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ACÓRDÃO Nº. 212/2019

brasao paraiba
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA

PROCESSO Nº 1449252015-5
PRIMEIRA CÂMARA DE JULGAMENTO
Recorrente: SERGIO LUIZ MARTINIANO DE OLIVEIRA
Recorrida: GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS GEJUP
Repartição Preparadora: CENTRAL DE ATENDIMENTO AO CIDADÃO DA GERÊNCIA REGIONAL DA SEGUNDA REGIÃO DA SER - GUARABIRA
Autuante(s): JOSELINDA GONCALVES MACHADO
Relatora: CONS.ª MONICA OLIVEIRA COELHO DE LEMOS

OMISSÃO DE SAÍDAS TRIBUTÁVEIS. LEVANTAMENTO DA CONTA MERCADORIAS. TÉCNICA INAPTA PARA APURAÇÃO FISCAL. EMPRESA DO SIMPLES NACIONAL. REFORMADA DE OFÍCIO A DECISÃO DE PRIMEIRA INSTÂNCIA. RECURSO HIERÁRQUICO DESPROVIDO.

Examinando a técnica aplicada para a apuração do feito fiscal, temos que ela não é apta para apuração do crédito. Isto porque, não se pode exigir lucro bruto de 30% das empresas do SIMPLES NACIONAL em função da obrigatoriedade não constar de qualquer dispositivo da Lei 123/06, em observância ao princípio de que a lei específica prevalece sobre a geral.

Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...

 

 

A C O R D A M os membros da Primeira Câmara   de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, à maioria e de acordo com o voto da  relatora, pelo recebimento do recurso hierárquico, por regular, e, quanto ao mérito pelo seu desprovimento, para reformar de ofício a sentença exarada na instância monocrática, que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento n.º 93300008.09.00001894/2015-87 (fl. 3), lavrado em 20/10/2015, contra SÉRGIO LUIZ MARTINIANO DE OLIVEIRA, contribuinte inscrito no CCICMS sob nº 16.142.880-0, devidamente qualificado nos autos, declarando nulo por vício material o presente feito fiscal, eximindo-a de quaisquer ônus decorrentes deste procedimento.


P.R.I

 

Primeira Câmara de Julgamento, Sala das Sessões Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em 30 de abril   de 2019.



                                                              MONICA OLIVEIRA COELHO DE LEMOS
                                                                          Conselheira Relatora



                                                          GIANNI CUNHA DA SILVEIRA CAVALCANTE
                                                                                    Presidente



Participaram do presente julgamento os membros da Primeira Câmara de Julgamento, THAÍS GUIMARÃES TEIXEIRA, ANÍSIO DE CARVALHO COSTA NETO e GILVIA DANTAS MACEDO



                                       SANCHA MARIA FORMIGA CAVALCANTE E RODOVALHO DE ALENCAR
                                                                               Assessora Jurídica

Trata-se de recurso hierárquico interposto perante este egrégio Conselho de Recursos Fiscais, com fundamento no art. 80 da Lei nº 10.094/2013, contra a decisão monocrática que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00001894/2015-87, lavrado em 20/10/2015, segundo o qual, a empresa, SÉRGIO LUIZ MARTINIANO DE OLIVEIRA, é acusada da irregularidade que adiante transcrevo:

 

OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – CONTA MERCADORIAS >> Contrariando dispositivos legais, o contribuinte omitiu saídas de mercadorias tributáveis, resultando na falta de recolhimento do ICMS. Irregularidade esta detectada através de levantamento da Conta Mercadorias.

 

Por considerar infringidos os arts. 158, I, e 160, I, c/c os arts. 643, § 4º, II, e 646, todos do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto nº 18.930/97, o autuante procedeu ao lançamento de ofício, exigindo o crédito tributário no valor total de R$ 207.451,82 (duzentos e sete mil, quatrocentos e cinquenta e um reais e oitenta e dois centavos), sendo R$103.725,91 (cento e três mil, setecentos e vinte e cinco reais e noventa e um centavos) a título de ICMS e igual valor por aplicação da penalidade pecuniária, nos termos dos arts. 82, V, “a” da Lei nº 6.379/96.

 

Documentos instrutórios constam nas fls. 3/35.

 

Cientificada pessoalmente do resultado da ação fiscal, a autuada apresentou reclamação tempestiva, por meio da qual alegou que:

 

- Havia sido autuada com base no exame das GIM´s e extratos do Simples Nacional, anexados aos autos;

- Não recebeu a relação das Notas Fiscais não lançadas, nem a chave de acesso para conferência, o que teria dificultado a sua defesa;

- A multa tem caráter confiscatório;

- O Auto de infração foi lavrado de forma sem a devida clareza, dificultando a ampla defesa;

- Por fim, pede a improcedência do Auto em análise.

 

Junta documentos às fls. 38/104.

 

Após a prestação de informação sobre a inexistência de antecedentes fiscais da autuada (fl. 105), os autos foram conclusos e remetidos à GEJUP, onde foram distribuídos a julgadora fiscal, Rosely Tavares de Arruda, que decidiu pela parcial procedência do auto de infração, acolhendo os documentos apresentados pelo contribuinte e ajustando os valores do crédito fiscal.

