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ACÓRDÃO Nº. 58/2019

brasao paraiba
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA

PROCESSO Nº 0539752016-0
PRIMEIRA CÂMARA DE JULGAMENTO
Recorrente: ATACADÃO S.A
Recorrida: GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS - GEJUP
Repartição Preparadora: SUBGERÊNCIA DA RECEBEDORIA DE RENDAS DA GERÊNCIA REGIONAL DA PRIMEIRA REGIÃO DA SER
Autuante: JOAO VIANEY VELOSO GOUVEIA
Relator: CONS.º ANISIO DE CARVALHO COSTA NETO

NULIDADE. NÃO INCIDÊNCIA. MINUDENTE DESCRIÇAÕ DA INFRAÇÃO IMPUTADA. GARANTIDOS A AMPLA DEFESA, O CONTRADITÓRIO E O DEVIDO PROCESSO LEGAL.OMISSÃO DE SAÍDAS TRIBUTÁVEIS PRETÉRITAS. PRESUNÇÃO. FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS PRÓPRIOS. PROVAS ACOSTADAS AOS AUTOS FAZEM SUCUMBIR PARTE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE. MANTIDA DECISÃO RECORRIDA. RECURSO VOLUNTÁRIO DESPROVIDO.

Nulidade não acatada por ter o lançamento de ofício observado, de forma precisa, as disposições relativas às formalidades intrínsecas e extrínsecas dispostas na legislação, razão pela qual foi garantido ao contribuinte o direito de alegar o que pretendeu.
Por disposição legal, infere-se que a conduta infratora de não lançar nos livros próprios as notas fiscais de aquisição autoriza imposição da presunção de omissão de saídas tributáveis pretéritas com o fito de fazer jus à despesa com as referidas compras. Provas acostadas aos autos fizeram sucumbir parte do crédito tributário levantado.

Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...

 

 

A C O R D A M os membros da Primeira Câmara   de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, e de acordo com o voto do relator, pelo recebimento do recurso voluntário, por regular e tempestivo, e, no mérito, pelo seu desprovimento, para manter a sentença prolatada na primeira instância, que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000523/2016-69, lavrado em 26/4/2016, em desfavor da empresa ATACADÃO S.A., inscrição estadual n° 16.159568-5, devidamente qualificada nos autos, impondo o ônus decorrente desta ação fiscal, condenando-a ao pagamento do crédito tributário no valor de R$ 45.362,46 (quarenta e cinco mil, trezentos e sessenta e dois reais e quarenta e seis centavos), sendo R$ 22.681,23 (vinte e dois mil, seiscentos e oitenta e um reais e vinte e três centavos), referentes ao ICMS, por infringência aos art. 158, I; art. 160, I; c/ fulcro no art. 646, todos do RICMS/PB, aprovado pelo decreto 18.930/97, e mais R$ 22.681,23 (vinte e dois mil, seiscentos e oitenta e um reais e vinte e três centavos), relativos à multa prevista no art. 82, V, “f” da Lei 6.379/96, alterada pela Lei 10.008/2013.

Ao tempo em que mantém cancelado o crédito tributário no valor de R$ 36.198,08 (trinta e seis mil, cento e noventa e oito reais e oito centavos), sendo R$ 18.099,04 (dezoito mil e noventa e nove reais e quatro centavos), de ICMS, e mais R$ 18.099,04 (dezoito mil e noventa e nove reais e quatro centavos), de multa por infração, pelos motivos já expostos.


P.R.I



Primeira Câmara de Julgamento, Sala das Sessões Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em 15 de fevereiro  de 2019.



                                                              ANÍSIO DE CARVALHO COSTA NETO
                                                                        Conselheiro Relator



                                                        GIANNI CUNHA DA SILVEIRA CAVALCANTE 
                                                                                 Presidente



Participaram do presente julgamento os membros da Primeira Câmara de Julgamento, GÍLVIA DANTAS MACEDO, THAIS GUIMARÃES TEIXEIRIA e MÔNICA OLIVEIRA COELHO DE LEMOS.



