ACÓRDÃO Nº 000146/2020 PROCESSO Nº 1519382018-2
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA
Processo nº 1519382018-2
PRIMEIRA CÂMARA DE JULGAMENTO
RECORRENTE: GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS
RECORRIDA: JIREH DIST. E VAR. EM AR COND., PEÇAS E ACESSÓRIOS EIRELI
PREPARADORA: CENTRO DE ATENDIMENTO AO CIDADÃO DA GR1 DA SEFAZ – JOÃO PESSOA
AUTUANTE: ROBERTO ELI PATRÍCIO DE BARROS
RELATOR: CONS.º. ANISIO DE CARVALHO COSTA NETO
OMISSÃO DE SAÍDAS PRETÉRITAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS. FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS PRÓPRIOS. COMPROVAÇÃO. NULIDADE NÃO CONFIGURADA. PROVAS ACOSTADAS AOS AUTOS PERMITEM PLENO CONHECIMENTO DA MATÉRIA SUSCITADA NO LANÇAMENTO DE OFÍCIO. AUTO DE INFRAÇÃO PROCEDENTE. REFORMADA A DECISÃO RECORRIDA. RECURSO HIERÁRQUICO PROVIDO.
A falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios autoriza a presunção legal de omissão pretérita de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto devido. Para além das alegações, o contribuinte não trouxe qualquer prova capaz de provocar a redução do crédito tributário originalmente lançado.
O reconhecimento de nulidade deve ter por fundamento vício capaz de tornar quase impossível a compreensão da matéria que no lançamento de ofício é posta, o que no caso não ocorreu. Os elementos probatórios são suficientes para que o autuado tome conhecimento pleno do fundamento da acusação e que possa dela se defender.
Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...
A C O R D A M os membros da Primeira Câmara de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, à unanimidade e de acordo com o voto pelo recebimento do recurso hierárquico, por regular, e, no mérito, pelo seu provimento, reformando a sentença prolatada na primeira instância, julgando PROCEDENTE o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00001684/2018-31, lavrado em 4/9/2018, em desfavor da empresa JIREH DISTRIBUIDORA E VAREJISTA EM AR CONDICIONADA, PEÇAS E ACESSÓRIOS EIRELI, inscrição estadual n° 16.213.342-1, devidamente qualificada nos autos, impondo o ônus desta ação fiscal, imputando-lhe o crédito tributário no valor de R$ 114.704,96 (cento e quatorze mil, setecentos e quatro reais e noventa e seis centavos), sendo R$ 57.352,48 (cinquenta e sete mil, trezentos e cinquenta e dois reais e quarenta e oito centavos) de ICMS, por infringência aos artigos 158, I, c/c 160, I, e 646, todos do RICMS-PB, aprovado pelo Decreto n. º 18.930/97, e mais R$ 57.352,48 (cinquenta e sete mil, trezentos e cinquenta e dois reais e quarenta e oito centavos), a título de penalidade pecuniária, por aplicação do artigo 82, V, “f” da Lei 6.379/96.
Intimações necessárias a cargo da Repartição Preparadora na forma prevista no Regulamento do ICMS.
P.R.I.
Primeira Câmara de Julgamento, Sessão realizada por meio de videoconferência, em 5 de junho de 2020.
ANÍSIO DE CARVALHO COSTA NETO
Conselheiro Relator
GIANNI CUNHA DA SILVEIRA CAVALCANTE
Presidente
Participaram do presente julgamento os membros da Primeira Câmara de Julgamento, GÍLVIA DANTAS MACEDO, MÔNICA OLIVEIRA COELHO DE LEMOS e THAÍS GUIMARÃES TEIXEIRA FONSECA.
SÉRGIO ROBERTO FÉLIX LIMA
Assessor Jurídico
Relatório
Neste colegiado examina-se o recurso hierárquico, nos moldes do artigo 77 da Lei nº 10.094/2013, diante da decisão monocrática que julgou nulo por vício material o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00001684/2018-31, lavrado em 4/9/2018, (fls. 3), no qual constam as seguintes infrações fiscais:
“0009 – FALTA DE LANÇAMENTO DE N. F. DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS PRÓPRIOS – Aquisição de mercadorias com recursos advindos de omissões de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis e/ou a realização de prestações de serviços tributáveis sem o pagamento do imposto devido, constatada pela falta de registro de notas fiscais nos livros próprios.”
