ACÓRDÃO Nº.000372/2020 PROCESSO N° 1895512018-4
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA
PROCESSO N° 1895512018-4
SEGUNDA CÂMARA DE JULGAMENTO
Recorrente: GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULG. DE PROCESSOS FISCAIS – GEJUP
Recorrida: BOMPREÇO SUPERMERCADOS DO NORDESTE LTDA
Preparadora: CENTRO DE ATENDIMENTO AO CIDADÃO DA GR1 DA SEFAZ – JOÃO PESSOA
Autuantes: MARCELO CRUZ DE LIRA E MÔNICA GONÇALVES SOUZA MIGUEL
Relator: CONS.º SIDNEY WATSON FAGUNDES DA SILVA
DECADÊNCIA – RECONHECIDA A EXTINÇÃO PARCIAL DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO – APLICAÇÃO DO ARTIGO 150, § 4º, DO CTN - FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS – INFRAÇÃO CARACTERIZADA EM PARTE – FALTA DE RECOLHIMENTO DO IMPOSTO ESTADUAL EM VIRTUDE DE IRREGULARIDADES NO USO DO ECF – DENÚNCIA CONFIGURADA – QUITAÇÃO – EXTINÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO - AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE – ALTERADA DE OFÍCIO A DECISÃO RECORRIDA QUANTO AOS VALORES - RECURSO DE OFÍCIO DESPROVIDO.
- Considerando que o contribuinte apresentou ao Fisco declarações de informações fiscais nas quais constam os documentos fiscais que motivaram o lançamento a título de falta de recolhimento do ICMS por haver o contribuinte indicado como isentas ou submetidas ao instituto da substituição tributária operações com mercadorias sujeitas ao imposto estadual, o prazo para constituição do crédito tributário inicia-se na data da ocorrência dos fatos geradores, nos termos do que estabelece o artigo 150, § 4º, do Código Tributário Nacional.
- Incorre em descumprimento de obrigação tributária principal o contribuinte que indica, como isentas ou não tributadas pelo ICMS, operações de vendas de produtos sujeitos ao imposto estadual, vez que este fato reduz o montante do tributo efetivamente devido, repercutindo no total a recolher em favor do Estado. In casu, as alegações apresentadas pela recorrente confirmaram a regularidade de algumas das operações relacionadas pela auditoria, o que fez sucumbir parte do crédito tributário originalmente lançado.
- Configura falta de recolhimento do ICMS o fato de o contribuinte declarar, nas informações econômico-fiscais, valores de operações de saídas de mercadorias tributáveis em montantes inferiores aos constantes nos documentos fiscais.
- O pagamento do crédito tributário acarreta sua extinção, nos termos do artigo 156, I, do CTN, tornando os lançamentos não contenciosos, conforme dicção do artigo 51, I, da Lei nº 10.094/13.
Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...
- A C O R D A M os membros da Segunda Câmara de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, à unanimidade e de acordo com o VOTO pelo recebimento do recurso de ofício, por regular e, quanto ao mérito, pelo seu desprovimento. Contudo, em observância ao princípio da verdade material, altero, quanto aos valores, a decisão monocrática que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00002590/2018-80, lavrado em 28 de novembro de 2018 contra a empresa BOMPREÇO SUPERMERCADOS DO NORDESTE LTDA., condenando-a ao pagamento do crédito tributário no valor total de R$ 319.990,00 (trezentos e dezenove mil, novecentos e noventa reais), sendo R$ 213.326,62 (duzentos e treze mil, trezentos e vinte e seis reais e sessenta e dois centavos) de ICMS, por infringência aos artigos 106; 376 e 379 c/c 106, II, “a”, todos do RICMS/PB e R$ 106.663,38 (cento e seis mil, seiscentos e sessenta e três reais e trinta e oito centavos) de multas por infração, com arrimo no artigo 82, II, “e”, da Lei nº 6.379/96.
Ao tempo que cancelo, por indevida, a quantia de R$ 337.973,52 (trezentos e trinta e sete mil, novecentos e setenta e três reais e cinquenta e dois centavos), sendo R$ 225.315,56 (duzentos e vinte e cinco mil, trezentos e quinze reais e cinquenta e seis centavos) de ICMS e R$ 112.657,86 (cento e doze mil, seiscentos e cinquenta e sete reais e oitenta e seis centavos) de multas por infração.