                                                            FELIPE TADEU LIMA SILVINO
                                                                      Assessor Jurídico

Neste colegiado examina-se o recurso voluntário, nos moldes do artigo 77 da Lei nº 10.094/2013, diante da decisão monocrática que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000523/2016-69, lavrado em 26/4/2016, (fls. 2-3), no qual constam as seguintes infrações fiscais:

 

“FALTA DE LANÇAMENTO DE N. F. DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS PRÓPRIOS – Aquisição de mercadorias com recursos advindos de omissões de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis e/ou a realização de prestações de serviços tributáveis sem o pagamento do imposto devido, constatada pela falta de registro de notas fiscais nos livros próprios.”

 

Foram dados como infringidos os artigos 158, I, 160, I, c/fulcro no artigo 646, todos do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto n° 18.930/97. O crédito tributário proposto foi de R$ 81.560,54 (oitenta e um mil, quinhentos e sessenta reais e cinquenta e quatro centavos), sendo R$ 40.780,27 (quarenta mil, setecentos e oitenta reais e vinte e sete centavos), referentes ao ICMS, e mais R$ 40.780,27 (quarenta mil, setecentos e oitenta reais e vinte e sete centavos), de multa por infração, cuja previsão legal se insere no artigo 82, V, alínea “f”, da Lei 6.379/96.

           

Regularmente cientificado do auto de Infração através de Aviso de Recebimento (A.R.) em 13/5/2016 (fl. 8), a empresa autuada apresentou reclamação em 13/6/2016, na qual se insurge contra os termos da autuação com base nas seguintes argumentações:

 

- que o auto é nulo por falta de descrição de autuação e da capitulação legal, incorrendo no cerceamento no direito à defesa e da ameaça aos princípios do devido processo legal e do contraditório;

 

- afirma que as notas fiscais de devolução jamais adentraram no estabelecimento da autuada, anexando como prova os documentos de devolução emitidos pelo próprio emitente;

 

- que as notas fiscais de n. º s 1425058 e 1425059 foram furtadas, não tendo havido entrada das mercadorias, anexando como prova o Boletim de Ocorrência;

 

- que a autuação só tem base em presunções, indícios e suspeitas, não havendo prova concreta do cometimento das infrações;

 

- que a multa aplicada, nos percentuais de 100% importa em natureza confiscatória da penalidade;

 

Assim, diante das argumentações, requereu a nulidade do auto de infração ou, caso as alegações referente à nulidade não sejam observadas, a decretação de sua improcedência.

 

Com anotação de ocorrência de antecedentes fiscais (fl. 129), os autos foram remetidos à GEJUP, com distribuição ao Julgador Lindembergh Roberto de Lima que exarou sentença considerando o auto de infração PARCIALMENTE PROCEDENTE, conforme ementa abaixo:

 

FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO. PRESUNÇÃO LEGAL DE OMISSÃO DE SAÍDAS PRETÉRITAS DE MERCADORIAS SEM PAGAMENTO DE IMPOSTO. DENÚNCIA COMPROVADA EM PARTE.

- A falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios configura a existência de compra efetuada com receita de origem não comprovada, impondo o lançamento tributário de ofício, em face da presunção legal de que trata o artigo 646 do RICMS/PB.

- A constatação de operação de entrada de mercadoria, pelo fornecedor em retorno/devolução, com o fim de anular a operação, fez sucumbir parte do crédito tributário inicialmente lançado.

AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE

 

Cientificado da decisão de primeira instância administrativa, através de A.R., em 13/12/2017 (fl. 142) – JT 23243281 6 BR -, o autuado apresentou Recurso Voluntário (fls. 143-156) ao Conselho de Recursos Fiscais em 11/01/2018, se insurgindo contra os termos da sentença com base nos seguintes argumentos:

 

- que é nulo o auto de infração por divergência entre a descrição dos fatos e os dispositivos da legislação apontados como violados, em clara inobservância ao disposto no artigo 142, do CTN, e 41, da Lei n. º 10.094/2013, cerceando o direito de defesa e infringindo os princípios constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa,

 

- que a autuação se baseia em presunções, não indicando qual método teria se utilizado a fiscalização para se chegar ao montante do crédito tributário cobrado, se baseando em “fato presumido”;

 

- que a penalidade aplicada decorre de acusação grave contida no art. 82, V, “l” e deveria, portanto, se basear em provas, razão pela qual a interpretação deveria ser a mais favorável ao contribuinte, nos moldes do artigo 112, do CTN;

 

- que uma parte das mercadorias consignadas em parte das notas fiscais relacionadas pela fiscalização foram objeto de roubo, mais especificamente as das notas fiscais de n. º s 1425058 e 1425059, conforme Boletim de Ocorrência;

 

- que a multa de 100% não deve ser exigida já que há autuação paralela em que se cobra 5% sobre o valor das operações em razão do não registro das notas fiscais na EFD;

 

- que além do item anterior, a multa extrapola os limites já esposados em entendimento do STF e em inobservância a princípios constitucionais, também não se aplicando porque sequer ficou comprovado o cometimento das infrações, sendo ela abusiva, extorsiva, expropriatória e confiscatória;

 

Na sequência, remetidos os autos a esta Casa, com distribuição a esta relatoria, segundo critério regimentalmente previsto, o recurso voluntário será objeto de apreciação e julgamento.

 

Com o pedido de sustentação oral (fl. 145), foi expedido solicitação de parecer à assessoria jurídica do Conselho de Recursos Fiscais (CRF) (fls. 187-188), da lavra da Procuradora Sancha Maria F. C. R. Alencar, que em seu parecer registra que nenhum vício surge do processo capaz de torná-lo nulo. Além disso, pugna pela legalidade do lançamento e pelo desprovimento do Recurso Voluntário quanto às questões de mérito.

 

Este é o relatório.

 

                                                                                  VOTO

 

Trata-se de recurso voluntário, nos moldes do que dispõe o artigo 77, interposto contra decisão de primeira instância que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento n.º 93300008.09.0000523/2016-69 lavrado em 26/4/2016 (fl. 2-3) em desfavor da empresa ATACADÃO S.A., devidamente qualificada nos autos.

 

A)    DA NULIDADE

 

Em primeira análise, cabe observar que o lançamento fiscal observou, de forma rigorosa, as disposições do art. 142 do CTN, não importando qualquer pretensão de nulidade referente às hipóteses elencadas nos arts. 14, 16 e 17 da Lei nº 10.094/2013 (Lei do PAT), em conformidade com o que prescreve os referidos diplomas.

 

O duplo grau de jurisdição administrativo, como controle da legalidade que é, exerce essa função: a de resguardar estreita relação com esse princípio tão caro a ele, não sendo necessário, portanto, de acordo com as provas inseridas neste processo, não merecendo, assim, acolhida as considerações do contribuinte a respeito da nulidade.

 

Em primeira análise, o fato infringido está pontualmente delineado no auto de infração. No campo descrição da infração do auto de infração podemos ter em mente a clara ideia do ato antijurídico praticado pelo contribuinte: FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS NO LIVRO PRÓPRIO. Nada mais banal e inteligível.

 

Assim como também me parece clarividente as disposições normativas contidas no campo Infração Cometida/Diploma Legal – Dispositivos do libelo acusatório onde constam precisamente quais artigos do Decreto 18.930/97 foram infringidos, oferecendo ao contribuinte a completa descrição daquilo de que está sendo acusado, razão pela qual o argumento de cerceamento de defesa e ameaça aos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa jamais foram, nem de longe, feridos.