Foram dados como infringidos os artigos 158, I, c/c 160, I, e 646, tendo sido objeto da autuação os fatos geradores referentes aos períodos 2013, todos dispositivos legais do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto n° 18.930/97. O crédito tributário proposto foi de R$ 114.704,96 (cento e quatorze mil, setecentos e quatro reais e noventa e seis centavos), sendo R$ 57.352,48 (cinquenta e sete mil, trezentos e cinquenta e dois reais e quarenta e oito centavos), de ICMS, e mais R$ 57.352,48 (cinquenta e sete mil, trezentos e cinquenta e dois reais e quarenta e oito centavos), referentes à multa por infração que tem escopo no art. 82, V, “f”, da Lei 6.379/96.
O fiscal autuante anexou aos autos todo o escopo probatório que consubstancia a acusação (fls. 4-5), onde fica delineada a base de informações com referência na qual foi lavrado o auto de infração em desfavor do contribuinte.
Regularmente cientificado através de Aviso de Recebimento (A. R.), em 24/9/2018 (fl. 7), a empresa autuada apresentou reclamação (fls. 9-12) em 15/10/2018 (fl. 8), na qual se insurge contra os termos da autuação sob reproche com base nas seguintes argumentações:
- que possui Termo de Acordo e, portanto, concessivo de prerrogativa de recolhimento do ICMS diferenciadamente;
Por fim, requer a improcedência/anulação do auto de infração.
Com remessa dos autos a GEJUP e lavrado o termo de conclusão (fl. 15), os autos foram distribuídos ao julgador Francisco Nociti, que exarou sentença considerando o auto de infração NULO POR VÍCIO MATERIAL, conforme ementa abaixo:
NOTAS FISCAIS DE ENTRADA NÃO LANÇADAS. OMISSÃO DE SAÍDAS PRETÉRITAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS. VÍCIO MATERIAL. NULIDADE.
- A planilha apresentada pela Fiscalização, com dados acerca dos documentos fiscais acusados, é insuficiente, pois apresenta chaves de acesso incompleta (falta um dígito). In casu, evidencia-se claro cerceamento de defesa, porquanto a autuada não obteve a informação necessária para o acesso às notas fiscais denunciadas.
- A consequência dessa nulidade por vício material é a impossibilidade de a Fiscalização promover novo lançamento, corrigindo o vício material incorrido, porque o prazo decadencial do art. 173, I, do CTN flui sem interrupções, sendo que infração reporta-se a meses do exercício 2013.
AUTO DE INFRAÇÃO NULO
Cientificado da decisão de primeira instância administrativa através de Comprovante de Cientificação no Domicílio Tributário Eletrônico - DTe (fl. 23), em 17/4/2019, o autuado não apresentou recurso voluntário ao Conselho de Recursos Fiscais, motivo pelo qual apenas o recurso de ofício será objeto de apreciação e julgamento.
Na sequência, os autos foram remetidos a esta Casa, com distribuição a esta relatoria, segundo critério regimentalmente previsto, para o fim de apreciação e julgamento.
Este é o relatório.
VOTO |
Trata-se de recurso hierárquico, nos moldes do que apregoa o artigo 80 da Lei 10.094/2013, interposto contra decisão de primeira instância que julgou nulo por vício material o Auto de Infração de Estabelecimento n.º 93300008.09.00001684/2018-31 lavrado em 4/9/2018 (fls. 3) em desfavor da empresa JIREH DISTRIBUIDORA E VAREJISTA EM AR CONDICIONADO, PEÇAS E ACESSÓRIOS EIRELI, inscrição estadual n. º 16.213.342-1, já devidamente qualificada nos autos.
