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ACÓRDÃO Nº. 268/2019

brasao paraiba
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA

PROCESSO Nº 0539582017-5
TRIBUNAL PLENO DE JULGAMENTO
1ª Recorrente: GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS - GEJUP
1ª Recorrida: MAGNO NASCIMENTO & CIA LTDA
2ª Recorrente: MAGNO NASCIMENTO & CIA LTDA
2ª Recorrida: GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS - GEJUP
Repartição Preparadora: CENTRAL DE ATENDIMENTO AO CIDADÃO DA GER. REG. 1ªREGIÃO
Autuante(s): WADIH DE ALMEIDA SILVA
Relator: CONS.º PETRONIO RODRIGUES LIMA
Relatora do voto divergente: CONS. GÍLVIA DANTAS MACEDO

FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO. OMISSÃO DE SAÍDAS PRETÉRITAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS SEM PAGAMENTO DO IMPOSTO DEVIDO. DENÚNCIA CONFIGURADA EM PARTE. CONTA MERCADORIAS.  INFRAÇÃO  NÃO CARACTERIZADA. AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE. ALTERADA DE OFÍCIO A DECISÃO RECORRIDA QUANTO AOS VALORES. RECURSOS HIERÁRQUICO E VOLUNTÁRIO DESPROVIDOS.

Em relação a contribuintes optantes pelo regime de recolhimento do imposto pelo Simples Nacional, no caso de omissões de receitas, não comporta aplicação de alíquotas inerentes a este regime de tributação, e sim àquela aplicável às demais pessoas jurídicas, na forma prevista na Lei Complementar nº 123/2006.
A falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios conduz à presunção de saídas de mercadorias tributáveis sem pagamento do imposto estadual. “In casu”, as provas apresentadas pelo contribuinte foram suficientes para demonstrar a inexistência em parte de repercussão tributária, o que acarretou, “ipso facto”, o cancelamento parcial do crédito tributário relativo a esta denúncia.
A existência de CMV negativo em um determinado exercício representa uma patologia fiscal que denuncia indício tributário, onde, no entanto, o procedimento, da Conta Mercadoria não possibilita a exigência do imposto pelo simples fato de apresentar negatividade no custo mercantil das operações, fato ocorrido sobre o exercício de 2012. Portanto, mantida decisão da instância “a quo”.
Improcedência do crédito tributário apurado sobre o exercício de 2014, em relação à técnica da Conta Mercadorias – Lucro Presumido – aplicado a contribuinte do Simples Nacional, uma vez que o arbitramento de lucro bruto se evidencia incompatível e em total dissonância com o que estabelece a Lei Complementar nº 123/06. O contribuinte enquadrado como Simples Nacional possui características e regramento próprios, o que o coloca em situação especial, não permitindo a utilização de margem de lucro presumido para fins de surgimento da presunção “juris tantum” de omissão de receitas.

Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...

 

 

A C O R D A M os membros do Tribunal Pleno de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, à maioria, e de acordo com o voto do relator, pelo recebimento dos recursos, hierárquico, por regular, e, voluntário, por regular e tempestivo e, quanto ao mérito, pelo desprovimento de ambos, para alterar de ofício, quanto aos valores, a decisão monocrática, que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração nº 93300008.09.00000769/2017-11, lavrado em 17 de abril de 2017, em desfavor da empresa, MAGNO NASCIMENTO & CIA LTDA EPP, condenando-a ao crédito tributário no valor de R$ 26.816,60 (vinte e seis mil, oitocentos e dezesseis reais e sessenta centavos), sendo R$ 13.408,30 (treze mil, quatrocentos e oito reais e trinta centavos), de ICMS, por infringência ao art. 158, I e art. 160, I, c/fulcro art. 646, todos do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto nº 18.930/97, e R$ 13.408,30 (treze mil, quatrocentos e oito reais e trinta centavos), de multa por infração, arrimada no art. 82, V, “f”, da Lei nº 6.379/96. Ao tempo em que cancela, por indevido, o crédito tributário no montante de R$ 4.632.862,08 (quatro milhões, seiscentos e trinta e dois mil, oitocentos e sessenta e dois reais e oito centavos), sendo R$ 2.316.431,04 (dois milhões, trezentos e dezesseis mil, quatrocentos e trinta e um reais e quatro centavos), de ICMS e R$ 2.316.431,04 (dois milhões, trezentos e dezesseis mil, quatrocentos e trinta e um reais e quatro centavos) de multa por infração, pelas razões acima evidenciadas. P.R.I



Tribunal pleno de Julgamento, Sala das Sessões Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em 24 de maio de 2019.



                                                                     PETRONIO RODRIGUES LIMA
                                                                              Conselheiro Relator



                                                       GIANNI CUNHA DA SILVEIRA CAVALCANTE
                                                                                  Presidente



Participaram do presente julgamento os membros do Tribunal pleno de Julgamento, acompanhando o Relator do voto original: DAYSE ANNYEDJA GONÇALVES CHAVES, MAIRA CATÃO DA CUNHA CAVALCANTI SIMÕES, MÔNICA OLIVEIRA COELHO DE LEMOS, THAÍS GUIMARAES TEIXEIRA, ANÍSIO DE CARVALHO COSTA NETO e SIDNEY WATSON FAGUNDES DA SILVA. Com voto divergente: GILVIA DANTAS MACEDO.




                                     SANCHA MARIA FORMIGA CAVALCANTE E RODOVALHO DE ALENCAR
                                                                            Assessora Jurídica

Em análise nesta Corte os recursos hierárquico e voluntário, interpostos nos termos dos artigos 77 e 80 da Lei nº 10.094/2013, contra decisão monocrática que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000769/2017-11, lavrado em 17 de abril de 2017, em desfavor da empresa, MAGNO NASCIMENTO & CIA LTDA, inscrição estadual nº 16.114.724-0, no qual constam as seguintes acusações, ipsis litteris:

 

0009 – FALTA DE LANÇAMENTO DE N. F. DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS PRÓPRIOS >> Aquisição de mercadorias com recursos advindos de omissões de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis ou a realização de prestações de serviços tributáveis sem o pagamento do imposto devido, constatada pela falta de registro de notas fiscais nos livros próprios.

 

Nota Explicativa:

“AQUISIÇÃO DE MERCADORIAS COM RECURSOS ADVINDOS DE OMISSÕES DE SAÍDAS, REFERENTE EXERCÍCIO 2013.”

 

0027 – OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – CONTA MERCADORIAS >> Contrariando dispositivos legais, o contribuinte omitiu saídas de mercadorias tributáveis, resultando na falta de recolhimento do ICMS. Irregularidade esta detectada através do levantamento Conta Mercadorias.

 

Nota Explicativa:

“OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS, EXERCÍCIOS 2012 E 2014.”

 

Em decorrência destes fatos, o representante fazendário lançou um crédito tributário na quantia total de R$ 4.659.678,68, sendo R$ 2.329.839,34, de ICMS, por infringência aos art. 158, I; art. 160, I c/ fulcro no art. 643, § 4º, II e 646, parágrafo único, todos do RICMS/PB, e multa por infração de igual valor, com fulcro no art. 82, V, “f” e “a”, da Lei nº 6.379/96.

Documentos instrutórios acostados às fls. 10-27, do libelo.

Depois de cientificada por via postal (fl. 28 e 29), em 15 de maio de 2017, nos termos do artigo 46, II, da Lei nº 10.094/13, a autuada, por intermédio de sua representante legal, apresentou impugnação tempestiva contra os lançamentos dos créditos tributários consignados no Auto de Infração em análise (fls. 32-70), protocolada em 9 de junho de 2017, pugnando pela improcedência do feito fiscal.

Sem informação de existência de antecedentes fiscais (fl. 71), foram os autos conclusos (fl. 72) e remetidos à Gerência Executiva de Julgamento de Processos Fiscais.

Acostado aos autos, documentos e CD, pela recorrente, em 22/6/2017, fls. 75-152.

Os autos foram distribuídos à julgadora fiscal, Rosely Tavares de Arruda, que decidiu pela procedência parcial da exigência fiscal, com recurso de ofício, conforme ementa abaixo transcrita:

 

PRESUNÇÃO LEGAL DE OMISSÃO DE VENDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS. FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO. INFRAÇAO CARACTERIZADA EM PARTE. CONTA MERCADORIAS. CMV NEGATIVO. INFRAÇÃO MANTIDA PARCIALMENTE.

Caracterizada a omissão de saídas tributáveis, decorrente da falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios. In casu, o contribuinte apresentou argumentos e provas que levaram a derrocada de parte dos créditos lançados na inicial.

As diferenças apuradas no Levantamento da Conta Mercadorias ensejam a ocorrência de omissão de saídas tributáveis sem o pagamento do imposto, conforme presunção relativa contida na legislação de regência. A ocorrência de CMV negativo acarretou a inviabilidade da técnica de auditoria do Levantamento da Conta Mercadorias quanto ao exercício fiscalizado de 2012.

 

                               

AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE.

 

Cientificada da decisão proferida pela instância singular, em 28 de novembro de 2017[1], da decisão proferida pela instância singular e inconformada com os termos da sentença, a autuada, por intermédio de sua representante legal, interpôs, em 28 de dezembro de 2017, recurso voluntário, tempestivo, ao Conselho de Recursos Fiscais do Estado da Paraíba.

 

Quanto à delação de falta de lançamento de n. f. de aquisição nos livros próprios, relata que a maior parte das notas, supostamente, não escrituradas diz respeito a uso e consumo, atividade que não repercute em obrigação de recolher ICMS, corroborando com o entendimento da cobrança da multa por descumprimento de obrigação acessória.

 

Quanto às demais notas que, embora não escrituradas, foram tributadas nas saídas, razão pela qual deve ser mantida apenas a multa por descumprimento de obrigação acessória.

 

Relata que a maior controvérsia diz respeito à presunção de que houve omissão de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis, pois a autoridade fiscalizatória partiu da premissa de que a recorrente contava com um estoque bem maior do que o real, no exercício de 2014. Tendo ocorrido um erro de digitação, em um item específico, qual seja, mangueira pneumática preta, inserindo-se a uma quantidade absurda. Tratando-se de um produto que sequer é vendido com frequência.

 

Requer, também, que seja afastada a aplicação da alíquota de 17%, vez que se trata de empresa do Simples Nacional.

 

Por fim, a recorrente requer a improcedência do feito fiscal e a realização de sustentação oral.

 

Ato contínuo, os autos foram distribuídos a esta relatoria, segundo critério regimentalmente previsto, para apreciação e julgamento.

 

Considerando o pedido da recorrente sobre concessão de oportunidade para a realização de uma provável sustentação oral, foi solicitado parecer prévio à Assessoria Jurídica, fl. 202, desta Corte, que o fez mediante o documento acostado, opinando pela legalidade do procedimento administrativo tributário, fls. 205-210, do libelo.

 

Por ocasião do julgamento neste Tribunal Administrativo, iniciado em 28/12/2018, foi realizada a sustentação oral pela sua representante legal, que reforçou a tese de ter ocorrido erro de digitação em fevereiro/2013, em um dos itens de seu estoque (Mangueira 1,0 m de Alta Pressão), que elevou seu valor a patamares bem acima do razoável, influenciando consideravelmente nos resultados das Contas Mercadorias realizadas pela fiscalização.

 

Em razão de seus argumentos, foi solicitado diligência no sentido de demonstrar a recomposição do estoque corrigido na sua EFD, provando o erro alegado, conforme documento às fls. 212 e 213. Em resposta, a empresa junta mídia em CD-R, contendo a EFD corrigida e notas fiscais das operações com o item questionado, retornando os autos para análise e julgamento.

 

 

Este é o RELATÓRIO.

 

VOTO

 

A matéria em apreciação versa sobre as denúncias de: a) falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios e b) Omissão de Saídas de Mercadorias Tributáveis – Conta Mercadorias, formalizadas em desfavor da empresa, MAGNO NASCIMENTO & CIA LTDA, inscrição estadual nº 16.114.724-0, já previamente qualificada nos autos.

Inicialmente, cumpre-me declarar que a peça acusatória apresenta-se apta a produzir os regulares efeitos inerentes ao aspecto formal do ato administrativo, visto que sua confecção observa os requisitos indispensáveis de constituição e desenvolvimento válido do processo: identificação das operações promovidas, base de cálculo, alíquota aplicável e período do fato gerador omitido (exercício fiscal), o que atende aos pressupostos de validade do lançamento de ofício dispostos no art. 142 do CTN, in verbis:

 

Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.