 

Dessa forma, diferentemente do que alegou o contribuinte, houve observância estreita ao devido processo legal. Desde o início da contenda, quando o contribuinte teve a oportunidade de protocolar sua reclamação contra o auto de infração na Gerência Executiva de Julgamento de Processos Fiscais, a primeira instância de análise da legalidade dos lançamentos de ofício.

 

Aliás, de olho no devido processo legal, a Lei 10.094/13, que regulamenta o processo administrativo tributário, estabeleceu o duplo grau de jurisdição, do qual se aproveitou o recorrente em toda sua extensão, sendo garantida a ele a observância, por parte da administração, do princípio.

 

Por todas essas razões, rechaço, desde já, qualquer insinuação a respeito de nulidade do processo. Aliás, reforçando a tese, vê-se que o contribuinte vem exercendo esse direito em todas as fases do processo, sendo-lhe garantido acesso mais do que amplo aos documentos instrutórios com base no qual fundamentou sua defesa em ambas as instâncias administrativas, jamais tendo sido cerceado qualquer direito impeditivo de se insurgir contra os termos da autuação.

 

B)    FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO DE MERCADORIAS/PRESTAÇÃO DE SERVIÇO NOS LIVROS PRÓPRIOS

 

Constata-se que o litígio administrativo versa sobre matéria bastante conhecida, e de tratativas recorrentes nesta Corte de Julgamento de Processos Administrativos Tributários, para aqueles que labutam no ramo do direito tributário no Estado da Paraíba, qual seja, lavratura de auto de infração por ocasião do cometimento do ilícito de não lançar, nos livros próprios, as notas fiscais de aquisição de mercadorias.

 

Assim, é bem sabido que o ato de não registrar nos livros próprios os documentos de aquisição de mercadorias, em regra, acarreta consequências que dizem respeito tanto à obrigação principal de recolher o ICMS quanto à obrigação acessória de efetuar o registro das notas fiscais no respectivo Livro Registro de Entradas e, como já dito, de tratativas recorrentes na corte administrativa de segundo grau.

 

Com relação ao mérito das questões aqui enfrentadas, pode-se dizer que a condição de contribuinte do ICMS no Estado da Paraíba impõe a todos enquadrados em tal circunstância uma série de obrigações, sejam de natureza principal, sejam de natureza acessória. Uma das quais é o efetivo e regular lançamento, nos livros próprios, das notas fiscais de aquisição de mercadorias no respectivo Livro Registro de Entradas.

 

Aliás, a escrituração do referido livro é de obrigatoriedade só excepcionada para específicos contribuintes que, em condição de hipossuficiência, situam-se em condição especial, o que para o denunciado não ocorre. Assim, persiste, para ele, a obrigatoriedade de escriturar o referido livro, nele devendo, obrigatoriamente, lançar todas as notas fiscais de compra de mercadoria – tributáveis ou não, além das de prestação de serviço que seja fato gerador do ICMS. É inteligência que se depreende do artigo 267 do RICMS:

 

Art. 267. Os contribuintes e demais pessoas obrigadas à inscrição deverão manter, em cada um dos estabelecimentos, os seguintes livros fiscais de conformidade com as operações que realizarem:

I - Registro de Entradas, modelo 1;

II - Registro de Entradas, modelo 1-A; (grifo nosso)

III - Registro de Saídas, modelo 2;

IV - Registro de Saídas, modelo 2-A;

V - Registro de Controle da Produção e do Estoque, modelo 3;

VI - Registro de Impressão de Documentos Fiscais, modelo 5;

VII - Registro de Utilização de Documentos Fiscais e Termos de

Ocorrências, modelo 6;

VIII - Registro de Inventário, modelo 7;

IX - Registro de Apuração do ICMS, modelo 9;

X - Livro de Movimentação de Combustíveis;

XI – Livro Caixa.

