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ACÓRDÃO Nº 000255/2020 PROCESSO Nº 1248492017-2

brasao paraiba
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA

PROCESSO Nº 1248492017-2
PRIMEIRA CÂMARA DE JULGAMENTO
Recorrente: R MACEDO & CIA LTDA
Recorrida: GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULG. DE PROCESSOS FISCAIS – GEJUP
Preparadora: UNIDADE DE ATENDIMENTO AO CIDADÃO DA SEFAZ – MAMANGUAPE
Autuante: NEUMA OLIVEIRA RIOS
Relator: CONS.º LEONARDO DO EGITO PESSOA

OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS. CONTA MERCADORIAS. INAPLICABILIDADE DA CONTA MERCADORIAS EM EMPRESAS ENQUADRADAS NO SIMPLES NACIONAL – DENÚNCIA NÃO CONFIGURADA. LEVANTAMENTO FINANCEIRO. ALÍQUOTA E PENALIDADE APLICÁVEIS NOS TERMOS DA LEGISLAÇÃO A QUE ESTÃO SUBMETIDAS AS DEMAIS PESSOAS JURÍDICAS. EXCLUSÃO DO MONTANTE RELATIVO AO PREJUÍZO BRUTO COM MERCADORIAS SUJEITAS À SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA, ISENTAS OU NÃO TRIBUTADAS APURADAS POR MEIO DA CONTA MERCADORIAS – DENÚNCIA PARCIALMENTE COMPROVADA – AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE – ALTERADA A DECISÃO RECORRIDA - RECURSO VOLUNTÁRIO PARCIALMENTE PROVIDO.

- A técnica da Conta Mercadorias – Lucro Presumido não é aplicável para contribuinte do Simples Nacional, uma vez que o arbitramento de lucro bruto se evidencia incompatível e em total dissonância com o que estabelece a Lei Complementar n⁰ 123/06.
- O Levantamento Financeiro consiste na realização de um confronto entre o montante das receitas do período e o total das despesas realizadas. Com efeito, se estas são maiores do que aquelas, resta caracterizada a figura de pagamentos a descoberto, revelador de operações comerciais sonegadas. In casu, a identificação de ocorrência de prejuízo bruto com mercadorias sujeitas à substituição tributária apurado nos levantamentos das Contas Mercadorias, bem como os ajustes realizados pela fiscal autuante após recebido o processo em diligência, fez sucumbir parte do crédito tributário originalmente Lançado no exercício de 2016.

Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...

 

 

              A C O R D A M os membros da Primeira Câmara de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, à unanimidade e de acordo com o VOTO pelo recebimento do recurso voluntário, por regular e tempestivo e, quanto ao mérito, pelo seu provimento parcial, alterando a sentença exarada na instância monocrática, que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00001795/2017-67, lavrado em 11 de agosto de 2017 contra a empresa R MACEDO & CIA LTDA, condenando-a ao pagamento do crédito tributário no valor total de R$ 104.716,38 (cento e quatro mil, setecentos e dezesseis reais e trinta e oito centavos), sendo R$ 52.358,19 (cinqüenta e dois mil, trezentos e cinquenta e oito reais e dezenove centavos) de ICMS, por infringência aos artigos 158, I e 160, I, c/fulcro no art. 646, parágrafo único, todos do RICMS/PB e R$ 52.358,19 (cinqüenta e dois mil, trezentos e cinquenta e oito reais e dezenove centavos) de multa por infração, com arrimo no artigo 82, V, “f”, da Lei nº 6.379/96.               Ao tempo em que cancelo, por indevido, o montante de R$ 29.070,80 (vinte e nove mil, setenta reais e oitenta centavos), sendo R$ 14.535,40 (quatorze mil, quinhentos e trinta e cinco reais e quarenta centavos) de ICMS e R$ 14.535,40 (quatorze mil, quinhentos e trinta e cinco reais e quarenta centavos) de multa por infração.               Intimações necessárias a cargo da repartição preparadora, na forma regulamentar.                                                                
                        P.R.I.

                        Primeira Câmara de Julgamento, Sessão realizada por meio de videoconferência, em 26 de agosto de 2020.