 

Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional.

 

No que diz respeito à Lei nº 10.094, de 27 de setembro de 2013, os artigos 14 a 17 elencam as situações em que o ato administrativo poderá ser anulado. Vejamos o texto legal abaixo:

 

Art. 14. São nulos:

I - os atos e termos lavrados por pessoa incompetente;

II - os despachos e decisões proferidas por autoridade incompetente;

III - os lançamentos cujos elementos sejam insuficientes para determinar a matéria objeto da exigência tributária e o respectivo sujeito passivo, ressalvada, quanto à identificação deste, a hipótese de bens considerados abandonados;

IV - os despachos e as intimações que não contenham os elementos essenciais ao cumprimento de suas finalidades;

V - os autos de infração de estabelecimentos lavrados pelos auditores fiscais tributários estaduais de mercadorias em trânsito.

 

§ 1º A nulidade de qualquer ato só prejudica os posteriores que dele diretamente dependam ou lhes sejam consequentes.

§ 2º Ao declarar a nulidade, a autoridade fiscal julgadora competente indicará os atos por ela atingidos, ordenando as providências necessárias ao prosseguimento ou solução do processo.

 

Art. 15. As incorreções, omissões ou inexatidões, que não importem nulidade, serão sanadas quando não ocasionarem prejuízo para a defesa do administrado, salvo, se este lhes houver dado causa ou quando influírem na solução do litígio.

 Parágrafo único. Sem prejuízo do disposto no “caput”, não será declarada a nulidade do auto de infração sob argumento de que a infração foi descrita de forma genérica ou imprecisa, quando não constar da defesa, pedido neste sentido.

 

Art. 16. Os lançamentos que contiverem vício de forma devem ser considerados nulos, de ofício, pelos Órgãos Julgadores, observado o disposto no art. 15 desta Lei.

 

Art. 17. Está incluído na hipótese prevista no art. 16 desta Lei, o Auto de Infração lavrado em desacordo com os requisitos obrigatórios estabelecidos no art. 142 do Código Tributário Nacional, quanto:

 I - à identificação do sujeito passivo;

 II - à descrição dos fatos;

 III - à norma legal infringida;

 IV - ao nome, ao cargo, ao número de matrícula e à assinatura do autor do feito;

 V - ao local, à data e à hora da lavratura;

 VI - à intimação para o sujeito passivo pagar, à vista ou parceladamente, ou impugnar a exigência, no prazo de 30 (trinta) dias, contado a partir da data da ciência do lançamento.

 

Nesse norte, percebe-se que a peça vestibular trouxe, devidamente, a indicação da pessoa do infrator, a natureza da infração, não se verificando quaisquer incorreções capazes de provocar a nulidade por vício formal da autuação, conforme se extrai dos artigos transcritos acima, tanto do Código Tributário Nacional (CTN), como da Lei nº 10.094/2013.

 

Preliminar

 

 

Impossibilidade de aplicação da Legislação Estadual para empresas optantes pelo Simples Nacional.

 

Quanto ao argumento, suscitado pela recorrente, especificamente no que se refere à aplicação dos percentuais previstos nos anexos I ou II da Lei Complementar nº 123/2006 em substituição à alíquota de 17% (dezessete por cento), pelo fato de se encontrar a empresa enquadrada no regime de tributação do Simples Nacional, vislumbramos não ser possível sua acolhida.

Isto porque as acusações descritas no Auto de Infração referem-se a omissões de saídas detectadas pela fiscalização quando verificada a existência de notas fiscais de aquisição que não foram escrituradas nos livros próprios do contribuinte, bem como quando identificada a diferença tributável no Levantamento da Conta Mercadorias e, para estes casos, o artigo 13, § 1º, “f”, da LC nº 123/06 determina seja utilizada a legislação tributária aplicável às demais pessoas jurídicas. Senão vejamos:

Art. 13.  O Simples Nacional implica o recolhimento mensal, mediante documento único de arrecadação, dos seguintes impostos e contribuições:

(...)

§ 1o O recolhimento na forma deste artigo não exclui a incidência dos seguintes impostos ou contribuições, devidos na qualidade de contribuinte ou responsável, em relação aos quais será observada a legislação aplicável às demais pessoas jurídicas:

(...)

XIII - ICMS devido:

(...)

f) na operação ou prestação desacobertada de documento fiscal; (g. n.)

O comando normativo insculpido no dispositivo acima transcrito não deixa dúvidas quanto à necessidade de deslocamento da sistemática de apuração do ICMS para o regime geral quando o contribuinte, enquadrado como Simples Nacional, realiza quaisquer das condutas descritas no inciso XIII do § 1º do artigo 13, da Lei Complementar nº 123/2006.

É exatamente esta a regra adotada quando, por exemplo, o Simples Nacional atua como substituto tributário ou quando realiza uma operação de importação. Em todos estes casos (incluindo as condutas descritas no Auto de Infração), deve-se observar a legislação aplicável às demais pessoas jurídicas.

Ressalte-se que não estamos diante de um conflito aparente de normas, muito menos de aplicação de lei mais gravosa ao contribuinte. É o próprio princípio da especialidade (observância à LC nº 123/06) que impõe aos destinatários da norma a obrigatoriedade de observar as regras gerais, sempre que o contribuinte realizar uma conduta que se amolde perfeitamente às situações descritas no artigo 13, § 1º, XIII, da LC nº 123/06 (fenômeno da subsunção).

A matéria já fora analisada em diversas oportunidades por este Colegiado, que, de forma reiterada, vem decidindo acerca do afastamento da LC nº 123/06 nos casos em que se constate haver o contribuinte omitido saídas tributadas, a exemplo do Acórdão CRF n° 006/2018, da relatoria deste relator, que assim dispõem:

 

OMISSÃO DE VENDAS. OPERAÇÕES COM CARTÕES DE CRÉDITO E DÉBITO. INFRAÇÃO CARACTERIZADA. SIMPLES NACIONAL. ALÍQUOTA APLICÁVEL ÀS DEMAIS PESSOAS JURÍDICAS.  MANTIDA A DECISÃO RECORRIDA. AUTO DE INFRAÇÃO PROCEDENTE. RECURSO VOLUNTÁRIO DESPROVIDO.

Declaração de vendas pelo contribuinte em valores inferiores aos fornecidos pelas administradoras de cartões de crédito e débito autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis, sem pagamento do ICMS, ressalvado ao sujeito passivo as provas da improcedência da acusação, o que não ocorreu no presente caso.

Na acusação de omissão de saídas de mercadorias tributáveis, em relação a  contribuintes optantes pelo regime recolhimento do imposto pelo Simples Nacional, não comporta aplicação de alíquotas inerentes a este regime de tributação, e sim àquela aplicável às demais pessoas jurídicas, na forma prevista na Lei Complementar nº 123/2006.

 

No caso dos autos, verifico que o contribuinte só passou a ser optante pela sistemática do Simples Nacional a partir de 1º/1/2014, alcançada apenas pela acusação de omissão de vendas detectada pela técnica da Conta Mercadorias, não apropriada para o caso em questão, como adiante comento.

 

 

Razões Meritórias

 

Falta de Lançamento de Notas Fiscais de Aquisição nos Livros Próprios

 

A suposta irregularidade foi constatada a partir da detecção, por parte da fiscalização, de que o contribuinte teria deixado de lançar diversas notas fiscais de aquisição nos livros próprios nos meses de janeiro a setembro de 2013. Esta conduta omissiva fez surgir a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto correspondente, obrigação principal, nos termos do que dispõem os artigos 3º, § 8º, da Lei nº 6.379/96 e 646 do RICMS/PB:

 

Lei nº 6.379/96:

 

Art. 3º O imposto incide sobre:

(...)

§ 8º O fato de a escrituração indicar insuficiência de caixa e bancos, suprimentos a caixa e bancos não comprovados ou a manutenção no passivo de obrigações já pagas ou inexistentes, bem como a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas ou de declarações de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito, autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou de prestações de serviços sem o recolhimento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção.

 

RICMS/PB:

 

Art. 646. Autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou a realização de prestações de serviços tributáveis sem o recolhimento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção:

I – o fato de a escrituração indicar:

a) insuficiência de caixa;

b) suprimentos a caixa ou a bancos, não comprovados;

II – a manutenção no passivo de obrigações já pagas ou inexistentes;

III – qualquer desembolso não registrado no Caixa;

IV – a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas; ( g. n.)

V – declarações de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito.

 

Parágrafo único. A presunção de que cuida este artigo aplica-se, igualmente, a qualquer situação em que a soma dos desembolsos no exercício seja superior à receita do estabelecimento, levando-se em consideração os saldos inicial e final de caixa e bancos, bem como, a diferença tributável verificada no levantamento da Conta Mercadorias, quando do arbitramento do lucro bruto ou da comprovação de que houve saídas de mercadorias de estabelecimento industrial em valor inferior ao Custo dos Produtos Fabricados , quando da transferência ou venda, conforme o caso.

 

Por imperativo legal, a constatação desta omissão obriga o auditor fiscal a lançar, de ofício, o crédito tributário decorrente desta infração, tendo em vista a receita marginal originária das saídas omitidas afrontar o disciplinamento contido nos art. 158, I, e art. 160, I, ambos do RICMS/PB, os quais transcrevemos a seguir:

 

Art. 158. Os contribuintes, excetuados os produtores agropecuários, emitirão Nota Fiscal, modelos 1 ou 1-A, Anexos 15 e 16:

 

I - sempre que promoverem saída de mercadorias;

 

Art. 160. A nota fiscal será emitida:

 

I - antes de iniciada a saída das mercadorias;

 

Para aqueles que incorrerem na conduta descrita nos artigos anteriormente reproduzidos, a Lei nº 6.379/96, em seu artigo 82, V, “f”, estabelece a seguinte penalidade:

 

Art. 82. As multas para as quais se adotará o critério referido no inciso II, do art. 80, serão as seguintes:

(...)

V - de 100% (cem por cento):

(...)

f) aos que deixarem de recolher o imposto proveniente de saída de mercadoria, dissimulada por receita de origem não comprovada, inclusive a representada por despesa realizada a descoberto de caixa, pela existência de passivo fictício ou por qualquer forma apurada através de levantamento da escrita contábil;

 

A presunção de que trata o artigo 646 do RICMS/PB, contudo, é relativa, cabendo a prova da sua improcedência ao contribuinte, conforme prevê a parte final do caput do referido dispositivo.

No que se refere à sistemática de apuração do tributo devido, é importante esclarecermos que, para a falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios, o artigo 646 do RICMS/PB autoriza a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou a realização de prestações de serviços tributáveis sem o recolhimento do imposto.

 

Este comando normativo, ao garantir o direito à Fazenda Pública de recuperar o ICMS incidente sobre operações pretéritas, o fez presumindo que todas elas foram realizadas com mercadorias tributáveis.

 

Assim, a exigência dos créditos não está relacionada diretamente às mercadorias consignadas nas notas fiscais não escrituradas, mas sim a operações pretéritas, cujas receitas não foram oferecidas à tributação e que possibilitaram ao contribuinte adquirir as mercadorias que se encontram descritas nas notas fiscais. Ou seja, o fato de algumas notas fiscais acobertarem aquisição de bens para o uso e consumo da empresa não afasta a presunção legal insculpida no artigo 646 do RICMS/PB.

 

Após analisar as provas apresentadas pela defesa, a julgadora monocrática, fl. 157, ao identificar que teve uma nota fiscal lançada na EFD em junho de 2013, outra cuja natureza da operação diz respeito à remessa em garantia e a terceira nota foi cancelada, acertadamente, afastou os créditos tributários a elas relativos, mantendo a denúncia quanto aos demais documentos fiscais, diante da falta de provas apresentadas pela defesa.

 

Destarte, corroboro com os ajustes realizados pela instância singular.