 

Interposto o recurso hierárquico e cientificada da decisão monocrática em 18/9/2015 (fl. 76), a autuada permaneceu inerte.

 

Aportados os autos nesta Corte Julgadora, estes foram distribuídos a esta relatoria, segundo critério regimentalmente previsto, para o fim de apreciação e julgamento da matéria de que dispõem.

 

Está relatado.

 

 

                               VOTO

               

 

Em exame, acusações sobre a prática irregular de omissão de saídas tributáveis detectadas mediante Levantamento da Conta Mercadorias, correspondente ao exercício de 2010 e 2011 em empresa inserida no Regime Simples Nacional.

 

 

 

Em princípio, cabe observar que o lançamento fiscal observou, de forma rigorosa, as disposições do art. 142 do CTN, não importando qualquer pretensão de nulidade elencados nos arts. 14, 16 e 17, da Lei nº 10.094/2013 (Lei do PAT), em conformidade com o que segue:

 

CTN.

Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.

Lei do PAT.

Art. 14. São nulos:

I - os atos e termos lavrados por pessoa incompetente;

II - os despachos e decisões proferidas por autoridade incompetente;

III - os lançamentos cujos elementos sejam insuficientes para determinar a matéria objeto da exigência tributária e o respectivo sujeito passivo, ressalvada, quanto à identificação deste, a hipótese de bens considerados abandonados;

IV - os despachos e as intimações que não contenham os elementos essenciais ao cumprimento de suas finalidades;

V - os autos de infração de estabelecimentos lavrados pelos auditores fiscais tributários estaduais de mercadorias em trânsito.

 

Art. 16. Os lançamentos que contiverem vício de forma devem ser considerados nulos, de ofício, pelos Órgãos Julgadores, observado o disposto no art. 15 desta Lei.

 

Art. 17. Está incluído na hipótese prevista no art. 16 desta Lei, o Auto de Infração lavrado em desacordo com os requisitos obrigatórios estabelecidos no art. 142 do Código Tributário Nacional, quanto:

I - à identificação do sujeito passivo;

II - à descrição dos fatos;

III - à norma legal infringida;

IV - ao nome, ao cargo, ao número de matrícula e à assinatura do autor do feito; 
V - ao local, à data e à hora da lavratura;

VI - à intimação para o sujeito passivo pagar, à vista ou parceladamente, ou impugnar a exigência, no prazo de 30 (trinta) dias, contado a partir da data da ciência do lançamento.

 

A)    DA INAPLICABILIDADE DO ARTIGO 643, § 4º, II do RICMS ÀS EMPRESAS DO SIMPLES NACIONAL

 

Inicialmente, necessário tecer alguns comentários a respeito da referida técnica contábil. É de notável e largo conhecimento entre os que labutam nos ramos do direito tributário e da contabilidade a referida conta mercadoria, que é técnica de fiscalização que se presta a verificar se o contribuinte de fato atende à legislação do ICMS em vigor, mais especificamente, se apurou lucro bruto com mercadorias tributáveis em percentual mínimo de 30%, caso em que, não ocorrendo, vai refletir na falta de recolhimento do ICMS e na constatação de omissão presumida de saídas de mercadorias tributáveis.

 

Claro está, contudo, que a referida técnica exclui até a entrada em vigor da Lei n.º 123/06, que institui o Estatuto Nacional da Microempresa e Empresa de Pequeno Porte, as empresas que declaram seus resultados com base no lucro real, aplicando-se, assim, apenas àquelas que apuram seus resultados com base no lucro presumido, conforme já largamente conhecido dos operadores do Direito.

 

O procedimento é técnica de fiscalização simplória, a vislumbrar, para os casos em que a legislação a prevê, omissão de saídas tributáveis – por presunção - decorrente da aplicação do disposto no artigo 646, e em consonância com o que estabelece o inciso II, do parágrafo 4º do artigo 643, que obriga o contribuinte que apura o resultado com base no lucro presumido a superávit nunca inferior a 30%, in verbis:

 

Art. 643. No interesse da Fazenda Estadual, será procedido exame nas escritas fiscal e contábil das pessoas sujeitas à fiscalização, especialmente no que tange à exatidão dos lançamentos e recolhimento do imposto, consoante as operações de cada exercício.

[...]

§ 4º Para efeito de aferição da regularidade das operações quanto ao recolhimento do imposto, deverão ser utilizados, onde couber, os procedimentos abaixo, dentre outros, cujas repercussões são acolhidas por este Regulamento:

[...]

II - o levantamento da Conta Mercadorias, caso em que o montante das vendas deverá ser equivalente ao custo das mercadorias vendidas (CMV) acrescido de valor nunca inferior a 30% (trinta por cento) para qualquer tipo de atividade, observado o disposto no inciso III do parágrafo único do art. 24.