Reitero que o contribuinte quitou parte do crédito tributário.
Intimações necessárias a cargo da repartição preparadora, na forma regulamentar.
P.R.I.
Segunda Câmara de Julgamento, Sessão realizada por meio de videoconferência, em 21 de outubro de 2020.
SIDNEY WATSON FAGUNDES DA SILVA
Conselheiro Relator
LEONILSON LINS DE LUCENA
Presidente
Participaram do presente julgamento os membros da Segunda Câmara de Julgamento, RODRIGO DE QUEIROZ NÓBREGA, PAULO EDUARDO DE FIGUEIREDO CHACON E LARISSA MENESES DE ALMEIDA (SUPLENTE).
FRANCISCO GLAUBERTO BEZERRA JÚNIOR
Assessor Jurídico
RELATÓRIO |
Por meio do Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00002590/2018-80, lavrado em 28 de novembro de 2018, os auditores fiscais responsáveis pelo cumprimento da Ordem de Serviço Específica nº 93300008.12.00007561/2017-83 denunciam a empresa BOMPREÇO SUPERMERCADOS DO NORDESTE LTDA., inscrição estadual nº 16.160.755-1, de haver cometido as seguintes infrações, ipsis litteris:
0285 – FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS. >> Falta de recolhimento do imposto estadual.
Nota Explicativa:
TAL IRREGULARIDADE FOI CONSTATADA PELO FATO DE O CONTRIBUINTE EM TOTAL DESACORDO COM A LEGISLAÇÃO FISCAL PERTINENTE, DEIXOU DE SE DEBITAR DO ICMS NAS VENDAS DE PRODUTOS TRIBUTÁVEIS DECLARADOS COMO ISENTOS OU NÃO TRIBUTADOS POR MEIO DE ECF – EMISSOR DE CUPOM FISCAL
0254 – FALTA DE RECOLHIMENTO DO IMPOSTO ESTADUAL EM VIRTUDE DE IRREGULARIDADES NO USO DO ECF. >> O contribuinte deixou de recolher o imposto estadual, tendo em vista a constatação de irregularidades no uso do ECF.
Nota Explicativa:
TAL IRREGULARIDADE SE VERIFICOU PELO FATO DE O CONTRIBUINTE, EM DESACORDO COM A LEGISLAÇÃO FISCAL PERTINENTE INFORMOU NA E. F. D. (REGISTRO C405), VALORES DE OPERAÇÕES DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS EM MONTANTES INFERIORES AOS CONSTANTES DA DOCUMENTAÇÃO FISCAL HÁBIL, (MEMÓRIA FISCAL). SEGUEM PLANILHAS EXPLICATIVAS EM ANEXO.
Em decorrência destes fatos, os representantes fazendários, considerando haver o contribuinte infringido os artigos 106; 376 e 379 c/c 106, II, “a”, todos do RICMS/PB, lançaram um crédito tributário na quantia total de R$ 657.963,52 (seiscentos e cinquenta e sete mil, novecentos e sessenta e três reais e cinquenta e dois centavos), sendo R$ 438.642,28 (quatrocentos e trinta e oito mil, seiscentos e quarenta e dois reais e vinte e oito centavos) de ICMS e R$ 219.321,24 (duzentos e dezenove mil, trezentos e vinte e um reais e vinte e quatro centavos) a título de multas por infração, com arrimo no artigo 82, II, “e”, da Lei nº 6.379/96.
Documentos instrutórios juntados às fls. 6 a 12.
Depois de cientificada pessoalmente em 10 de dezembro de 2018, a autuada, por intermédio de seu advogado, protocolou, em 9 de janeiro de 2019, impugnação tempestiva contra os lançamentos dos créditos tributários consignados no Auto de Infração em análise (fls. 15 a 46), por meio da qual afirma, em síntese, que:
a) O lançamento fiscal é nulo, uma vez que os autuantes não cumpriram a exigência formal contida na legislação vigente, deixando de apresentar ao contribuinte a cópia da ação fiscal, sua possível prorrogação, o deferimento da renovação da ordem de serviço proferido pelo órgão superior competente e a ciência da autuada relativamente aos procedimentos fiscalizatórios;
b) Os créditos tributários relativos ao período de janeiro a novembro de 2013 estão alcançados pela decadência, por força do que estabelece o artigo 150, § 4º, do Código Tributário Nacional;
c) Os produtos listados pela fiscalização estão sujeitos à isenção, como os peixes indicados às fls. 33 e 34 (item “a”), farinha de mandioca, cebolinha e cominho ou submetidos ao regime de substituição tributária, a exemplo dos biscoitos relacionados às fls. 24 (item “a”), super bonder, guaramix copo 290 ml, tapete Fiesta, ducha stilo 5400 w branco 220 V e salgadinhos listados às fls. 32 (item “f”);
d) A multa aplicada é desproporcional e confiscatória;
e) Em caso de dúvida, deve-se aplicar o artigo 112 do CTN.