 

Assim sendo, quanto a esta delação, ratifico a decisão proferida em primeira instância, que a julgou parcialmente procedente, passando o crédito tributário a apresentar a seguinte composição:

 

INFRAÇÃO

PERÍODO

NOTA FISCAL   (mantida a acusação)

BASE DE CALCULO

ICMS

MULTA

Falta de Lançamento de N.F   de aquisição

JAN/13

615

         924,40  

             157,15

              157,15

Falta de Lançamento de N.F   de aquisição

FEV/13

7887 e 7889

   59.979,76

     10.196,56

      10.196,56  

Falta de Lançamento de N.F   de aquisição

MAR/13

-

-

-

-

Falta de Lançamento de N.F   de aquisição

ABR/13

2363

         675,00  

             114,75

              114,75

Falta de Lançamento de N.F   de aquisição

MAI/13

2174 e 5799

   12.790,65

          2.174,41

           2.174,41

Falta de Lançamento de N.F   de aquisição

JUN/13

274

      2.962,50

             503,63

              503,63

Falta de Lançamento de N.F   de aquisição

JUL/13

280

      1.250,00

             212,50

              212,50

Falta de Lançamento de N.F   de aquisição

SET/13

322

         290,00  

               49,30

                49,30

 

 

 

Omissão de Saídas de Mercadorias Tributáveis – CONTA MERCADORIAS. Exercícios 2012 e 2014.

 

A Conta Mercadorias – Lucro Presumido é uma técnica fiscal que se aplica aos casos em que o contribuinte não possui contabilidade regular, circunstância em que se arbitra o lucro de 30% (trinta por cento) sobre o Custo das Mercadorias Vendidas - CMV. Caso, o valor das vendas seja inferior ao CMV acrescido deste lucro, a legislação tributária estadual autoriza a fiscalização a lançar mão da presunção de que houve saídas de mercadorias tributáveis sem pagamento do imposto devido, nos termos do que dispõem os artigos 3º, §§ 8º e 9º, da Lei nº 6.379/96 e 646 do RICMS/PB, supracitado, e art. 643, § 4º, II do RICMS/PB, verbis:

 

 

RICMS/PB:

 

Art. 643. No interesse da Fazenda Estadual, será procedido exame nas escritas fiscal e contábil das pessoas sujeitas à fiscalização, especialmente no que tange à exatidão dos lançamentos e recolhimento do imposto, consoante as operações de cada exercício.

(...)

§ 3º No exame da escrita fiscal de contribuinte que não mantenha escrituração contábil regular devidamente registrada na Junta Comercial, será exigido o livro Caixa, devidamente autenticado pela repartição fiscal do domicílio do contribuinte, com a escrituração analítica dos recebimentos e pagamentos ocorridos em cada mês.

§ 4º Para efeito de aferição da regularidade das operações quanto ao recolhimento do imposto, deverão ser utilizados, onde couber, os procedimentos abaixo, dentre outros, cujas repercussões são acolhidas por este Regulamento:

(...)

II - o levantamento da Conta Mercadorias, caso em que o montante das vendas deverá ser equivalente ao custo das mercadorias vendidas (CMV) acrescido de valor nunca inferior a 30% (trinta por cento) para qualquer tipo de atividade, observado o disposto no inciso III do parágrafo único do art. 24.

 

Quanto ao Levantamento da Conta Mercadorias, no exercício 2012, período em que o contribuinte pertencia ao regime norma de tributação, corroboro com o entendimento da instância monocrática ao excluir da exordial o crédito tributário no valor total de R$ 2.132.158,08, visto que, o resultado negativo do Custo de Mercadoria Vendidas, neste exercício, caracteriza uma figura anômala, que torna a técnica de apuração da situação fiscal do contribuinte, empregada pela Fiscalização, imprópria a evidenciar a falta denunciada, diante que esse resultado é indicativo apenas de indícios da existência de irregularidade distinta na delatada.

 

Portando, quanto ao resultado apontado, no procedimento relativo ao exercício de 2012, não há como considerar que este configura diferença tributável, mas tão-somente indícios de irregularidades que demandam apuração fiscal mediante aplicação de técnica de fiscalização distinta do Levantamento da Conta Mercadorias.

        

Nesse sentido entende este Conselho de Recursos Fiscais, conforme se infere nas decisões abaixo:

 

“OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁRIAS. REJEITADA PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA. CONTA MERCADORIAS. NOTAS FISCAIS NÃO LANÇADAS. CONCORRÊNCIA. SANEAMENTO. PARCIALIDADE. LEVANTAMENTO FINANCEIRO. OMISSÃO. REDUÇÃO DA MULTA APLICADA. ALTERADA, QUANTO AOS VALORES, A DECISÃO RECORRIDA. AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE. RECURSO HIERÁRQUICO E VOLUNTÁRIO PROVIDO EM PARTE.

- Não acolhimento da preliminar arguida, diante da inexistência de obstáculos ou vícios procedimentais cometidos pela fiscalização capaz de prejudicar o contribuinte no seu direito de tomar conhecimento da ação fiscal e do devido processo administrativo tributário instaurado, havendo perfeita sintonia aos princípios que regem o contencioso tributário do Estado da Paraíba, não ocorrendo medida de cerceamento a ampla defesa e a ao contraditório.

- Mantida a parcialidade da exigência fiscal sobre a constatação de aquisição de mercadorias com recursos de omissões de saídas pretéritas, em face da falta de registro de notas fiscais nos livros próprios, expurgando as que tiveram comprovação de concorrência de infração, decorrente de saneamento processual.

- Comprovação de déficit financeiro em decorrência das despesas incorridas superarem as receitas declaradas no exercício de 2005, eclodindo a presunção prevista pela legislação de regência.

- Reputa-se regular o lançamento compulsório consistente no levantamento da Conta Mercadorias efetuado com base no arbitramento do lucro bruto, diante da falta de uma escrituração contábil regular, sendo excluída a exação sobre o exercício de 2008, por representar procedimento fiscal que apresentou CMV negativado, mantendo-se os demais procedimentos que oferecem suporte à acusação de omissão de saídas tributáveis.

- Redução da penalidade aplicada na forma disciplinada pela edição da Lei n° 10.008/2013”.

(Acórdão CRF/PB nº 490/2014, relator Cons. João Lincoln Diniz Borges. DOE de 7/12/2014).

 

“OMISSÃO DE SAÍDAS. CONTA MERCADORIAS. CMV NEGATIVO. MANTIDA A DECISÃO RECORRIDA. AUTO DE INFRAÇÃO PROCEDENTE EM PARTE. RECURSO HIERÁRQUICO DESPROVIDO.

A existência de CMV negativo em um determinado exercício representa uma patologia fiscal que denuncia indício tributário, onde, no entanto, o procedimento, da Conta Mercadoria não possibilita a exigência do imposto pelo simples fato de apresentar negatividade no custo mercantil das operações, fato ocorrido sobre o exercício de 2008. Manutenção do resultado fiscal apurado sobre o exercício de 2010 por espelhar a legalidade de aplicação da técnica fiscal. Redução da multa incidente em face do advento da Lei ° 10.008/2013” (Acórdão CRF/PB nº 386/2014, relator Cons. João Lincoln Diniz Borges. DOE de 28/10/2014).

 

 

Quanto ao exercício de 2014, o contribuinte argumenta que o Levantamento da Conta Mercadorias está equivocado, pois a maior controvérsia diz respeito à presunção de que houve omissão de saídas de mercadorias tributáveis, em razão que a fiscalização partiu da premissa de que a recorrente contava com um estoque bem maior do que o real. Tendo ocorrido um erro de digitação, em relação ao item, mangueira pneumática preta, inserindo-se a uma quantidade absurda de 1.995.990,00 metros.

 

Consta dos autos declaração da empresa Chianca Softwares, dirigida à Receita Estadual da Paraíba, relatando que o produto mangueira Magno Alta Pressão foi informada nos arquivos da empresa em quantidade bem superior a existente fisicamente, devido a um lapso no sistema de banco de dados, que ao integrar as informações salvou uma quantidade incorreta, gerando uma informação não condizente com a quantidade real.

 

Em consulta ao Sistema ATF, da Secretaria de Estado da Receita da Paraíba, identifica-se que o auditor fiscal, ao alocar valores nas rubricas que compõem a Conta Mercadorias, registrou os declarados pela recorrente nos seus arquivos SPED.

 

Ressalvo, a autuada realizou a retificação de sua declaração, com entrega de EFD substituta, conforme cópia de recibos de entrega anexados nos autos em mídia digital, CD anexado às fls. 76, após a ação fiscal, o que exclui a espontaneidade do contribuinte. Porém, diante da evidente discrepância do valor de estoque do citado item “mangueira de alta pressão” foi aberto diligência para a comprovação do erro de informação persistido pela recorrente em sua sustentação oral.

 

Contudo, o resultado da diligência prescindiu de análise por esta relatoria, pois verifico que o contribuinte autuado passou a ser optante pelo regime simplificado de apuração, SIMPLES NACIONAL, a partir de 1º/1/2014, situação esta que requer uma análise diferenciada quanto à aplicação da Conta Mercadorias - Lucro Presumido.

Em diversos momentos, o Conselho de Recursos Fiscais do Estado da Paraíba se posicionou pela admissibilidade da Conta Mercadorias como técnica de fiscalização válida para fundamentar a denúncia de omissão de receitas. No entanto, o aprofundamento das discussões nesta Casa, aliado ao aprimoramento e ao melhor embasamento das defesas administrativas, minaram a certeza anteriormente existente e exigiram uma mudança de entendimento quanto à matéria, corroborada por este relator.

Pois bem. É cediço que a LC nº 123/06 instituiu tratamento diferenciado para os contribuintes que se amoldarem às condições nela estabelecidas e fizerem opção por este regime diferenciado. Neste norte, a partir da inclusão do contribuinte na sistemática do Simples Nacional, o regramento especial passa a produzir efeitos para o sujeito passivo, assim como para o Fisco. Não se quer dizer com isso que os demais normativos não lhe sejam aplicáveis. O que se afirma é que se deve observar se a norma se harmoniza com a LC nº 123/06, ou seja, para que se possa validar o procedimento fiscal que resultou na identificação de omissão de receitas, faz-se mister analisarmos se os procedimentos da Conta Mercadorias são compatíveis com o regramento especial.

O RICMS/PB, em seu artigo 643, §§ 3º e § 4º, disciplina que, no exame da escrita fiscal de contribuinte que não mantenha escrituração contábil regular devidamente registrada na Junta Comercial, para efeito de aferição da regularidade das operações quanto ao recolhimento do imposto, deverão ser utilizados, onde couberem, os seguintes procedimentos:

a)      Elaboração de Demonstrativo Financeiro, através do qual deverão ser evidenciadas todas as receitas e despesas, bem como a disponibilidade financeira existente em Caixa e Bancos, devidamente comprovada, no início e no final do período fiscalizado;

b)      Levantamento da Conta Mercadorias, caso em que o montante das vendas deverá ser equivalente ao custo das mercadorias vendidas (CMV) acrescido de valor nunca inferior a 30% (trinta por cento) para qualquer tipo de atividade, observado o disposto no inciso III do parágrafo único do art. 24.

Ao dispor acerca deste último procedimento, o RICMS/PB, ao estabelecer percentual (30%) a ser acrescido ao Custo de Mercadorias Vendidas, mostra-se claramente em dissonância com a sistemática estabelecida pela LC nº 123/06.

Importante destacarmos que o RICMS/PB é anterior à LC nº 123/06. Além do quê, esta é hierarquicamente superior àquele, e dispõe sobre matéria de conteúdo especial. Assim, deve prevalecer a LC nº 123/06, afastando-se o RICMS/PB, naquilo que se mostrar incompatível com a Lei Complementar.

O contribuinte enquadrado como Simples Nacional recolhe o tributo devido sobre o seu faturamento, em observância ao que estabelece o artigo 18, § 3º, da LC nº 123/06:

 

Art. 18.  O valor devido mensalmente pela microempresa ou empresa de pequeno porte optante pelo Simples Nacional será determinado mediante aplicação das alíquotas efetivas, calculadas a partir das alíquotas nominais constantes das tabelas dos Anexos I a V desta Lei Complementar, sobre a base de cálculo de que trata o § 3o deste artigo, observado o disposto no § 15 do art. 3º.

(...)

§ 3º Sobre a receita bruta auferida no mês incidirá a alíquota determinada na forma do caput e dos §§ 1º e 2º deste artigo, podendo tal incidência se dar, à opção do contribuinte, na forma regulamentada pelo Comitê Gestor, sobre a receita recebida no mês, sendo essa opção irretratável para todo o ano-calendário.

§ 3º Sobre a receita bruta auferida no mês incidirá a alíquota efetiva determinada na forma do caput e dos §§ 1º, 1º-A e 2º deste artigo, podendo tal incidência se dar, à opção do contribuinte, na forma regulamentada pelo Comitê Gestor, sobre a receita recebida no mês, sendo essa opção irretratável para todo o ano-calendário. (Redação dada pela Lei Complementar nº 155, de 2016)

O contribuinte optante pelo Simples Nacional, como já demonstrado, possui características e regramento próprios, o que o coloca em situação especial, não permitindo a utilização de margem de lucro presumido para fins de surgimento da presunção juris tantum de omissão de receitas.

