ACÓRDÃO Nº. 243/2019
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA
PROCESSO Nº 0167912016-6
PRIMEIRA CÂMARA DE JULGAMENTO
Recorrente: NORFIL S/A INDUSTRIA TEXTIL
Recorrida: GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS - GEJUP.
Repartição Preparadora: CENTRAL DE ATENDIMENTO AO CIDADÃO DA GERÊNCIA REGIONAL DA PRIMEIRA REGIÃO DA SER JOÃO PESSOA
Autuante(s): ACILINO ALBERTO MADEIRA NETO
Relatora: CONS.ª GILVIA DANTAS MACEDO
PRELIMINAR DE NULIDADE REJEITADA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO À DEFESA. FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS - DIFERENCIAL DE ALÍQUOTA. MERCADORIA DESTINADA AO ATIVO FIXO NÃO RELACIONADA AO PROCESSO PRODUTIVO. MANTIDA A DECISÃO RECORRIDA. AUTO DE INFRAÇÃO PROCEDENTE. RECURSO VOLUNTÁRIO DESPROVIDO.
Preliminar de nulidade - alegação de cerceamento de defesa não acolhida. Aplicação do princípio do pas de nullité sans grief. Ausência de comprovação do prejuízo. Confirmada a regularidade formal da denúncia.
Reputa-se devido o recolhimento do ICMS - Diferencial de Alíquota, em operações sobre as entradas de produtos destinados ao ativo fixo do estabelecimento.
Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...
A C O R D A M os membros da Primeira Câmara de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, à maioria e de acordo com o voto da relatora, pelo recebimento do recurso voluntário, por regular e tempestivo, e quanto ao mérito, pelo seu desprovimento, para manter a sentença exarada na instância monocrática que julgou procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000104/2016-27, lavrado em 15/2/2016, contra a empresa NORFIL S.A. INDÚSTRIA TÊXTIL, CCICMS n° 16.119.358-7, qualificada nos autos, declarando como devido o crédito tributário no valor de R$ 68.942,63 (sessenta e oito mil, novecentos e quarenta e dois reais e sessenta e três centavos), sendo R$ 45.961,75 (quarenta e cinco mil, novecentos e sessenta e um reais e setenta e cinco centavos) de ICMS, por infringência ao art. 106 do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto 18.930/96, e R$ 22.980,88 (vinte e dois mil, novecentos e oitenta reais e oitenta e oito centavos) de multa por infração, com fundamento legal no art. 82, II, e”, da Lei n.º 6.379/96.
P.R.I
Primeira Câmara de Julgamento, Sala das Sessões Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em 10 de maio de 2019.
GILVIA DANTAS MACEDO
Conselheira Relatora
GIANNI CUNHA DA SILVEIRA CAVALCANTE
Presidente
Participaram do presente julgamento os membros da Primeira Câmara de Julgamento, MONICA OLIVEIRA COELHO DE LEMOS, ANÍSIO DE CARVALHO COSTA NETO e THAÍS GUIMARÃES TEIXEIRA.
SANCHA MARIA FORMIGA CAVALCANTE E RODOVALHO DE ALENCAR
Assessora Jurídica
Relatório
Trata-se de recurso voluntário contra decisão de primeira instância, que julgou procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000104/2016-27, lavrado em 15/2/2016, contra a empresa NORFIL S.A. INDÚSTRIA TÊXTIL, CCICMS n° 16.119.358-7, em razão da seguinte irregularidade:
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS >> Falta de recolhimento do imposto estadual.
Nota Explicativa: Autuação por falta de recolhimento do ICMS FATURA/DAR nº 3007254424 (1108), 3007398537 (1120) e 3007520362 (1108).
Assim, constituiu-se o crédito tributário na quantia de R$ 68.942,63 (sessenta e oito mil, novecentos e quarenta e dois reais e sessenta e três centavos), sendo R$ 45.961,75 (quarenta e cinco mil, novecentos e sessenta e um reais e setenta e cinco centavos) de ICMS, dada a infringência ao artigo 106 do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto 18.930/96, e R$ 22.980,88 (vinte e dois mil, novecentos e oitenta reais e oitenta e oito centavos) de multa por infração, arrimada no art. 82, II, e”, da Lei n.º 6.379/96.
Documentos instrutórios, às fls. 3/35.
