOI APRESENTADA DOCUMENTAÇÃO COMPROBATÓRIA: EMPRÉSTIMOS BANCÁRIOS – BANCO SUDAMERIS – 50.000,00 BANCO ITAÚ – 144.444,43 DÉBITOS COM SÓCIOS EMPRÉSTIMOS DE SÓCIOS 45.726,08 EMPRÉSTIMOS DE TERCEIROS ADAILTON PEREIRA DA SILVA (POSTO TEXAS) 200.000,00 TOTAL R$ 400.170,51”
Considerando infringidos os arts. 158, I; 160, I; c/c o art. 646, todos do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto nº 18.930/97, o agente fazendário constituiu crédito tributário, por lançamento de ofício, no importe de R$ 136.057,98, sendo R$ 68.028,99, de ICMS, e R$ 68.028,99, de multa por infração, proposta nos termos do art. 82, V, “f”, da Lei nº 6.379/96.
Documentos instrutórios, anexos às fls. 3 a 44 dos autos.
Regularmente cientificado da lavratura do auto de infração em análise, em 19/3/2014, via postal, com Aviso de Recebimento – AR (fls. 45), o sujeito passivo apresentou peça reclamatória (fls. 47 a 59) em tempo hábil, por meio de advogado habilitado, conforme documentos anexos às fls. 67.
A reclamante inicialmente sumaria a acusação para, em seguida, combatê-la, dizendo que diversamente da afirmação da fiscalização os lançamentos contábeis em questão dispõem de lastro documental comprobatório, de modo que não há que se falar em passivo inexistente.
Aduz ainda que, caso assim não fosse, por atuar no ramo de varejo de combustíveis os quais são sujeitos ao regime de tributação da substituição tributária, na qual a retenção do ICMS é feita “na fonte”, em virtude disso a constatação de passivo inexistente não autoriza o emprego da presunção legal de omissão de saídas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto.
Neste sentido, propõe-se a demonstrar a improcedência do feito fiscal, alegando que:
1) Comercializa apenas mercadorias sujeitas à substituição tributária, por isso entende ser inadmissível cobrar ICMS decorrente de supostas saídas tributáveis quando é absolutamente induvidoso que o impugnante só vende mercadorias sobre as quais não haveria nova incidência de ICMS porque já foi retido na origem, pela refinaria de petróleo;
2) Contraiu empréstimo junto ao Banco Itaú no montante de R$ 200.000,00, a ser quitado em 18 parcelas mensais de R$ 11.111,11, remanescendo um saldo de R$ 144.444,43 no mês de dezembro de 2010, que, no seu entender, está comprovado mediante os documentos anexos às fls. 70 a 75;
3) Celebrou um empréstimo com o Sr. Adailton Pereira da Silva no montante de R$ 200.000,00, que foi transferido em duas parcelas de R$ 70.000,00 e R$ 130.000,00, consoante papéis anexos às fls. 76 a 86, daí argumenta que não há dúvidas quanto à ocorrência da operação, logo não há passivo inexistente;
4) Com referência aos empréstimos contraídos junto ao Banco Sudameris (R$ 50.000,00) e aos sócios da impugnante (R$ 47.426,08), argumenta que não foi possível colacionar aos autos o lastro documental no prazo conferido pela impugnação, no entanto, diz que foram firmados nos exercícios de 2008 e 2006, respectivamente, havendo sido registrados na contabilidade da época da celebração do contrato. Novamente reitera que não há passivo inexistente.
No intuito de robustecer seu entendimento, traz aos autos decisão proferida pelo CARF que cuida de passivo fictício, às fls. 57.
Prossegue sua defesa, alegando que o auto de infração é improcedente, pois os empréstimos junto ao Banco Sudameris e aos sócios ocorreram em data diversa da daquela do fato gerador lançado no auto de infração analisado (2010), vez que supostamente a infração imputada teria ocorrido nos exercícios de 2006 e 2008. Além disso, pleiteia a decadência dos referidos lançamentos com fulcro no art. 150, § 4º, do CTN.
Por último, reitera o pedido de improcedência do auto de infração.
Sem informações de antecedentes fiscais (fls. 87), os autos foram conclusos (fls. 88) e encaminhados à Gerência Executiva de Julgamento de Processos Fiscais - GEJUP, onde foram distribuídos ao julgador fiscal Rodrigo Antônio Alves de Araújo, que decidiu pela nulidade do auto de infração sub judice,em conformidade com a sentença acostada às fls. 90 a 95 e a ementa abaixo reproduzida, litteris:
“PRESUNÇÃO DE OMISSÃO DE SAÍDAS – PASSIVO INEXISTENTE – ERRO NA NATUREZA DA INFRAÇÃO – VÍCIO FORMAL – NULIDADE.
No lançamento de ofício a natureza da infração deve estar determinada com segurança, onde a determinação do fato infringente eiva de vício o lançamento realizado, impondo a nulidade por vício formal, para que seja realizado novo feito fiscal.
AUTO DE INFRAÇÃO NULO”
Ciente da decisão proferida pelo órgão julgador monocrático, via postal, com Aviso de Recebimento – AR, consoante fls. 97 e 98, a interessada não mais se manifestou nos autos.
É o relatório.
V O T O |
Cuida-se, nestes autos, da acusação de passivo inexistente, vez que a ora recorrente lançou no seu Balancete Analítico, referente ao mês de dezembro de 2010, os valores: de R$ 50.000,00 e R$ 144.444,43 a título de Empréstimos Bancários, sendo R$ 45.726,08 como Empréstimos de Sócios, e R$ 200.000,00 consignou como Empréstimos de Terceiros, ou seja, os referidos valores foram lançados nas contas de obrigação sem que tenha qualquer lastro documental que lhe deem veracidade, de acordo com documento às fls. 6.