Na acusação, objeto deste processo, a empresa foi autuada por omissão de saídas de mercadorias tributáveis, detectada através do da falta de lançamento de notas fiscais de aquisição, técnica de fiscalização bastante conhecida e que, assim como já decidido fartamente pelo Conselho de Recursos Fiscais da Paraíba, tem força probante de detectar a referida infração.
Em princípio, cabe observar que o lançamento fiscal observou, de forma rigorosa, as disposições do art. 142 do CTN, não importando qualquer pretensão de nulidade elencados nos arts. 14, 16 e 17, da Lei nº 10.094/2013 (Lei do PAT).
Assim, o auto de infração atendeu não só os requisitos materiais, mas também formais, não devendo prevalecer a consideração a respeito da qual haja qualquer nulidade em função de ausência dos requisitos estabelecidos nos artigos 692 do RICMS e 41 da Lei do PAT, assim como o disposto no artigo 142, do CTN, já que os requisitos exigidos na normas destacadas estão, de forma hialina, consignados no lançamento de ofício.
Tratando-se, portanto, de recurso hierárquico, deve-se ter em mente que, malgrado a bem fundamentada decisão de primeira instância, ouso discordar do julgador monocrático que declarou nulo, por vício material, o lançamento de ofício.
A discórdia tem razão de ser baseada nos fundamentos em que se apoia o reconhecimento do vício relativo ao ato administrativo, aqui representado pelo auto de infração, o que a meu ver, deve ser aquele que, de tão bizarro, torna a compreensão tão difícil que seria quase impossível dele se defender.
Ocorre que o julgador monocrático, de forma muito percuciente, enxergou um erro na disposição das chaves de acesso relativas aos documentos fiscais relacionados pela fiscalização no feito fiscal. Nisso, ele tem completa razão. Sem perceber, o auditor relacionou diversas notas fiscais, com suas respectivas chaves de acesso, em que falta o último dígito da sequência numérica. Ao invés de 44 dígitos, as chaves só se apresentam com 43 números.
Pois bem. O ato administrativo deve conter os requisitos, o que segundo doutrina mais festejada, são a competência, a finalidade, a forma, o motivo e o objeto. A possibilidade de anular seus próprios atos é matéria pacífica, sendo inclusive objeto de regulamentação através do artigo 53 da Lei n. º 9.784/99, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal:
Art. 53. A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos.
O dispositivo é claro, e disso ninguém tem dúvida, e remete à possibilidade de anulação dos atos administrativos quando eivados de ilegalidade. Portanto, deve-se ter claramente o argumento, tratando-se de ato ilegal, deve ser anulado. Assim, a nulidade está, a meu ver, umbilicalmente relacionada à gravidade do vício. Este deve ser de tal magnitude que não permita, no senso do homem comum, a compreensão do conteúdo geral do ato administrativo praticado.
Com toda deferência que deve ser feita à acuidade laboral já reconhecida do julgador singular, não vislumbro no lançamento de ofício, ousando discordar dele, defeito tão grave que tenha tido a possibilidade de cercear o direito à defesa do contribuinte. Tenho em mente que a relação anexada pela fiscalização aponta outros elementos que são suficientes para tornar o contraponto do autuado possível.
E aqui me refiro ao número das notas fiscais constantes da relação já referida. Percebe-se claramente que todas as notas fiscais relacionadas pelo auditor fazendário tem como elementos o período, a chave de acesso (com a supressão de um dígito), o número do documento, a data de emissão, o CFOP, o valor do documento fiscal, o valor do ICMS lançado e o valor da suposta penalidade por descumprimento de obrigação acessória.
Ora, esses são elementos suficientes, junto com a descrição da infração contida no lançamento de ofício que oferecem informações bastantes para que o contribuinte possa, sem qualquer prejuízo, exercer o seu direito à ampla defesa e ao contraditório.
A própria Lei n. º 9.784/99, em seu artigo 55, se refere à possibilidade de convalidação do ato, quando não trouxer qualquer prejuízo aos interessados, assim como disposta na redação da norma:
Art. 55. Em decisão na qual se evidencie não acarretarem lesão ao interesse público nem prejuízo a terceiros, os atos que apresentarem defeitos sanáveis poderão ser convalidados pela própria Administração.