Depois de pessoalmente cientificada, em 16/2/2016, a autuada ingressou com peça reclamatória tempestiva (fls. 38/54), por meio da qual arguiu a nulidade da infração de falta de recolhimento de ICMS, descrita de forma genérica, com a identificação do artigo 106 como infringido, sem especificar o inciso nem a alínea do referido dispositivo legal, acarretando, assim, cerceamento ao seu direito de defesa.
Com informação de inexistência de antecedentes fiscais (fl. 55), que acarretem a aplicação de multa recidiva, foram os autos conclusos à instância prima (fl. 56), ocasião em que a julgadora singular – Eliane Vieira Barreto Costa – em sua decisão, manifestou-se pela procedência da denúncia, conforme ementa abaixo transcrita:
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS. DIFERENCIAL DE ALÍQUOTA – AQUISIÇÃO INTERESTADUAL DE BENS DESTINADOS AO USO E/OU CONSUMO E ATIVO FIXO DE ESTABELECIMENTO INDUSTRIAL – PRELIMINAR DE NULIDADE REJEITADA – DENÚNCIA COMPROVADA.
- O ICMS Diferencial de Alíquotas incide sobre as aquisições de materiais que não se integram ao produto final na qualidade de insumos, haja vista serem destinados ao uso e/ou consumo da empresa, bem como a aquisição de bens que não correspondam a máquinas, aparelhos e equipamentos destinados a integrar o ativo fixo do estabelecimento e que estejam relacionados com o processo produtivo faz surgir à obrigatoriedade do recolhimento do ICMS – Diferencial de Alíquotas.
- Não acolhimento de preliminar arguida de nulidade diante da existência do Parecer nº 2014.01.05.00126 da Consulta Fiscal formulada pela Autuada a Gerência de Tributação desta secretaria, bem como a mesma não satisfeita com a decisão, impetrou recurso voluntário ao Conselho de Recursos Fiscais que manteve p entendimento emitido pela Gerência Executiva de Tributação no Parecer nº 2014.01.05.00126, a respeito da interpretação e aplicação da legislação tributária estadual relativamente ao diferimento do ICMS – Diferencial de Alíquotas incidente sobre as aquisições das mercadorias, cujas notas fiscais estão dispostas nas Faturas nº 3007520362, 3007398537 e 3007254424, objeto do presente Auto de Infração, motivo pelo qual entendo não ocorrer cerceamento à ampla defesa e ao contraditório.
Cientificado da sentença singular por meio de AR, cuja ciência resta comprovada à fl. 75, em 14/8/2018, a autuada protocolou Recurso Voluntário (fls. 77/86) e anexos (fls. 88/89), perante este Colegiado, em 15/9/2018, buscando a reforma da decisão monocrática, reitera o argumento de nulidade, levantado na instância prima, da infração de falta de recolhimento de ICMS pela ausência de descrição de forma genérica, apontando apenas o caput do artigo 106, que se refere à falta de recolhimento do imposto, impossibilitando uma defesa viável e inteligente, na medida em que não se indica a razão para a falta de recolhimento, a alíquota interestadual, a ocorrência de importação e a existência de diferimento na operação.
Argui o direito de creditamento do valor exigido no presente auto de infração, além daquele referente ao diferencial de alíquota pago antecipadamente, constante das faturas, objeto da autuação.
Defende que o auto de infração não considerou o pedido para abater do valor total da cobrança aquele referente ao diferencial de alíquota pago antecipadamente, R$ 9.667,33, bem como o da multa que incide sobre tal importância.
Questiona o lançamento realizado pela fiscalização que incluiu bens do ativo fixo empregado no processo produtivo da empresa de mesma natureza e destinação daqueles que decidiu não “taxar”. Assim, a incoerência precisa ser sanada pelo presente órgão julgador.
Por fim, suscita no caso de entendimento pela procedência da exigência fiscal pela correção do valor denunciado e conceda o direito ao crédito de todo o valor do ICMS.
Remetidos os autos a esta casa, estes foram a distribuídos a esta relatoria, conforme critério regimental, para apreciação e julgamento.
Eis o relatório.
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Em exame recurso voluntário interposto pela autuada contra a decisão monocrática que julgou procedente o auto de infração de estabelecimento, exigindo o crédito tributário acima descrito em razão da infração apurada, durante o exercício de 2014.
