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ACÓRDÃO Nº.000341/2020 PROCESSO Nº 1551492015-1

brasao paraiba
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA

Processo nº 1551492015-1
SEGUNDA CÂMARA DE JULGAMENTO
Recorrente: VAREJÃO NAVARRO MEDICAMENTOS GENÉRICOS LTDA - ME
Recorrida: GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULG. DE PROCESSOS FISCAIS – GEJUP
Repartição Preparadora: UNIDADE DE ATENDIMENTOS AO CIDADÃO DA SEFAZ – SANTA RITA
Autuante: SILAS RIBEIRO TORRES
Relator: CONS.º SIDNEY WATSON FAGUNDES DA SILVA

FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS PRÓPRIOS – ACUSAÇÃO COMPROVADA EM PARTE - OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – LEVANTAMENTO FINANCEIRO - INFRAÇÃO CONFIGURADA – PARCELAMENTO ADMINISTRATIVO – EXTINÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO - AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE – REFORMADA A DECISÃO RECORRIDA - RECURSO DE OFÍCIO PARCIALMENTE PROVIDO

- A falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios conduz à presunção de saídas de mercadorias tributáveis sem pagamento do imposto estadual, nos termos do artigo 646 do RICMS/PB. A existência de uma nota fiscal cancelada na relação de documentos apresentada pela fiscalização fez sucumbir o crédito tributário a ela relacionado.
- A ocorrência de desembolsos em valores superiores às receitas auferidas no período, constatados por meio do Levantamento Financeiro, autoriza, nos termos do artigo 646, parágrafo único do RICMS/PB, a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis sem o devido pagamento do imposto. In casu, o sujeito passivo reconheceu sua condição de devedor quanto aos lançamentos efetuados a título de omissão de saídas de mercadorias tributáveis – Levantamento Financeiro, aderindo ao REFIS/PEP, tornando os lançamentos não contenciosos, conforme dicção do artigo 51, I, da Lei nº 10.094/13.

Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...

 

 

               A C O R D A M os membros da Segunda Câmara de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, à unanimidade e de acordo com o VOTO pelo recebimento do recurso de ofício, por regular e, quanto ao mérito, pelo seu provimento parcial, para reformar a decisão monocrática e julgar parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00002009/2015-87, lavrado em 10 de novembro de 2015 em desfavor da empresa VAREJÃO NAVARRO MEDICAMENTOS GENÉRICOS LTDA - ME, condenando-a ao pagamento do crédito tributário no valor total de R$ 67.540,30 (sessenta e sete mil, quinhentos e quarenta reais e trinta centavos), sendo R$ 33.770,15 (trinta e três mil, setecentos e setenta reais e quinze centavos) de ICMS, por infringência aos artigos 158, I e 160, I c/ fulcro no artigo 646 e parágrafo único, todos do RICMS/PB e R$ 33.770,15 (trinta e três mil, setecentos e setenta reais e quinze centavos) a título de multa por infração, com fulcro no artigo 82, V, “f”, da Lei nº 6.379/96. Ao tempo em que cancelo, por indevida, a quantia de R$ 156,64 (cento e cinquenta e seis reais e sessenta e quatro centavos), sendo R$ 78,52 (setenta e oito reais e cinquenta e dois centavos) de ICMS e R$ 78,52 (setenta e oito reais e cinquenta e dois centavos) de multa. Ressalto que parte do crédito tributário foi objeto de parcelamento REFIS/PEP.
                   Intimações necessárias a cargo da repartição preparadora, na forma regulamentar  
                   P.R.I.
                 Segunda Câmara de Julgamento, Sessão realizada por meio de videoconferência, em 28 de setembro de 2020.

                                                         SIDNEY WATSON FAGUNDES DA SILVA
                                                                        Conselheiro Relator
                                                         LEONILSON LINS DE LUCENA 
                                                                         Presidente
                          Participaram do presente julgamento os membros da Segunda Câmara de Julgamento, PAULO EDUARDO DE FIGUEIREDO CHACON, JULIANA FIGUEIREDO E CARVALHO COSTA E  RODRIGO DE QUEIROZ NÓBREGA.