Portanto, não vislumbro, neste caso específico, e a casuística deve ser sempre analisada, que a falta de um dígito na chave de acesso constante da relação de notas fiscais de aquisição não lançadas nos livros próprios tenha trazido prejuízo ao interessado, em observância à vedação do parágrafo único, do artigo 15, da Lei n. º 10.094/13:
Art. 15. As incorreções, omissões ou inexatidões, que não importem nulidade, serão sanadas quando não ocasionarem prejuízo para a defesa do administrado, salvo, se este lhes houver dado causa ou quando influírem na solução do litígio.
Parágrafo único. Sem prejuízo do disposto no “caput”, não será declarada a nulidade do auto de infração sob argumento de que a infração foi descrita de forma genérica ou imprecisa, quando não constar da defesa, pedido neste sentido.
A) OMISSÃO DE VENDAS DETECTADA ATRAVÉS DA COMPROVAÇÃO DE FALTA DE LANÇAMENTOS DE NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS PRÓPRIOS
Neste ponto, o litígio administrativo versa sobre matéria bastante conhecida, e de tratativas recorrentes nesta Corte de Julgamento de Processos Administrativos Tributários, para aqueles que labutam no ramo do direito tributário no Estado da Paraíba, qual seja, lavratura de auto de infração por ocasião do cometimento do ilícito de não lançar, nos livros próprios, as notas fiscais de aquisição de mercadorias.
Assim, é bem sabido que o ato de não registrar nos livros próprios os documentos de aquisição de mercadorias, em regra, acarreta consequências que dizem respeito tanto à obrigação principal de recolher o ICMS quanto à obrigação acessória de efetuar o registro das notas fiscais no respectivo Livro Registro de Entradas e, como já dito, de tratativas recorrentes na corte administrativa de julgamento de processos tributários de segundo grau.
Essas considerações, inclusive, independem do dolo com que agiu o contribuinte, seja culposa ou dolosamente. A sua boa-fé, portanto, não o exime das responsabilidades do ato ilícito praticado. Se alguém o induziu ao erro, não se afasta a responsabilidade e as consequências que a lei determinar.
Nesse diapasão, com relação ao mérito das questões aqui enfrentadas, pode-se dizer que a condição de contribuinte do ICMS no Estado da Paraíba impõe a todos enquadrados em tal circunstância uma série de obrigações, sejam de natureza principal, sejam de natureza acessória. Uma das quais é o efetivo e regular lançamento, nos livros próprios, das notas fiscais de aquisição de mercadorias no respectivo Livro Registro de Entradas.
Aliás, a escrituração do referido livro é de obrigatoriedade só excepcionada para específicos contribuintes que, em condição de hipossuficiência, situam-se em condição especial, o que para o denunciado não ocorre. Assim, persiste, para ele, a obrigatoriedade de escriturar o referido livro, nele devendo, obrigatoriamente, lançar todas as notas fiscais de aquisição de mercadoria – tributáveis ou não -, além das de prestação de serviço que impliquem fato gerador do ICMS. É inteligência que se depreende do artigo 267 do RICMS:
Art. 267. Os contribuintes e demais pessoas obrigadas à inscrição deverão manter, em cada um dos estabelecimentos, os seguintes livros fiscais de conformidade com as operações que realizarem:
I - Registro de Entradas, modelo 1;
II - Registro de Entradas, modelo 1-A; (grifo nosso)
III - Registro de Saídas, modelo 2;
IV - Registro de Saídas, modelo 2-A;
V - Registro de Controle da Produção e do Estoque, modelo 3;
VI - Registro de Impressão de Documentos Fiscais, modelo 5;
VII - Registro de Utilização de Documentos Fiscais e Termos de
Ocorrências, modelo 6;
VIII - Registro de Inventário, modelo 7;
IX - Registro de Apuração do ICMS, modelo 9;
X - Livro de Movimentação de Combustíveis;
XI – Livro Caixa.