Quanto ao requisito de tempestividade, faz-se necessário declarar que o recurso da autuada foi interposto no prazo previsto no art. 77 da Lei n° 10.094/2013.
Antes de passarmos à análise do mérito, necessário se faz discorrermos acerca da preliminar de nulidade arguida pela defesa.
Inicialmente, cumpre-me declarar que a peça acusatória apresenta-se apta a produzir os regulares efeitos inerentes ao aspecto formal do ato administrativo, visto que sua confecção observa os requisitos indispensáveis de constituição e desenvolvimento válido do processo: identificação das operações promovidas, base de cálculo, sujeito passivo e período do fato gerador (exercício fiscal), o que atende aos requisitos de validade do lançamento de ofício, dispostos no art. 142 do CTN.
Observa-se, portanto, que os requisitos obrigatórios do auto de infração disciplinados no artigo 41 da Lei nº 10.094/13[1] foram atendidos quando da sua lavratura.
Ademais, a autuada compreendeu a acusação fiscal, o que se verifica pelas peças de defesa apresentadas, impugnação e recurso voluntário, abordando todos os aspectos relacionados com os fatos objeto do lançamento.
Da análise dos autos, vislumbra-se que as peças acostadas pelo auditor para embasarem a denúncia conferem à empresa condições amplas para exercer, em sua plenitude, o seu direito de defesa. Todos os elementos necessários: identificação das faturas nº 3007254424, 3007398537 e 3007520362, constando, inclusive, os números das notas fiscais; o Parecer nº 2014.01.05.00126 da consulta fiscal formulada pela autuada à Gerência Executiva de Tributação; o Acórdão nº 346/2014, exarado por esta Corte; e, por fim, as alterações promovidas na fatura nº 3007520362, estão acostados ao libelo, possibilitando, à autuada, o necessário para consultar todos os documentos fiscais e, com isso, exercer o seu direito de defesa de forma integral.
É de surpreender a alegação de nulidade do lançamento de ofício por cerceamento de defesa, justo porque são de clareza meridiana que todos os elementos inseridos no auto de infração, conforme acima exposto, estão presentes e prontos a fornecer à acusada todas as condições para o exercício pleno da ampla defesa e do contraditório, de forma que é de se estranhar a alegação em contrário feita pela acusada. Não devendo prosperar, desta feita.
Vale lembrar que um ato administrativo só poderá ser anulado quando ilegal ou ilegítimo. O libelo acusatório trouxe devidamente a indicação da pessoa do infrator, a natureza da infração, não existindo incorreções capazes de provocar a nulidade, a autuação, conforme se aduz do artigo 41 da Lei nº 10.094, de 27 de setembro de 2013.
Verificamos, portanto, que não há que se falar em nulidade do auto de infração pela descrição genérica da infração, ou ainda, pela ausência do inciso ou alínea do dispositivo infringido, no caso o art. 106 do RICMS/PB.
Neste quesito, inclino-me a corroborar a decisão da instância prima, que se manifestou favorável à manutenção da acusação em tela, porquanto não ter verificado a existência de aspectos prejudiciais ao direito de defesa da autuada, em decorrência da descrição lacunosa do teor acusatório.
Outrossim, tal entendimento encontra âncora em parecer proferido pela Assessoria Jurídica desta Casa, na pessoa da Procuradora Dra. Sancha Maria Formiga C. e Rodovalho de Alencar, representante da Procuradoria da Fazenda Estadual, pelo que se pronunciou a respeito de matéria de similar natureza no processo n° 090.695.2012-5, que continha narrativa de infração formulada de forma genérica, contudo inexistia nos autos descrição do teor narrativo, além do estado de revelia da parte autuada, conforme Parecer nº 01/2014, abaixo transcrito:
ASSESSORIA JURÍDICA
PARECER Nº 01/2014
Processo n° 090.695.2012-5
RECORRENTE |
Gerência Executiva de Julg. De Processos Fiscais - GEJUP |
RECORRIDA |
Indústria e Comércio de Laticínio Dirce Ltda. |
REPARTIÇÃO |
Coletoria Estadual de Sousa |
AUTUANTE |
Wanderlino Vieira Filho |
RELATOR(a) |
Consª. Patrícia Márcia de Arruda Barbosa |
EMENTA: FALTA DE RECOLHIMENTO DE ICMS - IMPRECISÃO NA NATUREZA DA INFRAÇÃO – REVELIA DA PARTE AUTUADA – DECLARAÇÃO DE NULIDADE – INAPLICABILIDADE DO ART. 15 DO NOVO PAT (LEI Nº 10.094/2013).