Ao final, a autuada requereu:
a) O reconhecimento e declaração/decretação da nulidade e/ou da improcedência da exigência fiscal;
b) Sucessivamente, o afastamento da multa aplicada;
c) Que, em caso de dúvida, se interprete a norma jurídica da forma mais favorável ao sujeito passivo;
d) A produção de todos os meios de prova em Direito admitidos, em especial a juntada aos autos de documentos, bem como a realização de perícia técnica, a fim de demonstrar a inexistência das irregularidades apontadas em seu desfavor;
e) Que todas as intimações e publicações sejam realizadas em nome dos patronos da autuada.
No dia 9 de janeiro de 2019, o contribuinte requereu a emissão de guias para quitação parcial do Auto de Infração, nos valores indicados às fls. 135.
Declarados conclusos (fls. 160), foram os autos remetidos à Gerência Executiva de Julgamento de Processos Fiscais - GEJUP, sendo distribuídos à julgadora fiscal Adriana Cássia Lima Urbano, que decidiu pela parcial procedência da exigência fiscal, nos termos da seguinte ementa, litteris:
PRELIMINAR DE DECADÊNCIA ACATADA. DILIGÊNCIA. INDEFERIMENTO. FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS – ESCRITURAÇÃO INCORRETA DAS REDUÇÕES “Z”. CONFIRMADA A IRREGULARIDADE. FALTA DE RECOLHIMENTO – AUSÊNCIA DE DÉBITO FISCAL DO ICMS. INDICAR COMO ISENTAS OU NÃO TRIBUTÁVEIS MERCADORIAS SUJEITAS AO IMPOSTO ESTADUAL. NULIDADE. VÍCIO FORMAL. QUITAÇÃO PARCIAL. EXTINÇÃO ART. 156 DO CTN.
Configurada a decadência de parte dos créditos tributários lançados, em observância ao disposto no artigo 150, § 4º, do Código Tributário Nacional.
Descabe o pedido de diligência ou perícia quando presentes nos autos todos os elementos necessários para que a autoridade julgadora forme sua convicção.
Escriturar em valores inferiores, nos arquivos de Escrituração Fiscal Digital – EFD, as operações de vendas com mercadorias tributáveis realizadas por meio de equipamento emissor de cupons fiscais – ECF é conduta que deve ser censurada pela fiscalização e suscita a exigência de pagamento do imposto devido. Fato comprovado pelos autuantes, o que levou à procedência da acusação inserta na inicial.
O lançamento relativo à denúncia de falta de recolhimento do ICMS ao indicar nos documentos fiscais como isentas ou não tributadas mercadorias sujeitas ao imposto estadual contém vício formal, uma vez que se mostra em desacordo com o requisito de que trata o artigo 17, III, da Lei nº 10.094/13. Todavia, o reconhecimento da exação fiscal relacionada a uma parte do lançamento de ofício, configurado mediante o recolhimento de valores dos respectivos créditos tributários, impõe a manutenção parcial da respectiva acusação, conforme reza o art. 156 do CTN.
AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE
Em observância ao que determina o artigo 80 da Lei nº 10.094/13, a julgadora fiscal recorreu de sua decisão.
Cientificada da decisão proferida pela instância prima em 7 de novembro de 2019, a autuada não mais se manifestou nos autos.
Remetidos ao Conselho de Recursos Fiscais, foram os autos distribuídos a esta relatoria, segundo os critérios regimentais, para apreciação e julgamento.
Eis o relatório.