Ora, a obrigatoriedade de escrituração do Livro Registro de Entradas envolve outra obrigação: a de manter nele todos os registros de aquisição de mercadorias e de contratação de serviços de transporte e de comunicação com a qual o contribuinte transacione em referido período, de acordo com o que estabelece o artigo 276 do RICMS:
Art. 276. O Registro de Entradas, modelos 1 ou 1-A, Anexos 24 e 25, destina-se à escrituração do movimento de entradas de mercadorias, a qualquer título, no estabelecimento e de utilização de serviços de transporte e de comunicação. (grifo nosso)
Da parte grifada do texto extrai-se que a obrigatoriedade se estende a qualquer tipo de aquisição, não importando se a aquisição se destina à revenda, ativo fixo ou consumo. Pouco importa. Adquiriu mercadorias ou contratou serviços, nasce a obrigação de lançar no livro registro de entrada. Assim, se algumas aquisições realizadas pelo autuado não se destinam à revenda, nada mais irrelevante, a presunção de que trata o artigo 646, destacado adiante, prevalece.
Ocorre que, no âmbito da legislação em vigor, a falta de lançamento de notas fiscais de aquisição de mercadorias tem efeito muito mais abrangente do que apenas a responsabilização pelo descumprimento da obrigação acessória. De acordo com o que estabelece o referido artigo 646, do RICMS-PB:
Art. 646. Autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou a realização de prestações de serviços tributáveis sem o recolhimento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção:
I – o fato de a escrituração indicar:
a) insuficiência de caixa;
b) suprimentos a caixa ou a bancos, não comprovados;
II – a manutenção no passivo de obrigações já pagas ou inexistentes;
III – qualquer desembolso não registrado no Caixa;
IV – a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas;
V – declarações de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito.
Parágrafo único. A presunção de que cuida este artigo aplica-se, igualmente, a qualquer situação em que a soma dos desembolsos no exercício seja superior à receita do estabelecimento, levando-se em consideração os saldos inicial e final de caixa e bancos, bem como, a diferença tributável verificada no levantamento da Conta Mercadorias, quando do arbitramento do lucro bruto ou da comprovação de que houve saídas de mercadorias de estabelecimento industrial em valor inferior ao Custo dos Produtos Fabricados , quando da transferência ou venda, conforme o caso. (grifo nosso) (com redação vigente a partir de 23/06/2012)
Não é por menos que a indigitada presunção mereceu do legislador uma atenção especial, reforçando-a por disposição legal, mais especificamente no § 8º do artigo 2º da Lei 6.379/96:
Art. 3º O imposto incide sobre:
(...)
§ 8º O fato de a escrituração indicar insuficiência de caixa e bancos, suprimentos a caixa e bancos não comprovados ou a manutenção no passivo de obrigações já pagas ou inexistentes, bem como a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas ou de declarações de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito, autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou de prestações de serviços sem o recolhimento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção. (grifo nosso) (com redação a partir de 2011)
Há, portanto, efeitos que ultrapassam a mera consideração a respeito da falta de cumprimento de obrigação acessória. Impõe ao auditor a obrigação de lançar crédito tributário decorrente de omissão de saída pretérita de mercadorias tributáveis sempre que estiver diante da situação em que o contribuinte não lançar em sua escrita fiscal e contábil (se for o caso) notas fiscais de aquisição de mercadorias e de prestação de serviço de transporte e de comunicação.
E aqui se faça uma advertência a respeito das presunções em que se baseia o auto de infração. O libelo acusatório se baseia num fato: o cometimento da omissão do contribuinte de não ter lançado, nos livros próprios, diversas notas fiscais de aquisição de mercadorias ou prestações de serviço cuja relação está anexada ao processo. Esse é o fato e que, de acordo com a instrução processual, está mais do que provado, integralmente.
