ACÓRDÃO Nº.000133/2020 PROCESSO Nº 0945262016-1
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA
PROCESSO Nº 0945262016-1
PRIMEIRA CÂMARA DE JULGAMENTO
Recorrente:MANOEL ANTÔNIO DE PAIVA IRMÃO (MERCADINHO COMÉRCIO VAREJISTA SAO BENTO LTDA)
RecorridaGERÊNCIA EXEC. DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS
Repartição Preparadora:COLETORIA ESTADUAL DE BAYEUX
Autuante:WADIH DE ALMEIDA SILVA
Relator:CONS.ª GÍLVIA DANTAS MACEDO
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS - SIMPLES NACIONAL. RECOLHIMENTO A MENOR. DENÚNCIA CONFIRMADA. CONTA MERCADORIAS. ARBITRAMENTO. LUCRO PRESUMIDO. TÉCNICA INAPLICÁVEL. REFORMADA A DECISÃO RECORRIDA. AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE. RECURSO VOLUNTÁRIO DESPROVIDO.
O não recolhimento do imposto nos prazos regulamentares constitui infração tributária, nos termos da legislação vigente. No presente caso, caracteriza-se legítima a ação fiscal que exige do contribuinte autuado o pagamento do ICMS - Simples Nacional, diante do recolhimento a menor deste imposto no prazo regulamentar.
A técnica da Conta Mercadorias – Lucro Presumido não é aplicável para contribuinte do Simples Nacional, uma vez que o arbitramento de lucro bruto se evidencia incompatível e em total dissonância com o que estabelece a Lei Complementar nº 123/06.
Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...
A C O R D A M os membros da Primeira Câmara de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, à unanimidade e de acordo com o VOTO pelo recebimento do recurso voluntário, por regular e tempestivo, e quanto ao mérito, pelo seu desprovimento, para reformar, de oficio, tendo em vista a falta de previsão legal de aplicação da técnica Conta Mercadorias para contribuintes optantes do Simples Nacional, a sentença exarada na instância monocrática, julgando parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000979/2016-29, lavrado em 27/6/2016, contra a empresa MANOEL ANTÔNIO DE PAIVA IRMÃO (MERCADINHO COMERCIO VAREJISTA SAO BENTO LTDA), CCICMS n° 16.105.316-5, devidamente qualificada nos autos, fixando o crédito tributário no montante de R$ 23.381,51 (vinte e três mil, trezentos e oitenta e um reais e cinquenta e um centavos), sendo R$ 13.360,85 (treze mil, trezentos e sessenta reais e oitenta e cinco centavos) de ICMS, por infringência ao art. 106 do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto 18.930/97, e R$ 10.020,66 (dez mil, vinte reais e sessenta e seis centavos) de multa por infração, arrimada no art. 16, I, da Resolução CGSN nº 030/2008.
Ao tempo em que cancelo, por indevido, o quantum de R$ 149.268,15 (cento e quarenta e nove mil, duzentos e sessenta e oito reais e quinze centavos), sendo R$ 86.324,83 (oitenta e seis mil, trezentos e vinte e quatro reais e oitenta e três centavos) de ICMS e R$ 86.324,83 (oitenta e seis mil, trezentos e vinte e quatro reais e oitenta e três centavos) relativo à penalidade proposta, em razão das fundamentações apresentadas neste voto.
Intimações necessárias, na forma regulamentar.
P.R.I.
Primeira Câmara de Julgamento, Sessão realizada por meio de videoconferência, em 4 de junho de 2020.
GÍLVIA DANTAS MACEDO
Conselheira Relatora
GIANNI CUNHA DA SILVEIRA CAVALCANTE
Presidente
Participaram do presente julgamento os membros da Primeira Câmara de Julgamento, THAÍS GIOMARÃES TEIXEIRA FONSECA, MÔNICA OLIVEIRA COELHO DE LEMOS e ANÍSIO DE CARVALHO COSTA NETO..