VOTO |
Em apreciação nesta corte a remessa de ofício do Processo nº 1895512018-4 em razão da decisão monocrática que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento lavrado contra a empresa BOMPREÇO SUPERMERCADOS DO NORDESTE LTDA., no qual estão assinaladas as seguintes denúncias: a) falta de recolhimento do ICMS; e b) falta de recolhimento do imposto estadual em virtude de irregularidades no uso do ECF.
Antes de passarmos à análise das acusações, necessário se faz discorrermos acerca da decadência arguida pela autuada.
Na decisão proferida na instância prima, a julgadora singular, após identificar que o contribuinte enviou à SEFAZ/PB as declarações de informações econômico-fiscais, sem omissão dos documentos (fls. 168), acolheu os argumentos da defesa e cancelou os créditos tributários referentes aos meses de janeiro a novembro de 2013, por considerá-los extintos pela decadência, em observância ao que estabelece o § 3º do art. 22 da Lei nº 10.094/13:
Art. 22. Os prazos de decadência e prescrição obedecerão ao disposto na legislação específica de cada tributo, respeitadas as regras do Código Tributário Nacional.
(...)
§ 3° Na hipótese de tributo sujeito a lançamento por homologação, em que o contribuinte tenha realizado a entrega de declaração de informações fiscais, à Fazenda Estadual, ou tenha realizado recolhimento a menor do que o declarado, o prazo decadencial será de 5 (cinco) anos, contado exatamente da data da ocorrência do fato gerador.
No caso em apreciação, portanto, não resta dúvida de que o prazo decadencial para constituição do crédito tributário submete-se à regra estabelecida no § 4º do art. 150 do CTN:
Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa.
(...)
§ 4º Se a lei não fixar prazo a homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação. (g. n.)
Isto posto, importa dissertarmos a respeito de quando ocorreram os fatos geradores.
Para a situação em tela, o momento a ser considerado para início da contagem do prazo decadencial é o estabelecido no artigo 12, I, da Lei nº 6.379/96:
Art. 12. Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:
I - da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular;
Sendo assim, considerando que a ciência do Auto de Infração se efetivou em 10 de dezembro de 2018, devem ser excluídos todos os créditos tributários cujos fatos geradores ocorreram até o dia 10 de dezembro de 2013.
Não obstante a decisão recorrida estar em consonância com o que requereu a então impugnante, não podemos nos eximir de tratar a matéria com a devida atenção, porquanto a decadência deve ser reconhecida de ofício, por ser matéria de ordem pública, consoante determina o § 1º do art. 22 da Lei nº 10.094/13.
Art. 22. Os prazos de decadência e prescrição obedecerão ao disposto na legislação específica de cada tributo, respeitadas as regras do Código Tributário Nacional.
§ 1º A decadência deve ser reconhecida e declarada de ofício.
Neste sentido, peço vênia para divergir do entendimento esposado pela nobre julgadora singular e declarar extintos pela decadência os créditos tributários dos fatos geradores realizados até o dia 10 de dezembro de 2013.
Destaco que, não obstante a impossibilidade de exigência de crédito fiscal relativo ao período alcançado pela decadência, o contribuinte efetuou pagamento relativo ao mês de novembro de 2013.
0285 – FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS
Após analisar o caderno processual, a julgadora fiscal se manifestou nos seguintes termos:
“No libelo acusatório, vislumbra-se uma repercussão tributária gerada pela auditoria nos equipamentos ECF do contribuinte, no qual se constataram registros fiscais de operações com mercadorias sujeitas ao ICMS nas saídas por vendas, porém armazenadas ou lançadas com indicação de se tratarem de isentas e/ou sujeitas à substituição tributária, o que levou a propositura da exação fiscal sobre o montante real da repercussão tributária em face de ausência de débito do imposto nos livros próprios.
Ocorre que, para a infração de falta de recolhimento do ICMS ao indicar nos documentos fiscais como isentas ou não tributadas mercadorias sujeitas ao imposto estadual, consta como infringido tão-somente o art. 106 do RICMS/PB.
Conforme descrito na Nota Explicativa do auto de infração, a irregularidade teria ocorrido pelo fato de o contribuinte haver realizado operações normais com débito do imposto, porém, ao registrar os documentos na sua EFD, não teria se debitado, incorrendo, por estes fatos, em falta de recolhimento do ICMS.”