                                                    FRANCISCO GLAUBERTO BEZERRA JÚNIOR
                                                                              Assessor Jurídico

Por meio do Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00002009/2015-87 (fls. 3 e 4), lavrado em 10 de novembro de 2015 contra a empresa VAREJÃO NAVARRO MEDICAMENTOS GENÉRICOS LTDA - ME, inscrição estadual nº 16.172.918-5, o auditor fiscal responsável pelo cumprimento da Ordem de Serviço Normal nº 93300008.12.00003572/2015-22 denuncia o sujeito passivo de haver cometido as seguintes infrações, ipsis litteris:

 

0009 – FALTA DE LANÇAMENTO DE N. F. DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS PRÓPRIOS >> Aquisição de mercadorias com recursos advindos de omissões de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis e/ou a realização de prestações de serviços tributáveis sem o pagamento do imposto devido, constatada pela falta de registro de notas fiscais nos livros próprios.

 

Nota Explicativa:

NOTAS FISCAIS DE ENTRADAS TRIBUTADAS NÃO LANÇADAS NOS EXERCÍCIOS DE 2010, 2011 E 2012 CONFORME DEMONSTRATIVO INCLUSO AO PROCESSO.

 

0021 – OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – LEVANTAMENTO FINANCEIRO >> O contribuinte omitiu saídas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto devido, tendo em vista a constatação de que os pagamentos efetuados superaram as receitas auferidas. Irregularidade esta detectada através de Levantamento Financeiro.

 

Nota Explicativa:

LEVANTAMENTO FINANCEIRO DO EXERCÍCIO DE 2010 E 2012 A EMPRESA APRESENTA DESPESAS MAIORES DO AS RECEITAS [SIC]

 

Em decorrência destes fatos, o representante fazendário, considerando haver o contribuinte infringido os artigos 158, I e 160, I c/ fulcro no artigo 646 e parágrafo único, todos do RICMS/PB, lançou um crédito tributário na quantia total de R$ 67.696,94 (sessenta e sete mil, seiscentos e noventa e seis reais e noventa e quatro centavos), sendo R$ 33.848,47 (trinta e três mil, oitocentos e quarenta e oito reais e quarenta e sete centavos) de ICMS e R$ 33.848,47 (trinta e três mil, oitocentos e quarenta e oito reais e quarenta e sete centavos) a título de multas por infração, com arrimo no artigo 82, V, “f”, da Lei nº 6.379/96.

Documentos instrutórios juntados às fls. 5 a 43.

Depois de cientificada pessoalmente em 11 de novembro de 2015, a autuada, por intermédio de seu representante legal, protocolou, em 14 de dezembro de 2015, impugnação contra os lançamentos dos créditos tributários consignados no Auto de Infração em análise (fls. 46 a 51).

Na mesma data, foi emitida a Notificação nº 00097462/2015 (fls. 44), por meio da qual a repartição preparadora do domicílio do contribuinte informa que sua defesa fora entregue fora do prazo.

Na peça impugnatória, o contribuinte alega, em síntese, que:

a)      O Auto de Infração encontra-se eivado de vício para a constituição do Levantamento Financeiro, haja vista a fiscalização não ter apresentado as Contas Mercadorias dos referidos exercícios, não sendo possível o enfrentamento dos “supostos” cálculos e origens das omissões;

b)      A empresa comercializa produtos sujeitos à substituição tributária (medicamentos), ou seja, os produtos adquiridos são tributados na origem, não havendo que se falar em omissão de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis;

c)      Alguns dos documentos fiscais relacionados pela auditoria estão devidamente registrados nos livros próprios da autuada.

 

Considerando as justificativas apresentadas, o sujeito passivo requereu a nulidade ou a improcedência do Auto de Infração em tela.

Em despacho exarado às fls. 252, o então Coletor de Santa Rita informa que, no dia 11 de dezembro de 2015, não houve expediente no período da tarde e que o contribuinte autuado compareceu para apresentar sua defesa, sendo impossibilitado de protocolá-la na data citada, o que só foi possível no dia 14 de dezembro de 2015 (primeiro dia útil subsequente).