                                                                   LEONARDO DO EGITO PESSOA
                                                                                Conselheiro Relator

                                                                  LEONILSON LINS DE LUCENA 
                                                                                  Presidente

Participaram do presente julgamento os membros da Primeira Câmara de Julgamento, PETRÔNIO RODRIGUES LIMA, THAÍS GUIMARÃES TEIXEIRA FONSECA, NAYLA COELI DA COSTA BRITO CARVALHO (Suplente).

                                                                  SÉRGIO ROBERTO FÉLIX LIMA      
                                                                              Assessor Jurídico

Em análise nesta Corte, o recurso voluntário interposto contra decisão monocrática que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00001795/2017-67, lavrado em 11 de agosto de 2017 em desfavor da empresa R MACEDO & CIA LTDA, inscrição estadual nº 16.040.861-0.

Na referida peça acusatória, constam as seguintes denúncias, ipsis litteris:

 

0027 – OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – CONTA MERCADORIAS >> Contrariando dispositivos legais, o contribuinte omitiu saídas de mercadorias tributáveis, resultando na falta de recolhimento do ICMS, irregularidade esta detectada através do levantamento Conta Mercadorias.

 

0021 – OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – LEVANTAMENTO FINANCEIRO >> O contribuinte omitiu saídas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto devido, tendo em vista a constatação que os pagamentos efetuados superaram as receitas auferidas. Irregularidade esta detectada através de Levantamento Financeiro.

 

Em decorrência destes fatos, a Agente Fazendária, considerando haver o contribuinte infringido os artigos 158, I; 160, I; 643, § 4º, II e 646, parágrafo único, todos do RICMS/PB, lançou um crédito tributário na quantia total de R$ 133.787,18 (cento e trinta e três mil, setecentos e oitenta e sete reais e dezoito centavos), sendo R$ 66.893,59 (sessenta e seis mil, oitocentos e noventa e três reais e cinqüenta e nove centavos) de ICMS e R$ 66.893,59 (sessenta e seis mil, oitocentos e noventa e três reais e cinqüenta e nove centavos) a título de multa por infração, com arrimo no artigo 82, V, alíneas “a”e “f”, da Lei nº 6.379/96.

Documentos instrutórios às fls. 8 a 15.

Cientificada pessoalmente em 28/08/2017, conforme consta no próprio auto de infração (fls. 07), a Autuada ingressa com peça reclamatória tempestiva (fls. 21 a 23), protocolada em 25/09/2017, contrapondo-se às acusações com as seguintes argumentações:

1- As infrações são concorrentes no exercício de 2015;

2.1- No Levantamento Financeiro de 2015, os valores referentes às compras efetuadas, após a redução das compras com substituição tributária e devoluções, apresentam divergências.

2.2- Ainda nesse Levantamento, as NFs de nºs 1417891, 7237, 14893, 2848, 15195, 2985, 15831, 3103, 16578, 16598, 16916, 17165, e 17411 encontram-se lançadas no livro Registro de Entradas, faltou à empresa proceder a retificação no arquivo emitido (GIM).

2.3- Ainda acerca desse Levantamento, as despesas pro-labore também se encontram divergentes, uma vez que apenas um sócio da empresa apresentou sua retirada.

2.4- Assim, anexamos cópia do Levantamento Financeiro “paralelo” de 2015, do Registro de Entradas e de recibos de pagamento de pró-labore.

3.1- No Levantamento Financeiro 2016, observa-se que a Agente Tributária também alocou valores que divergem com os apresentados pela empresa.

3.2- Os valores referentes às compras efetuadas no exercício, após a redução das compra com substituição tributária e devoluções, apresentam divergências.

3.3- O valor das notas fiscais não lançadas, constantes no referido Levantamento, R$ 42.771,16; não expressam a realidade, uma vez que verificamos que foram lançadas as NFs de nºs 17619, 17872, 17787, 17708, 17792, 17987, 17950, 18356, 18086, 18665, 18648, 18649,19305, 19126, 19026, 3466, 19592, 19467, 19514, 20565, 21063, 162176, 47996 e 4114.

3.4- Assim, anexamos cópia do Levantamento Financeiro “paralelo” de 2016, e do Registro de Entradas.