Trata-se de diligência requerida pelo Conselho de Recursos Fiscais, quando do julgamento do Recurso Hierárquico do Processo nº 629/2013, após decisão monocrática proferida pela Gerência Executiva de Julgamento de Processos Fiscais – GEJUP, que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00001668/2012-53, lavrado em 07 de agosto de 2012 contra a Indústria e Comércio de Laticínio Dirce Ltda., condenando-a ao recolhimento da quantia total de R$ 164.248,22 (cento e sessenta e quatro mil, duzentos e quarenta e oito reais e vinte e dois centavos), referente à multa por infração e ao ICMS. Ao mesmo tempo foi cancelado o crédito tributário no valor de R$ 85.799,25 (oitenta e cinco mil, setecentos e noventa e nove reais e vinte e cinco centavos), onde R$ 1.827,57 de ICMS e R$ 83.951,68 de multa. Assim ementado:
''REVELIA – FALTA DE LANÇAMENTO DE N.F. DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS PRÓPRIOS – REDUÇÃO DO PERCENTUAL DA MULTA APLICADO – FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS – IMPRECISÃO NA NATUREZA DA INFRAÇÃO.
Quem se mantém em estado de revelia, assume o ônus da acusação que lhe é imposta. Todavia, a Lei nº 10.008/2013, que alterou o percentual da multa aplicado e a imprecisão na natureza da infração acarretam a sucumbência parcial do crédito.''
Para melhor entendimento do caso, passamos a responder o questionamento das páginas 560/561, item por item:
1 – No que tange à primeira pergunta, se a narrativa (''falta de recolhimento de ICMS'') e a capitulação (art. 106 do RICMS PB) no Auto de Infração atendem aos artigos 40 e 41, V, da Lei 10.094/2013, entendemos que a referida tipificação não atendeu os requisitos legais, pois os documentos constantes nos autos, nitidamente o auto de infração, não trazem com clareza o fato gerador do ICMS.
Assim, resta evidenciado que não foi cumprido o disciplinamento dos artigos referidos, pois se tipificou de forma genérica a infração no auto, não trazendo com objetividade em qual inciso estaria tipificada a infração, em desacordo com o princípio da estrita legalidade, da tipicidade cerrada do direito tributário, ferindo, desta forma, os princípios constitucionais da ampla defesa e o contraditório (Art. 5º, LV, da CRFB-88).
Art. 40. O Auto de Infração tem por fim exigir o crédito tributário, determinar a pessoa do autuado, a infração verificada, o respectivo valor e propor as penalidades cabíveis, inclusive as recidivas, quando for o caso.
§ 1º A Representação Fiscal terá como objeto qualquer das seguintes hipóteses:
I - o imposto declarado e não recolhido;
II - o imposto lançado e apurado em livro próprio, não declarado e não recolhido, no todo ou em parte;
III - o saldo de parcelamento decorrente de denúncia espontânea;
IV - a omissão da entrega de documentos de controle e informações fiscais.
§ 2º Entende-se como imposto declarado e não recolhido aquele sujeito ao lançamento por homologação, não recolhido, total ou parcialmente, no prazo estabelecido, mas declarado pelo contribuinte:
I - por escrituração fiscal eletrônica;
II - em guias de informação e apuração.
§ 3º O registro do imposto em livros fiscais importa a confissão de dívida, ressalvada a hipótese de retificação, quando houver, na forma prevista em legislação específica.
Art. 41. São requisitos do Auto de Infração e da Representação Fiscal:
[...]
V - a descrição da falta com o respectivo montante tributável;
Ora, segundo os artigos acima referidos, para que a tipificação constante no Auto de Infração seja válida, esta tem de coadunar com os fatos narrados e ser expressa de forma clara e específica, sendo inadmissíveis tipificações genéricas, imprecisas, que possam impedir a defesa do contribuinte, bem como que não tragam com clareza e objetividade o motivo real da exação fiscal.
Observe-se, ainda, que o art. 106 traz diversas hipóteses referentes ao recolhimento direto do ICMS de responsabilidade direta do contribuinte.
