ACÓRDÃO Nº.000165/2020 PROCESSO Nº 1556292016-6
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA
PROCESSO Nº 1556292016-6
PRIMEIRA CÂMARA DE JULGAMENTO
RECORRENTE: GERÊNCIA EXEC. DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS
RECORRIDA: MARILENE BARBOSA DA SILVA
PREPARADORA: COLETORIA ESTADUAL DE ITABAIANA
AUTUANTE: ALBERTO NUNES DE OLIVEIRA
RELATORA: CONS.ª GÍLVIA DANTAS MACEDO
CONTA MERCADORIAS. SIMPLES NACIONAL. ARBITRAMENTO. LUCRO PRESUMIDO. TÉCNICA INAPLICÁVEL. MANTIDA A DECISÃO RECORRIDA POR FUNDAMENTO DIVERSO. AUTO DE INFRAÇÃO IMPROCEDENTE. RECURSO HIERÁRQUICO DESPROVIDO.
A técnica da Conta Mercadorias – Lucro Presumido não é aplicável para contribuinte do Simples Nacional, uma vez que o arbitramento de lucro bruto se evidencia incompatível e em total dissonância com o que estabelece a Lei Complementar nº 123/06. O contribuinte enquadrado como Simples Nacional possui características e regramento próprios, o que o coloca em situação especial, não permitindo a utilização de margem de lucro presumido para fins de surgimento da presunção juris tantum de omissão de saídas de mercadorias tributáveis
Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...
A C O R D A M os membros da Primeira Câmara de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, à unanimidade e de acordo com o voto pelo recebimento do recurso hierárquico, por regular, e quanto ao mérito pelo seu desprovimento, para manter a sentença monocrática que julgou improcedente o Auto de Infração de Estabelecimento n° 93300008.09.00002230/2016-16, lavrado em 7/11/2016, contra a empresa MARILENE BARBOSA DA SILVA, CCICMS n° 16.128.354-3, já qualificada nos autos, eximindo-a de todos os efeitos decorrentes da exordial acusatória.
Intimações necessárias, na forma regulamentar.
.
P.R.E.
Primeira Câmara de Julgamento, Sessão realizada por meio de videoconferência, em 22 de junho de 2020.
GÍLVIA DANTAS MACEDO
Conselheira Relatora
GIANNI CUNHA DA SILVEIRA CAVALCANTE
Presidente
Participaram do presente julgamento os membros da Primeira Câmara de Julgamento, ANÍSIO DE CARVALHO COSTA NETO, MÔNICA OLIVEIRA COELHO DE LEMOS e THAÍS GUIMARÃES TEIXEIRA FONSECA.
SÉRGIO ROBERTO FÉLIX LIMA
Assessor Jurídico
Relatório
Por meio do Auto de Infração de Estabelecimento n° 93300008.09.00002230/2016-16, lavrado em 7/11/2016, contra a empresa MARILENE BARBOSA DA SILVA, CCICMS n° 16.128.354-3, em razão da seguinte irregularidade verificada no exercício de 2012:
OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – CONTA MERCADORIAS - Contrariando dispositivos legais, o contribuinte omitiu saídas de mercadorias tributáveis, resultando na falta de recolhimento do ICMS. Irregularidade esta detectada através do levantamento Conta Mercadorias.
NOTA EXPLICATIVA: Embora em 2012 tenha sido lavrado o Auto de Infração 93300008.09.00002230/2016-16 com a conta mercadorias 2012, foi realizado um complemento no valor de R$ 292.121,52 com ICMS devido no valor de R$ 49.960,38 em função da inclusão de notas fiscais não lançadas no valor tributável de R$ 292.121,52.
O representante fazendário constituiu o crédito tributário na quantia de R$ 99.321,32 (noventa e nove mil, trezentos e vinte e um reais e trinta e dois centavos), sendo R$ 49.660,66 (quarenta e nove mil, seiscentos e sessenta reais e sessenta e seis centavos) de ICMS, por infringência aos art. 158, I; 160, I, e 646, c/ fulcro no art. 643, § 4º, II, do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto n° 18.930/97, e igual valor de multa por infração, arrimada no art. 82, V, alínea “a”, da Lei n.º 6.379/96.
Juntou documentos às fls. 4/11.
Cientificada, em 21/11/2016, a autuada ingressou com peça reclamatória tempestiva (fl. 13), por meio da qual argui a desconstituição do auto de infração, em face da correta escrituração nos livros próprios das saídas ECF e das notas fiscais de entrada, acostando, inclusive, mídia digital para corroborar suas alegações.