 

Com informação de inexistência de antecedentes fiscais (fls. 19), foram os autos conclusos (fls. 78) e remetidos à Gerência Executiva de Julgamento de Processos Fiscais – GEJUP, sendo distribuído ao julgador fiscal Francisco Nociti, que devolveu o processo em diligência com o intuito de obter maiores esclarecimentos para o deslinde dos itens 2.1 a 3.4 (acima).

Em resposta a Diligência Fiscal a Agente Tributária compila nova Planilha do Levantamento Financeiro do Exercício de 2015 (fl. 81), e relata sua análise acerca das argumentações da impugnante na folha 82, onde concorda com o levantamento apresentado pelo contribuinte no tocante ao Levantamento Financeiro do Exercício de 2016.

Em seguida o processo retornou para GEJUP para o Julgador Francisco Nociti o qual julgou o auto de infração parcialmente procedente, nos termos da seguinte ementa, litteris:

OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS. CONTA MERCADORIAS. ACUSAÇÃO CARACTERIZADA. OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS. CONSTATADA PELO LEVANTAMENTO FINANCEIRO. DENÚNCIA CONFIGURADA EM PARTE.

- A ocorrência de omissão de saída de mercadorias tributáveis verificada nas Contas Mercadorias e no Levantamento Financeiro enseja a presunção de não recolhimento do ICMS, conforme presunção legal relativa do art. 646 do RICMS/PB.

- Quando dos valores de ICMS que a Fiscalização aponta no Levantamento Financeiro já houver sido excluído o montante de imposto devido acusado na Conta Mercadorias, não há de se cogitar concorrência de infração.

- Ajustes no Levantamento Financeiro de 2016, em decorrência das provas apresentadas pela reclamante, associada à Diligência Fiscal, demandada por esta Instância de Julgamento.

AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE.

 

Cientificada da decisão proferida pela instância prima por DTE em 19 de junho de 2019, a autuada apresentou em 19 de julho de 2019, recurso voluntário tempestivo ao Conselho de Recursos Fiscais do Estado da Paraíba (fls. 96 a 101), por meio do qual assevera que:

a)      O levantamento financeiro dos exercícios 2015 e 2016 deve ser descaracterizado pois a recorrente é empresa optante do Simples Nacional, obrigada à escrituração do Livro Caixa e que para se proceder a elaboração do demonstrativo financeiro, seria necessário a presença do Livro Caixa e este não foi solicitado a empresa pela fiscalização;

b)      Alega que em diversos julgados o Conselho de Recursos Fiscais não tem admitido a aplicação da técnica levantamento da Conta Mercadorias para empresas do Simples Nacional;

 

Com base nas considerações acima, a recorrente requer:

A anulação em relação a penalidade imputada no Auto de Infração de Estabelecimento n° 93300008.09.00001795/2017-67;

 

Remetidos ao Conselho de Recursos Fiscais, foram os autos distribuídos a esta relatoria, segundo os critérios regimentais, para apreciação e julgamento.

 

Eis o relatório.

 

VOTO

 

A quaestio juris versa sobre as denúncias de: i) levantamento da conta mercadorias – exercício 2015 e ii) levantamento financeiro – exercícios 2015 e 2016, em face da empresa R MACEDO & CIA LTDA, já previamente qualificada nos autos.

De início, cabe considerar que o lançamento fiscal se procedeu conforme os requisitos da legislação de regência, estando nele delineadas as formalidades prescritas no art. 142 do CTN e nos dispositivos constantes nos arts. 14, 16 e 17, da Lei estadual, nº 10.094/2013 (Lei do PAT), não se vislumbrando quaisquer incorreções ou omissões que venham a caracterizar a sua nulidade.

Instaurado o contencioso tributário a partir da interposição tempestiva da impugnação contra o lançamento do crédito tributário e não havendo preliminares suscitadas na peça de defesa, e, para melhor entendimento e compreensão, passo a análise individualizada do mérito de cada acusação.

 

- Do mérito

Acusação 01: Contas Mercadorias – Exercício 2015

A acusação trata de diferença tributável apurada em Levantamento da Conta Mercadorias, referente ao exercício de 2015, onde foi apurado que o contribuinte não alcançou a margem de lucro de 30% (trinta por cento) sobre o Custo das Mercadorias Vendidas – CMV, conforme demonstrativos (fls. 08).