 

Ora, a obrigatoriedade de escrituração do Livro Registro de Entradas envolve outra obrigação: a de manter nele todos os registros de aquisição de mercadorias e de contratação de serviços de transporte e de comunicação com a qual o contribuinte transacione em referido período, de acordo com o que estabelece o artigo 276 do RICMS:

 

Art. 276. O Registro de Entradas, modelos 1 ou 1-A, Anexos 24 e 25, destina-se à escrituração do movimento de entradas de mercadorias, a qualquer título, no estabelecimento e de utilização de serviços de transporte e de comunicação. (grifo nosso)

 

Da parte grifada do texto extrai-se que a obrigatoriedade se estende a qualquer tipo de aquisição, não importando se a aquisição se destina à revenda, ativo fixo ou consumo. Pouco importa. Adquiriu mercadorias ou contratou serviços, nasce a obrigação de lançar no livro registro de entrada. Assim, se algumas aquisições realizadas pelo autuado não se destinam à revenda, nada mais irrelevante, a presunção de que trata o artigo 646, destacado adiante, prevalece.

 

Ocorre que, no âmbito da legislação em vigor, a falta de lançamento de notas fiscais de aquisição de mercadorias tem efeito muito mais abrangente do que apenas a responsabilização pelo descumprimento da obrigação acessória. De acordo com o que estabelece o referido artigo 646, do RICMS-PB:

 

Art. 646. Autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou a realização de prestações de serviços tributáveis sem o recolhimento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção:

I – o fato de a escrituração indicar:

a) insuficiência de caixa;

b) suprimentos a caixa ou a bancos, não comprovados;

II – a manutenção no passivo de obrigações já pagas ou inexistentes;

III – qualquer desembolso não registrado no Caixa;

IV – a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas;

V – declarações de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito.

Parágrafo único. A presunção de que cuida este artigo aplica-se, igualmente, a qualquer situação em que a soma dos desembolsos no exercício seja superior à receita do estabelecimento, levando-se em consideração os saldos inicial e final de caixa e bancos, bem como, a diferença tributável verificada no levantamento da Conta Mercadorias, quando do arbitramento do lucro bruto ou da comprovação de que houve saídas de mercadorias de estabelecimento industrial em valor inferior ao Custo dos Produtos Fabricados , quando da transferência ou venda, conforme o caso. (grifo nosso) (com redação vigente a partir de 23/06/2012)

 

Não é por menos que a indigitada presunção mereceu do legislador uma atenção especial, reforçando-a por disposição legal, mais especificamente no § 8º do artigo 2º da Lei 6.379/96:

 

Art. 3º O imposto incide sobre:

(...)

§ 8º O fato de a escrituração indicar insuficiência de caixa e bancos, suprimentos a caixa e bancos não comprovados ou a manutenção no passivo de obrigações já pagas ou inexistentes, bem como a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas ou de declarações de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito, autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou de prestações de serviços sem o recolhimento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção. (grifo nosso) (com redação a partir de 2011)

 

Há, portanto, efeitos que ultrapassam a mera consideração a respeito da falta de cumprimento de obrigação acessória. Impõe ao auditor a obrigação de lançar crédito tributário decorrente de omissão de saída pretérita de mercadorias tributáveis sempre que estiver diante da situação em que o contribuinte não lançar em sua escrita fiscal e contábil (se for o caso) notas fiscais de aquisição de mercadorias e de prestação de serviço de transporte e de comunicação.

 

E aqui se faça uma advertência a respeito das alegações do contribuinte de que o auto se baseia apenas em presunções. Isso não é verdade. O auto de infração se baseia num fato: o cometimento da omissão do contribuinte de não ter lançado, nos livros próprios, diversas notas fiscais de aquisição de mercadorias ou prestações de serviço. Esse é o fato e que, de acordo com a instrução processual, está mais do que provado, aos menos parcialmente.