SÉRGIO ROBERTO FÉLIX LIMA
Assessor Jurídico
Relatório
Por meio do Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000979/2016-29, lavrado em 27/6/2016, contra a empresa MANOEL ANTÔNIO DE PAIVA IRMÃO, CCICMS n° 16.105.316-5, em razão das seguintes irregularidades, detectadas entre 1/1/2011 a 31/12/2012:
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS – SIMPLES NACIONAL - Contrariando dispositivos legais, o contribuinte optante do Simples Nacional não recolheu, dentro do prazo legal, o ICMS – Simples Nacional, em razão da omissão de informações.
NOTA EXPLICATIVA: Contribuinte recolheu a menor.
OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – CONTA MERCADORIAS - Contrariando dispositivos legais, o contribuinte omitiu saídas de mercadorias tributáveis, resultando na falta de recolhimento do ICMS. Irregularidade esta detectada através do levantamento Conta Mercadorias.
NOTA EXPLICATIVA: Omissão de mercadorias tributáveis 2011 e 2012.
O representante fazendário constituiu o crédito tributário na quantia de R$ 196.031,17 (cento e noventa e seis mil, trinta e um reais e dezessete centavos), sendo R$ 99.685,68 (noventa e nove mil, seiscentos e oitenta e cinco reais e sessenta e oito centavos) de ICMS, por infringência ao art. 106 e aos art. 158, I; 160, I, e 646, parágrafo único, c/fulcro no art. 643, §4º, II, do RICMS/PB, aprovado pelo Dec.18.930/97, e R$ 96.345,49 (noventa e seis mil, trezentos e quarenta e cinco reais e quarenta e nove centavos) de multa por infração, arrimada no art. 82, V, alínea “a”, da Lei n.º 6.379/96 e art. 16, I, da Resolução CGSN nº 030/2008.
Juntou documentos às fls. 5/32.
Depois de cientificada, através de A.R., em 12/7/2016, fl. 33, a autuada ingressou com peça reclamatória tempestiva (fls. 35/37) e anexos (fls. 38), na qual rebate, tão somente, a denúncia relativa ao Levantamento da Conta Mercadorias.
Argui a inexistência de provas que comprovem a aquisição e a venda das mercadorias objeto do auto de infração, bem como tampouco há comprovação do pagamento da compra/venda dessas mercadorias.
Defende que o ônus da prova é do Fisco, autor da denúncia, porquanto a ele caber demonstrar a ocorrência do fato gerador, assim, deveria constar dos autos todas as notas fiscais arroladas pelos fornecedores, recibos de entrega das mercadorias, e os pagamentos respectivos (duplicatas).
Advoga, ainda, que “a apuração de eventual omissão de compras, por si só, não é elemento bastante para caracterizar a omissão de receitas, já que inexiste presunção legal que ampare esta imputação”. (sic)
Com informação de inexistência de antecedentes fiscais (fl. 39), foram os autos conclusos à instância prima (fl. 40), ocasião em que a julgadora singular, em sua decisão, manifesta-se pela procedência da denúncia, fls. 43/51, conforme ementa abaixo transcrita:
FALTA DE RECOLHIMENTO DE ICMS SIMPLES NACIONAL. RECOLHIMENTO A MENOR. OMISSÃO DE SAÍDAS PRETÉRITAS – CONTA MERCADORIAS. INFRAÇÕES CARACTERIZADAS.
- Confirmado o recolhimento a menor do ICMS- Simples Nacional, ante a análise e confronto das informações prestadas pelo contribuinte em suas DASN e GIM como sendo o valor do seu faturamento a ser tributado e o ICMS que fora efetivamente recolhido.
- O procedimento fiscal efetuado por meio da técnica de levantamento da Conta Mercadorias tem o efeito de inverter o ônus da prova para cometê-la ao contribuinte, ante a presunção relativa de certeza e liquidez do seu resultado. No caso, a Autuada não trouxe a baila instrumentos probatórios para desconstituir a ilação.