O Levantamento da Conta Mercadorias, guardiã do movimento de entradas e saídas da espécie, tem a finalidade de aferir a margem mínima de lucro alcançada pelo contribuinte, e, através da análise dos estoques inicial e final de cada período, obtém-se elementos necessários à apuração de irregularidades.

A bem de ver, é a Conta Mercadorias técnica de aferição amparada em presunção legal, cujo objetivo é apurar, com base em um parâmetro percentual sugerido em lei para a margem de lucro bruto, a regularidade fiscal das operações de saídas de mercadorias tributáveis. Tudo na conformidade do que preceitua art. 643, §4º, II c/c art. 646 do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto 18.930/96.

Em sua peça recursal, a recorrente alega que em diversos julgados o Conselho de Recursos Fiscais não tem admitido a aplicação da técnica levantamento da Conta Mercadorias para empresas do Simples Nacional.

A Lei Complementar nº 123/06 - Lei do Simples Nacional - dispõe taxativamente, em seu art. 34, que as microempresas e as empresas de pequeno porte estão sujeitas a todas as presunções de omissão de receitas existentes nas legislações de regência dos impostos e contribuições incluídos no Simples Nacional.

Assim, dada a leitura das normas supracitadas – de que as empresas inseridas no Simples Nacional estão sujeitas a todas as presunções de omissão de receita existente nas legislações de regência dos impostos (LC 123/06), e, bem assim, de que é legítima a presunção de omissão de receitas e exigência do imposto por meio do levantamento da Conta Mercadorias (RICMS/PB) – poderíamos concluir, ainda que tal se revele um equívoco, como veremos mais à frente, que o procedimento do Levantamento da Conta Mercadorias seria perfeitamente aplicável às empresas do Simples Nacional. Noutras palavras, num exame muito superficial, e partindo-se de interpretação literal das normas acima citadas, poderíamos pensar correta e legítima a utilização do Levantamento da Conta Mercadorias na auditoria da autuada, empresa inserta no Simples Nacional.

Ocorre, porém, que, não obstante a redação dos dispositivos de lei supracitados, não há negar que, especificamente a Conta Mercadorias depende, para fazer eclodir a denúncia de omissão de receitas, da manutenção de uma margem de lucro mínima de 30% sobre o chamado Custo das Mercadorias Vendidas – o CMV. Ou seja, para que o contribuinte seja considerado regular perante a Fazenda Estadual, é preciso que obtenha um lucro de 30% sobre o Custo das Mercadorias Vendidas, cujo percentual, convém lembrar, tem uma razão de ser, isto é, destina-se a fazer frente às despesas do contribuinte.

Este aspecto em particular - a exigência de uma margem de lucro mínima de 30% para empresas do Simples Nacional - assume contornos relevantes na disciplina da matéria, porquanto a legislação concernente a esse regime de tributação, a LC 123/06, não obriga a que o contribuinte obtenha tal lucro. Ao revés, libera a empresa de manter um lucro real ou presumido, até porque, é bem verdade, não poderia ser diferente, já que se trata de um regime de tributação diverso daqueles outros nos quais há a obrigatoriedade, pela legislação do Imposto de Renda, para que se apure o lucro real e lucro presumido, conforme o caso.

Considerando esse fato - ausência de exigência legal de obtenção de lucro, e mais que isso, do lucro mínimo de 30%, seja na lei federal do Imposto de Renda ou na lei regente do Simples Nacional – resta-nos decidir se ainda assim é cabível a exigência imposta pela lei do ICMS, especialmente porque a subsunção do fato à norma de regência – omissão de receitas – somente ocorre se o contribuinte não alcançar a margem mínima de lucro prevista pela lei estadual.

A primeira reflexão importante neste caso é que, se a LC 123/06 determina que a tributação/recolhimento do ICMS por este contribuinte em particular – isto é, aquele beneficiado pelo sistema do Simples Nacional - seja realizada com base no valor do faturamento da empresa e que, ademais, está dispensado de contabilidade regular, é de fato incabível interpretação de que a lei estadual possa conter exigência de que esse mesmo contribuinte pratique uma margem de lucro de 30% sobre o Custo de Mercadorias Vendidas.