Com informação de existência de antecedentes fiscais (fls. 253), foram os autos conclusos (fls. 254) e remetidos à Gerência Executiva de Julgamento de Processos Fiscais, onde foram distribuídos ao julgador fiscal Leonardo do Egito Pessoa, que decidiu pela nulidade do Auto de Infração, nos termos da seguinte ementa, verbis:

 

ICMS. OMISSÕES DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS. FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS PRÓPRIOS. LEVANTAMENTO FINANCEIRO. CONTRIBUINTE QUE EXERCE ATIVIDADE PRINCIPAL DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS. TÉCNICAS FISCAIS IMPRÓPRIAS À VERIFICAÇÃO DA SUA REGULARIDADE QUANTO À OBRIGAÇÃO PRINCIPAL. VÍCIO MATERIAL CONFIGURADO – AUTO DE INFRAÇÃO NULO.

- A falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios conduz à presunção de saídas de mercadorias tributáveis sem pagamento do imposto estadual, nos termos do artigo 646 do RICMS/PB. Todavia, tal presunção, prevista no art. 646 do RICMS/PB, não se mostra aplicável nos casos de contribuinte em exercício no seguimento do comércio varejista de produtos farmacêuticos, cujas operações de maior predominância nessa atividade se regulam pelo regime da substituição tributária, o que determina a nulidade do lançamento de ofício, por vício material, visto que a denúncia tem suporte na aplicação de técnica imprópria à aferição da situação do contribuinte quanto ao cumprimento da obrigação principal.

- Desembolsos em valores superiores às receitas auferidas no período, identificados por meio do Levantamento Financeiro autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis. Todavia, tal presunção, ínsita no art. 646, parágrafo único do RICMS/PB, não se mostra justificável nos casos em que o contribuinte comercializa precipuamente mercadorias sujeitas ao regime da substituição tributária e com mercadorias adstritas ao regime de tributação normal, como objeto da sua atividade principal, visto que a denúncia tem suporte na aplicação de técnica imprópria à aferição da situação do contribuinte quanto ao cumprimento da obrigação principal.

AUTO DE INFRAÇÃO NULO

 

Em observância ao que determina o artigo 80 da Lei nº 10.094/13, o julgador fiscal recorreu de sua decisão.

Cientificada da decisão proferida pela instância prima em 10 de dezembro de 2018, a autuada não mais se manifestou nos autos.

Remetidos ao Conselho de Recursos Fiscais, foram os autos distribuídos a esta relatoria, segundo os critérios regimentais, para apreciação e julgamento.

Eis o relatório.

 

VOTO

 

Em apreciação nesta corte o recurso de ofício contra decisão monocrática que julgou nulo o Auto de Infração lavrado contra a empresa VAREJÃO NAVARRO MEDICAMENTOS GENÉRICOS LTDA – ME, no qual estão descritas as seguintes denúncias: a) falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios; e b) omissão de saídas de mercadorias tributáveis – Levantamento Financeiro.

Na decisão recorrida, o ilustre julgador fiscal reconheceu a existência de vícios materiais nos lançamentos, por entender que as técnicas que detectaram as omissões de saídas seriam inaplicáveis ao sujeito passivo, haja vista a empresa operar, preponderantemente, com produtos sujeitos à sistemática da substituição tributária.

Em que pesem os abalizados fundamentos ofertados pelo julgador singular, peço vênia para apresentar posicionamento divergente quanto à matéria.

Para melhor compreensão acerca do tema, passaremos a expor as razões da divergência ao tempo em que analisamos as acusações de forma individualizada.

 

0009 - FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS PRÓPRIOS

 

Além de caracterizar descumprimento de obrigação acessória, a falta de escrituração de documentos fiscais de entradas pode ganhar contornos mais amplos. Isto porque a legislação tributária do Estado da Paraíba incluiu esta conduta no rol daquelas que autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis sem o recolhimento do imposto devido.

Vejamos o que estabelecem os artigos 3º, § 8º, da Lei nº 6.379/96 e 646 do RICMS/PB[1]:

 

Lei nº 6.379/96:

 

Art. 3º O imposto incide sobre:

 

(...)

 

§ 8º O fato de a escrituração indicar insuficiência de caixa, suprimentos a caixa não comprovados ou a manutenção no passivo, de obrigações já pagas ou inexistentes, bem como a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas ou de declarações de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito, autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis sem pagamento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção.

Nova redação dada ao § 8º do art. 3º pelo art. 1º da Lei nº 9.550/11 (DOE de 07.12.11).