Na LC nº 123/06, não há qualquer exigência neste sentido para fins de tributação. Apenas no inciso X do seu artigo 29 consta uma referência ao lucro bruto – ainda que de forma indireta -, contudo para efeito de exclusão do regime.

Art. 29. A exclusão de ofício das empresas optantes pelo Simples Nacional dar-se-á quando:

(...)

X – for constatado que durante o ano-calendário o valor das aquisições de mercadorias para comercialização ou industrialização, ressalvadas hipóteses justificadas de aumento de estoque, for superior a 80% (oitenta por cento) dos ingressos de recursos no mesmo período, excluído o ano de início de atividade;

Somente depois de excluído do Simples Nacional, o Fisco está autorizado a lançar mão da Conta Mercadorias – Lucro Presumido para aqueles que não detenham escrita contábil, o que não implica dizer que o contribuinte, enquanto enquadrado na sistemática da LC nº 123/06, esteja “blindado”. A fiscalização tem o poder-dever de verificar a regularidade das operações do contribuinte, utilizando-se, para tanto, dos demais recursos de que dispõe para cumprir o seu mister.

Vejamos algumas decisões da Segunda Câmara de Julgamento desta Casa:

 

DECADÊNCIA – PRELIMINAR NÃO ACOLHIDA – FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS – SIMPLES NACIONAL - INFRAÇÃO CARACTERIZADA – AJUSTE DA PENALIDADE PROPOSTA – APLICAÇÃO DO PERCENTUAL ESTABELECIDO NOS ARTIGOS 16, I, DA RES. CGSN Nº 30/2008 E 87, I, DA RES. CGSN Nº 87/2011 – OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS –– CONTA MERCADORIAS – INAPLICABILIDADE DA TÉCNICA PARA CONTRIBUINTES DO SIMPLES NACIONAL – IMPROCEDÊNCIA DA ACUSAÇÃO – REFORMADA, DE OFÍCIO, A DECISÃO RECORRIDA – AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE – RECURSO VOLUNTÁRIO DESPROVIDO

- A identificação da existência de valores tributáveis informados nas GIM do contribuinte e não oferecidas à tributação do Simples Nacional impõe a necessidade de lançamento de ofício. Ajuste da penalidade proposta, uma vez não confirmada a ocorrência de nenhuma das condutas autorizativas da aplicação dos artigos 16, II, da Res. CGSN nº 30/2008 e 87, II, da Res. CGSN nº 94/2011.

- A técnica da Conta Mercadorias – Lucro Presumido não é aplicável para contribuinte do Simples Nacional, uma vez que o arbitramento de lucro bruto se evidencia incompatível e em total dissonância com o que estabelece a Lei Complementar nº 123/06. O contribuinte enquadrado como Simples Nacional possui características e regramento próprios, o que o coloca em situação especial, não permitindo a utilização de margem de lucro presumido para fins de surgimento da presunção juris tantum de omissão de receitas.

ACÓRDÃO Nº. 162/2019

Relator : CONS.º SIDNEY WATSON FAGUNDES DA SILVA

 

OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS. CONTA MERCADORIAS. CONTRIBUINTE OPTANTE PELO REGIME DE TRIBUTAÇÃO SIMPLES NACIONAL. TÉCNICA DE FISCALIZAÇÃO INADEQUADA. AUTO DE INFRAÇÃO IMPROCEDENTE. REFORMADA A DECISÃO RECORRIDA. RECURSO HIERÁRQUICO DESPROVIDO.

A legislação estadual autoriza a presunção legal de omissão de saídas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto estadual, quando for detectada diferença tributável via Conta Mercadorias, na hipótese do sujeito passivo não possuir escrita contábil.

No entanto, a técnica da Conta Mercadorias – Lucro Presumido não é aplicável para contribuinte do Simples Nacional, uma vez que o arbitramento de lucro bruto se evidencia incompatível e em total dissonância com o que estabelece a Lei Complementar nº 123/06. O contribuinte enquadrado como Simples Nacional possui características e regramento próprios, o que o coloca em situação especial, não permitindo a utilização de margem de lucro presumido para fins de surgimento da presunção juris tantum de omissão de receitas.

ACÓRDÃO Nº. 185/2019

CONS.ª MAIRA CATÃO DA CUNHA CAVALCANTI SIMÕES

 

Ressalto que, o que discuti não é a omissão em si, mas a técnica da Conta Mercadorias – Lucro Presumido - empregada para contribuintes optantes do Simples Nacional, por se mostrar incompatível com a legislação inerente a este regime simplificado de recolhimento de tributos, o que não impede o uso de outras técnicas de auditoria utilizadas pra detectar omissões de vendas.

Assim como recorremos à lei especial para justificar a possibilidade de aplicação de a legislação afetar às demais pessoas jurídicas para os casos de omissão de receitas, também o fazemos para sustentar a imprestabilidade da técnica utilizada (Conta Mercadorias) para dar arrimo à acusação em comento.

Diante de todo o exposto, resta-me improceder a denúncia de omissão de saídas de mercadorias tributáveis, detectada por meio da Conta Mercadorias, não impedindo, contudo, que sejam realizados outros procedimentos de auditoria fiscal para o mesmo período fiscalizado, respeitando o prazo decadencial.

Destarte, feitos os ajustes necessários, o crédito tributário efetivamente devido pela recorrente evidenciou-se conforme a planilha abaixo:

INFRAÇÃO

PERÍODO

ICMS (A.I.)

VALOR EXCLUÍDO

ICMS DEVIDO

MULTA

CRED. TRIB. DEVIDO

OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS - CONTA   MERCADORIAS

01/01/2012

31/12/2012

1.066.079,04

1.066.079,04

-

-

-

OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS - CONTA   MERCADORIAS

01/01/2014

31/12/2014

1.249.332,18

1.249.332,18

-

-

-

FALTA DE LANÇAMENTO DE N.F. DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS   PRÓPRIOS

01/01/2013

31/01/2013

157,15

-

157,15

157,15

314,30

FALTA DE LANÇAMENTO DE N.F. DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS   PRÓPRIOS

01/02/2013

28/02/2013

10.196,56

-

10.196,56

10.196,56

20.393,12

FALTA DE LANÇAMENTO DE N.F. DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS   PRÓPRIOS

01/03/2013

31/03/2013

180,27

180,27

-

-

-

FALTA DE LANÇAMENTO DE N.F. DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS   PRÓPRIOS

01/04/2013

30/04/2013

114,75

-

114,75

114,75

229,50

FALTA DE LANÇAMENTO DE N.F. DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS   PRÓPRIOS

01/05/2013

31/05/2013

2.225,50

51,09

2.174,41

2.174,41

4.348,82

FALTA DE LANÇAMENTO DE N.F. DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS   PRÓPRIOS

01/06/2013

30/06/2013

503,63

-

503,63

503,63

1.007,26

FALTA DE LANÇAMENTO DE N.F. DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS   PRÓPRIOS

01/07/2013

31/07/2013

212,50

-

212,50

212,50

425,00

FALTA DE LANÇAMENTO DE N.F. DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS   PRÓPRIOS

01/09/2013

30/09/2013

837,76

788,46

49,30

49,30

98,60

TOTAL

2.329.839,34

2.316.431,04

13.408,30

13.408,30

26.816,60

 

Com estes fundamentos,

 

VOTO pelo recebimento dos recursos, hierárquico, por regular, e, voluntário, por regular e tempestivo e, quanto ao mérito, pelo desprovimento de ambos, para alterar de ofício, quanto aos valores, a decisão monocrática, que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração nº 93300008.09.00000769/2017-11, lavrado em 17 de abril de 2017, em desfavor da empresa, MAGNO NASCIMENTO & CIA LTDA EPP, condenando-a ao crédito tributário no valor de R$ 26.816,60(vinte e seis mil, oitocentos e dezesseis reais e sessenta centavos), sendo R$ 13.408,30(treze mil, quatrocentos e oito reais e trinta centavos),de ICMS, por infringência ao art. 158, I e art. 160, I, c/fulcro art. 646, todos do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto nº 18.930/97, e R$ 13.408,30(treze mil, quatrocentos e oito reais e trinta centavos),de multa por infração, arrimada no art. 82, V, “f”, da Lei nº 6.379/96.

Ao tempo em que cancelo, por indevido, o crédito tributário no montante de R$ 4.632.862,08 (quatro milhões, seiscentos e trinta e dois mil, oitocentos e sessenta e dois reais e oito centavos), sendo R$ 2.316.431,04 (dois milhões, trezentos e dezesseis mil, quatrocentos e trinta e um reais e quatro centavos), de ICMS e R$ 2.316.431,04 (dois milhões, trezentos e dezesseis mil, quatrocentos e trinta e um reais e quatro centavos) de multa por infração, pelas razões acima evidenciadas.

Tribunal Pleno, Sala das Sessões Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em 24 de maio de 2019.

 

 

PETRONIO RODRIGUES LIMA

          Conselheiro relator

Processo nº 0539582017-5

TRIBUNAL PLENO

1ªRecorrente: GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULG. DE PROCESSOS FISCAIS – GEJUP

1ªRecorrida: MAGNO NASCIMENTO & CIA LTDA           

2ªRecorrente: MAGNO NASCIMENTO & CIA LTDA         

2ªRecorrida: GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULG. DE PROCESSOS FISCAIS - GEJUP

Preparadora: SUBGER. DA REC. DE RENDAS DA GER. REG. DA PRIMEIRA REGIÃO

Autuante: WADIH DE ALMEIDA SILVA

Relatora do voto divergente: CONS. GÍLVIA DANTAS MACEDO

 

                                                                                       

FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO. OMISSÃO DE SAÍDAS PRETÉRITAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS SEM PAGAMENTO DO IMPOSTO DEVIDO. DENÚNCIA CONFIGURADA EM PARTE. CONTA MERCADORIAS.  INFRAÇÃO NÃO CARACTERIZADA. AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE. ALTERADA DE OFÍCIO A DECISÃO RECORRIDA QUANTO AOS VALORES. RECURSOS HIERÁRQUICO E VOLUNTÁRIO DESPROVIDOS.

Em relação a contribuintes optantes pelo regime de recolhimento do imposto pelo Simples Nacional, no caso de omissões de receitas, não comporta aplicação de alíquotas inerentes a este regime de tributação, e sim àquela aplicável às demais pessoas jurídicas, na forma prevista na Lei Complementar nº 123/2006.

A falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios conduz à presunção de saídas de mercadorias tributáveis sem pagamento do imposto estadual. “In casu”, as provas apresentadas pelo contribuinte foram suficientes para demonstrar a inexistência em parte de repercussão tributária, o que acarretou, “ipso facto”, o cancelamento parcial do crédito tributário relativo a esta denúncia.

A existência de CMV negativo em um determinado exercício representa uma patologia fiscal que denuncia indício tributário, onde, no entanto, o procedimento, da Conta Mercadoria não possibilita a exigência do imposto pelo simples fato de apresentar negatividade no custo mercantil das operações, fato ocorrido sobre o exercício de 2012. Portanto, mantida decisão da instância “a quo”.

- A técnica da Conta Mercadorias – Lucro Presumido não é aplicável para contribuinte do Simples Nacional, uma vez que a obrigação de obter lucro bruto de no mínimo 30% sobre o CMV - custo das mercadorias vendidas  se evidencia incompatível e em total dissonância com o que estabelece a Lei Complementar nº 123/06.

 

 

 

RELATÓRIO

 

Em análise nesta Corte os recursos hierárquico e voluntário, interpostos nos termos dos artigos 77 e 80 da Lei nº 10.094/2013, contra decisão monocrática que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000769/2017-11, lavrado em 17 de abril de 2017, em desfavor da empresa, MAGNO NASCIMENTO & CIA LTDA, inscrição estadual nº 16.114.724-0, no qual constam as seguintes acusações, ipsis litteris:

 

0009 – FALTA DE LANÇAMENTO DE N. F. DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS PRÓPRIOS >> Aquisição de mercadorias com recursos advindos de omissões de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis ou a realização de prestações de serviços tributáveis sem o pagamento do imposto devido, constatada pela falta de registro de notas fiscais nos livros próprios.