 

Assim, a aplicação do dispositivo destacado em combinação com o que preceitua o artigo 646, faz alvorecer a presunção de omissão de saídas em decorrência da não observância do percentual mínimo de lucro bruto imposto na legislação do ICMS em vigor no estado:

 

Art. 646. Autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou a realização de prestações de serviços tributáveis sem o recolhimento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção:

I – o fato de a escrituração indicar:

a) insuficiência de caixa;

b) suprimentos a caixa ou a bancos, não comprovados;

II – a manutenção no passivo de obrigações já pagas ou inexistentes;

III – qualquer desembolso não registrado no Caixa;

IV – a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas;

V – declarações de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito.

Parágrafo único. A presunção de que cuida este artigo aplica-se, igualmente, a qualquer situação em que a soma dos desembolsos no exercício seja superior à receita do estabelecimento, levando-se em consideração os saldos inicial e final de caixa e bancos, bem como, a diferença tributável verificada no levantamento da Conta Mercadorias, quando do arbitramento do lucro bruto ou da comprovação de que houve saídas de mercadorias de estabelecimento industrial em valor inferior ao Custo dos Produtos Fabricados , quando da transferência ou venda, conforme o caso. (destaque nosso)

 

É uma posição que se sustenta em vastos julgados do Conselho de Recursos Fiscais, a exemplo do Acórdão n. º 684/2018, exarado por esta corte de julgamento colegiado em 27/12/2018:

 

FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS. OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS. CONTA MERCADORIAS. LEVANTAMENTO FINANCEIRO. SIMPLES NACIONAL. MANTIDA A DECISÃO RECORRIDA. AUTO DE INFRAÇÃO PROCEDENTE. RECURSO VOLUNTÁRIO DESPROVIDO.

As diferenças apuradas em Conta Mercadorias e Levantamento Financeiro denunciam omissão de saídas tributáveis sem o pagamento do imposto, conforme presunção contida na legislação de regência.

 

Ressalte-se, neste caso, a ressalva da parte final do caput do artigo 646, que coloca à disposição do contribuinte, de forma categórica e explícita, a prova da improcedência da acusação, que, em consonância com o princípio à ampla defesa e ao contraditório, foi oportunidade aproveitada pelo contribuinte, que alegou tudo aquilo que quis.

 

Ocorre que, no plano do direito, são as alegações que emprestam força ao debate que se estabelece no litígio, mas no plano dos fatos, as provas são elementos incontestáveis a emprestar força às considerações feitas ao longo do processo que se desenrola, de forma litigiosa, no âmbito da querela administrativa.

 

Em que pese não ter havido qualquer questionamento por parte do contribuinte sobre a aplicação da técnica de apuração do feito fiscal, insta rememorar nestes autos a ampla discussão em torno deste assunto.

 

Após discussão em colegiado, esta relatoria passou a entender que a Técnica Conta Mercadoria aplicada no caso concreto, qual seja, empresas inseridas no Regime do Simples Nacional, com o dever de apresentar lucro bruto de 30%, não teria o condão de apurar de forma adequada crédito tributário a ponto de lavrar Auto de infração, com consequências, inclusive, de ordem criminal.

 

E, ainda em relação à inaplicabilidade da técnica fiscal, deve-se chamar atenção para um fato bastante relevante: que estamos diante de antinomia que coloca frente a frente uma Lei Complementar de aplicação em todo o território brasileiro (Lei 123/06) com um decreto estadual que vigora apenas no território paraibano (Decreto 18.930/97). Ou seja, diante da antinomia, ao sopesar a prevalência das Normas, temos que, quer seja pelo critério cronológico, pelo critério hierárquico ou pelo critério da especificidade, em qualquer destes, a aplicabilidade da Lei 123/06 se sobressairia.

 

Assim, não parece razoável a exigência, muito mais ainda a cobrança de tributo através do referido levantamento. E, malgrado a primariedade do referido levantamento, entendo que, somente para aqueles contribuintes, cuja desídia sobre os seus negócios exsurge pela resistência em apurar seus resultados pelo lucro real, possa se aplicar os paradigmas do referido artigo 643.

 

Assim, sendo a Técnica inapropriada, por conseguinte, não há que se falar em prosseguimento do julgamento do auto, não havendo espaço sequer para iniciar a análise do mérito, visto que, desde seu nascedouro já padece de vício material.

 

 

Por essas razões,

 

 

VOTO pelo recebimento do recurso hierárquico, por regular, e, quanto ao mérito pelo seu desprovimento, para reformar de ofício a sentença exarada na instância monocrática, que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento n.º 93300008.09.00001894/2015-87 (fl. 3), lavrado em 20/10/2015, contra SÉRGIO LUIZ MARTINIANO DE OLIVEIRA, contribuinte inscrito no CCICMS sob nº 16.142.880-0, devidamente qualificado nos autos, declarando nulo por vício material o presente feito fiscal, eximindo-a de quaisquer ônus decorrentes deste procedimento.

 

Intimações necessárias, na forma regulamentar.

 

 

Primeira Câmara de Julgamento, Sala das Sessões, Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em 24 de abril de 2019.

 

                                                                                                                                       MÔNICA OLIVEIRA COELHO DE LEMOS 
                                                                                                                                                      Conselheira Relatora

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