Remetidos os autos à GEJUP, foram os mesmos conclusos, com informação no Termo de Antecedentes Fiscais de que não existe anotação de reincidência fiscal, à fl. 14, e distribuídos ao julgador singular, Heitor Collet, que decidiu pela improcedência do auto infracional, conforme ementa abaixo transcrita:
OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS - CONTA MERCADORIAS – DIFERENÇA TRIBUTÁVEL DECORRENTE EXCLUSIVAMENTE DA INCLUSÃO DE NOTAS FISCAIS NÃO LANÇADAS - NÃO APRESENTAÇÃO NOS AUTOS DOS DOCUMENTOS FISCAIS NÃO REGISTRADOS OU MESMO DA RELAÇÃO COM IDENTIFICAÇÃO DESTES – FALTA DE PROVAS - INSUBSISTÊNCIA DA ACUSAÇÃO. Afastada a exigibilidade do crédito lançado, por falta de provas, em virtude de não ter sido acostadas aos autos as notas fiscais ou a relação dos documentos fiscais de aquisição não lançados na escrita fiscal do autuado, os quais constituem a origem da diferença apontada no procedimento fiscal e a base da acusação em evidência.
Pessoalmente cientificado da sentença de primeiro grau (fl. 22), em 17/4/2019, o contribuinte não se manifestou nos autos.
Observando os trâmites regulares, enfim, os autos foram remetidos ao Conselho de Recursos Fiscais, e distribuídos a esta relatoria, segundo critério regimentalmente previsto, para apreciação e julgamento.
Eis o relatório.
|
Trata-se de recurso hierárquico interposto contra decisão de primeira instância que julgou improcedente o Auto de Infração de Estabelecimento n° 93300008.09.00002230/2016-16, lavrado contra a empresa MARILENE BARBOSA DA SILVA, devidamente qualificada nos autos, em razão da “omissão de saídas de mercadorias tributáveis, apurada através da técnica do levantamento da conta Mercadorias”, no exercício de 2012.
O julgador singular, por seu turno, ao identificar que faltava provas da infração, a exemplo da numeração da notas fiscais não lançadas que foram incluídas no levantamento da Conta mercadorias, julgou o feito improcedente por falta de provas da infração.
Entendo, contudo, que a denúncia não tem como se manter, sendo que, todavia, por razão diversa daquela da instância prima.
Senão vejamos:
É sabido que a Conta Mercadorias – Lucro Presumido é uma técnica fiscal que se aplica aos casos em que o contribuinte não possui contabilidade regular, circunstância em que se arbitra o lucro de 30% (trinta por cento) sobre o Custo das Mercadorias Vendidas - CMV. Caso o valor das vendas seja inferior ao CMV acrescido deste percentual de lucro, a legislação tributária estadual autoriza a fiscalização a lançar mão da presunção de que houve saídas de mercadorias tributáveis sem pagamento do imposto, nos termos do que dispõem os art. 643, § 4º, II e 646 do RICMS/PB.
Trata-se de uma técnica de aferição amparada em presunção legal, cujo objetivo é apurar, com base em um parâmetro percentual sugerido em lei para a margem de lucro bruto, a regularidade fiscal das operações de saídas de mercadorias tributáveis. Tudo na conformidade do que preceitua art. 643, §4, II c/c art. 646 do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto 18.930/96.
A sua vez, a Lei Complementar nº 123/06 - Lei do Simples Nacional - dispõe taxativamente, em seu art. 34, que as microempresas e as empresas de pequeno porte estão sujeitas a todas as presunções de omissão de receitas existentes nas legislações de regência dos impostos e contribuições incluídos no Simples Nacional.
Assim, dada a leitura das normas supracitadas – de que as empresas inseridas no SN estão sujeitas a todas as presunções de omissão de receita existente nas legislações de regência dos impostos (LC 123/06), e, bem assim, de que é legítima a presunção de omissão de receitas e exigência do imposto por meio do levantamento da Conta Mercadorias (RICMS/PB) – poderíamos concluir, ainda que tal se revele um equívoco, como veremos mais à frente, que o procedimento do Levantamento da Conta Mercadorias seria perfeitamente aplicável às empresas do Simples Nacional. Noutras palavras, num exame muito superficial, e partindo-se de interpretação literal das normas acima citadas, poderíamos pensar correta a decisão de primeiro grau que considerou legítima a utilização do Levantamento da Conta Mercadorias na auditoria da autuada, empresa inserta no Simples Nacional.