 

Nota Explicativa:

“AQUISIÇÃO DE MERCADORIAS COM RECURSOS ADVINDOS DE OMISSÕES DE SAÍDAS, REFERENTE EXERCÍCIO 2013.”

 

0027 – OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – CONTA MERCADORIAS >> Contrariando dispositivos legais, o contribuinte omitiu saídas de mercadorias tributáveis, resultando na falta de recolhimento do ICMS. Irregularidade esta detectada através do levantamento Conta Mercadorias.

 

Nota Explicativa:

“OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS, EXERCÍCIOS 2012 E 2014.”

 

Em decorrência destes fatos, o representante fazendário lançou um crédito tributário na quantia total de R$ 4.659.678,68, sendo R$ 2.329.839,34, de ICMS, por infringência aos art. 158, I; art. 160, I c/ fulcro no art. 643, § 4º, II e 646, parágrafo único, todos do RICMS/PB, e multa por infração de igual valor, com fulcro no art. 82, V, “f” e “a”, da Lei nº 6.379/96.

Documentos instrutórios acostados às fls. 10-27, do libelo.

Depois de cientificada por via postal (fl. 28 e 29), em 15 de maio de 2017, nos termos do artigo 46, II, da Lei nº 10.094/13, a autuada, por intermédio de sua representante legal, apresentou impugnação tempestiva contra os lançamentos dos créditos tributários consignados no Auto de Infração em análise (fls. 32-70), protocolada em 9 de junho de 2017, pugnando pela improcedência do feito fiscal.

Sem informação de existência de antecedentes fiscais (fl. 71), foram os autos conclusos (fl. 72) e remetidos à Gerência Executiva de Julgamento de Processos Fiscais.

Acostado aos autos, documentos e CD, pela recorrente, em 22/6/2017, fls. 75-152.

Os autos foram distribuídos à julgadora fiscal, Rosely Tavares de Arruda, que decidiu pela procedência parcial da exigência fiscal, com recurso de ofício, conforme ementa abaixo transcrita:

 

PRESUNÇÃO LEGAL DE OMISSÃO DE VENDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS. FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO. INFRAÇAO CARACTERIZADA EM PARTE. CONTA MERCADORIAS. CMV NEGATIVO. INFRAÇÃO MANTIDA PARCIALMENTE.

Caracterizada a omissão de saídas tributáveis, decorrente da falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios. In casu, o contribuinte apresentou argumentos e provas que levaram a derrocada de parte dos créditos lançados na inicial.

As diferenças apuradas no Levantamento da Conta Mercadorias ensejam a ocorrência de omissão de saídas tributáveis sem o pagamento do imposto, conforme presunção relativa contida na legislação de regência. A ocorrência de CMV negativo acarretou a inviabilidade da técnica de auditoria do Levantamento da Conta Mercadorias quanto ao exercício fiscalizado de 2012.

 

                               

AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE.

 

Cientificada da decisão proferida pela instância singular, em 28 de novembro de 2017[2], da decisão proferida pela instância singular e inconformada com os termos da sentença, a autuada, por intermédio de sua representante legal, interpôs, em 28 de dezembro de 2017, recurso voluntário, tempestivo, ao Conselho de Recursos Fiscais do Estado da Paraíba.

 

Quanto à delação de falta de lançamento de n. f. de aquisição nos livros próprios, relata que a maior parte das notas, supostamente, não escrituradas diz respeito a uso e consumo, atividade que não repercute em obrigação de recolher ICMS, corroborando com o entendimento da cobrança da multa por descumprimento de obrigação acessória.

 

Quanto às demais notas que, embora não escrituradas, foram tributadas nas saídas, razão pela qual deve ser mantida apenas a multa por descumprimento de obrigação acessória.

 

Relata que a maior controvérsia diz respeito à presunção de que houve omissão de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis, pois a autoridade fiscalizatória partiu da premissa de que a recorrente contava com um estoque bem maior do que o real, no exercício de 2014. Tendo ocorrido um erro de digitação, em um item específico, qual seja, mangueira pneumática preta, inserindo-se a uma quantidade absurda. Tratando-se de um produto que sequer é vendido com frequência.

 

Requer, também, que seja afastada a aplicação da alíquota de 17%, vez que se trata de empresa do Simples Nacional.

 

Por fim, a recorrente requer a improcedência do feito fiscal e a realização de sustentação oral.

 

Ato contínuo, os autos foram distribuídos a esta relatoria, segundo critério regimentalmente previsto, para apreciação e julgamento.

 

Considerando o pedido da recorrente sobre concessão de oportunidade para a realização de uma provável sustentação oral, foi solicitado parecer prévio à Assessoria Jurídica, fl. 202, desta Corte, que o fez mediante o documento acostado, opinando pela legalidade do procedimento administrativo tributário, fls. 205-210, do libelo.

 

Por ocasião do julgamento neste Tribunal Administrativo, iniciado em 28/12/2018, foi realizada a sustentação oral pela sua representante legal, que reforçou a tese de ter ocorrido erro de digitação em fevereiro/2013, em um dos itens de seu estoque (Mangueira 1,0 m de Alta Pressão), que elevou seu valor a patamares bem acima do razoável, influenciando consideravelmente nos resultados das Contas Mercadorias realizadas pela fiscalização.

 

Em razão de seus argumentos, foi solicitado diligência no sentido de demonstrar a recomposição do estoque corrigido na sua EFD, provando o erro alegado, conforme documento às fls. 212 e 213. Em resposta, a empresa junta mídia em CD-R, contendo a EFD corrigida e notas fiscais das operações com o item questionado, retornando os autos para análise e julgamento.

 

 

Este é o RELATÓRIO.

 

VOTO

 

A matéria em apreciação versa sobre as denúncias de: a) falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios e b) Omissão de Saídas de Mercadorias Tributáveis – Conta Mercadorias, formalizadas em desfavor da empresa, MAGNO NASCIMENTO & CIA LTDA, inscrição estadual nº 16.114.724-0, já previamente qualificada nos autos.

Inicialmente, cumpre-me declarar que a peça acusatória apresenta-se apta a produzir os regulares efeitos inerentes ao aspecto formal do ato administrativo, visto que sua confecção observa os requisitos indispensáveis de constituição e desenvolvimento válido do processo: identificação das operações promovidas, base de cálculo, alíquota aplicável e período do fato gerador omitido (exercício fiscal), o que atende aos pressupostos de validade do lançamento de ofício dispostos no art. 142 do CTN, in verbis:

 

Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.

 

Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional.

 

No que diz respeito à Lei nº 10.094, de 27 de setembro de 2013, os artigos 14 a 17 elencam as situações em que o ato administrativo poderá ser anulado. Vejamos o texto legal abaixo:

 

Art. 14. São nulos:

I - os atos e termos lavrados por pessoa incompetente;

II - os despachos e decisões proferidas por autoridade incompetente;

III - os lançamentos cujos elementos sejam insuficientes para determinar a matéria objeto da exigência tributária e o respectivo sujeito passivo, ressalvada, quanto à identificação deste, a hipótese de bens considerados abandonados;

IV - os despachos e as intimações que não contenham os elementos essenciais ao cumprimento de suas finalidades;

V - os autos de infração de estabelecimentos lavrados pelos auditores fiscais tributários estaduais de mercadorias em trânsito.

 

§ 1º A nulidade de qualquer ato só prejudica os posteriores que dele diretamente dependam ou lhes sejam consequentes.

§ 2º Ao declarar a nulidade, a autoridade fiscal julgadora competente indicará os atos por ela atingidos, ordenando as providências necessárias ao prosseguimento ou solução do processo.

 

Art. 15. As incorreções, omissões ou inexatidões, que não importem nulidade, serão sanadas quando não ocasionarem prejuízo para a defesa do administrado, salvo, se este lhes houver dado causa ou quando influírem na solução do litígio.

 Parágrafo único. Sem prejuízo do disposto no “caput”, não será declarada a nulidade do auto de infração sob argumento de que a infração foi descrita de forma genérica ou imprecisa, quando não constar da defesa, pedido neste sentido.

 

Art. 16. Os lançamentos que contiverem vício de forma devem ser considerados nulos, de ofício, pelos Órgãos Julgadores, observado o disposto no art. 15 desta Lei.

 

Art. 17. Está incluído na hipótese prevista no art. 16 desta Lei, o Auto de Infração lavrado em desacordo com os requisitos obrigatórios estabelecidos no art. 142 do Código Tributário Nacional, quanto:

 I - à identificação do sujeito passivo;

 II - à descrição dos fatos;

 III - à norma legal infringida;

 IV - ao nome, ao cargo, ao número de matrícula e à assinatura do autor do feito;

 V - ao local, à data e à hora da lavratura;

 VI - à intimação para o sujeito passivo pagar, à vista ou parceladamente, ou impugnar a exigência, no prazo de 30 (trinta) dias, contado a partir da data da ciência do lançamento.

 

Nesse norte, percebe-se que a peça vestibular trouxe, devidamente, a indicação da pessoa do infrator, a natureza da infração, não se verificando quaisquer incorreções capazes de provocar a nulidade por vício formal da autuação, conforme se extrai dos artigos transcritos acima, tanto do Código Tributário Nacional (CTN), como da Lei nº 10.094/2013.

 

Preliminar

 

 

Impossibilidade de aplicação da Legislação Estadual para empresas optantes pelo Simples Nacional.

 

Quanto ao argumento, suscitado pela recorrente, especificamente no que se refere à aplicação dos percentuais previstos nos anexos I ou II da Lei Complementar nº 123/2006 em substituição à alíquota de 17% (dezessete por cento), pelo fato de se encontrar a empresa enquadrada no regime de tributação do Simples Nacional, vislumbramos não ser possível sua acolhida.

Isto porque as acusações descritas no Auto de Infração referem-se a omissões de saídas detectadas pela fiscalização quando verificada a existência de notas fiscais de aquisição que não foram escrituradas nos livros próprios do contribuinte, bem como quando identificada a diferença tributável no Levantamento da Conta Mercadorias e, para estes casos, o artigo 13, § 1º, “f”, da LC nº 123/06 determina seja utilizada a legislação tributária aplicável às demais pessoas jurídicas. Senão vejamos:

Art. 13.  O Simples Nacional implica o recolhimento mensal, mediante documento único de arrecadação, dos seguintes impostos e contribuições:

(...)

§ 1o O recolhimento na forma deste artigo não exclui a incidência dos seguintes impostos ou contribuições, devidos na qualidade de contribuinte ou responsável, em relação aos quais será observada a legislação aplicável às demais pessoas jurídicas:

(...)

XIII - ICMS devido:

(...)

f) na operação ou prestação desacobertada de documento fiscal; (g. n.)

O comando normativo insculpido no dispositivo acima transcrito não deixa dúvidas quanto à necessidade de deslocamento da sistemática de apuração do ICMS para o regime geral quando o contribuinte, enquadrado como Simples Nacional, realiza quaisquer das condutas descritas no inciso XIII do § 1º do artigo 13, da Lei Complementar nº 123/2006.

É exatamente esta a regra adotada quando, por exemplo, o Simples Nacional atua como substituto tributário ou quando realiza uma operação de importação. Em todos estes casos (incluindo as condutas descritas no Auto de Infração), deve-se observar a legislação aplicável às demais pessoas jurídicas.

Ressalte-se que não estamos diante de um conflito aparente de normas, muito menos de aplicação de lei mais gravosa ao contribuinte. É o próprio princípio da especialidade (observância à LC nº 123/06) que impõe aos destinatários da norma a obrigatoriedade de observar as regras gerais, sempre que o contribuinte realizar uma conduta que se amolde perfeitamente às situações descritas no artigo 13, § 1º, XIII, da LC nº 123/06 (fenômeno da subsunção).

A matéria já fora analisada em diversas oportunidades por este Colegiado, que, de forma reiterada, vem decidindo acerca do afastamento da LC nº 123/06 nos casos em que se constate haver o contribuinte omitido saídas tributadas, a exemplo do Acórdão CRF n° 006/2018, da relatoria deste relator, que assim dispõem:

 

OMISSÃO DE VENDAS. OPERAÇÕES COM CARTÕES DE CRÉDITO E DÉBITO. INFRAÇÃO CARACTERIZADA. SIMPLES NACIONAL. ALÍQUOTA APLICÁVEL ÀS DEMAIS PESSOAS JURÍDICAS.  MANTIDA A DECISÃO RECORRIDA. AUTO DE INFRAÇÃO PROCEDENTE. RECURSO VOLUNTÁRIO DESPROVIDO.