Em seguida, a diligente julgadora reconhece a nulidade, por vício formal, dos lançamentos, ao tempo que ressalvou que o contribuinte reconhecera o cometimento de parte da infração, quitando, espontaneamente, o montante de R$ 211.530,57 (duzentos e onze mil, quinhentos e trinta reais e cinquenta e sete centavos), o que motivou a decretação da extinção do crédito tributário, nos termos do artigo 156, I, do CTN.
Diante deste cenário, conforme já relatado, o Auto de Infração foi julgado parcialmente procedente.
Em que pesem os abalizados argumentos esposados pela julgadora para reconhecer a nulidade de parte dos lançamentos, peço vênia para me manifestar em sentido diverso.
Observemos, inicialmente, que os auditores fiscais responsáveis pela autuação apresentaram, às fls. 12, como suporte para embasar a primeira denúncia, uma mídia digital, na qual estão discriminadas todas as vendas de produtos tributáveis que, segundo a fiscalização, teriam sido declarados como isentos ou sujeitos à substituição tributária quando das vendas realizadas pela autuada por meio de equipamentos ECF durantes os períodos discriminados no Auto de Infração.
Além disso, na Nota Explicativa da peça acusatória, consta exatamente a descrição deste fato infringente.
Ocorre que, ao indicar o dispositivo legal violado, a fiscalização apontou, tão somente, o artigo 106 do RICMS/PB.
A matéria disciplinada pelo dispositivo acima citado se limita aos prazos para recolhimento. E não poderia ser diferente, vez que o artigo 106 é parte integrante da Seção IV do RICMS/PB (Dos Prazos de Recolhimento).
A descrição genérica do fato infringente, assim como a falta de elementos que possibilitem o contribuinte extrair as informações necessárias para compreender, de forma plena, a acusação que pesa contra si, são inadmissíveis em um lançamento de ofício e, por este motivo, não devem ser reconhecidas como válidas no Direito Tributário. O direito ao contraditório e à ampla defesa só pode ser exercido em sua totalidade quando, ao sujeito passivo, é dada a possibilidade de saber, com segurança, de que está sendo acusado.
A anulação do Auto de Infração por violação ao Princípio Constitucional do Devido Processo Legal - do qual derivam os seus consectários lógicos: Princípios do Contraditório e da Ampla Defesa -, em virtude da ausência de elementos que propiciem o entendimento acerca da denúncia que está sendo imputada ao contribuinte, é medida que se impõe como forma de buscar a justiça fiscal.
Conforme já relatado, a denúncia apresentada trata de FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS.
Sendo assim, da maneira como fora elaborada, a acusação se evidencia genérica, dado que todo e qualquer descumprimento de obrigação principal, à exceção dos casos relacionados ao FUNCEP e aos demais tributos de competência dos Estados, forçosamente, tem fundamento na falta de recolhimento do ICMS.
Exatamente por este motivo, torna-se imperiosa a delimitação da matéria por meio da Nota Explicativa do Auto de Infração (quando necessário para precisar os contornos da acusação).
No caso em apreço, é indubitável que o teor da Nota Explicativa não se contrapõe à Descrição da Infração. Em verdade, complementa-a, dando-lhe os contornos necessários para validar a acusação.
A matéria tributável, sendo elemento essencial para constituição do crédito tributário, deve estar claramente determinada no lançamento. Não se quer dizer com isso que quaisquer incorreções ou omissões possam acarretar nulidade. O artigo 15 da Lei nº 10.094/13 restringe o alcance da nulidade por infração descrita de forma genérica ou imprecisa ao condicioná-la à comprovação de efetivo prejuízo à defesa do sujeito passivo.
Esta medida (nulidade), portanto, não deve ser aplicada indistintamente. Trata-se de providência a ser adotada em casos bastante específicos e desde que conste, na defesa, pedido neste sentido, conforme estabelece o parágrafo único do artigo 15 da Lei nº 10.094/13.
Art. 15. As incorreções, omissões ou inexatidões, que não importem nulidade, serão sanadas quando não ocasionarem prejuízo para a defesa do administrado, salvo, se este lhes houver dado causa ou quando influírem na solução do litígio.
Parágrafo único. Sem prejuízo do disposto no “caput”, não será declarada a nulidade do auto de infração sob argumento de que a infração foi descrita de forma genérica ou imprecisa, quando não constar da defesa, pedido neste sentido. (g. n.)