Cientificada da sentença singular, através de Aviso de Recebimento, em 18/6/2019, a autuada protocolou Recurso Voluntário perante este Colegiado, em 5/7/2019, fls. 56/58, buscando a reforma da decisão monocrática, na qual apresenta os mesmos argumentos trazidos anteriormente na reclamação peticionada ao órgão monocrático.
Remetidos os autos ao Conselho de Recursos Fiscais, tem-se que foram distribuídos a esta relatoria, conforme critério regimental, para apreciação e julgamento.
Eis o relatório.
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Em exame recurso voluntário interposto pela autuada contra a decisão monocrática que julgou procedente o auto de infração de estabelecimento, exigindo o crédito tributário acima descrito em razão da falta de recolhimento do ICMS – Simples Nacional e da omissão de saídas de mercadorias tributáveis, apurada através da conta Mercadorias.
Quanto ao requisito de tempestividade, faz-se necessário declarar que o recurso da autuada foi interposto no prazo previsto no art. 77 da Lei n° 10.094/2013.
Inicialmente, cumpre-me declarar que a peça acusatória apresenta-se apta a produzir os regulares efeitos inerentes ao aspecto formal do ato administrativo, visto que sua confecção observa os requisitos indispensáveis de constituição e desenvolvimento válido do processo: identificação das operações promovidas, base de cálculo, sujeito passivo e período do fato gerador (exercício fiscal), o que atende aos requisitos de validade do lançamento de ofício, dispostos no art. 142 do CTN.
Para melhor compreensão do presente voto, passo ao exame separadamente das acusações em epígrafe.
Acusação 1 – FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS – SIMPLES NACIONAL
Foi apurado pela fiscalização o recolhimento a menor do Simples Nacional, nos exercícios de 2011 e 2012, conforme planilhas acostadas às fls. 19/20 dos autos.
Analisando o auto de infração, observa-se que a fundamentação fático-legal da infringência se encontra lastreada no art. 106 do Regulamento do ICMS/PB e a penalidade aplicada em consonância com o art. 16, I, da Resolução nº 030/2008 do Comitê Gestor do Simples Nacional - CGSN, a seguir descritos:
RESOLUÇÃO Nº 030/2008
Art. 16. O descumprimento de obrigação principal devida no âmbito do Simples Nacional sujeita o infrator às seguintes multas:
I - 75% (setenta e cinco por cento) sobre a totalidade ou diferença do tributo não pago ou recolhido (art. 44, I, da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, com a Redação dada pela Lei no 11.488, de 15 de junho de 2007);
REGULAMENTO DO ICMS/PB
Art. 106. O recolhimento do imposto de responsabilidade direta do contribuinte far-se-á:
Neste sentido, sendo optante do Simples Nacional, a empresa deveria ter procedido ao cálculo do imposto na forma prevista no art. 18 e §§ 1º e 3º, da Lei Complementar nº 123/2006, abaixo reproduzido:
Art. 18. O valor devido mensalmente pela microempresa ou empresa de pequeno porte optante pelo Simples Nacional será determinado mediante aplicação das tabelas do Anexo I desta Lei Complementar.
§ 1º Para efeito de determinação da alíquota, o sujeito passivo utilizará a receita bruta acumulada nos 12 (doze) meses anteriores ao do período de apuração.
(...)
§ 3º Sobre a receita bruta auferida no mês incidirá a alíquota determinada na forma do caput e dos §§ 1º e 2º deste artigo, podendo tal incidência se da, à opção do contribuinte, na forma regulamentada pelo Comitê Gestor, sobre a receita recebida no mês, sendo essa opção irretratável para todo o ano calendário.
Considerando o valor tributável não excedente e a RBT-12, para cada período auditado, a fiscalização calculou o ICMS devido, donde abateu o imposto declarado no PGDAS-D e recolhido pela autuada, restando a diferença a recolher apontada, às fls. 19/20, dos autos, cabendo, ainda, a aplicação de multa no percentual de 75% (setenta e cinco por cento).