Declaração de vendas pelo contribuinte em valores inferiores aos fornecidos pelas administradoras de cartões de crédito e débito autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis, sem pagamento do ICMS, ressalvado ao sujeito passivo as provas da improcedência da acusação, o que não ocorreu no presente caso.

Na acusação de omissão de saídas de mercadorias tributáveis, em relação a  contribuintes optantes pelo regime recolhimento do imposto pelo Simples Nacional, não comporta aplicação de alíquotas inerentes a este regime de tributação, e sim àquela aplicável às demais pessoas jurídicas, na forma prevista na Lei Complementar nº 123/2006.

 

No caso dos autos, verifico que o contribuinte só passou a ser optante pela sistemática do Simples Nacional a partir de 1º/1/2014, alcançada apenas pela acusação de omissão de vendas detectada pela técnica da Conta Mercadorias, não apropriada para o caso em questão, como adiante comento.

 

 

Razões Meritórias

 

Falta de Lançamento de Notas Fiscais de Aquisição nos Livros Próprios

 

A suposta irregularidade foi constatada a partir da detecção, por parte da fiscalização, de que o contribuinte teria deixado de lançar diversas notas fiscais de aquisição nos livros próprios nos meses de janeiro a setembro de 2013. Esta conduta omissiva fez surgir a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto correspondente, obrigação principal, nos termos do que dispõem os artigos 3º, § 8º, da Lei nº 6.379/96 e 646 do RICMS/PB:

 

Lei nº 6.379/96:

 

Art. 3º O imposto incide sobre:

(...)

§ 8º O fato de a escrituração indicar insuficiência de caixa e bancos, suprimentos a caixa e bancos não comprovados ou a manutenção no passivo de obrigações já pagas ou inexistentes, bem como a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas ou de declarações de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito, autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou de prestações de serviços sem o recolhimento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção.

 

RICMS/PB:

 

Art. 646. Autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou a realização de prestações de serviços tributáveis sem o recolhimento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção:

I – o fato de a escrituração indicar:

a) insuficiência de caixa;

b) suprimentos a caixa ou a bancos, não comprovados;

II – a manutenção no passivo de obrigações já pagas ou inexistentes;

III – qualquer desembolso não registrado no Caixa;

IV – a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas; ( g. n.)

V – declarações de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito.

 

Parágrafo único. A presunção de que cuida este artigo aplica-se, igualmente, a qualquer situação em que a soma dos desembolsos no exercício seja superior à receita do estabelecimento, levando-se em consideração os saldos inicial e final de caixa e bancos, bem como, a diferença tributável verificada no levantamento da Conta Mercadorias, quando do arbitramento do lucro bruto ou da comprovação de que houve saídas de mercadorias de estabelecimento industrial em valor inferior ao Custo dos Produtos Fabricados , quando da transferência ou venda, conforme o caso.

 

Por imperativo legal, a constatação desta omissão obriga o auditor fiscal a lançar, de ofício, o crédito tributário decorrente desta infração, tendo em vista a receita marginal originária das saídas omitidas afrontar o disciplinamento contido nos art. 158, I, e art. 160, I, ambos do RICMS/PB, os quais transcrevemos a seguir:

 

Art. 158. Os contribuintes, excetuados os produtores agropecuários, emitirão Nota Fiscal, modelos 1 ou 1-A, Anexos 15 e 16:

 

I - sempre que promoverem saída de mercadorias;

 

Art. 160. A nota fiscal será emitida:

 

I - antes de iniciada a saída das mercadorias;

 

Para aqueles que incorrerem na conduta descrita nos artigos anteriormente reproduzidos, a Lei nº 6.379/96, em seu artigo 82, V, “f”, estabelece a seguinte penalidade:

 

Art. 82. As multas para as quais se adotará o critério referido no inciso II, do art. 80, serão as seguintes:

(...)

V - de 100% (cem por cento):

(...)

f) aos que deixarem de recolher o imposto proveniente de saída de mercadoria, dissimulada por receita de origem não comprovada, inclusive a representada por despesa realizada a descoberto de caixa, pela existência de passivo fictício ou por qualquer forma apurada através de levantamento da escrita contábil;

 

A presunção de que trata o artigo 646 do RICMS/PB, contudo, é relativa, cabendo a prova da sua improcedência ao contribuinte, conforme prevê a parte final do caput do referido dispositivo.

No que se refere à sistemática de apuração do tributo devido, é importante esclarecermos que, para a falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios, o artigo 646 do RICMS/PB autoriza a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou a realização de prestações de serviços tributáveis sem o recolhimento do imposto.

 

Este comando normativo, ao garantir o direito à Fazenda Pública de recuperar o ICMS incidente sobre operações pretéritas, o fez presumindo que todas elas foram realizadas com mercadorias tributáveis.

 

Assim, a exigência dos créditos não está relacionada diretamente às mercadorias consignadas nas notas fiscais não escrituradas, mas sim a operações pretéritas, cujas receitas não foram oferecidas à tributação e que possibilitaram ao contribuinte adquirir as mercadorias que se encontram descritas nas notas fiscais. Ou seja, o fato de algumas notas fiscais acobertarem aquisição de bens para o uso e consumo da empresa não afasta a presunção legal insculpida no artigo 646 do RICMS/PB.

 

Após analisar as provas apresentadas pela defesa, a julgadora monocrática, fl. 157, ao identificar que teve uma nota fiscal lançada na EFD em junho de 2013, outra cuja natureza da operação diz respeito à remessa em garantia e a terceira nota foi cancelada, acertadamente, afastou os créditos tributários a elas relativos, mantendo a denúncia quanto aos demais documentos fiscais, diante da falta de provas apresentadas pela defesa.

 

Destarte, corroboro com os ajustes realizados pela instância singular.

 

Assim sendo, quanto a esta delação, ratifico a decisão proferida em primeira instância, que a julgou parcialmente procedente, passando o crédito tributário a apresentar a seguinte composição:

 

INFRAÇÃO

PERÍODO

NOTA   FISCAL (mantida a acusação)

BASE DE CALCULO

ICMS

MULTA

Falta de Lançamento de N.F   de aquisição

JAN/13

615

           924,40

             157,15

              157,15

Falta de Lançamento de N.F   de aquisição

FEV/13

7887 e 7889

   59.979,76

     10.196,56  

        10.196,56

Falta de Lançamento de N.F   de aquisição

MAR/13

-

-

-

-

Falta de Lançamento de N.F   de aquisição

ABR/13

2363

           675,00

             114,75

              114,75

Falta de Lançamento de N.F   de aquisição

MAI/13

2174 e 5799

   12.790,65

          2.174,41

           2.174,41

Falta de Lançamento de N.F   de aquisição

JUN/13

274

      2.962,50  

             503,63

              503,63

Falta de Lançamento de N.F   de aquisição

JUL/13

280

      1.250,00  

             212,50

              212,50

Falta de Lançamento de N.F   de aquisição

SET/13

322

         290,00

               49,30

                49,30

 

 

 

Omissão de Saídas de Mercadorias Tributáveis – CONTA MERCADORIAS. Exercícios 2012 e 2014.

 

A Conta Mercadorias – Lucro Presumido é uma técnica fiscal que se aplica aos casos em que o contribuinte não possui contabilidade regular, circunstância em que se arbitra o lucro de 30% (trinta por cento) sobre o Custo das Mercadorias Vendidas - CMV. Caso, o valor das vendas seja inferior ao CMV acrescido deste lucro, a legislação tributária estadual autoriza a fiscalização a lançar mão da presunção de que houve saídas de mercadorias tributáveis sem pagamento do imposto devido, nos termos do que dispõem os artigos 3º, §§ 8º e 9º, da Lei nº 6.379/96 e 646 do RICMS/PB, supracitado, e art. 643, § 4º, II do RICMS/PB, verbis:

 

 

RICMS/PB:

 

Art. 643. No interesse da Fazenda Estadual, será procedido exame nas escritas fiscal e contábil das pessoas sujeitas à fiscalização, especialmente no que tange à exatidão dos lançamentos e recolhimento do imposto, consoante as operações de cada exercício.

(...)

§ 3º No exame da escrita fiscal de contribuinte que não mantenha escrituração contábil regular devidamente registrada na Junta Comercial, será exigido o livro Caixa, devidamente autenticado pela repartição fiscal do domicílio do contribuinte, com a escrituração analítica dos recebimentos e pagamentos ocorridos em cada mês.

§ 4º Para efeito de aferição da regularidade das operações quanto ao recolhimento do imposto, deverão ser utilizados, onde couber, os procedimentos abaixo, dentre outros, cujas repercussões são acolhidas por este Regulamento:

(...)

II - o levantamento da Conta Mercadorias, caso em que o montante das vendas deverá ser equivalente ao custo das mercadorias vendidas (CMV) acrescido de valor nunca inferior a 30% (trinta por cento) para qualquer tipo de atividade, observado o disposto no inciso III do parágrafo único do art. 24.

 

Quanto ao Levantamento da Conta Mercadorias, no exercício 2012, período em que o contribuinte pertencia ao regime norma de tributação, corroboro com o entendimento da instância monocrática ao excluir da exordial o crédito tributário no valor total de R$ 2.132.158,08, visto que, o resultado negativo do Custo de Mercadoria Vendidas, neste exercício, caracteriza uma figura anômala, que torna a técnica de apuração da situação fiscal do contribuinte, empregada pela Fiscalização, imprópria a evidenciar a falta denunciada, diante que esse resultado é indicativo apenas de indícios da existência de irregularidade distinta na delatada.

 

Portando, quanto ao resultado apontado, no procedimento relativo ao exercício de 2012, não há como considerar que este configura diferença tributável, mas tão-somente indícios de irregularidades que demandam apuração fiscal mediante aplicação de técnica de fiscalização distinta do Levantamento da Conta Mercadorias.

        

Nesse sentido entende este Conselho de Recursos Fiscais, conforme se infere nas decisões abaixo:

 

“OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁRIAS. REJEITADA PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA. CONTA MERCADORIAS. NOTAS FISCAIS NÃO LANÇADAS. CONCORRÊNCIA. SANEAMENTO. PARCIALIDADE. LEVANTAMENTO FINANCEIRO. OMISSÃO. REDUÇÃO DA MULTA APLICADA. ALTERADA, QUANTO AOS VALORES, A DECISÃO RECORRIDA. AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE. RECURSO HIERÁRQUICO E VOLUNTÁRIO PROVIDO EM PARTE.

- Não acolhimento da preliminar arguida, diante da inexistência de obstáculos ou vícios procedimentais cometidos pela fiscalização capaz de prejudicar o contribuinte no seu direito de tomar conhecimento da ação fiscal e do devido processo administrativo tributário instaurado, havendo perfeita sintonia aos princípios que regem o contencioso tributário do Estado da Paraíba, não ocorrendo medida de cerceamento a ampla defesa e a ao contraditório.

- Mantida a parcialidade da exigência fiscal sobre a constatação de aquisição de mercadorias com recursos de omissões de saídas pretéritas, em face da falta de registro de notas fiscais nos livros próprios, expurgando as que tiveram comprovação de concorrência de infração, decorrente de saneamento processual.

- Comprovação de déficit financeiro em decorrência das despesas incorridas superarem as receitas declaradas no exercício de 2005, eclodindo a presunção prevista pela legislação de regência.

- Reputa-se regular o lançamento compulsório consistente no levantamento da Conta Mercadorias efetuado com base no arbitramento do lucro bruto, diante da falta de uma escrituração contábil regular, sendo excluída a exação sobre o exercício de 2008, por representar procedimento fiscal que apresentou CMV negativado, mantendo-se os demais procedimentos que oferecem suporte à acusação de omissão de saídas tributáveis.

- Redução da penalidade aplicada na forma disciplinada pela edição da Lei n° 10.008/2013”.

(Acórdão CRF/PB nº 490/2014, relator Cons. João Lincoln Diniz Borges. DOE de 7/12/2014).

 

“OMISSÃO DE SAÍDAS. CONTA MERCADORIAS. CMV NEGATIVO. MANTIDA A DECISÃO RECORRIDA. AUTO DE INFRAÇÃO PROCEDENTE EM PARTE. RECURSO HIERÁRQUICO DESPROVIDO.