§ 8º O fato de a escrituração indicar insuficiência de caixa e bancos, suprimentos a caixa e bancos não comprovados ou a manutenção no passivo de obrigações já pagas ou inexistentes, bem como a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas ou de declarações de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito, autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou de prestações de serviços sem o recolhimento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção.


 

RICMS/PB:

 

Art. 646. O fato de a escrituração indicar insuficiência de caixa, suprimentos a caixa não comprovados ou a manutenção no passivo, de obrigações já pagas ou inexistentes, bem como a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas ou de declarações de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito, autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis sem pagamento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção.

Parágrafo único. A presunção de que cuida este artigo aplica-se igualmente a qualquer situação em que a soma das despesas, pagamentos de títulos, salários, retiradas, pró-labore, serviços de terceiros, aquisição de bens em geral e outras aplicações do contribuinte seja superior à receita do estabelecimento.

Nova redação dada ao art. 646 pelo art. 1º do Decreto nº 32.718/12 (DOE de 25.01.12).

Art. 646. O fato de a escrituração indicar insuficiência de caixa e bancos, suprimentos a caixa e bancos não comprovados ou a manutenção no passivo de obrigações já pagas ou inexistentes, bem como a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas ou de declarações de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito, autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou de prestações de serviços sem o recolhimento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção.

Parágrafo único. A presunção de que cuida este artigo aplica-se, igualmente, a qualquer situação em que a soma dos desembolsos no exercício seja superior à receita do estabelecimento, levando-se em consideração os saldos inicial e final de caixa e bancos, assim como a diferença tributável verificada no levantamento da Conta Mercadorias, quando do arbitramento do lucro bruto ou da comprovação de que houve saídas de mercadorias de estabelecimento industrial em valor inferior ao Custo dos Produtos Fabricados ou Vendidos, conforme o caso.  (g. n.)

 

Por imperativo legal, a constatação desta omissão obriga o auditor fiscal a lançar, de ofício, o crédito tributário decorrente desta infração, tendo em vista a receita marginal originária das saídas omitidas afrontar o disciplinamento contido nos art. 158, I, e art. 160, I, ambos do RICMS/PB, os quais transcrevemos a seguir:

 

Art. 158. Os contribuintes, excetuados os produtores agropecuários, emitirão Nota Fiscal, modelos 1 ou 1-A, Anexos 15 e 16:

 

I - sempre que promoverem saída de mercadorias;

 

Art. 160. A nota fiscal será emitida:

 

I - antes de iniciada a saída das mercadorias;

 

Para aqueles que incorrerem na conduta descrita nos artigos anteriormente reproduzidos, a Lei nº 6.379/96, em seu artigo 82, V, “f”, estabelece a seguinte penalidade:

 

Art. 82. As multas para as quais se adotará o critério referido no inciso II, do art. 80, serão as seguintes:

 

(...)

 

V - de 100% (cem por cento):

 

(...)

 

f) aos que deixarem de recolher o imposto proveniente de saída de mercadoria, dissimulada por receita de origem não comprovada, inclusive a representada por despesa realizada a descoberto de caixa, pela existência de passivo fictício ou por qualquer forma apurada através de levantamento da escrita contábil;

 

No que se refere à sistemática de apuração do tributo devido, é importante destacarmos que, para a falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios, o artigo 646 do RICMS/PB autoriza a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis sem o recolhimento do imposto, sendo indispensável, para tanto, que as operações mercantis relativas às notas fiscais não lançadas sejam onerosas, haja vista a necessidade de ter havido pagamento de mercadorias com recursos financeiros advindos de receitas omitidas.

Este comando normativo, ao garantir o direito à Fazenda Pública de recuperar o ICMS incidente sobre operações pretéritas, o fez presumindo que todas elas foram realizadas com mercadorias tributáveis, cabendo ao contribuinte o ônus de provar a improcedência da acusação, conforme estabelecido na parte final do caput do artigo 646 do RICMS/PB.

Na sua peça impugnatória, a defesa alega a ausência de repercussão tributária, em razão de comercializar apenas produtos sujeitos à substituição tributária (medicamentos). Afirma, ainda, que parte dos documentos fiscais que embasaram a denúncia está lançada no Livro Registro de Entradas da empresa.