Ocorre, porém, que, não obstante a redação dos dispositivos de lei supracitados, não há negar que, especificamente a Conta Mercadorias depende, para fazer eclodir a denúncia de omissão de receitas, da manutenção de uma margem de lucro mínima de 30% sobre o chamado Custo das Mercadorias Vendidas – o CMV. Ou seja, para que o contribuinte seja considerado regular perante a Fazenda Estadual, é preciso que obtenha um lucro de 30% sobre o Custo das Mercadorias Vendidas.
Este aspecto em particular - a exigência de uma margem de lucro mínima de 30% para empresas do SN - assume contornos relevantes na disciplina da matéria, porquanto a legislação concernente a esse regime de tributação, a LC 123/06, não obriga a que o contribuinte obtenha tal lucro. Ao revés, libera a empresa de manter um lucro real ou presumido, até porque, convém que se diga, não poderia ser diferente, já que se trata de um regime de tributação diverso daquel’outros nos quais há a obrigatoriedade, pela legislação do Imposto de Renda, para que se apure o lucro real e lucro presumido, conforme o caso.
Considerando esse fato - ausência de exigência legal de obtenção de lucro, e mais que isso, do lucro mínimo de 30%, seja na lei federal do Imposto de Renda ou na lei regente do Simples Nacional – resta-nos decidir se ainda assim é cabível a exigência imposta pela lei do ICMS, especialmente porque a subsunção do fato à norma de regência – omissão de receitas – somente ocorre se o contribuinte não alcançar a margem mínima de lucro prevista pela lei estadual.
A primeira reflexão importante neste caso é que, se a LC 123/06 determina que a tributação/recolhimento do ICMS por este contribuinte em particular – isto é, aquele beneficiado pelo sistema do Simples Nacional - seja realizada com base no valor do faturamento da empresa e que, ademais, está dispensado de contabilidade regular, é de fato incabível interpretação de que a lei estadual possa conter exigência de que esse mesmo contribuinte pratique uma margem de lucro de 30% sobre o Custo de Mercadorias Vendidas. Nesse caso, entendo haver prevalência da lei específica.
A título de reforço ao nosso entendimento, note-se que as empresas do SN estão dispensadas de contabilidade regular e que somente esta providência seria capaz de afastar a presunção relativa detectada por meio da Conta Mercadorias. Nessa linha de raciocínio, importa salientar, não poderia a lei exigir imposto do contribuinte mediante um exame de auditoria que depende dessa contabilidade.
A propósito do mesmíssimo tema, trazemos trecho de voto já antes proferido por este mesmo Conselho de Recursos Fiscais, cujo voto da lavra do Conselheiro Sidney Watson traz importantes considerações para elucidação do caso:
“O RICMS/PB, em seu artigo 643, §§ 3º e § 4º, disciplina que, no exame da escrita fiscal de contribuinte que não mantenha escrituração contábil regular devidamente registrada na Junta Comercial, para efeito de aferição da regularidade das operações quanto ao recolhimento do imposto, deverão ser utilizados, onde couberem, os seguintes procedimentos:
a) Elaboração de Demonstrativo Financeiro, através do qual deverão ser evidenciadas todas as receitas e despesas, bem como a disponibilidade financeira existente em Caixa e Bancos, devidamente comprovada, no início e no final do período fiscalizado;
b) Levantamento da Conta Mercadorias, caso em que o montante das vendas deverá ser equivalente ao custo das mercadorias vendidas (CMV) acrescido de valor nunca inferior a 30% (trinta por cento) para qualquer tipo de atividade, observado o disposto no inciso III do parágrafo único do art. 24.
Ao dispor acerca deste último procedimento, o RICMS/PB, ao estabelecer percentual (30%) a ser acrescido ao Custo de Mercadorias Vendidas, mostra-se claramente em dissonância com a sistemática estabelecida pela LC nº 123/06.
Importante destacarmos que o RICMS/PB é anterior à LC nº 123/06. Também convém salientarmos que, além de hierarquicamente superior àquele, esta última dispõe sobre matéria de conteúdo especial.
Destarte, sob qualquer princípio que se analise (hierárquico, cronológico ou da especialidade), deve prevalecer a LC nº 123/06, afastando-se o RICMS/PB, naquilo que se mostrar incompatível com a Lei Complementar.