Não há dúvidas de que agiu corretamente a fiscalização, ao proceder ao lançamento do crédito tributário correspondente, mormente o fato de o contribuinte não ter apresentado nenhuma prova material de que recolheu o ICMS devido. Portanto, mantenho a procedência da denúncia de falta de recolhimento do ICMS – Simples Nacional, conforme a peça vestibular.
Acusação 2 – OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – CONTA MERCADORIAS
A bem de ver, é a Conta Mercadorias técnica de aferição amparada em presunção legal, cujo objetivo é apurar, com base em um parâmetro percentual sugerido em lei para a margem de lucro bruto, a regularidade fiscal das operações de saídas de mercadorias tributáveis. Tudo na conformidade do que preceitua art. 643, §4, II c/c art. 646 do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto 18.930/96.
A sua vez, a Lei Complementar nº 123/06 - Lei do Simples Nacional - dispõe taxativamente, em seu art. 34, que as microempresas e as empresas de pequeno porte estão sujeitas a todas as presunções de omissão de receitas existentes nas legislações de regência dos impostos e contribuições incluídos no Simples Nacional.
Assim, dada a leitura das normas supracitadas – de que as empresas inseridas no SN estão sujeitas a todas as presunções de omissão de receita existente nas legislações de regência dos impostos (LC 123/06), e, bem assim, de que é legítima a presunção de omissão de receitas e exigência do imposto por meio do levantamento da Conta Mercadorias (RICMS/PB) – poderíamos concluir, ainda que tal se revele um equívoco, como veremos mais à frente, que o procedimento do Levantamento da Conta Mercadorias seria perfeitamente aplicável às empresas do Simples Nacional. Noutras palavras, num exame muito superficial, e partindo-se de interpretação literal das normas acima citadas, poderíamos pensar correta a decisão de primeiro grau que considerou legítima a utilização do Levantamento da Conta Mercadorias na auditoria da autuada, empresa inserta no Simples Nacional.
Ocorre, porém, que, não obstante a redação dos dispositivos de lei supracitados, não há negar que, especificamente a Conta Mercadorias depende, para fazer eclodir a denúncia de omissão de receitas, da manutenção de uma margem de lucro mínima de 30% sobre o chamado Custo das Mercadorias Vendidas – o CMV. Ou seja, para que o contribuinte seja considerado regular perante a Fazenda Estadual, é preciso que obtenha um lucro de 30% sobre o Custo das Mercadorias Vendidas.
Este aspecto em particular - a exigência de uma margem de lucro mínima de 30% para empresas do SN - assume contornos relevantes na disciplina da matéria, porquanto a legislação concernente a esse regime de tributação, a LC 123/06, não obriga a que o contribuinte obtenha tal lucro. Ao revés, libera a empresa de manter um lucro real ou presumido, até porque, convém que se diga, não poderia ser diferente, já que se trata de um regime de tributação diverso daquel’outros nos quais há a obrigatoriedade, pela legislação do Imposto de Renda, para que se apure o lucro real e lucro presumido, conforme o caso.
Considerando esse fato - ausência de exigência legal de obtenção de lucro, e mais que isso, do lucro mínimo de 30%, seja na lei federal do Imposto de Renda ou na lei regente do Simples Nacional – resta-nos decidir se ainda assim é cabível a exigência imposta pela lei do ICMS, especialmente porque a subsunção do fato à norma de regência – omissão de receitas – somente ocorre se o contribuinte não alcançar a margem mínima de lucro prevista pela lei estadual.
A primeira reflexão importante neste caso é que, se a LC 123/06 determina que a tributação/recolhimento do ICMS por este contribuinte em particular – isto é, aquele beneficiado pelo sistema do Simples Nacional - seja realizada com base no valor do faturamento da empresa e que, ademais, está dispensado de contabilidade regular, é de fato incabível interpretação de que a lei estadual possa conter exigência de que esse mesmo contribuinte pratique uma margem de lucro de 30% sobre o Custo de Mercadorias Vendidas. Nesse caso, entendo haver prevalência da lei específica.