Assim, a mera descrição do caput do art. 106 do RICMS não especifica em qual das diversas hipóteses constantes neste estaria tipificado o autuado, sendo, portanto, genérico, e, desta forma, impossibilitando a ampla defesa do autuado.
Neste sentido são esclarecedores os comentários de Ana Paulo Dourado sobre a tipicidade, pois, entende que esta “estaria assegurada se a incidência do imposto e os fundamentos para o cálculo do montante de imposto a pagar ou base tributária e taxa de imposto constassem, em regra, da lei (DOURADO, 2007).”
Segundo o princípio da tipicidade fechada (ou cerrada) no direito tributário, a lei não pode definir genericamente os aspectos típicos do tributo, de forma que se possa tentar dar uma interpretação extensiva e diferenciada, tentando adaptar o fato descrito ao caso concreto, pois esta prerrogativa dada ao administrador, ao magistrado, ou intérprete, seria uma forma de burlar a lei e gerar uma insegurança jurídica.
Assim, a infração tem de ser descrita de forma precisa, taxativa, para que não permita dúvidas ou interpretações ampliativas.
Nos moldes do Auto de Infração, que menciona unicamente a violação ao art. 106 do RICMS, dificulta a defesa do autuado, posto que não se pode exigir que alguém se defenda de maneira adequada em face da multiplicidade de supostas infrações que poderiam ocorrer com o menção genérica em uma só capitulação legal - “falta de recolhimento de ICMS”. É clara a afronta ao princípio constitucional do devido processo legal e da ampla defesa o que, por conseguinte, gera condição inócua à pretensão fiscal almejada, devendo ser sanado tal vício formal.
2 – Em relação ao segundo questionamento, como já respondido no item acima, entendemos que a tipificação constante no AI referido não atendeu aos princípios da tipicidade cerrada, da segurança jurídica, da ampla defesa e do contraditório, tendo em vista que no lançamento tributário em questão a narrativa fora realizada de forma abstrata e imprecisa, impossibilitando o autuado de identificar sobre o que está sendo acusado.
3 – Quanto à terceira indagação, também entendemos que não há clareza acerca da natureza da infração cometida, posto que o art. 106 do RICMS, tido como violado, por “falta de recolhimento de ICMS”, traz diversas hipóteses referentes à necessidade de recolhimento direto do ICMS pelo contribuinte, e, sem que haja a menção ao inciso e à alínea correlatos, não se tem clareza quanto à tipificação.
Para justificar a não nulidade do auto de infração na hipótese acima mencionada, temos que uma defesa escrita que discorre e rebate as imputações que lhe são dirigidas de modo pleno e eficaz, só poderia fazê-lo caso compreendesse as infrações que rebateu. Assim, onde residiria o cerceamento à ampla defesa de quem magistralmente se defendeu e a impossibilidade de contraditório de quem soube contraditar?
Além do mais, se o próprio contribuinte apresentou sua defesa, rebatendo a infração, fazendo juntada de documentos/provas de seu direito, sem alegar nenhum prejuízo, restaria precluso seu direito de arguir nulidade por “infração descrita de forma genérica ou imprecisa”, já que teria demonstrado que os demais documentos dos autos, eventual diligência realizada, teriam possibilitado o conhecimento pormenorizado da tipificação imposta, possibilitando, assim, o seu exercício amplo de defesa.
Vejamos que o seguinte julgado apenas admite a nulidade do auto de infração por “descrição imperfeita” quando acarretar perceptível prejuízo ao direito de defesa do contribuinte, o que não ocorrerá caso este mesmo tenha se defendido quanto ao mérito da acusação, sem fazer qualquer ressalva:
"PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL - Nulidade do Auto de Infração. A imperfeita descrição dos fatos, aliados a falta de menção dos dispositivos legais infringidos, quando acarreta perceptível prejuízo ao direito de defesa ao contribuinte, enseja a nulidade do auto de infração".(Ac. n.º 101-79.775/90-Revista de Estudos Tributário 2º Semestre de 1999).
Registre-se, conforme entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça, o princípio da “pas de nullité sans grief”, que exige a respectiva comprovação do prejuízo para que seja declarada nulidade do processo, aplica-se também à esfera administrativa, como se observa:
PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. ADMINISTRATIVO. VIOLAÇÃO AO CDC. APLICAÇÃO DE PENALIDADES. AUTO DE INFRAÇÃO. NÃO OBSERVÂNCIA DE FORMALIDADE. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. INVIABILIDADE, EM SEDE DE MANDADO DE SEGURANÇA, DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. PRECEDENTE: RMS 21.520/RN.