Pois bem. Ao se manifestar nos autos por meio de sua impugnação, a autuada não trouxe qualquer alegação quanto à matéria. Ao contrário: enfrentou o mérito de forma pormenorizada, contestando a inclusão de diversos itens no levantamento fiscal e indicando os normativos que a autorizariam a não tributar estes produtos pelas saídas.
Mais ainda. Reconheceu sua condição de devedora, quitando parte dos créditos tributários.
Neste contexto, cabe-nos afastar a nulidade declarada pela instância prima, motivo pelo qual passamos a enfrentar o mérito.
No que se refere às nulidades arguidas pela defesa, não se faz necessário enfrentá-las, haja vista terem sido muito bem afastadas pela julgadora fiscal. Além disso, o contribuinte não apresentou recurso voluntário.
0285 – FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS
No bojo da decisão recorrida, restou consignada a ausência de indicação dos dispositivos específicos para a denúncia em tela.
Com efeito, ainda que não tenha acarretado a nulidade dos lançamentos, a conduta infracional estaria mais bem delimitada caso houvessem sido apontados, como violados, os artigos 2º, 3º, 52, 54, 60, I, “b” e III, “d” e “l” e 106, todos do RICMS/PB.
No que se refere à penalidade aplicada, também merece destaque o registro feito pela julgadora fiscal ao registrar que os auditores lançaram mão da multa genérica insculpida no artigo 82, II, “e”, da Lei nº 6.379/96, preterindo a norma específica para o caso, a saber: artigo 82, IV, do mesmo diploma legal. Vejamos o teor dos referidos artigos.
Art. 82. As multas para as quais se adotará o critério referido no inciso II, do art. 80, serão as seguintes:
(...)
II - de 50% (cinquenta por cento):
(...)
e) aos que deixarem de recolher o imposto no todo ou em parte, nas demais hipóteses não contidas neste artigo;
(...)
IV - de 75% (setenta e cinco por cento) aos que indicarem como isentas ou não tributadas, nos documentos fiscais, as operações ou prestações sujeitas ao imposto; (g. n.)
O equívoco quanto à propositura da penalidade não é passível de correção, uma vez que não se pode, nas instâncias de julgamento, agravar o crédito tributário originalmente lançado.
Destarte, deve-se manter o percentual da multa aplicada pelos auditores, ou seja, considerar-se-á o montante de 50% (cinquenta por cento) sobre o valor do imposto devido.
Passemos à análise probatória.
A partir dos argumentos trazidos à baila pela defesa, examinamos a situação tributária de todos os itens por ela indicados e obtivemos os seguintes resultados:
Descrição do Produto |
Justificativa da Defesa |
Providência |
Justificativa para manutenção/exclusão do produto [1] (*) https://www.sefaz.pb.gov.br/info/produtos-substituicao-tributaria#perguntas-e-respostas (Resposta à 12º pergunta). |
Na coluna “Justificativa para manutenção/exclusão do produto”, estão detalhados os fundamentos que motivaram a permanência (ou não) dos itens para efeito do cálculo do crédito tributário.
Sobre o Guaramix, importa destacarmos um fragmento da decisão proferida no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 439.135 - RJ (2013/0392573-7):
“É que, se o Tribunal de Justiça considerou suficiente a documentação, apresentada pela autora, comprobatória de que o produto "guaramix" não é isotônico ou energético, perquirir a respeito de eventual violação do art. 333 do CPC implica, necessariamente, no revolvimento dos elementos probatórios juntados aos autos.”
Quanto aos produtos salgadinhos sortidos, salg. queijo concha e salg. Petix calabpim, havemos de ressaltar que a descrição apresentada pela autuada em suas declarações à SEFAZ/PB são insuficientes para atestarem o enquadramento destes itens no regramento da substituição tributária.
No que se refere à mercadoria farofa mais ekonomico não há como acolhermos os argumentos para enquadrá-la no campo de isenção do ICMS, uma vez que o sujeito passivo não logrou êxito em comprovar tal condição.