Quanto à primeira alegação, o fato é que o Conselho de Recursos Fiscais do Estado da Paraíba vem afastando a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis quando o contribuinte opera exclusivamente com mercadorias enquadradas na regra especial da substituição tributária.

No caso em que a empresa também realize vendas de mercadorias com regime “normal” de tributação, havemos de aprofundar o exame, sob pena de se afastar um crédito tributário efetivamente devido ou, por outro lado, legitimar uma presunção absurda.

Com vistas a comprovar a afirmação da então impugnante, recorremos ao princípio da verdade material e, buscando a desejada justiça fiscal, analisamos todas as aquisições declaradas pela autuada nos exercícios de 2010 a 2012, o que foi possível por meio da consulta ao dossiê do contribuinte no Sistema ATF da SEFAZ/PB[2].

 

Relatório de Informações   Econômico-Fiscais (Entradas)

Contribuinte:   16.172.918-5 - VAREJÃO NAVARRO MEDICAMENTOS GENÉRICOS LTDA-ME

Período   informado: 01/2010 a 12/2012

 

 

 

 

CFOP

Descrição CFOP

Valor Contábil (R$)

1102

COMPRA   PARA COMERCIALIZAÇÃO

  38.845,95

1403

COMPRA   PARA COMERCIALIZAÇÃO EM OPERAÇÃO COM MERC. SUJEITA AO REGIME DE SUBST.   TRIBUTÁRIA

  148.170,13

1909

RETORNO   DE BEM REMETIDO POR CONTA DE CONTRATO DE COMODATO

  189,11

2102

COMPRA   PARA COMERCIALIZAÇÃO

  6.153,07

2403

COMPRA   PARA COMERCIALIZAÇÃO EM OPERAÇÃO COM MERC. SUJEITA AO REGIME DE SUBST.   TRIBUTÁRIA

  9.623,78

 

A partir das informações acima, tomamos, como parâmetro, apenas as aquisições onerosas e fizemos um comparativo, no período, entre as aquisições de mercadorias sujeitas à substituição tributária e aquelas submetidas às regras normais de tributação. Vejamos os resultados obtidos:

 

Total de compras para comercialização   (tributação normal)

R$ 44.999,02

Total de compras para comercialização   (substituição tributária)

R$ 157.793,91

Total de compras para comercialização

R$ 202.792,93

Percentual de compras (tributação normal)   em relação ao total de compras

22,19%

 

Da tabela anterior, extrai-se, inequivocamente, que a afirmação da autuada não se mostra alinhada à verdade dos fatos. O percentual das aquisições de mercadorias com tributação normal representa quase um quarto da movimentação realizada pela empresa.

Também é fato incontroverso que os estabelecimentos farmacêuticos há muito tempo não se limitam à comercialização de produtos sujeitos à substituição tributária e, no caso em apreço, identificamos, nas notas fiscais de aquisição, compras de diversos itens submetidos ao regime normal de tributação, a exemplo de desodorantes, pentes, escovas para cabelo, sabonetes, esmaltes, etc.

Diante desta constatação, não há como acatarmos a alegação trazida à baila pela defesa, motivo pelo qual reconheço, para o caso ora em exame, a legitimidade da técnica de fiscalização que identificou omissões de saídas de mercadorias tributáveis.

Superada a preliminar de nulidade, faz-se imperativa a análise probatória.

De início, verificarmos, na relação de notas fiscais dos exercícios de 2010 e 2011 (fls. 14 e 25, respectivamente) algumas omissões de informações quanto às chaves de acesso dos documentos fiscais.

Não obstante as lacunas evidenciadas, este fato não trouxe qualquer prejuízo à defesa do administrado, haja vista existir a possibilidade de o contribuinte acessar o Sistema ATF (SER Virtual), no endereço eletrônico www.receita.pb.gov.br, por meio do qual é facultada a realização de diversas consultas relacionadas à nota fiscal eletrônica, inclusive para detectar, por período, quais as NF-e que a ele foram destinadas (consulta genérica).

Realizando a referida consulta, pudemos constatar que todos os documentos que deram sustentação à denúncia são notas fiscais eletrônicas.

Observamos, ainda, que a nota fiscal nº 25120, emitida em 13 de abril de 2011, encontra-se cancelada, motivo pelo qual se deve expurgá-la para efeito do cálculo do crédito tributário devido.