1. A multa prevista no art. 56 do CDC não visa à reparação do dano sofrido pelo consumidor, mas sim à punição pela infração às normas que tutelam as relações de consumo.
2. Não se reconhece a nulidade de auto de infração sem a demonstração do prejuízo causado pela ausência do cumprimento de determinada formalidade (RMS 18.188/GO, 5ª T., Min. Gilson Dipp, DJ de 29.05.2006; RMS 131.44/BA, 5ª T., Min. Arnaldo Esteves Lima, DJ de 10.04.2006; MS 10.770/DF, 3ª S., Min. Félix Fischer, DJ de 06.02.2006), o que, no caso, não ocorreu.
3. A juntada de apenas algumas das peças que formaram o processo administrativo impede o exame a respeito da alegada falta de oportunidade para a apresentação de defesa antes da aplicação da multa.
[...]5. Recurso ordinário parcialmente conhecido e desprovido. (STJ. RMS 22.610/RN, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 06/02/2007, DJ 22/02/2007, p. 165) grifamos
"ADMINSTRATIVO -SERVIDOR PÚBLICO -PROCESO ADMINSTRATIVO DISCIPLINAR -COMPETÊNCIA -INSTAURAÇÃO DAÇÃO DISCIPLINAR E APLICAÇÃO DA PENA -DELGAÇÃO -LEGALIDADE -ANULAÇÃO DE ATO PROCESUAL -AUSÊNCIA DE
COMPROVAÇÃO -PREJUÍZO -PROCESSO CRIMNAL -SUPENSÃO CONDICONAL -SOBRESTAMENTO DO FEITO ADMINSTRATIVO -DESNECSIDADE -INDEPENDÊNCIA DAS ESFERAS ADMINSTRATIVA EPENAL -PRECDENTES -RECURSO DESPROVIDO.
I -omissis
I -Aplicável à espécie o princípio do “pas de nullité sans grief", tendo em vista que eventual nulidade do processo administrativo exige a respectiva comprovação do prejuízo, que não ocorreu no presente caso.
III e IV –omissis.
V -Recurso conhecido e desprovido." (STJ. RMS 18.8/GO, 5ªT., Min. Gilson Dip, DJde 29.05206) grifamos
Por fim, deve-se destacar que o auto de infração deve ser descrito de forma pormenorizada, específica, clara, posto que no processo administrativo o contraditório se traduz na faculdade do autuado manifestar sua posição sobre os fatos ou documentos trazidos ao processo pelo autuante, ou seja, é sua oportunidade de tomar conhecimento dos atos processuais e de reagir contra as tipificações das quais discorde.
Assim, para se evitar discussões quanto à nulidade de auto de infração por violação à ampla defesa/contraditório, deve o autuante descrever a infração apurada, com a indicação da origem e natureza do crédito tributário, mencionando especificamente a disposição da lei em que seja fundado e a descrição completa dos fatos.
É o parecer, salvo melhor juízo.
João Pessoa, 07 de outubro de 2014.
SANCHA MARIA F C R ALENCAR
Procuradora do Estado
Assessora Jurídica do Conselho de Recursos Fiscais
Neste sentido, não se constata a necessidade de decretar a nulidade do presente lançamento de ofício, aplicando-se o princípio do pas de nullité sans grief, com a exigência de comprovação do prejuízo, o que não ocorreu no presente caso.
Adentrando na análise de mérito da presente acusação, é de se ressaltar que trata da cobrança do ICMS - Diferencial de Alíquotas (ICMS-Difal), não recolhido por ocasião de aquisições de mercadorias destinadas ao ativo fixo do estabelecimento.
Como bem se sabe as aquisições de mercadorias oriundas de outra unidade da Federação destinadas ao uso/consumo ou ativo fixo ensejam a obrigação do contribuinte adquirente recolher o ICMS - Diferencial de Alíquotas, por determinação constitucional, conforme se vislumbra do artigo 155, § 2°, VII, da atual Carta Magna.
Em consonância com a previsão constitucional supra, o RICMS/PB regulamentou a obrigação, conforme previsão nos arts. 2º e 106:
Art. 2º
(...)