Note-se, porque relevante, que as empresas do Simples Nacional estão dispensadas de manter contabilidade regular e que somente está seria capaz de afastar a presunção relativa detectada por meio da Conta Mercadorias – lucro presumido (objeto dos autos). Nessa linha de raciocínio, convenhamos, não poderia se manter uma exigência de imposto do contribuinte mediante um exame de auditoria cuja principal maneira de afastar seria a presença da contabilidade.

A propósito do mesmíssimo tema, colaciono abaixo, os recentes acórdãos nº 170/2019 e 210/2019 do Conselho de Recursos Fiscais do Estado da Paraíba – CRF/PB, cujas ementas transcrevemos a seguir:

Acórdão nº 170/2019

Processo nº 0922032016-9

SEGUNDA CÂMARA DE JULGAMENTO

Relator: CONS.º SIDNEY WATSON FAGUNDES DA SILVA

OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS –– CONTA MERCADORIAS – INAPLICABILIDADE DA TÉCNICA PARA CONTRIBUINTES DO SIMPLES NACIONAL – IMPROCEDÊNCIA DA ACUSAÇÃO - REFORMADA A DECISÃO RECORRIDA – AUTO DE INFRAÇÃO IMPROCEDENTE – RECURSO VOLUNTÁRIO PROVIDO

 

- A técnica da Conta Mercadorias – Lucro Presumido não é aplicável para contribuinte do Simples Nacional, uma vez que o arbitramento de lucro bruto se evidencia incompatível e em total dissonância com o que estabelece a Lei Complementar nº 123/06. O contribuinte enquadrado como Simples Nacional possui características e regramento próprios, o que o coloca em situação especial, não permitindo a utilização de margem de lucro presumido para fins de surgimento da presunção juris tantum de omissão de receitas.

 

Acórdão nº 210/2019

Processo nº 1634592014-2

PRIMEIRA CÂMARA DE JULGAMENTO

Relatora Voto Vencedor: CONS.ª GILVIA DANTAS MACEDO

OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS. CONTA MERCADORIA. INAPLICABILIDADE DA CONTA MERCADORIAS EM EMPRESAS ENQUADRADAS NO SIMPLES NACIONAL. AUTO DE INFRAÇÃO NULO. VÍCIO MATERIAL. REFORMADA A DECISÃO RECORRIDA. RECURSO VOLUNTÁRIO PROVIDO.

 

- A técnica da Conta Mercadorias – Lucro Presumido não é aplicável para contribuinte do Simples Nacional, uma vez que a obrigação de obter lucro bruto de no mínimo 30% sobre o CMV - custo das mercadorias vendidas se evidencia incompatível e em total dissonância com o que estabelece a Lei Complementar nº 123/06.

 

Cumpre destacar que este caso é, portanto, da utilização de procedimento impróprio para a apuração do crédito, o que corresponde a um defeito do lançamento pertinente à verificação do cálculo do tributo. Em tal circunstância, está na linha dos chamados vícios insanáveis e, por isto, não podem nem ser aproveitados pelo julgador, mediante diligências, nem podem ser refeitos pela autoridade fiscal.

Em face do acima exposto, estou provendo o recurso apresentado pela recorrente no tocante a acusação em tela, por entender restar demonstrada a fragilidade da presente denúncia descrita na inicial, uma vez que se mostrou injustificável a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto devido quando da utilização da técnica do Levantamento da Conta Mercadoria.

In fine, comprovada a inocorrência de violação à legislação tributária estadual, forçoso reconhecermos a necessidade de cancelamento da exação fiscal no montante de R$ 17.060,74 (dezessete mil, sessenta reais e setenta e quatro centavos).