A existência de CMV negativo em um determinado exercício representa uma patologia fiscal que denuncia indício tributário, onde, no entanto, o procedimento, da Conta Mercadoria não possibilita a exigência do imposto pelo simples fato de apresentar negatividade no custo mercantil das operações, fato ocorrido sobre o exercício de 2008. Manutenção do resultado fiscal apurado sobre o exercício de 2010 por espelhar a legalidade de aplicação da técnica fiscal. Redução da multa incidente em face do advento da Lei ° 10.008/2013” (Acórdão CRF/PB nº 386/2014, relator Cons. João Lincoln Diniz Borges. DOE de 28/10/2014).

 

 

Quanto ao exercício de 2014, o contribuinte argumenta que o Levantamento da Conta Mercadorias está equivocado, pois a maior controvérsia diz respeito à presunção de que houve omissão de saídas de mercadorias tributáveis, em razão que a fiscalização partiu da premissa de que a recorrente contava com um estoque bem maior do que o real. Tendo ocorrido um erro de digitação, em relação ao item, mangueira pneumática preta, inserindo-se a uma quantidade absurda de 1.995.990,00 metros.

 

Consta dos autos declaração da empresa Chianca Softwares, dirigida à Receita Estadual da Paraíba, relatando que o produto mangueira Magno Alta Pressão foi informada nos arquivos da empresa em quantidade bem superior a existente fisicamente, devido a um lapso no sistema de banco de dados, que ao integrar as informações salvou uma quantidade incorreta, gerando uma informação não condizente com a quantidade real.

 

Em consulta ao Sistema ATF, da Secretaria de Estado da Receita da Paraíba, identifica-se que o auditor fiscal, ao alocar valores nas rubricas que compõem a Conta Mercadorias, registrou os declarados pela recorrente nos seus arquivos SPED.

 

Ressalvo, a autuada realizou a retificação de sua declaração, com entrega de EFD substituta, conforme cópia de recibos de entrega anexados nos autos em mídia digital, CD anexado às fls. 76, após a ação fiscal, o que exclui a espontaneidade do contribuinte. Porém, diante da evidente discrepância do valor de estoque do citado item “mangueira de alta pressão” foi aberto diligência para a comprovação do erro de informação persistido pela recorrente em sua sustentação oral.

 

Contudo, o resultado da diligência prescindiu de análise por esta relatoria, pois verifico que o contribuinte autuado passou a ser optante pelo regime simplificado de apuração, SIMPLES NACIONAL, a partir de 1º/1/2014, situação esta que requer uma análise diferenciada quanto à aplicação da Conta Mercadorias - Lucro Presumido.

 

No caso dos autos, o Relator do voto originário - Dr. Petrônio Rodrigues Lima, ao identificar que a empresa autuada era optante pelo regime de recolhimento denominado Simples Nacional (SN), considerou o auto de infração improcedente, ao fundamento de que não se pode aplicar o exame relativo à Conta Mercadorias para empresas do Simples Nacional, posto que tal mecanismo de aferição, com o intuito de detectar a ocorrência ou não de omissão de saídas de mercadorias tributáveis, utiliza uma margem de valor agregado de 30% (trinta por cento) ao custo das mercadorias vendidas, na conformidade da art. 643, § 4º, II, do RICMS/PB, enquanto que, diferentemente desta lei, a Lei Complementar n 123/06, que trata do Simples Nacional, não prevê qualquer disposição normativa obrigando o contribuinte a ter uma margem de lucro bruto igual ou superior a 30%.

 

Ou seja, no entender do Preclaro Relator do voto, estando encerrada a fase de tributação para todos os entes federados, não caberia exigir-se uma obrigação disposta na lei geral – Decreto nº 18.930/97 – quando, em verdade, a lei especial, que afasta a incidência da geral, não prevê qualquer disposição normativa obrigando o contribuinte a ter lucro bruto igual ou superior a 30%. Assim, em respeito ao Princípio da Especialidade (segundo o qual a norma especial afasta a incidência da norma geral) a denúncia de omissão de receitas com base no Levantamento da Conta Mercadorias não teria como se manter, no dizer do eminente Relator.

 

Divirjo do entendimento do Relator do Voto, todavia, pelas razões que passarei a expor.

 

A bem de ver, é a Conta Mercadorias técnica de aferição amparada em presunção legal, cujo objetivo é apurar, com base em um parâmetro percentual sugerido em lei para a margem de lucro bruto, a regularidade fiscal das operações de saídas de mercadorias tributáveis. Tudo na conformidade do que preceitua art. 643,§ 4º, II c/c art. 646 do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto 18.930/96.

 

A sua vez, a Lei Complementar nº 123/06 - Lei do Simples Nacional - dispõe taxativamente, em seu art. 34, que as microempresas e as empresas de pequeno porte estão sujeitas a todas as presunções de omissão de receitas existentes nas legislações de regência dos impostos e contribuições incluídos no Simples Nacional.

 

Assim, dada a leitura das normas supracitadas – de que as empresas inseridas no SN estão sujeitas a todas as presunções de omissão de receita existente nas legislações de regência dos impostos (LC 123/06), e, bem assim, de que é legítima a presunção de omissão de receitas e exigência do imposto por meio do levantamento da Conta Mercadorias (RICMS/PB) – poderíamos concluir, ainda que tal se revele um equívoco, como veremos mais à frente, que o procedimento do Levantamento da Conta Mercadorias seria perfeitamente aplicável às empresas do Simples Nacional. Noutras palavras, num exame muito superficial, e partindo-se de interpretação literal das normas acima citadas, poderíamos pensar correta a decisão de primeiro grau que considerou legítima a utilização do Levantamento da Conta Mercadorias na auditoria da autuada, empresa inserta no Simples Nacional.

 

                               Ocorre, porém, que, não obstante a redação dos dispositivos de lei supracitados, não há negar que, especificamente a Conta Mercadorias depende, para fazer eclodir a denúncia de omissão de receitas, da manutenção de uma margem de lucro mínima de 30% sobre o chamado Custo das Mercadorias Vendidas – o CMV. Ou seja, para que o contribuinte seja considerado regular perante a Fazenda Estadual, é preciso que obtenha um lucro de 30% sobre o Custo das Mercadorias Vendidas, cujo percentual, convém lembrar, tem uma razão de ser, isto é, destina-se a fazer frente às despesas do contribuinte.

 

Este aspecto em particular - a exigência de uma margem de lucro mínima de 30% para empresas do SN - assume contornos relevantes na disciplina da matéria, porquanto a legislação concernente a esse regime de tributação, a LC 123/06, não obriga a que o contribuinte obtenha tal lucro. Ao revés, libera a empresa de manter um lucro real ou presumido, até porque, é bem verdade, não poderia ser diferente, já que se trata de um regime de tributação diverso daqueles outros nos quais há a obrigatoriedade, pela legislação do Imposto de Renda, para que se apure o lucro real e lucro presumido, conforme o caso.

 

  Considerando esse fato - ausência de exigência legal de obtenção de lucro, e mais que isso, do lucro mínimo de 30%, seja na lei federal do Imposto de Renda ou na lei regente do Simples Nacional – resta-nos decidir se ainda assim é cabível a exigência imposta pela lei do ICMS, especialmente porque a subsunção do fato à norma de regência – omissão de receitas – somente ocorre se o contribuinte não alcançar a margem mínima de lucro prevista pela lei estadual.

 

A primeira reflexão importante neste caso é que, se a LC 123/06 determina que a tributação/recolhimento do ICMS por este contribuinte em particular – isto é, aquele beneficiado pelo sistema do Simples Nacional - seja realizada com base no valor do faturamento da empresa e que, ademais, está dispensado de contabilidade regular, é de fato incabível interpretação de que a lei estadual possa conter exigência de que esse mesmo contribuinte pratique uma margem de lucro de 30% sobre o Custo de Mercadorias Vendidas.

 

Note-se, porque relevante, que as empresas do SN estão dispensadas de manter contabilidade regular e que somente esta providência seria capaz de afastar a presunção relativa detectada por meio da Conta Mercadorias – lucro presumido (objeto dos autos). Nessa linha de raciocínio, convenhamos, não poderia se manter uma exigência de imposto do contribuinte mediante um exame de auditoria cuja principal maneira de afastar seria a presença da contabilidade.

 

A propósito do mesmíssimo tema, trazemos trecho de voto já antes proferido por este mesmo Conselho de Recursos Fiscais, e que traz importantes considerações para elucidação do caso:

“O RICMS/PB, em seu artigo 643, §§ 3º e § 4º, disciplina que, no exame da escrita fiscal de contribuinte que não mantenha escrituração contábil regular devidamente registrada na Junta Comercial, para efeito de aferição da regularidade das operações quanto ao recolhimento do imposto, deverão ser utilizados, onde couberem, os seguintes procedimentos:

c)        Elaboração de Demonstrativo Financeiro, através do qual deverão ser evidenciadas todas as receitas e despesas, bem como a disponibilidade financeira existente em Caixa e Bancos, devidamente comprovada, no início e no final do período fiscalizado;

d)       Levantamento da Conta Mercadorias, caso em que o montante das vendas deverá ser equivalente ao custo das mercadorias vendidas (CMV) acrescido de valor nunca inferior a 30% (trinta por cento) para qualquer tipo de atividade, observado o disposto no inciso III do parágrafo único do art. 24.

Ao dispor acerca deste último procedimento, o RICMS/PB, ao estabelecer percentual (30%) a ser acrescido ao Custo de Mercadorias Vendidas, mostra-se claramente em dissonância com a sistemática estabelecida pela LC nº 123/06.

Importante destacarmos que o RICMS/PB é anterior à LC nº 123/06. Também convém salientarmos que, além de hierarquicamente superior àquele, esta última dispõe sobre matéria de conteúdo especial.

Destarte, sob qualquer princípio que se analise (hierárquico, cronológico ou da especialidade), deve prevalecer a LC nº 123/06, afastando-se o RICMS/PB, naquilo que se mostrar incompatível com a Lei Complementar.

O contribuinte enquadrado como Simples Nacional recolhe o tributo devido sobre o seu faturamento, em observância ao que estabelece o artigo 18, § 3º, da LC nº 123/06:

Art. 18.  O valor devido mensalmente pela microempresa ou empresa de pequeno porte optante pelo Simples Nacional será determinado mediante aplicação das alíquotas efetivas, calculadas a partir das alíquotas nominais constantes das tabelas dos Anexos I a V desta Lei Complementar, sobre a base de cálculo de que trata o § 3o deste artigo, observado o disposto no § 15 do art. 3º.

 

(...)

 

§ 3º Sobre a receita bruta auferida no mês incidirá a alíquota determinada na forma do caput e dos §§ 1º e 2º deste artigo, podendo tal incidência se dar, à opção do contribuinte, na forma regulamentada pelo Comitê Gestor, sobre a receita recebida no mês, sendo essa opção irretratável para todo o ano-calendário.

§ 3º Sobre a receita bruta auferida no mês incidirá a alíquota efetiva determinada na forma do caput e dos §§ 1º, 1º-A e 2º deste artigo, podendo tal incidência se dar, à opção do contribuinte, na forma regulamentada pelo Comitê Gestor, sobre a receita recebida no mês, sendo essa opção irretratável para todo o ano-calendário. (Redação dada pela Lei Complementar nº 155, de 2016)

Destarte, o contribuinte que apura e recolhe o tributo com base nos dispositivos acima reproduzidos, estará em situação regular quanto à obrigação principal à luz da LC nº 123/06.

A cobrança de tributos, por força do que estabelece o artigo 3º do Código Tributário Nacional, é uma atividade administrativa vinculada, não sendo possível ao auditor fiscal agir de forma discricionária.

Esta ressalva se faz necessária para explicar que, no caso em comento, não estamos afastando a aplicabilidade do artigo 643, § 4º, do RICMS/PB, tampouco deixando ao talante da autoridade fiscal a possibilidade de “escolher” quando utilizá-la. Uma análise mais atenta do dispositivo citado nos permite concluir que a solução para a questão extrai-se do § 4º do referido artigo. Vejamos:

Art. 643. No interesse da Fazenda Estadual, será procedido exame nas escritas fiscal e contábil das pessoas sujeitas à fiscalização, especialmente no que tange à exatidão dos lançamentos e recolhimento do imposto, consoante as operações de cada exercício.

 

(...)

 

§ 3º No exame da escrita fiscal de contribuinte que não mantenha escrituração contábil regular devidamente registrada na Junta Comercial, será exigido o livro Caixa, devidamente autenticado pela repartição fiscal do domicílio do contribuinte, com a escrituração analítica dos recebimentos e pagamentos ocorridos em cada mês.