§ 1º O imposto incide também:
(...)
IV - sobre a entrada, no estabelecimento do contribuinte, de mercadoria ou bem oriundos de outra unidade da Federação, destinados a uso, consumo ou ativo fixo;
(...)
Art. 106...
(...)
II - até o 15º (décimo quinto) dia do mês subsequente ao em que tiver ocorrido o fato gerador, nos casos de:
(...)
c) aquisições em outra unidade da Federação de mercadorias ou bens destinados a consumo ou a integrar o ativo fixo, em regime de pagamento normal ou contribuinte enquadrado no SIMPLES NACIONAL;
(...)
§1° O recolhimento previsto na alínea “e” do inciso I, e nas alíneas “c” e “d” do inciso II, será resultante da diferença de alíquota.
Pelo fato descrito na delação, recaiu sobre a recorrente a denúncia de haver infringido os artigos 106, II, “c” e § 1º c/c art. 2º, § 1º, IV; art. 3º, XIV e art. 14, X, todos do RICMS/PB, in verbis :
“Art. 106. O recolhimento do imposto de responsabilidade direta do contribuinte far-se-á:
(...)
II - até o 15º (décimo quinto) dia do mês subsequente ao em que tiver ocorrido o fato gerador, nos casos de:
(...)
c) aquisições em outra unidade da Federação de mercadorias ou bens destinados a consumo ou a integrar o ativo fixo, em regime de pagamento normal ou contribuinte enquadrado no SIMPLES NACIONAL;
§ 1º O recolhimento previsto na alínea “e” do inciso I, e nas alíneas “c” e “d” do inciso II, será o resultante da diferença de alíquota.
Diante de tais normativos, a fiscalização lavrou o auto de infração ora em comento, pois teria identificado aquisições para o ativo fixo do estabelecimento sem a observância aos termos legais mencionados.
Oportuno se torna dizer que a autuada, inicialmente, formulou consulta à Gerência Executiva de Tributação desta Secretaria com o intuito de se beneficiar com o diferimento previsto no art. 10 do RICMS/PB, arguindo que as mercadorias constantes das faturas nº 3007254424, 3007398537 e 3007520362: cabos isolados, tampas para canaleta, material para implantação da subestação de energia, quadro elétrico, bombas para produção, roteadores de máquina, filtro rotativo, esticadores/acionamentos de trocadores, tambor para sistema de ventilação, válvulas de proteção, cones de entradas e saídas, ventilador centrífugo, redutor, telhas para sistema de ar-condicionado fabril, entre outros itens, dizem respeito a operações com mercadorias destinadas ao ativo fixo e que estão relacionadas ao processo produtivo da empresa (indústria), cujo imposto é diferido, nos termos do artigo 10, IX, do RICMS/PB. Vejamos o dispositivo:
Art. 10. O pagamento do imposto será diferido:
(...)
IX - nas operações internas, interestaduais e de importação, realizadas com máquinas, aparelhos e equipamentos industriais destinados a integrar o ativo fixo de estabelecimento industrial e relacionados com o processo produtivo, observado o disposto no § 8º (Decreto nº 19.111/97);
Mister se faz ressaltar que o Parecer nº 2014.01.05.00126 da consulta fiscal formulada pela autuada, bem como o Acórdão nº 346/2014, impetrado em sede de recurso a esta Corte, manifestaram-se ambos no sentido de que a concessão da postergação do recolhimento do imposto se aplica apenas nas operações de aquisição de máquinas, aparelhos e equipamentos industriais, destinados a integrar o ativo fixo do estabelecimento industrial, e que estejam diretamente relacionados com o processo produtivo da empresa, conforme se extrai do próprio texto da norma supracitada. Vejamos a ementa do referido acórdão:
CONSULTA FISCAL. ICMS. DIFERENCIAL DE ALÍQUOTAS. AQUISIÇÃO INTERESTADUAL DE BENS DESTINADOS AO ATIVO FIXO DE ESTABELECIMENTO INDUSTRIAL. DIFERIMENTO. EMPRESA INDUSTRIAL DO RAMO DE PREPARAÇÃO E FIAÇÃO DE FIOS DE ALGODÃO. APLICABILIDADE PARCIAL DO BENEFÍCIO FISCAL. MANTIDA A DECISÃO “A QUO”. RECURSO HIERÁRQUICO DESPROVIDO.