 

Desse fato, nasce a presunção: omissão de saídas de mercadorias tributáveis pretéritas, já que devem ter ocorrido antes para que se pudesse fazer jus às despesas com a aquisição. Esclareça-se, dessa forma, para que não paire mais dúvidas no contribuinte que essa presunção nasce de dispositivos legais, mandamentais, regularmente constituídas pelo servidor fazendário e que são, portanto, absolutamente procedente.

 

Assim, é preciso esclarecer, como já delineado, de que ele está sendo acusado de omitir saídas tributáveis pretéritas em decorrência da constatação de que houve a falta de lançamento (registro fiscal ou contábil) de notas fiscais de aquisição nos livros próprios, a exemplo dos Livros Registro de Entradas, Livro Caixa etc.

 

Conforme demonstrado, portanto, a autuação diz respeito à obrigação principal, referente àquelas saídas pretéritas que foram omitidas com o fim de levantar recursos financeiros para suportar o ônus, financeiro, das aquisições realizadas. Essas estão demonstradas na relação de documentos fiscais acostada aos autos às fls. 4-6. Essa é a presunção que, do texto do artigo 646 do RICMS, já destacado, se deve ser feita. Dessa presunção, nasce efeitos que decorrem das disposições dos artigos 158, I e 160, I do RICMS-PB:

 

Art. 158. Os contribuintes, excetuados os produtores agropecuários, emitirão Nota Fiscal, modelos 1 ou 1-A, Anexos 15 e 16:

I - sempre que promoverem saída de mercadorias;

[...]

Art. 160. A nota fiscal será emitida:

I - antes de iniciada a saída das mercadorias;

[...]

 

E, em função dos devaneios jurídicos, se faça uma advertência adicional no entendimento do fim a que se presta a presunção autorizada pelo dispositivo em destaque: o que se cobra nesse caso não é o somatório das notas fiscais não lançadas. Não são as notas fiscais não lançadas, em si, o objeto da autuação. O que se tributa é o valor das saídas de mercadorias tributáveis omitidas em etapa anterior às aquisições e cujo resultado das operações serviu de esteio financeiro para o pagamento das compras cujas entradas não foram registradas. A presunção é de saídas pretéritas ao pagamento das referidas notas fiscais.

 

Assim, ao contrário do que alega o contribuinte, há provas inequívocas de uma relação jurídica/comercial entre dois contratantes. Que documento teria mais força probante que uma nota fiscal a emprestar a um acordo entre partes a natureza de uma relação comercial de compra e venda, e, portanto, materializando um negócio jurídico? Posso me antecipar e responder: NENHUM.

 

Vê-se, assim que, o fato de um suposto sinistro não pode se opor aos interesses da Fazenda, mais ainda quando nenhuma notícia sobre o encerramento de inquérito foi dada. Na verdade, o procedimento correto seria de cancelamento das operações, quando se sabe que o suposto sinistro ocorreu em fase de entrega das mercadorias, antes mesmo da chegada dos produtos ao estabelecimento do autuado.

 

Neste momento o que se discute é a ocorrência, ou não, do fato gerador do ICMS e se as provas acostadas aos autos são suficientes para dar sustentabilidade fática aos fundamentos em que se baseia o auto de infração. Nada mais. Por isso é que, mais do que em qualquer outra circunstância, o que se persegue no processo administrativo tributário é a observância estreita à verdade material.

 

E, no caso de documentos de aquisição não lançados nos livros próprios, a técnica é simplória. Basta que se acesse o sistema de tecnologia da informação desenvolvido pela Secretaria de Estado da Receita para que se consiga detectar a infração. De forma que caberia ao contribuinte o ônus de provar o contrário, o que, neste caso, só aconteceu parcialmente.

 

Em outro ponto, o contribuinte alega que a multa contida no artigo 82, V, “l” é de gravidade alta, recaindo sobre sua conduta um extrato de reprovação acima do razoável. Mas nisso não assiste qualquer razão ao recorrente. Primeiro que estabeleceu uma confusão conceitual porque errou ao descrever o dispositivo utilizado pelo auditor para a aplicação da penalidade.