Partindo dos resultados identificados na tabela, refizemos o cálculo dos valores dos créditos tributários a serem deduzidos do montante lançado no Auto de Infração, conforme demonstrado na tabela apresentada em anexo a este voto[2]:
|
AUTO DE INFRAÇÃO |
VALOR CANCELADO |
CRÉDITO TRIBUTÁRIO DEVIDO |
|||||
DESCRIÇÃO DA INFRAÇÃO |
PERÍODO |
ICMS (R$) |
MULTA (R$) |
ICMS (R$) |
MULTA (R$) |
ICMS (R$) |
MULTA (R$) |
CRÉDITO TRIBUTÁRIO DEVIDO (R$) |
0285 - FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS. |
jan/13 |
11.398,68 |
5.699,34 |
11.398,68 |
5.699,34 |
0,00 |
0,00 |
0,00 |
fev/13 |
10.756,35 |
5.378,18 |
10.756,35 |
5.378,18 |
0,00 |
0,00 |
0,00 |
|
mar/13 |
45.396,96 |
22.698,48 |
45.396,96 |
22.698,48 |
0,00 |
0,00 |
0,00 |
|
abr/13 |
9.574,03 |
4.787,02 |
9.574,03 |
4.787,02 |
0,00 |
0,00 |
0,00 |
|
mai/13 |
27.399,60 |
13.699,80 |
27.399,60 |
13.699,80 |
0,00 |
0,00 |
0,00 |
|
jun/13 |
6.937,19 |
3.468,60 |
6.937,19 |
3.468,60 |
0,00 |
0,00 |
0,00 |
|
jul/13 |
9.416,47 |
4.708,23 |
9.416,47 |
4.708,23 |
0,00 |
0,00 |
0,00 |
|
ago/13 |
11.358,43 |
5.679,22 |
11.358,43 |
5.679,22 |
0,00 |
0,00 |
0,00 |
|
set/13 |
4.457,79 |
2.228,90 |
4.457,79 |
2.228,90 |
0,00 |
0,00 |
0,00 |
|
out/13 |
6.260,55 |
3.130,28 |
6.260,55 |
3.130,28 |
0,00 |
0,00 |
0,00 |
|
nov/13 |
4.564,82 |
2.282,41 |
2.411,48 |
1.205,74 |
2.153,34 |
1.076,67 |
3.230,01 |
|
dez/13 |
6.519,32 |
3.259,66 |
2.765,41 |
1.382,70 |
3.753,91 |
1.876,96 |
5.630,87 |
|
jan/14 |
6.917,99 |
3.459,00 |
2.291,21 |
1.145,61 |
4.626,78 |
2.313,40 |
6.940,18 |
|
fev/14 |
5.768,43 |
2.884,22 |
1.683,21 |
841,61 |
4.085,22 |
2.042,62 |
6.127,84 |
|
mar/14 |
13.378,62 |
6.689,31 |
5.363,39 |
2.681,70 |
8.015,23 |
4.007,62 |
12.022,85 |
|
abr/14 |
39.635,74 |
19.817,87 |
8.475,92 |
4.237,96 |
31.159,82 |
15.579,91 |
46.739,73 |
|
mai/14 |
5.786,19 |
2.893,10 |
1.890,67 |
945,34 |
3.895,52 |
1.947,77 |
5.843,29 |
|
jun/14 |
5.217,95 |
2.608,98 |
1.597,86 |
798,93 |
3.620,09 |
1.810,05 |
5.430,14 |
|
jul/14 |
4.167,83 |
2.083,92 |
1.307,60 |
653,80 |
2.860,23 |
1.430,12 |
4.290,35 |
|
ago/14 |
1.539,41 |
769,71 |
607,41 |
303,71 |
932,00 |
466,00 |
1.398,00 |
|
set/14 |
27.160,04 |
13.580,02 |
1.876,92 |
938,46 |
25.283,12 |
12.641,56 |
37.924,68 |
|
out/14 |
15.176,85 |
7.588,43 |
11.204,71 |
5.602,36 |
3.972,14 |
1.986,07 |
5.958,21 |
|
nov/14 |
6.321,60 |
3.160,80 |
1.464,02 |
732,01 |
4.857,58 |
2.428,79 |
7.286,37 |
|
dez/14 |
9.947,09 |
4.973,55 |
5.877,52 |
2.938,76 |
4.069,57 |
2.034,79 |
6.104,36 |
|
jan/15 |
7.307,70 |
3.653,85 |
4.914,29 |
2.457,15 |
2.393,41 |
1.196,71 |
3.590,12 |
|
fev/15 |
9.904,14 |
4.952,07 |
2.943,41 |
1.471,71 |
6.960,73 |
3.480,37 |
10.441,10 |
|
mar/15 |
26.227,73 |
13.113,87 |
4.814,89 |
2.407,45 |
21.412,84 |
10.706,43 |
32.119,27 |
|
abr/15 |
78.990,65 |
39.495,32 |
10.985,87 |
5.492,94 |
68.004,78 |
34.002,39 |
102.007,17 |