A título de reforço ao nosso entendimento, note-se que as empresas do SN estão dispensadas de contabilidade regular e que somente esta providência seria capaz de afastar a presunção relativa detectada por meio da Conta Mercadorias. Nessa linha de raciocínio, importa salientar, não poderia a lei exigir imposto do contribuinte mediante um exame de auditoria que depende dessa contabilidade.
A propósito do mesmíssimo tema, trazemos trecho de voto já antes proferido por este mesmo Conselho de Recursos Fiscais, cujo voto da lavra do Conselheiro Sidney Watson, que traz importantes considerações para elucidação do caso:
“O RICMS/PB, em seu artigo 643, §§ 3º e § 4º, disciplina que, no exame da escrita fiscal de contribuinte que não mantenha escrituração contábil regular devidamente registrada na Junta Comercial, para efeito de aferição da regularidade das operações quanto ao recolhimento do imposto, deverão ser utilizados, onde couberem, os seguintes procedimentos:
a) Elaboração de Demonstrativo Financeiro, através do qual deverão ser evidenciadas todas as receitas e despesas, bem como a disponibilidade financeira existente em Caixa e Bancos, devidamente comprovada, no início e no final do período fiscalizado;
b) Levantamento da Conta Mercadorias, caso em que o montante das vendas deverá ser equivalente ao custo das mercadorias vendidas (CMV) acrescido de valor nunca inferior a 30% (trinta por cento) para qualquer tipo de atividade, observado o disposto no inciso III do parágrafo único do art. 24.
Ao dispor acerca deste último procedimento, o RICMS/PB, ao estabelecer percentual (30%) a ser acrescido ao Custo de Mercadorias Vendidas, mostra-se claramente em dissonância com a sistemática estabelecida pela LC nº 123/06.
Importante destacarmos que o RICMS/PB é anterior à LC nº 123/06. Também convém salientarmos que, além de hierarquicamente superior àquele, esta última dispõe sobre matéria de conteúdo especial.
Destarte, sob qualquer princípio que se analise (hierárquico, cronológico ou da especialidade), deve prevalecer a LC nº 123/06, afastando-se o RICMS/PB, naquilo que se mostrar incompatível com a Lei Complementar.
O contribuinte enquadrado como Simples Nacional recolhe o tributo devido sobre o seu faturamento, em observância ao que estabelece o artigo 18, § 3º, da LC nº 123/06:
Art. 18. O valor devido mensalmente pela microempresa ou empresa de pequeno porte optante pelo Simples Nacional será determinado mediante aplicação das alíquotas efetivas, calculadas a partir das alíquotas nominais constantes das tabelas dos Anexos I a V desta Lei Complementar, sobre a base de cálculo de que trata o § 3o deste artigo, observado o disposto no § 15 do art. 3º.
(...)
§ 3º Sobre a receita bruta auferida no mês incidirá a alíquota determinada na forma do caput e dos §§ 1º e 2º deste artigo, podendo tal incidência se dar, à opção do contribuinte, na forma regulamentada pelo Comitê Gestor, sobre a receita recebida no mês, sendo essa opção irretratável para todo o ano-calendário.
§ 3º Sobre a receita bruta auferida no mês incidirá a alíquota efetiva determinada na forma do caput e dos §§ 1º, 1º-A e 2º deste artigo, podendo tal incidência se dar, à opção do contribuinte, na forma regulamentada pelo Comitê Gestor, sobre a receita recebida no mês, sendo essa opção irretratável para todo o ano-calendário. (Redação dada pela Lei Complementar nº 155, de 2016)
Destarte, o contribuinte que apura e recolhe o tributo com base nos dispositivos acima reproduzidos, estará em situação regular quanto à obrigação principal à luz da LC nº 123/06.
A cobrança de tributos, por força do que estabelece o artigo 3º do Código Tributário Nacional, é uma atividade administrativa vinculada, não sendo possível ao auditor fiscal agir de forma discricionária.