 

Acusação 02: Levantamento Financeiro – Exercícios 2015 e 2016

OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – LEVANTAMENTO FINANCEIRO

A presente acusação trata-se de infração que foi alcançada pela técnica fiscal denominada de Levantamento Financeiro em um procedimento de aferição que analisa se há equilíbrio entre os somatórios das despesas incorridas com as receitas auferidas em um determinado exercício, repercutindo em omissão de vendas sempre que as despesas superarem as receitas. Nesta hipótese, a legislação vigente autoriza a Fiscalização a se valer da presunção juris tantum de omissão de saídas de mercadorias tributáveis, arrimado no parágrafo único do art. 646 do RICMS/PB:

Art. 646. Autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou a realização de prestações de serviços tributáveis sem o recolhimento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção:

 

I – o fato de a escrituração indicar:

 

a)       insuficiência de caixa;

 

b)    suprimentos a caixa ou a bancos, não comprovados;

 

II – a manutenção no passivo de obrigações já pagas ou inexistentes;

 

III – qualquer desembolso não registrado no Caixa;

 

IV – a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas;

 

V – declarações de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito.

 

Parágrafo único. A presunção de que cuida este artigo aplica-se, igualmente, a qualquer situação em que a soma dos desembolsos no exercício seja superior à receita do estabelecimento, levando-se em consideração os saldos inicial e final de caixa e bancos, bem como, a diferença tributável verificada no levantamento da Conta Mercadorias, quando do arbitramento do lucro bruto ou da comprovação de que houve saídas de mercadorias de estabelecimento industrial em valor inferior ao Custo dos Produtos Fabricados , quando da transferência ou venda, conforme o caso.

 

A presunção de que trata o artigo 646 do RICMS/PB, contudo, é relativa, cabendo ao contribuinte a prova da sua improcedência, conforme prevê a parte final do caput do referido artigo.

Por imperativo legal, a constatação desta omissão obriga o auditor fiscal a lançar, de ofício, o crédito tributário decorrente desta infração, tendo em vista a receita marginal originária das saídas omitidas afrontar o disciplinamento contido nos art. 158, I, e art. 160, I, ambos do RICMS/PB, os quais transcrevemos abaixo:

Art. 158. Os contribuintes, excetuados os produtores agropecuários, emitirão Nota Fiscal, modelos 1 ou 1-A, Anexos 15 e 16:

 

I - sempre que promoverem saída de mercadorias;

 

Art. 160. A nota fiscal será emitida:

 

I - antes de iniciada a saída das mercadorias;

 

Nesta esteira, considerando haver o Contribuinte infringido a legislação tributária, o Auditor Fiscal responsável pela lavratura do Auto de Infração em tela, propôs, como medida punitiva, a aplicação da multa insculpida no artigo 82, V, “f”, da Lei nº 6.379/96, in verbis:

Art. 82. As multas para as quais se adotará o critério referido no inciso II, do art. 80, serão as seguintes:

(...)

V - de 100% (cem por cento):

(...)

f) aos que deixarem de recolher o imposto proveniente de saída de mercadoria, dissimulada por receita de origem não comprovada, inclusive a representada por despesa realizada a descoberto de caixa, pela existência de passivo fictício ou por qualquer forma apurada através de levantamento da escrita contábil;

 

O levantamento fiscal, no presente caso concreto, concluiu que a totalidade dos recursos disponíveis pelo contribuinte, em 2015 e 2016, não foi suficiente a fazer frente às despesas e pagamentos que declarou ter realizado no mesmo período. Configurou-se a ocorrência de situação operacional deficitária do ponto de vista econômico/financeiro na empresa, nos exercícios citados, situação que, em se configurando, cede lugar a exigência do imposto sobre a diferença entre o montante aplicado e o disponível, diante da sua significação: saídas tributáveis não faturadas.

No entanto, consoante previsão ínsita no parágrafo único do art. 646, tal conclusão firma-se em presunção relativa, posto que devolve ao acusado o ônus de demonstrar a veracidade de suas alegações.

Abro aqui um parêntese para ratificar que, diferentemente da Conta Mercadorias, o Levantamento Financeiro é uma técnica perfeitamente aplicável aos contribuintes do Simples Nacional, uma vez que a legislação de regência não se contrapõe à regra geral a que estão submetidas as demais pessoas jurídicas.

Inconformada com a autuação, a recorrente em seu recurso alega que o levantamento financeiro dos exercícios 2015 e 2016 devem ser descaracterizados, pois é empresa optante do Simples Nacional, obrigada à escrituração do Livro Caixa e que para se proceder a elaboração do demonstrativo financeiro, seria necessário a presença do Livro Caixa e este não foi solicitado a empresa pela fiscalização.