 

Não foi o artigo 82, V, “l” e sim o artigo 82, V, “f”, da mesma Lei, a de n.º 6379/96. Esse dispositivo dispõe com clareza a penalidade aplicada, de 100%, quando se está diante de situação que se aplica “aos que deixarem de recolher o imposto proveniente de saída de mercadoria ou de prestação serviço, dissimulada por receita de origem não comprovada, inclusive, a representada por despesa realizada a descoberto de caixa, pela existência de passivo fictício ou por qualquer outra forma apurada através de levantamento da escrita contábil ou do livro Caixa quando o contribuinte não estiver obrigado à escrituração”.

 

E é certo também que ao contribuinte assistiria razão se do auto de infração soçobrassem circunstâncias plenas a ser objeto de interpretação. Mas não é o caso. Até porque, não há interpretação a ser feita. O auto de infração obedece todos os preceitos atinentes à constituição do crédito tributário devido, não se depreendendo qualquer vício capaz de maculá-lo de dúvidas.

 

Evidentemente que toda as presunções legais repousam sobre o manto da relativa natureza da aplicação, motivo pelo qual recai sobre os mandamentos da legislação tributária o ônus invertido de provar que a acusação não é consistente.

 

Dessa forma, cabe ao contribuinte a prova em contrário, seja por dispor de muito mais condições de fazê-lo, seja por ser o interessado com mais disposição sobre a documentação fiscal e contábil, reflexa do seu movimento diário de mercadorias, objeto de seu estatuto social; seja por gozar de presunção relativa, o lançamento tributário. Assim se posiciona o CRF em diversos julgados:

 

Recai sobre o contribuinte o encargo da prova negativa, quando o Fisco dispõe de documentos indicativos da aquisição, tais como, via da nota fiscal indicativa da operação. Com o documento fiscal o Fisco está provando a aquisição, acusando com prova documental, que, todavia, não é exaustiva, admitindo prova em contrário por parte do contribuinte, lastreada por documento. O denunciante retirou a acusação, relativa à diferença entre as saídas registradas e as declaradas para efeito do Imposto de Renda.

RECURSO DE OFÍCIO PARCIALMENTE PROVIDO

Processo nº CRF 217/98

Acórdão nº 4.410/98 - Decisão unânime de 01-07-1998

Relator: Cons. Moacir Tavares dos Santos.

 

Por esse motivo, provou o contribuinte que parte das notas fiscais emitidas em seu nome foi objeto de cancelamento e para as quais anexou notas fiscais de devolução, comprovando suas argumentações. Dessa forma, deve ser excluído crédito tributário no montante de R$ 36.198,08 (trinta e seis mil, cento e noventa e oito reais e oito centavos), em convergência com o que ficou demonstrado no julgamento de primeira instância (fls. 136-138).

 

Assim, diante do fato de a escrituração indicar a falta de lançamento de documentos fiscais nos livros próprios, é condição suficiente para que se autorize a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis. Esta é consideração que converge para vasta jurisprudência administrativa do Conselho de Recursos Fiscais, cujo exemplo será demonstrado, em decisão recente:

 

Acórdão 148/2018

 

FALTA DE LANÇAMENTOS DE NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS PRÓPRIOS. PRESUNÇÃO LEGAL DE OMISSÃO DE SAIDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS. INFRAÇÃO CARACTERIZADA EM PARTE. AFASTADA MULTA RECIDIVA. JULGAMENTO PARCIALMENTE PROCEDENTE. MANTIDA A DECISÃO RECORRIDA. RECURSO HIERÁRQUICO DESPROVIDO.

- Falta de lançamentos de notas fiscais de aquisição nos livros próprios caracteriza a presunção legal juris tantum de que houve omissões de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis, sem o pagamento do imposto devido. No presente caso, o contribuinte apresentou provas documentais que desconstituíram parte do feito acusatório.

- Afastada a aplicação de multa recidiva, em consonância com o art. 87, parágrafo único, da Lei nº 6.379/96.