Antecedendo a discussão de mérito, é imprescindível anotar que o sujeito passivo, além de comercializar combustíveis e lubrificantes, que são sujeitos ao regime de substituição tributária, também pratica o comércio varejista de acessórios para veículos automotores, conforme contrato social às fls. 63 e anotações no cadastro da SER/PB.
Diante disso, considero descabida a alegação do contribuinte de que comercializa exclusivamente mercadorias sujeitas à substituição tributária, motivo pelo qual não seria alcançado pela presunção legal de omissões de saídas de mercadorias tributáveis em decorrência ade passivo fictício ou inexistente, conforme art. 646, II, do RICMS, aprovado pelo Decreto nº 18.930/97.
É sabido que o artigo 646 do RICMS/PB prescreve a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do tributo devido na hipótese de manutenção no passivo, de obrigações já pagas ou inexistentes, in verbis:
Nova redação dada ao art. 646 pelo art. 1º do Decreto nº 33.047/12 (DOE de 23.06.12).
“Art. 646. Autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou a realização de prestações de serviços tributáveis sem o recolhimento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção:
(...)
II – a manutenção no passivo de obrigações já pagas ou inexistentes; ”
Percebe-se, por dicção do artigo acima destacado, que a manutenção de obrigações já pagas ou inexistentes no passivo, mais especificamente, no BALANCETE ANALÍTICO DE DEZEMBRO DE 2010 (fls. 22 a 26), autoriza o emprego da presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis sem qualquer espaço para mitigação ou interpretação que se possa estabelecer, já que a conduta, leva à conclusão de que houve movimento de desembolsos sem que a Fazenda Pública tenha alcançado com a tributação do imposto devido.
No caso em litígio, a análise do balancete em questão conduziu o auditor fazendário à constatação de que os saldos das rubricas Empréstimos Bancários, Empréstimos de Sócios e Empréstimos de Terceiros estão desprovidos de lastro probatório capaz de conferir legitimidade aos lançamentos, que contra as contas foram feitos, nem em relação ao próprio saldo, vez que para comprovar a regularidade dos saldos se faria necessária a apresentação da escrita contábil, discriminando em seus lançamentos as contratações ou amortizações dos empréstimos supracitados, ou ainda, a comprovação da quitação dos referidos empréstimos.
Importante destacar que os extratos bancários acostados aos autos pela, então reclamante, às fls. 70 a 86, não estão relacionados à escrita contábil, que seria o instrumento probatório, juntamente com o contrato de mútuo, capazes de fazer sucumbir a denúncia fiscal.
Buscando um melhor esclarecimento da matéria, é prudente apresentar a distinção entre as figuras do passivo fictício, passivo inexistente e do passivo oculto, que é de fundamental importância para compreensão da verdade dos fatos, cuja perseguição é razão precípua dos processos em geral.
Dessa forma, podemos vislumbrar o passivo fictício como gênero do qual são espécies o passivo mantido escriturado, mas já pago e o passivo mantido escriturado, mas para o qual o contribuinte não oferece lastro probatório documental capaz de verificar sua regularidade, este dito inexistente. Sabemos, como é de conhecimento de todos que imergem nos fundamentos da ciência contábil, que os lançamentos contábeis só se sustentam para fatos registrados em que fique configurado o lastro probatório/documental, sem o qual é como não existissem.
Por fim, inclina-se pela definição daquilo que na jurisprudência administrativa ficou conhecido como passivo oculto, que se relaciona com os fatos de aquisições a prazo, que não foram registradas na contabilidade, mas que a liquidação respectiva dessas obrigações se faz de forma registral, por meio de caixa ou bancos, por exemplo.
Feitas essas considerações, move-nos, das decisões já lavradas nesta Corte Plural, o caminho dotado de perspicácia e intuição em que se configura a repercussão tributária do ICMS em relação ao passivo já pago e mantido escriturado e o passivo escriturado em que não haja documento para lhe emprestar lastro. Isso se depreende de uma leitura rasteira do texto do artigo 646 do RICMS/PB.
Dessa forma, ousando discordar da decisão proferida na instância monocrática, reformo a decisão monocrática que anulou por vício formal o auto de infração em reproche, por entender estarem presentes nestes autos os pressupostos exigidos no art. 646 que dão substância à exigência fiscal.
Por todo o exposto,
V O T O - pelo recebimento do recurso hierárquico, por regular e, no mérito, pelo seu provimento, para reformar a sentença prolatada na primeira instância, que julgou nulo por vício formal o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000211/2014-93, lavrado em 17/2/2014, em desfavor da empresa A B CAVALCANTI & CIA LTDA., inscrição estadual n° 16.119.242-4, devidamente qualificada nos autos, considerando-o PROCEDENTE e impondo o ônus decorrente desta ação fiscal para imputar o crédito tributário no valor de R$ 136.057,98 (cento e trinta e seis mil, cinquenta e sete reais e noventa e oito centavos), sendo R$ 68.028,99 (sessenta e oito mil, vinte e oito reais e noventa e nove centavos) de ICMS, por infringência aos artigos 158, I, 160, I, c/c 646, II, todos do RICMS/PB, e R$ 68.028,99 (sessenta e oito mil, vinte e oito reais e noventa e nove centavos), de multa por aplicação do artigo 82, V, “f” da Lei 6.379/96.
Primeira Câmara de Julgamento, Sala das Sessões, Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em 14 de setembro de 2018..
THAÍS GUIMARÃES TEIXEIRA
Conselheira Relatora
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