O contribuinte enquadrado como Simples Nacional recolhe o tributo devido sobre o seu faturamento, em observância ao que estabelece o artigo 18, § 3º, da LC nº 123/06:
Art. 18. O valor devido mensalmente pela microempresa ou empresa de pequeno porte optante pelo Simples Nacional será determinado mediante aplicação das alíquotas efetivas, calculadas a partir das alíquotas nominais constantes das tabelas dos Anexos I a V desta Lei Complementar, sobre a base de cálculo de que trata o § 3o deste artigo, observado o disposto no § 15 do art. 3º.
(...)
§ 3º Sobre a receita bruta auferida no mês incidirá a alíquota determinada na forma do caput e dos §§ 1º e 2º deste artigo, podendo tal incidência se dar, à opção do contribuinte, na forma regulamentada pelo Comitê Gestor, sobre a receita recebida no mês, sendo essa opção irretratável para todo o ano-calendário.
§ 3º Sobre a receita bruta auferida no mês incidirá a alíquota efetiva determinada na forma do caput e dos §§ 1º, 1º-A e 2º deste artigo, podendo tal incidência se dar, à opção do contribuinte, na forma regulamentada pelo Comitê Gestor, sobre a receita recebida no mês, sendo essa opção irretratável para todo o ano-calendário. (Redação dada pela Lei Complementar nº 155, de 2016)
Destarte, o contribuinte que apura e recolhe o tributo com base nos dispositivos acima reproduzidos, estará em situação regular quanto à obrigação principal à luz da LC nº 123/06.
A cobrança de tributos, por força do que estabelece o artigo 3º do Código Tributário Nacional, é uma atividade administrativa vinculada, não sendo possível ao auditor fiscal agir de forma discricionária.
Esta ressalva se faz necessária para explicar que, no caso em comento, não estamos afastando a aplicabilidade do artigo 643, § 4º, do RICMS/PB, tampouco deixando ao talante da autoridade fiscal a possibilidade de “escolher” quando utilizá-la. Uma análise mais atenta do dispositivo citado nos permite concluir que a solução para a questão extrai-se do § 4º do referido artigo. Vejamos:
Art. 643. No interesse da Fazenda Estadual, será procedido exame nas escritas fiscal e contábil das pessoas sujeitas à fiscalização, especialmente no que tange à exatidão dos lançamentos e recolhimento do imposto, consoante as operações de cada exercício.
(...)
§ 3º No exame da escrita fiscal de contribuinte que não mantenha escrituração contábil regular devidamente registrada na Junta Comercial, será exigido o livro Caixa, devidamente autenticado pela repartição fiscal do domicílio do contribuinte, com a escrituração analítica dos recebimentos e pagamentos ocorridos em cada mês.
§ 4º Para efeito de aferição da regularidade das operações quanto ao recolhimento do imposto, deverão ser utilizados, onde couber, os procedimentos abaixo, dentre outros, cujas repercussões são acolhidas por este Regulamento:
I - a elaboração de Demonstrativo Financeiro, através do qual deverão ser evidenciadas todas as receitas e despesas, bem como considerada a disponibilidade financeira existente em Caixa e Bancos, devidamente comprovada, no início e no final do período fiscalizado;
II - o levantamento da Conta Mercadorias, caso em que o montante das vendas deverá ser equivalente ao custo das mercadorias vendidas (CMV) acrescido de valor nunca inferior a 30% (trinta por cento) para qualquer tipo de atividade, observado o disposto no inciso III do parágrafo único do art. 24. (g. n.)
Partindo do princípio de que a lei não contém palavras inúteis, a expressão “onde couber” indica que os procedimentos previstos nos inciso I e II do § 4º do artigo 643 do RICMS/PB não são obrigatórios para todo e qualquer exame da escrita fiscal de contribuinte que não mantenha escrituração contábil regular.
Este comando, portanto, não é taxativo e não vincula o auditor fiscal a adotá-los em todas as situações, mas somente nos casos em que “couberem”.
O contribuinte enquadrado como Simples Nacional, como já demonstrado, possui características e regramento próprios, o que o coloca em situação especial, não permitindo a utilização de margem de lucro presumido para fins de surgimento da presunção juris tantum de omissão de receitas.
Na LC nº 123/06, não há qualquer exigência neste sentido para fins de tributação. Apenas no inciso X do seu artigo 29 consta uma referência ao lucro bruto – ainda que de forma indireta -, contudo para efeito de exclusão do regime.
Art. 29. A exclusão de ofício das empresas optantes pelo Simples Nacional dar-se-á quando:
(...)