Desse fato, nasce a presunção: omissão de saídas de mercadorias tributáveis pretéritas, já que devem ter ocorrido antes para que se pudesse fazer jus às despesas com as aquisições. Esclareça-se, dessa forma, para que não pairem mais dúvidas, que essa presunção nasce de dispositivos legais, mandamentais, regularmente constituídas pelo servidor fazendário e que são, portanto, absolutamente procedentes.
Assim, é preciso esclarecer, como já delineado, de que ele está sendo acusado de omitir saídas tributáveis pretéritas em decorrência da constatação de que houve a falta de lançamento (registro fiscal ou contábil) de notas fiscais de aquisição nos livros próprios, a exemplo dos Livros Registro de Entradas, Livro Caixa etc.
Conforme demonstrado, portanto, a autuação diz respeito à obrigação principal, referente àquelas saídas pretéritas que foram omitidas com o fim de levantar recursos financeiros para suportar o ônus, financeiro, das aquisições realizadas. Essas estão demonstradas na relação de documentos fiscais acostada aos autos às fls. 4-6. Essa é a presunção que, do texto do artigo 646 do RICMS, já destacado, se deve ser feita. Dessa presunção, nasce efeitos que decorrem das disposições dos artigos 158, I e 160, I do RICMS-PB:
Art. 158. Os contribuintes, excetuados os produtores agropecuários, emitirão Nota Fiscal, modelos 1 ou 1-A, Anexos 15 e 16:
I - sempre que promoverem saída de mercadorias;
[...]
Art. 160. A nota fiscal será emitida:
I - antes de iniciada a saída das mercadorias;
[...]
E, em função dos devaneios jurídicos, se faça uma advertência adicional no entendimento do fim a que se presta a presunção autorizada pelo dispositivo em destaque: o que se cobra nesse caso não é o somatório das notas fiscais não lançadas. Não são as notas fiscais não lançadas, em si, o objeto da autuação. O que se tributa é o valor das saídas de mercadorias tributáveis omitidas, sem o devido recolhimento do imposto devido, em etapa anterior às aquisições e cujo resultado das operações serviu de esteio financeiro para o pagamento das compras cujas entradas não foram registradas. A presunção é de saídas pretéritas ao pagamento das referidas notas fiscais.
Evidentemente que todas as presunções legais repousam sobre o manto da relativa natureza da incidência do art. 646 do RICMS/PB, motivo pelo qual recai sobre a responsabilidade do contribuinte os mandamentos da legislação tributária que diz respeito ao ônus invertido de provar que a acusação não é consistente.
Nesse sentido, deveria, para além das alegações robustas, trazer provas aos autos de que as notas foram lançadas na escrita fiscal ou pagas através de Livros Financeiros (Caixa, por exemplo), provocando, assim, a improcedência do lançamento de ofício, em sentido de que é o contribuinte que deve provar que a acusação que lhe é imputada não procede, assim como se extrai da dicção do artigo 56 da Lei n. º 10.094/13:
Art. 56. Todos os meios legais, ainda que não especificados nesta Lei, são hábeis para provar a verdade dos fatos em que se funda a ação, a impugnação ou o recurso.
Parágrafo único. O ônus da prova compete a quem esta aproveita. (grifo nosso)
Dessa forma, cabe ao contribuinte a prova em contrário, seja por dispor de muito mais condições de fazê-lo, seja por ser o interessado com mais disposição sobre a documentação fiscal e contábil, reflexa do seu movimento diário de mercadorias, objeto de seu estatuto social; seja por gozar de presunção relativa, o lançamento tributário. Assim se posiciona o CRF em diversos julgados, a exemplo do 424/2019:
DESCUMPRIMENTO DE DEVERES INSTRUMENTAIS. FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS NO LIVRO REGISTRO DE ENTRADAS. INFRAÇÃO CARACTERIZADA. INVERTE-SE O ÔNUS DA PROVA PARA QUE O CONTRIBUINTE APRESENTE CONTRAPROVAS QUE LHE APROVEITA NA DEFESA APRESENTADA. AUTO DE INFRAÇÃO PROCEDENTE. MANTIDA A DECISÃO RECORRIDA. RECURSO VOLUNTÁRIO DESPROVIDO.