|
mai/15 |
5.757,55 |
2.878,78 |
2.113,06 |
1.056,53 |
3.644,49 |
1.822,25 |
5.466,74 |
|
jun/15 |
3.204,45 |
1.602,23 |
1.965,74 |
982,87 |
1.238,71 |
619,36 |
1.858,07 |
|
jul/15 |
5.484,61 |
2.742,31 |
2.011,30 |
1.005,65 |
3.473,31 |
1.736,66 |
5.209,97 |
|
ago/15 |
3.256,87 |
1.628,44 |
2.231,88 |
1.115,94 |
1.024,99 |
512,50 |
1.537,49 |
|
set/15 |
2.335,23 |
1.167,62 |
1.561,84 |
780,92 |
773,39 |
386,70 |
1.160,09 |
|
0254 - FALTA DE RECOLHIMENTO DO IMPOSTO ESTADUAL EM VIRTUDE DE IRREGULARIDADES NO USO DO ECF. |
mar/14 |
10,77 |
5,39 |
0,00 |
0,00 |
10,77 |
5,39 |
16,16 |
nov/15 |
47,65 |
23,83 |
0,00 |
0,00 |
47,65 |
23,83 |
71,48 |
|
dez/15 |
17,58 |
8,79 |
0,00 |
0,00 |
17,58 |
8,79 |
26,37 |
|
fev/16 |
1.019,80 |
509,90 |
0,00 |
0,00 |
1.019,80 |
509,90 |
1.529,70 |
|
mar/16 |
19,62 |
9,81 |
0,00 |
0,00 |
19,62 |
9,81 |
29,43 |
|
TOTAIS (R$) |
438.642,28 |
219.321,24 |
225.315,66 |
112.657,86 |
213.326,62 |
106.663,38 |
319.990,00 |
Com estes fundamentos,
VOTO pelo recebimento do recurso de ofício, por regular e, quanto ao mérito, pelo seu desprovimento. Contudo, em observância ao princípio da verdade material, altero, quanto aos valores, a decisão monocrática que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00002590/2018-80, lavrado em 28 de novembro de 2018 contra a empresa BOMPREÇO SUPERMERCADOS DO NORDESTE LTDA., condenando-a ao pagamento do crédito tributário no valor total de R$ 319.990,00 (trezentos e dezenove mil, novecentos e noventa reais), sendo R$ 213.326,62 (duzentos e treze mil, trezentos e vinte e seis reais e sessenta e dois centavos) de ICMS, por infringência aos artigos 106; 376 e 379 c/c 106, II, “a”, todos do RICMS/PB e R$ 106.663,38 (cento e seis mil, seiscentos e sessenta e três reais e trinta e oito centavos) de multas por infração, com arrimo no artigo 82, II, “e”, da Lei nº 6.379/96.
Ao tempo que cancelo, por indevida, a quantia de R$ 337.973,52 (trezentos e trinta e sete mil, novecentos e setenta e três reais e cinquenta e dois centavos), sendo R$ 225.315,56 (duzentos e vinte e cinco mil, trezentos e quinze reais e cinquenta e seis centavos) de ICMS e R$ 112.657,86 (cento e doze mil, seiscentos e cinquenta e sete reais e oitenta e seis centavos) de multas por infração.
Reitero que o contribuinte quitou parte do crédito tributário.
Intimações necessárias a cargo da repartição preparadora, na forma regulamentar.
[2] Para os períodos em que o valor quitado se mostrou superior ao que fora considerado após a exclusão dos produtos indicados na planilha Produtos Isentos e ST Processo nº 1895512018-4.pdf, o valor pago foi mantido, em razão da extinção do crédito tributário.
Segunda Câmara de Julgamento, sessão realizada por meio de videoconferência em 21 de outubro de 2020.
Sidney Watson Fagundes da Silva
Conselheiro Relator
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