 

§ 4º Para efeito de aferição da regularidade das operações quanto ao recolhimento do imposto, deverão ser utilizados, onde couber, os procedimentos abaixo, dentre outros, cujas repercussões são acolhidas por este Regulamento:

 

I - a elaboração de Demonstrativo Financeiro, através do qual deverão ser evidenciadas todas as receitas e despesas, bem como considerada a disponibilidade financeira existente em Caixa e Bancos, devidamente comprovada, no início e no final do período fiscalizado;

 

II - o levantamento da Conta Mercadorias, caso em que o montante das vendas deverá ser equivalente ao custo das mercadorias vendidas (CMV) acrescido de valor nunca inferior a 30% (trinta por cento) para qualquer tipo de atividade, observado o disposto no inciso III do parágrafo único do art. 24. (g. n.)

Partindo do princípio de que a lei não contém palavras inúteis, a expressão “onde couber” indica que os procedimentos previstos nos inciso I e II do § 4º do artigo 643 do RICMS/PB não são obrigatórios para todo e qualquer exame da escrita fiscal de contribuinte que não mantenha escrituração contábil regular.

Este comando, portanto, não é taxativo e não vincula o auditor fiscal a adotá-los em todas as situações, mas somente nos casos em que “couberem”.

O contribuinte enquadrado como Simples Nacional, como já demonstrado, possui características e regramento próprios, o que o coloca em situação especial, não permitindo a utilização de margem de lucro presumido para fins de surgimento da presunção juris tantum de omissão de receitas.

Na LC nº 123/06, não há qualquer exigência neste sentido para fins de tributação. Apenas no inciso X do seu artigo 29 consta uma referência ao lucro bruto – ainda que de forma indireta -, contudo para efeito de exclusão do regime.

Art. 29. A exclusão de ofício das empresas optantes pelo Simples Nacional dar-se-á quando:

(...)

X – for constatado que durante o ano-calendário o valor das aquisições de mercadorias para comercialização ou industrialização, ressalvadas hipóteses justificadas de aumento de estoque, for superior a 80% (oitenta por cento) dos ingressos de recursos no mesmo período, excluído o ano de início de atividade;

Somente depois de excluído do Simples Nacional, o Fisco está autorizado a lançar mão da Conta Mercadorias – Lucro Presumido para aqueles que não detenham escrita contábil, o que não implica dizer que o contribuinte, enquanto enquadrado na sistemática da LC nº 123/06, esteja “blindado”. A fiscalização tem o poder-dever de verificar a regularidade das operações do contribuinte, utilizando-se, para tanto, dos demais recursos de que dispõe para cumprir o seu mister.”

Como dito acima e se infere dos dispositivos do RICMS/PB, em especial o inciso II do § 4º do artigo 643 do RICMS/PB, o Levantamento de Conta Mercadorias é procedimento que se adota “onde couber”, de modo que, se o contribuinte não é obrigado a manter escrituração contábil regular, dito exame da escrita fiscal não pode e nem deve ter cabimento, sob pena, diga-se, de estar-se ferindo o princípio da segurança jurídica.

Afora tudo isso, chama a atenção também a impossibilidade de aplicar-se a Conta Mercadorias pelo lucro real (caso a empresa, embora desobrigada, tivesse contabilidade regular) notadamente porque, em sendo detectada uma falta de estorno de crédito, tal imposto não poderia ser exigido, pois, como é sabido, a sistemática de tributação não permite que ele se credite ou se debite de imposto. Daí se vê que há de fato uma incompatibilidade na aplicação das contas mercadorias, seja pelo lucro presumido, seja pelo lucro real, às empresas do SN.

 

Não se está a dizer, entretanto, que outras técnicas fiscalizatórias não possam ser aplicadas a tais empresas. Pelo contrário, como dito acima, a possibilidade de aplicação de mecanismos de aferição da regularidade do cumprimento das obrigações por parte dos contribuintes do simples está ressalvada expressamente no art. 34 da Lei Complementar 123/06, redigidos nos seguintes termos:

 

“Art. 34.  Aplicam-se à microempresa e à empresa de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional todas as presunções de omissão de receita existentes nas legislações de regência dos impostos e contribuições incluídos no Simples Nacional.”

 

 Ou seja, a própria legislação específica do SIMPLES tratou de ressaltar a possibilidade de utilização desses mecanismos de apuração. Isso não quer dizer, como já explicado, que todo e qualquer instrumento fiscalizatório adotado para controle dos contribuintes submetidos ao ICMS possam ser aplicados, sem os necessários temperamentos e ajustes, aos integrantes do SIMPLES. Repito, porque importante, as empresas submetidas a esse regime podem ter métodos de controle de suas operações, o que não quer dizer que lhes seja possível aplicar um método que tem por pressuposto o arbitramento de uma margem mínima de agregação para suas operações. É o caso da Conta mercadorias.

 

Ou seja, estamos ponderando, aqui, o cabimento da exigência deste lucro em forma de margem mínima (que dá origem à presunção legal de omissão de receitas). 

 

Já o livro Caixa, este sim, obrigatório por lei, pode e deve ser exigido, pela Fiscalização sempre, sob pena, inclusive, na sua não exibição ou não escrituração, de desenquadramento de tal regime de tributação.

 

Assim considerado, e apenas por caminho diverso, chego às mesmas conclusões do relator originário quanto à imprestabilidade do levantamento de conta mercadorias para empresas optantes do SIMPLES.

 

Cumpre destacar que este caso é, portanto, da utilização de procedimento impróprio para a apuração do crédito, o que corresponde a um defeito do lançamento pertinente à verificação do cálculo do tributo. Em tal circunstância, está na linha dos chamados vícios insanáveis e, por isto, não podem nem ser aproveitados pelo julgador, mediante diligências, nem podem ser refeitos pela autoridade fiscal. Portanto,

 

  Diante de todo o exposto, resta-me afastar o procedimento fiscal, a vista da existência de falha na técnica fiscal adotada, o que caracteriza, no meu sentir, um vicio, de natureza procedimental, pelo que julgo a ação fiscal nula, por vício material, dada a flagrante inobservância aos requisitos elementares dos requisitos elementares de constituição do crédito tributário, consoante inteligência emergente do art. 142 do CTN, in verbis:

                                                                                 

 “Art.   142 – Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o   crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento   administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação   correspondente, determinar a matéria   tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e,   sendo o caso,  propor a aplicação da   penalidade cabível.” (g.n.)

                                                                                                                     

Portanto, em virtude do comprometimento da legitimidade do crédito tributário, motivado em virtude de utilização de procedimento inadequado, de modo a dificultar o ajustamento do fato material à legislação pertinente, procedo à anulação da ação fiscal, ressalvando ao Estado o direito de reaver o procedimento de fiscalização, mediante outra técnica, e, se for o caso, proceder a novo lançamento, caso seja identificada omissão de receitas.

 

De fato, o erro verificado é procedimental, visto que se evidencia na técnica que lhe dá suporte que, em razão da distorção, contaminou a matéria que se pretendeu tributar e, por consequência, calculou um montante indevido de imposto a recolher.

 

     Diante do que, entendo que se caracterizou vício material, visto que atingiu a própria identificação da natureza da infração, e não somente a descrição do fato. Nesta circunstância, impõe-se a decretação da nulidade da ação fiscal, porquanto o lançamento de ofício não apresenta elementos suficientes para determinar a matéria objeto da exigência tributária. Aplicação da norma ínsita no inciso III do art. 14 da Lei Estadual nº 10.094/2013, que nos diz:

 

“Art.14. São nulos:

 

III – os lançamentos cujos elementos sejam insuficientes para determinar a matéria objeto da exigência tributária e o respectivo sujeito passivo, ressalva, quanto à identificação deste, a hipótese de bens considerados abandonados”. (Grifo não constante do original).

 

Todavia, tendo em vista que é de natureza material o vício que inquina o lançamento em referência, já que, como dito anteriormente, a legislação autoriza os demais exames de auditoria a serem aplicados a empresas do Simples Nacional, faço observar que o novo auto de infração, se cabível, teria que ser lavrado dentro do prazo de cinco anos, contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que poderia ter sido efetuado, ou da data da ocorrência do fato gerador, conforme o caso.

 

Com efeito, as nulidades decorrentes de vício material não atraem a aplicação do art. 173, II do CTN, uma vez que essa regra é aplicável às nulidades por vício formal, o que não é o caso dos autos, consoante os fundamentos acima expedidos.

 

Diante do que, reformo a decisão singular, para declarar a nulidade da ação fiscal em relação a esta parte do feito, por ser de justiça.

Destarte, feitos os ajustes necessários, o crédito tributário efetivamente devido pela recorrente evidenciou-se conforme a planilha abaixo:

 

INFRAÇÃO

PERÍODO

ICMS (A.I.)

VALOR EXCLUÍDO

ICMS DEVIDO

MULTA

CRED. TRIB. DEVIDO

OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS - CONTA   MERCADORIAS

01/01/2012

31/12/2012

1.066.079,04

1.066.079,04

-

-

-

OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS - CONTA   MERCADORIAS

01/01/2014

31/12/2014

1.249.332,18

1.249.332,18

-

-

-

FALTA DE LANÇAMENTO DE N.F. DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS   PRÓPRIOS

01/01/2013

31/01/2013

157,15

-

157,15

157,15

314,30

FALTA DE LANÇAMENTO DE N.F. DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS   PRÓPRIOS

01/02/2013

28/02/2013

10.196,56

-

10.196,56

10.196,56

20.393,12

FALTA DE LANÇAMENTO DE N.F. DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS   PRÓPRIOS

01/03/2013

31/03/2013

180,27

180,27

-

-

-

FALTA DE LANÇAMENTO DE N.F. DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS   PRÓPRIOS

01/04/2013

30/04/2013

114,75

-

114,75

114,75

229,50

FALTA DE LANÇAMENTO DE N.F. DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS   PRÓPRIOS

01/05/2013

31/05/2013

2.225,50

51,09

2.174,41

2.174,41

4.348,82

FALTA DE LANÇAMENTO DE N.F. DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS   PRÓPRIOS

01/06/2013

30/06/2013

503,63

-

503,63

503,63

1.007,26

FALTA DE LANÇAMENTO DE N.F. DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS   PRÓPRIOS

01/07/2013

31/07/2013

212,50

-

212,50

212,50

425,00

FALTA DE LANÇAMENTO DE N.F. DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS   PRÓPRIOS

01/09/2013

30/09/2013

837,76

788,46

49,30

49,30

98,60

TOTAL

2.329.839,34

2.316.431,04

13.408,30

13.408,30

26.816,60

 

Com estes fundamentos,

 

VOTO pelo recebimento dos recursos, hierárquico, por regular, e, voluntário, por regular e tempestivo e, quanto ao mérito, pelo desprovimento de ambos, para alterar de ofício, quanto aos valores, a decisão monocrática, que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração nº 93300008.09.00000769/2017-11, lavrado em 17 de abril de 2017, em desfavor da empresa, MAGNO NASCIMENTO & CIA LTDA EPP, condenando-a ao crédito tributário no valor de R$ 26.816,60(vinte e seis mil, oitocentos e dezesseis reais e sessenta centavos), sendo R$ 13.408,30(treze mil, quatrocentos e oito reais e trinta centavos),de ICMS, por infringência ao art. 158, I e art. 160, I, c/fulcro art. 646, todos do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto nº 18.930/97, e R$ 13.408,30(treze mil, quatrocentos e oito reais e trinta centavos),de multa por infração, arrimada no art. 82, V, “f”, da Lei nº 6.379/96.

Ao tempo em que cancelo, por indevido, o crédito tributário no montante de R$ 4.632.862,08 (quatro milhões, seiscentos e trinta e dois mil, oitocentos e sessenta e dois reais e oito centavos), sendo R$ 2.316.431,04 (dois milhões, trezentos e dezesseis mil, quatrocentos e trinta e um reais e quatro centavos), de ICMS e R$ 2.316.431,04 (dois milhões, trezentos e dezesseis mil, quatrocentos e trinta e um reais e quatro centavos) de multa por infração, pelas razões acima evidenciadas.


  

Tribunal Pleno, Sala das Sessões Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em 24 de maio de 2019.

 

                                                                                                                                                                      Gílvia Dantas Macedo
                                                                                                                                                          Conselheira relatora voto Divergente 

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