Esta ressalva se faz necessária para explicar que, no caso em comento, não estamos afastando a aplicabilidade do artigo 643, § 4º, do RICMS/PB, tampouco deixando ao talante da autoridade fiscal a possibilidade de “escolher” quando utilizá-la. Uma análise mais atenta do dispositivo citado nos permite concluir que a solução para a questão extrai-se do § 4º do referido artigo. Vejamos:
Art. 643. No interesse da Fazenda Estadual, será procedido exame nas escritas fiscal e contábil das pessoas sujeitas à fiscalização, especialmente no que tange à exatidão dos lançamentos e recolhimento do imposto, consoante as operações de cada exercício.
(...)
§ 3º No exame da escrita fiscal de contribuinte que não mantenha escrituração contábil regular devidamente registrada na Junta Comercial, será exigido o livro Caixa, devidamente autenticado pela repartição fiscal do domicílio do contribuinte, com a escrituração analítica dos recebimentos e pagamentos ocorridos em cada mês.
§ 4º Para efeito de aferição da regularidade das operações quanto ao recolhimento do imposto, deverão ser utilizados, onde couber, os procedimentos abaixo, dentre outros, cujas repercussões são acolhidas por este Regulamento:
I - a elaboração de Demonstrativo Financeiro, através do qual deverão ser evidenciadas todas as receitas e despesas, bem como considerada a disponibilidade financeira existente em Caixa e Bancos, devidamente comprovada, no início e no final do período fiscalizado;
II - o levantamento da Conta Mercadorias, caso em que o montante das vendas deverá ser equivalente ao custo das mercadorias vendidas (CMV) acrescido de valor nunca inferior a 30% (trinta por cento) para qualquer tipo de atividade, observado o disposto no inciso III do parágrafo único do art. 24. (g. n.)
Partindo do princípio de que a lei não contém palavras inúteis, a expressão “onde couber” indica que os procedimentos previstos nos inciso I e II do § 4º do artigo 643 do RICMS/PB não são obrigatórios para todo e qualquer exame da escrita fiscal de contribuinte que não mantenha escrituração contábil regular.
Este comando, portanto, não é taxativo e não vincula o auditor fiscal a adotá-los em todas as situações, mas somente nos casos em que “couberem”.
O contribuinte enquadrado como Simples Nacional, como já demonstrado, possui características e regramento próprios, o que o coloca em situação especial, não permitindo a utilização de margem de lucro presumido para fins de surgimento da presunção juris tantum de omissão de receitas.
Na LC nº 123/06, não há qualquer exigência neste sentido para fins de tributação. Apenas no inciso X do seu artigo 29 consta uma referência ao lucro bruto – ainda que de forma indireta -, contudo para efeito de exclusão do regime.
Art. 29. A exclusão de ofício das empresas optantes pelo Simples Nacional dar-se-á quando:
(...)
X – for constatado que durante o ano-calendário o valor das aquisições de mercadorias para comercialização ou industrialização, ressalvadas hipóteses justificadas de aumento de estoque, for superior a 80% (oitenta por cento) dos ingressos de recursos no mesmo período, excluído o ano de início de atividade;
Somente depois de excluído do Simples Nacional, o Fisco está autorizado a lançar mão da Conta Mercadorias – Lucro Presumido para aqueles que não detenham escrita contábil, o que não implica dizer que o contribuinte, enquanto enquadrado na sistemática da LC nº 123/06, esteja “blindado”. A fiscalização tem o poder-dever de verificar a regularidade das operações do contribuinte, utilizando-se, para tanto, dos demais recursos de que dispõe para cumprir o seu mister.”
Como dito acima e se infere dos dispositivos do RICMS/PB, em especial o inciso II do § 4º do artigo 643 do RICMS/PB, o Levantamento de Conta Mercadorias é procedimento que se adota “onde couber”, de modo que, se o contribuinte não é obrigado a manter escrituração contábil regular, dito exame da escrita fiscal não pode ter cabimento.
Afora tudo isso, chama atenção também o fato da impossibilidade de aplicar-se a Conta Mercadorias pelo lucro real (caso a empresa tivesse contabilidade regular) notadamente porque, em sendo detectada uma falta de estorno de crédito, o imposto não poderia ser exigido, pois que a sistemática de tributação não permite que ele se credite ou se debite de imposto. Daí se vê que há de fato um descompasso na aplicação das contas mercadorias, seja pelo lucro presumido, seja pelo lucro real.