X – for constatado que durante o ano-calendário o valor das aquisições de mercadorias para comercialização ou industrialização, ressalvadas hipóteses justificadas de aumento de estoque, for superior a 80% (oitenta por cento) dos ingressos de recursos no mesmo período, excluído o ano de início de atividade;
Somente depois de excluído do Simples Nacional, o Fisco está autorizado a lançar mão da Conta Mercadorias – Lucro Presumido para aqueles que não detenham escrita contábil, o que não implica dizer que o contribuinte, enquanto enquadrado na sistemática da LC nº 123/06, esteja “blindado”. A fiscalização tem o poder-dever de verificar a regularidade das operações do contribuinte, utilizando-se, para tanto, dos demais recursos de que dispõe para cumprir o seu mister.”
Como dito acima e se infere dos dispositivos do RICMS/PB, em especial o inciso II do § 4º do artigo 643 do RICMS/PB, o Levantamento de Conta Mercadorias é procedimento que se adota “onde couber”, de modo que, se o contribuinte não é obrigado a manter escrituração contábil regular, dito exame da escrita fiscal não pode ter cabimento.
Afora tudo isso, chama atenção também o fato da impossibilidade de aplicar-se a Conta Mercadorias pelo lucro real (caso a empresa tivesse contabilidade regular) notadamente porque, em sendo detectada uma falta de estorno de crédito, o imposto não poderia ser exigido, pois que a sistemática de tributação não permite que ele se credite ou se debite de imposto. Daí se vê que há de fato um descompasso na aplicação das contas mercadorias, seja pelo lucro presumido, seja pelo lucro real.
Por todas essas razões supracitadas, havemos de reformar a decisão recorrida, julgando improcedente a ação fiscal, notadamente porque a empresa, no exercício dos fatos geradores, encontrava-se enquadrada como Simples Nacional.
A bem de ver, o Conselho de Recursos Fiscais já se manifestou em questão semelhante a que ora se nos apresenta para julgamento, conforme se vê do Acórdão nº 456/2019, que teve o voto de desempate da Conselheira Presidente Gianni Cunha da Silveira Cavalcante, cuja ementa reproduzo na sequência:
EMBARGOS DECLARATÓRIOS. VÍCIOS NÃO EVIDENCIADOS. ALTERADA DE OFÍCIO DECISÃO EMBARGADA. INEXISTÊNCIA DE INFRAÇÃO À LEGISLAÇÃO ESTADUAL. RECURSO DESPROVIDO.
É cabível o Recurso de Embargos Declaratórios para suprir omissão, esclarecer obscuridade e/ou eliminar contradição. No caso em epígrafe, os argumentos trazidos à baila pela embargante foram ineficazes para modificar a decisão recorrida. Contudo, o entendimento pela inexistência de infração à legislação quanto à diferença detectada por meio da aplicação da técnica Conta Mercadorias – Lucro Presumido - para as empresas optantes do Simples Nacional, ensejou, de ofício, alteração da decisão embargada.
Em que pese as razões do n. julgador singular para afastar a denúncia posta pela fiscalização, ouso, data venia, discordar do entendimento exarado no que tange à fundamentação utilizada, porquanto consideramos inaplicável a técnica da conta Mercadorias à autuada, haja vista que a mesma, no exercício dos fatos geradores, encontrava-se enquadrada como Simples Nacional.
Diante de todo o exposto, resta-me manter a improcedência da denúncia de omissão de saídas de mercadorias tributáveis – Conta Mercadorias pelo fato de, durante o exercício autuado, a empresa estava submetida ao regramento especial de tributação de que trata a Lei Complementar nº 123/06, pelo que estou desprovendo o recurso hierárquico.
Com estes fundamentos,
V O T O - pelo recebimento do recurso hierárquico, por regular, e quanto ao mérito pelo seu desprovimento, para manter a sentença monocrática que julgou improcedente o Auto de Infração de Estabelecimento n° 93300008.09.00002230/2016-16, lavrado em 7/11/2016, contra a empresa MARILENE BARBOSA DA SILVA, CCICMS n° 16.128.354-3, já qualificada nos autos, eximindo-a de todos os efeitos decorrentes da exordial acusatória.
Intimações necessárias, na forma regulamentar.
Primeira Câmara de Julgamento, sessão realizada por videoconferência, em 22 de junho de 2020.
GÍLVIA DANTAS MACEDO
Conselheira Relatora
Os Textos disponibilizados na Internet não substituem os publicados oficialmente, por determinação legal.