A falta de lançamento de notas fiscais no livro registro de entradas caracteriza ato infracional à legislação tributária em vigor na Paraíba, o que acarreta lavratura de auto de infração com a cobrança de penalidade atinente à omissão constatada.
Lavrado o auto de infração, cabe ao contribuinte apresentar argumentos e provas que sejam suficientes para afastar de si as acusações que lhe são imputadas.
Aliás, o próprio Conselho de Recursos Fiscais já emitiu jurisprudência sumulada, com base na qual reconhece que, em se tratando de notas fiscais não lançadas, é o contribuinte que assumirá a tarefa de provar a improcedência da autuação, conforme texto adiante destacado:
SÚMULA 02 – DA NOTA FISCAL NÃO LANÇADA-A constatação de falta de registro da entrada de nota fiscal de aquisição impõe ao contribuinte o ônus da prova negativa da aquisição, da presunção legal de omissão de saídas pretéritas em razão de mercadorias tributáveis ou realização de prestações de serviços tributáveis.
Assim, diante do fato de a escrituração indicar a falta de lançamento de documentos fiscais nos livros próprios, é condição suficiente para que se autorize a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis. Esta é consideração que converge para vasta jurisprudência administrativa do Conselho de Recursos Fiscais, cujo exemplo será demonstrado em decisão recente:
Acórdão 470/2019
NOTAS FISCAS NÃO LANÇADAS. ICMS SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO. PROCEDÊNCIA DA EXIGÊNCIA FISCAL. MANUTENÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA. AUTO DE INFRAÇÃO PROCEDENTE. RECURSO VOLUNTÁRIO DESPROVIDO.
A lavratura do auto de infração se deu dentro dos parâmetros legais exigidos, não havendo que se falar em cerceamento de defesa ou mesmo ausência de elementos probatórios ou ainda, qualquer outro vício de natureza formal ou material capaz de comprometer a validade da autuação fiscal.
Constatada, portanto, a irregularidade fiscal diante da ausência de provas com força para elidir a acusação.
A exigência fiscal apresentou-se regular diante da desobediência à legislação de regência à época. (grifo nosso)
O contribuinte, portanto, para além das alegações, não apresentou qualquer prova elidente das acusações que lhe são dirigidas. Bastaria, portanto, que apresentasse documentos que atestassem ou o lançamento dos documentos relacionados pela fiscalização ou a comprovação de que o ônus suportado nessas aquisições foi registrado em sua contabilidade: Livros Caixa, Razão etc, mas não o fez.
Por todo o exposto,
V O T O - pelo recebimento do recurso hierárquico, por regular, e, no mérito, pelo seu provimento, reformando a sentença prolatada na primeira instância, julgando PROCEDENTE o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00001684/2018-31, lavrado em 4/9/2018, em desfavor da empresa JIREH DISTRIBUIDORA E VAREJISTA EM AR CONDICIONADA, PEÇAS E ACESSÓRIOS EIRELI, inscrição estadual n° 16.213.342-1, devidamente qualificada nos autos, impondo o ônus desta ação fiscal, imputando-lhe o crédito tributário no valor de R$ 114.704,96 (cento e quatorze mil, setecentos e quatro reais e noventa e seis centavos), sendo R$ 57.352,48 (cinquenta e sete mil, trezentos e cinquenta e dois reais e quarenta e oito centavos) de ICMS, por infringência aos artigos 158, I, c/c 160, I, e 646, todos do RICMS-PB, aprovado pelo Decreto n. º 18.930/97, e mais R$ 57.352,48 (cinquenta e sete mil, trezentos e cinquenta e dois reais e quarenta e oito centavos), a título de penalidade pecuniária, por aplicação do artigo 82, V, “f” da Lei 6.379/96.
Intimações necessárias a cargo da Repartição Preparadora na forma prevista no Regulamento do ICMS.
Primeira Câmara de Julgamento, sessão realizada por meio de vídeo conferência em 05 de junho de 2020.
ANISIO DE CARVALHO COSTA NETO
Conselheiro Relator
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