Por todas essas razões supracitadas, havemos de reformar a decisão recorrida, julgando improcedente esta parte do feito fiscal, notadamente porque a empresa, no exercício dos fatos geradores, encontrava-se enquadrada como Simples Nacional.
A bem de ver, o Conselho de Recursos Fiscais já se manifestou em questão semelhante a que ora se nos apresenta para julgamento, conforme se vê do Acórdão nº 456/2019, que teve o voto de desempate da Conselheira Presidente Gianni Cunha da Silveira Cavalcante, cuja ementa reproduzo na sequência:
EMBARGOS DECLARATÓRIOS. VÍCIOS NÃO EVIDENCIADOS. ALTERADA DE OFÍCIO DECISÃO EMBARGADA. INEXISTÊNCIA DE INFRAÇÃO À LEGISLAÇÃO ESTADUAL. RECURSO DESPROVIDO.
É cabível o Recurso de Embargos Declaratórios para suprir omissão, esclarecer obscuridade e/ou eliminar contradição. No caso em epígrafe, os argumentos trazidos à baila pela embargante foram ineficazes para modificar a decisão recorrida. Contudo, o entendimento pela inexistência de infração à legislação quanto à diferença detectada por meio da aplicação da técnica Conta Mercadorias – Lucro Presumido - para as empresas optantes do Simples Nacional, ensejou, de ofício, alteração da decisão embargada.
Sendo assim, depois de efetuados os ajustes necessários, o crédito tributário efetivamente devido pela recorrente apresentou a seguinte configuração:
INFRAÇÃO |
PERÍODO |
ICMS NO AI |
MULTA NO AI |
ICMS PÓS CORREÇÃO |
MULTA PÓS CORREÇÃO |
CRÉDITO TRIBUTÁRIO PÓS CORREÇÃO |
|
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS-SIMPLES NACIONAL |
01/01/2011 |
31/01/2011 |
348,57 |
261,43 |
348,57 |
261,43 |
610,00 |
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS-SIMPLES NACIONAL |
01/02/2011 |
28/02/2011 |
762,67 |
572 |
762,67 |
572 |
1.334,67 |
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS-SIMPLES NACIONAL |
01/03/2011 |
31/03/2011 |
1.141,13 |
855,85 |
1.141,13 |
855,85 |
1.996,98 |
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS-SIMPLES NACIONAL |
01/05/2011 |
31/05/2011 |
926,15 |
694,61 |
926,15 |
694,61 |
1.620,76 |
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS-SIMPLES NACIONAL |
01/06/2011 |
30/06/2011 |
443,61 |
332,71 |
443,61 |
332,71 |
776,32 |
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS-SIMPLES NACIONAL |
01/07/2011 |
31/07/2011 |
582,67 |
437 |
582,67 |
437 |
1.019,67 |
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS-SIMPLES NACIONAL |
01/08/2011 |
31/08/2011 |
810,69 |
608,02 |
810,69 |
608,02 |
1.418,71 |
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS-SIMPLES NACIONAL |
01/09/2011 |
30/09/2011 |
310,53 |
232,9 |
310,53 |
232,9 |
543,43 |
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS-SIMPLES NACIONAL |
01/10/2011 |
31/10/2011 |
342,45 |
256,84 |
342,45 |
256,84 |
599,29 |
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS-SIMPLES NACIONAL |
01/11/2011 |
30/11/2011 |
681,5 |
511,13 |
681,5 |
511,13 |
1.192,63 |
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS-SIMPLES NACIONAL |
01/12/2011 |
31/12/2011 |
465,73 |
349,3 |
465,73 |
349,3 |
815,03 |
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS-SIMPLES NACIONAL |
01/01/2012 |
31/01/2012 |
748,85 |
561,64 |
748,85 |
561,64 |
1.310,49 |
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS-SIMPLES NACIONAL |
01/02/2012 |
29/02/2012 |
309,86 |
232,4 |
309,86 |
232,4 |
542,26 |