Conforme já registrado anteriormente, a autuada assevera que alguns documentos estariam lançados no seu “Livro Registro de Entradas”.

Ocorre que os “documentos” apresentados às fls. 229, 234 a 251, denominados “Registro de Entradas – RE – Modelo P1A”, trazidos pela defesa com o propósito de comprovar haver registrado as notas fiscais, em verdade, não se prestam para ratificar as alegações da autuada.

Não por acaso recorremos ao uso de aspas (“”) quando nos referimos ao “Livro Registro de Entradas” do contribuinte. O uso deste sinal de pontuação, portanto, é intencional e se justifica em virtude de que tais elementos não se revestem dos requisitos essenciais para que possam ser admitidos como livros fiscais idôneos e hábeis para fins de registro de notas fiscais de aquisição, não podendo, portanto, produzir os efeitos pretendidos pela defesa, ou seja, a comprovação de haver lançado as notas fiscais de aquisição.

Isto porque os referidos assentamentos fiscais não possuem eficácia probatória, em razão de não terem sido autenticados pela repartição fiscal do seu domicílio, não garantindo a veracidade das informações trazidas pela empresa.

Para melhor demonstrar o fato, reproduzimos a consulta realizada no Sistema ATF da Secretaria de Estado da Fazenda da Paraíba, por meio da qual se comprova que o contribuinte não possui qualquer livro fiscal autenticado. Vejamos o extrato da consulta abaixo reproduzido:

 

                       

 

Diante de todo o exposto, acolho a denúncia de falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios, exceto quanto à nota fiscal nº 25120, pelos motivos já apresentados.

 

0021 – OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – LEVANTAMENTO FINANCEIRO

 

A acusação ora em comento originou-se a partir da técnica de fiscalização denominada LEVANTAMENTO FINANCEIRO, cujo mecanismo de aferição proporciona analisar se houve equilíbrio entre os somatórios dos desembolsos e o total das receitas auferidas no mesmo exercício, repercutindo em omissão de vendas sempre que as despesas superarem as receitas. Nessa hipótese, a legislação vigente autoriza a fiscalização a se valer da presunção juris tantum de omissão de saídas de mercadorias tributáveis, arrimado no parágrafo único do art. 646 do RICMS/PB, já reproduzido anteriormente.

Destarte, considerando haver o contribuinte infringido a legislação tributária nos exercícios de 2010 e 2012 (vide demonstrativos às fls. 15 e 38), o auditor fiscal propôs, como medida punitiva, a aplicação da multa insculpida no artigo 82, V, “f”, da Lei nº 6.379/96, também já transcrita quando da análise da primeira acusação.

Importante destacarmos que, identificada a existência de saldo deficitário no Levantamento Financeiro, o artigo 646 do RICMS/PB autoriza a presunção de que o contribuinte omitiu saídas de mercadorias tributáveis e/ou que realizou prestações de serviços tributáveis sem o recolhimento do imposto.

Na instância prima, a acusação foi afastada, com base no mesmo fundamento que embasou o cancelamento, pelo julgador a quo, dos créditos tributários relativos à falta de lançamentos de notas fiscais de aquisição nos livros próprios.

A questão ora em exame não exige maiores discussões, uma vez que o contribuinte reconheceu sua condição de devedor, aderindo ao REFIS/PEP ao parcelar o crédito tributário lançado a título de OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – LEVANTAMENTO FINANCEIRO, tornando-o extinto, nos termos do artigo 156 do Código Tributário Nacional.

 

Art. 156. Extinguem o crédito tributário:

 

I - o pagamento;

 

 O reconhecimento da condição de devedor por parte do sujeito passivo afasta o caráter contencioso do processo em tela, conforme dicção do artigo 51, I, da Lei nº 10.094/13:

 

Art. 51. São Processos Administrativos Tributários não contenciosos os decorrentes de lançamentos constituídos por intermédio de:

I - Auto de Infração com crédito tributário não impugnado no prazo regulamentar, quitado ou parcelado na sua totalidade, observado o direito de interposição de recurso de agravo;

 

Destarte, o crédito tributário efetivamente devido pela recorrente apresenta-se conforme tabela a seguir:

 

 