O benefício do diferimento do ICMS Diferencial de Alíquotas, previsto na aquisição de bens destinados ao ativo fixo de estabelecimento industrial, se aplica apenas às máquinas, aparelhos e equipamentos industriais relacionados com o processo produtivo da empresa.
Assim, não se sujeitam ao diferimento as operações de aquisição de bens que não participem diretamente do processo produtivo da empresa ou que se tratem de partes, peças, componentes ou acessórios.
Em sua defesa, a recorrente argui que o auditor fiscal autuante incluiu indevidamente no lançamento bens do ativo fixo empregados no processo produtivo da empresa de mesma natureza e destinação daqueles que decidiu não “taxar”. Ao pleitear o saneamento do que chama de incoerência, o contribuinte pretende, na verdade, discutir novamente o entendimento anteriormente exarado por esta Corte no acórdão supracitado, o que não é objeto deste processo, porquanto tal posicionamento não ser mais passível de alteração, além do que esta relatoria se posiciona no mesmo norte.
Quanto à existência de pagamentos realizados pela recorrente, motivo pelo qual suscita a correção do valor denunciado, alegando que a fiscalização não considerou o pagamento parcial do diferencial de alíquotas realizado no montante de R$ 9.667,33 e denunciou o valor integral da fatura de número 3007520362, vemos que não procede tal alegação.
Verifica-se nos autos a inocorrência de equívoco no valor do crédito tributário aqui exigido, porquanto o valor reconhecido e pago pela autuada, R$ 9.667,33, bem como as notas fiscais, cujas mercadorias se relacionavam com o processo produtivo, já haviam sido excluídos pelos auditores fiscais e a instância monocrática manteve tal exclusão, assim, a denúncia formulada pela fiscalização através do presente auto de infração pretende exigir tão-somente o montante do crédito remanescente.
Registre-se que, de acordo com o Parecer nº 2014.01.05.00126 da consulta fiscal formulada pela autuada que considerou parte das alegações da empresa e, assim, se posicionou pela exclusão de algumas notas fiscais que compunham a fatura de número 3007520362, o setor desta Secretaria responsável pela retificação de faturas, anteriormente à lavratura do auto de infração, abateu do valor total da referida fatura aquele correspondente ao ICMS - Diferencial de Alíquotas sobre estas notas fiscais.
No que tange ao direito de creditamento do valor exigido no presente auto de infração, além daquele referente ao diferencial de alíquotas pago antecipadamente, constante das faturas, objeto da autuação, objeto de alegação da recorrente, necessário informar que não é cabível, no âmbito do processo administrativo tributário, dispor sobre possibilidade de compensação de crédito.
Desta forma, cabe ao contribuinte formalizar petição em processo de compensação, ser avaliado e constatado por meio de processo próprio, e em setor competente da SER, nos termos da legislação tributária vigente.
Por fim, após os levantamentos e consultas realizadas, mantenho o entendimento da instância monocrática, uma vez que a ação fiscal tem respaldo nos dispositivos de lei supracitados, daí porque mantenho a decisão singular, razão pela qual dou como desprovido o recurso voluntário.
Com estes fundamentos,
VOTO - pelo recebimento do recurso voluntário, por regular e tempestivo, e quanto ao mérito, pelo seu desprovimento, para manter a sentença exarada na instância monocrática que julgou procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000104/2016-27, lavrado em 15/2/2016, contra a empresa NORFIL S.A. INDÚSTRIA TÊXTIL, CCICMS n° 16.119.358-7, qualificada nos autos, declarando como devido o crédito tributário no valor de R$ 68.942,63 (sessenta e oito mil, novecentos e quarenta e dois reais e sessenta e três centavos), sendo R$ 45.961,75 (quarenta e cinco mil, novecentos e sessenta e um reais e setenta e cinco centavos) de ICMS, por infringência ao art. 106 do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto 18.930/96, e R$ 22.980,88 (vinte e dois mil, novecentos e oitenta reais e oitenta e oito centavos) de multa por infração, com fundamento legal no art. 82, II, e”, da Lei n.º 6.379/96.
Intimações necessárias, na forma regulamentar.
Primeira Câmara de Julgamento, Sala das Sessões, Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em 10 de maio de 2019.
Gilvia Dantas Macedo
Conselheira Relatora
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