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS-SIMPLES NACIONAL |
01/04/2012 |
30/04/2012 |
784,96 |
588,72 |
784,96 |
588,72 |
1.373,68 |
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS-SIMPLES NACIONAL |
01/05/2012 |
31/05/2012 |
530,87 |
398,15 |
530,87 |
398,15 |
929,02 |
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS-SIMPLES NACIONAL |
01/06/2012 |
30/06/2012 |
1.038,15 |
778,61 |
1.038,15 |
778,61 |
1.816,76 |
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS-SIMPLES NACIONAL |
01/07/2012 |
31/07/2012 |
485,49 |
364,12 |
485,49 |
364,12 |
849,61 |
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS-SIMPLES NACIONAL |
01/08/2012 |
31/08/2012 |
635,83 |
476,87 |
635,83 |
476,87 |
1.112,70 |
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS-SIMPLES NACIONAL |
01/09/2012 |
30/09/2012 |
792,7 |
594,53 |
792,7 |
594,53 |
1.387,23 |
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS-SIMPLES NACIONAL |
01/10/2012 |
31/10/2012 |
283,67 |
212,75 |
283,67 |
212,75 |
496,42 |
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS-SIMPLES NACIONAL |
01/11/2012 |
30/11/2012 |
423,84 |
317,88 |
423,84 |
317,88 |
741,72 |
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS-SIMPLES NACIONAL |
01/12/2012 |
31/12/2012 |
510,93 |
383,2 |
510,93 |
383,2 |
894,13 |
OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS - CONTA MERCADORIAS |
01/01/2011 |
31/12/2011 |
39.379,89 |
39.379,89 |
0,00 |
0,00 |
0,00 |
OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS - CONTA MERCADORIAS |
01/01/2012 |
31/12/2012 |
46.944,94 |
46.944,94 |
0,00 |
0,00 |
0,00 |
TOTAIS |
99.685,68 |
96.345,49 |
13.360,85 |
10.020,66 |
23.381,51 |
Com estes fundamentos,
VOTO pelo recebimento do recurso voluntário, por regular e tempestivo, e quanto ao mérito, pelo seu desprovimento, para reformar, de oficio, tendo em vista a falta de previsão legal de aplicação da técnica Conta Mercadorias para contribuintes optantes do Simples Nacional, a sentença exarada na instância monocrática, julgando parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000979/2016-29, lavrado em 27/6/2016, contra a empresa MANOEL ANTÔNIO DE PAIVA IRMÃO (MERCADINHO COMERCIO VAREJISTA SAO BENTO LTDA), CCICMS n° 16.105.316-5, devidamente qualificada nos autos, fixando o crédito tributário no montante de R$ 23.381,51 (vinte e três mil, trezentos e oitenta e um reais e cinquenta e um centavos), sendo R$ 13.360,85 (treze mil, trezentos e sessenta reais e oitenta e cinco centavos) de ICMS, por infringência ao art. 106 do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto 18.930/97, e R$ 10.020,66 (dez mil, vinte reais e sessenta e seis centavos) de multa por infração, arrimada no art. 16, I, da Resolução CGSN nº 030/2008.
Ao tempo em que cancelo, por indevido, o quantum de R$ 149.268,15 (cento e quarenta e nove mil, duzentos e sessenta e oito reais e quinze centavos), sendo R$ 86.324,83 (oitenta e seis mil, trezentos e vinte e quatro reais e oitenta e três centavos) de ICMS e R$ 86.324,83 (oitenta e seis mil, trezentos e vinte e quatro reais e oitenta e três centavos) relativo à penalidade proposta, em razão das fundamentações apresentadas neste voto.
Intimações necessárias, na forma regulamentar.
Primeira Câmara de Julgamento, sessão por videoconferência, em 4 de junho de 2020.
Gílvia Dantas Macedo
Conselheira Relatora
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