AUTO DE INFRAÇÃO

VALOR CANCELADO

CRÉDITO TRIBUTÁRIO DEVIDO

DESCRIÇÃO DA INFRAÇÃO

PERÍODO

ICMS (R$)

MULTA (R$)

ICMS (R$)

MULTA (R$)

ICMS (R$)

MULTA (R$)

CRÉDITO TRIBUTÁRIO DEVIDO (R$)

0009 - FALTA DE LANÇAMENTO DE N. F. DE   AQUISIÇÃO NOS LIVROS PRÓPRIOS

ago/10

1.935,71

1.935,71

0,00

0,00

1.935,71

1.935,71

3.871,42

set/10

395,18

395,18

0,00

0,00

395,18

395,18

790,36

nov/10

819,19

819,19

0,00

0,00

819,19

819,19

1.638,38

dez/10

1.925,04

1.925,04

0,00

0,00

1.925,04

1.925,04

3.850,08

jan/11

1.110,77

1.110,77

0,00

0,00

1.110,77

1.110,77

2.221,54

fev/11

711,73

711,73

0,00

0,00

711,73

711,73

1.423,46

mar/11

322,22

322,22

0,00

0,00

322,22

322,22

644,44

abr/11

1.629,60

1.629,60

78,32

78,32

1.551,28

1.551,28

3.102,56

mai/11

1.634,12

1.634,12

0,00

0,00

1.634,12

1.634,12

3.268,24

jun/11

326,81

326,81

0,00

0,00

326,81

326,81

653,62

jan/12

2.195,85

2.195,85

0,00

0,00

2.195,85

2.195,85

4.391,70

fev/12

1.313,41

1.313,41

0,00

0,00

1.313,41

1.313,41

2.626,82

mar/12

1.807,92

1.807,92

0,00

0,00

1.807,92

1.807,92

3.615,84

abr/12

658,70

658,70

0,00

0,00

658,70

658,70

1.317,40

0021 - OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS   TRIBUTÁVEIS - LEVANTAMENTO FINANCEIRO

01/01/2010  a    31/12/2010

6.981,79

6.981,79

0,00

0,00

6.981,79

6.981,79

13.963,58

01/01/2012  a    31/12/2012

10.080,43

10.080,43

0,00

0,00

10.080,43

10.080,43

20.160,86

TOTAIS (R$)

33.848,47

33.848,47

78,32

78,32

33.770,15

33.770,15

67.540,30

 

 

Com estes fundamentos,

 

VOTO pelo recebimento do recurso de ofício, por regular e, quanto ao mérito, pelo seu provimento parcial, para reformar a decisão monocrática e julgar parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00002009/2015-87, lavrado em 10 de novembro de 2015 em desfavor da empresa VAREJÃO NAVARRO MEDICAMENTOS GENÉRICOS LTDA - ME, condenando-a ao pagamento do crédito tributário no valor total de R$ 67.540,30 (sessenta e sete mil, quinhentos e quarenta reais e trinta centavos), sendo R$ 33.770,15 (trinta e três mil, setecentos e setenta reais e quinze centavos) de ICMS, por infringência aos artigos 158, I e 160, I c/ fulcro no artigo 646 e parágrafo único, todos do RICMS/PB e R$ 33.770,15 (trinta e três mil, setecentos e setenta reais e quinze centavos) a título de multa por infração, com fulcro no artigo 82, V, “f”, da Lei nº 6.379/96.

Ao tempo em que cancelo, por indevida, a quantia de R$ 156,64 (cento e cinquenta e seis reais e sessenta e quatro centavos), sendo R$ 78,52 (setenta e oito reais e cinquenta e dois centavos) de ICMS e R$ 78,52 (setenta e oito reais e cinquenta e dois centavos) de multa.

Ressalto que parte do crédito tributário foi objeto de parcelamento REFIS/PEP.

Intimações necessárias a cargo da repartição preparadora, na forma regulamentar.



[1] Redações vigentes à época dos fatos.



[2] Módulo: Cadastro / Contribuinte / Consultas / Consultar dados de contribuinte / Dossiê do Contribuinte.



 

 

Segunda Câmara de Julgamento, sessão realizada por meio de videoconferência em 28 de setembro de 2020.

 

                                                                                                 Sidney Watson Fagundes da Silva

                                                                                                          Conselheiro Relator

 

 


                                                                                                        

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