 

Por isso mesmo que, em relação à multa de 100% do valor do imposto aplicada neste processo não pode se confundir com aquelas lançadas por ocasião de outro auto de infração, onde se cobra 5% sobre o valor das operações a título de multa pelo descumprimento acessório. Esta se refere à penalidade por omissão de saídas. Excluiu do conhecimento do Fisco estadual operações realizadas que são tributáveis pelo ICMS.

 

Por fim, as questões constitucionais não são objeto de análise das Cortes de Julgamento Administrativo, como já bem decidido pelo Conselho de Recursos Fiscais, em apreço à observância do que dispõe o artigo 55 e 72-A da Lei n. º 10.094/2013 e do parágrafo único do artigo 1º da Portaria n. º 075/2017:

 

Art. 55. Não se inclui na competência dos órgãos julgadores:

I - a declaração de inconstitucionalidade;

II - a aplicação de equidade.

 

Art. 72-A. No julgamento do processo administrativo tributário é vedado afastar a aplicação de lei sob alegação de inconstitucionalidade, ressalvadas as hipóteses em que a inconstitucionalidade tenha sido proclamada:

I - em ação direta de inconstitucionalidade;

II - por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal, em via incidental, desde que o Senado Federal tenha suspendido a execução do ato normativo.

 

Art. 1º O Conselho de Recursos Fiscais - CRF, a que se refere o art. 142 da Lei n° 10.094, de 27 de setembro de 2013, órgão vinculado à Secretaria de Estado da Receita - SER, a quem compete, em segunda instância administrativa, julgar os recursos interpostos contra decisões proferidas em processos administrativos tributários contenciosos ou de consultas, é o órgão colegiado da Justiça Fiscal Administrativa, com autonomia funcional, sede na Capital e alçada em todo território do Estado, representado, paritariamente, pelas entidades e pela Fazenda Estadual.

Parágrafo único. É vedado ao Conselho de Recursos Fiscais deixar de aplicar ato normativo, ainda que sob alegação de sua ilegalidade ou inconstitucionalidade.

 

 

Por todo o exposto,

 

V O T O - pelo recebimento do recurso voluntário, por regular e tempestivo, e, no mérito, pelo seu desprovimento, para manter a sentença prolatada na primeira instância, que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000523/2016-69, lavrado em 26/4/2016, em desfavor da empresa ATACADÃO S.A., inscrição estadual n° 16.159568-5, devidamente qualificada nos autos, impondo o ônus decorrente desta ação fiscal, condenando-a ao pagamento do crédito tributário no valor de R$ 45.362,46 (quarenta e cinco mil, trezentos e sessenta e dois reais e quarenta e seis centavos), sendo R$ 22.681,23 (vinte e dois mil, seiscentos e oitenta e um reais e vinte e três centavos), referentes ao ICMS, por infringência aos art. 158, I; art. 160, I; c/ fulcro no art. 646, todos do RICMS/PB, aprovado pelo decreto 18.930/97, e mais R$ 22.681,23 (vinte e dois mil, seiscentos e oitenta e um reais e vinte e três centavos), relativos à multa prevista no art. 82, V, “f” da Lei 6.379/96, alterada pela Lei 10.008/2013.

 

Ao tempo em que mantenho cancelado o crédito tributário no valor de R$ 36.198,08 (trinta e seis mil, cento e noventa e oito reais e oito centavos), sendo R$ 18.099,04 (dezoito mil e noventa e nove reais e quatro centavos), de ICMS, e mais R$ 18.099,04 (dezoito mil e noventa e nove reais e quatro centavos), de multa por infração, pelos motivos já expostos.

 

 

Primeira Câmara de Julgamentos, Sala das Sessões, Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em 15 de fevereiro de 2019.

 

                                                                                                                                    ANISIO DE CARVALHO COSTA NETO
                                                                                                                                                 Conselheiro Relator 

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