Inicialmente, cabe-nos lembrar que o julgador monocrático em razão dos pedidos da defesa, acertadamente baixou o processo em diligência, oportunidade em que a fiscal autuante ao analisar os pedidos da defesa e revisar seus trabalhos de auditoria, manteve a acusação no tocante ao exercício de 2015 e com relação ao exercício de 2016, atendeu aos proclames da defesa, procedendo aos ajustes necessários e reduzindo o credito tributário devido de R$ 53.093,78 para R$ 42.811,52.

Analisando o resultado da diligência realizada, bem como as razões de decidir do julgador singular, discordo apenas no tocante à falta de dedução do prejuízo bruto apurado com mercadorias com substituição tributária, isentas e não tributadas, encontrado quando da realização da conta mercadorias do exercício 2016 (fls. 13).

No tocante ao seu recurso em que pede a desconsideração dos levantamentos realizados, pelo fato da fiscalização não ter solicitado e nem levado em consideração o seu Livro Caixa, reputo insubsistente tal alegação.

Ora, como se vê das próprias peças de impugnação e recursal apresentadas pelo contribuinte, o mesmo apenas discorda dos valores lançados a título de pró-labore e das compras, concordando com as demais receitas e despesas levantadas pela fiscalização, de forma que nos dá razoável certeza de que o levantamento foi realizado com base nos livros e documentos fiscais apresentados pela empresa.

Ademais, importante atentar para o fato de que não foram trazidos aos autos os livros caixas mencionados pela recorrente, de forma que se torna argumento inócuo diante de provas materiais.

Não obstante as considerações acima, não foi considerado no Levantamento Financeiro do Exercício de 2016 o prejuízo bruto com mercadorias sujeita ao regime de ST, evidenciado na apuração da Conta Mercadorias do mesmo exercício (fls. 13), conforme já acima exposado, razão pela qual, refizemos os cálculos para apuração da diferença tributável e obtivemos o seguinte resultado:.

Exercício 2016

                       

Assim, diante de tudo o acima evidenciado e do ajuste procedido no tocante ao exercício de 2016, temos para a acusação de omissão de saídas de mercadorias tributáveis – levantamento financeiro um Icms devido de R$ 31.816,33 para o exercício de 2015 e de R$ 20.541,86 para o exercício de 2016.

Por todo o exposto, considero subsistente o seguinte crédito tributário:



 

Com estes fundamentos,

 

VOTO pelo recebimento do recurso voluntário, por regular e tempestivo e, quanto ao mérito, pelo seu provimento parcial, alterando a sentença exarada na instância monocrática, que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00001795/2017-67, lavrado em 11 de agosto de 2017 contra a empresa R MACEDO & CIA LTDA, condenando-a ao pagamento do crédito tributário no valor total de R$ 104.716,38 (cento e quatro mil, setecentos e dezesseis reais e trinta e oito centavos), sendo R$ 52.358,19 (cinqüenta e dois mil, trezentos e cinquenta e oito reais e dezenove centavos) de ICMS, por infringência aos artigos 158, I e 160, I, c/fulcro no art. 646, parágrafo único, todos do RICMS/PB e R$ 52.358,19 (cinqüenta e dois mil, trezentos e cinquenta e oito reais e dezenove centavos) de multa por infração, com arrimo no artigo 82, V, “f”, da Lei nº 6.379/96.

Ao tempo em que cancelo, por indevido, o montante de R$ 29.070,80 (vinte e nove mil, setenta reais e oitenta centavos), sendo R$ 14.535,40 (quatorze mil, quinhentos e trinta e cinco reais e quarenta centavos) de ICMS e R$ 14.535,40 (quatorze mil, quinhentos e trinta e cinco reais e quarenta centavos) de multa por infração.

Intimações necessárias a cargo da repartição preparadora, na forma regulamentar.

 

 

Primeira Câmara de Julgamento, sessão realizada por meio de videoconferência, em 26 de agosto de 2020.

 

                                                                                                            Leonardo do Egito Pessoa
                                                                                                                   Conselheiro Relator 

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