ACÓRDÃO Nº.000397/2020 PROCESSO Nº 1865102017-1
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA
PROCESSO Nº 1865102017-1
PRIMEIRA CÂMARA DE JULGAMENTO
Recorrente: J S TECIDOS LTDA
Recorrida: GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULG. DE PROCESSOS FISCAIS – GEJUP
Preparadora: CENTRO DE ATENDIMENTO AO CIDADÃO DA GR1 DA SEFAZ – JOÃO PESSOA
Autuante: MARCELO DAMASCENO FERREIRA
Relator: CONS.º LEONARDO DO EGITO PESSOA
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS – INDICAR COMO NÃO TRIBUTADAS PELO ICMS OPERAÇÕES COM MERCADORIAS OU PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS SUJEITOS AO IMPOSTO ESTADUAL – DENÚNCIA CONFIGURADA – MANTIDA A DECISÃO RECORRIDA – AUTO DE INFRAÇÃO PROCEDENTE - RECURSO VOLUNTÁRIO DESPROVIDO.
- Indicar nos documentos fiscais mercadorias normalmente tributáveis como não tributadas pelo ICMS é conduta que deve ser censurada pela fiscalização e suscita a exigência de pagamento do imposto devido.
- Mercadorias submetidas à substituição tributária são aquelas que, cumulativamente, enquadram-se no código fiscal (NCM) e na descrição apresentada nas legislações a elas relativas.
Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...
A C O R D A M os membros da Primeira Câmara de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, à unanimidade e de acordo com o VOTO pelo recebimento do recurso voluntário, por regular e tempestivo e, quanto ao mérito, pelo seu desprovimento, mantendo a sentença prolatada na primeira instância, declarando procedente o Auto de Infração de Estabelecimento n° 93300008.09.00003126/2017-20, lavrado em 22 de dezembro de 2017, contra a empresa J S TECIDOS LTDA, inscrição estadual nº 16.080.155-9, devidamente qualificada nos autos, impondo o ônus desta ação fiscal, imputando-lhe o crédito tributário no valor de R$ 171.251,45 (cento e setenta e um mil, duzentos e cinqüenta e um reais e quarenta e cinco centavos), sendo R$ 97.857,96 (noventa e sete mil, oitocentos e cinqüenta e sete reais e noventa e seis centavos) de ICMS, por infringência ao artigo 106 c/c o art. 52 e art. 2º, art. 3º, art. 60, I, “b” e III, “d” e “l”, todos do RICMS/PB e R$ 73.393,49 (setenta e três mil, trezentos e noventa e três reais e quarenta e nove centavos) a título de multa por infração, com fulcro no artigo 82, IV, da Lei nº 6.379/96.
Intimações necessárias a cargo da repartição preparadora, na forma regulamentar.
P.R.I.
Primeira Câmara de Julgamento, Sessão realizada por meio de videoconferência, em 29 de outubro de 2020.
LEONARDO DO EGITO PESSOA
Conselheiro Relator
LEONILSON LINS DE LUCENA
Presidente
Participaram do presente julgamento os membros da Primeira Câmara de Julgamento, JOSÉ ERIELSON ALMEIDA DO NASCIMENTO (SUPLENTE), MAÍRA CATÃO CAVALCANTI SIMÕES, THAÍS GUIMARÃES TEIXEIRA FONSECA E PETRÔNIO RODRIGUES LIMA.
SANCHA MARIA FORMIGA CAVALCANTE E RODOVALHO DE ALENCAR
Assessora Jurídica
Relatório
Em análise, neste egrégio Conselho de Recursos Fiscais, o recurso voluntário interposto contra a decisão monocrática que julgou procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00003126/2017-20 (fls. 3-6), lavrado em 22 de dezembro de 2017 contra a empresa J S TECIDOS LTDA, inscrição estadual nº 16.080.155-9.
Na referida peça acusatória, consta a seguinte acusação, ipsis litteris:
0195 – INDICAR COMO NÃO TRIBUTADAS PELO ICMS, OPERAÇÕES C/ MERCADORIAS OU PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS SUJEITAS AO IMPOSTO ESTADUAL. >> Falta de recolhimento do imposto estadual, face à ausência de débito(s) do imposto nos livros próprios, em virtude de o contribuinte ter indicado no(s) documento(s) fiscal(is) operações com mercadorias tributáveis ou prestações de serviços como sendo não tributada(s) pelo ICMS.
Nota Explicativa: FALTA DE RECOLHIMENTO DO IMPOSTO ESTADUAL, FACE À AUSÊNCIA DE DÉBITO(S) DO IMPOSTO NOS LIVROS PRÓPRIOS, EM VIRTUDE DE O CONTRIBUINTE TER INDICADO NO(S) DOCUMENTO(S) FISCAL(IS) OPERAÇÕES COM MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS OU PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS COMO SENDO NÃO TRIBUTADA(S) PELO ICMS NOS EXERCÍCIOS DE 2013 E 2014.
Em decorrência deste fato, o representante fazendário, considerando haver o contribuinte infringido o artigo 106 c/c os artigos 52; 54; 2º; 3º; art. 60, I, “b” e III, “d” e ‘l”, todos do RICMS/PB, lançou um crédito tributário na quantia total de R$ 171.251,45 (cento e setenta e um mil, duzentos e cinqüenta e um reais e quarenta e cinco centavos), sendo R$ 97.857,96 (noventa e sete mil, oitocentos e cinqüenta e sete reais e noventa e seis centavos) de ICMS e R$ 73.393,49 (setenta e três mil, trezentos e noventa e três reais e quarenta e nove centavos) a título de multa por infração, com arrimo no artigo 82, IV, da Lei nº 6.379/96.
Além da peça acusatória, o auditor fiscal responsável pelo cumprimento da Ordem de Serviço Normal nº 93300008.12.00002414/2017-17 (fls. 7-8) anexou aos autos os seguintes documentos:
a) Planilha denominada “RELAÇÃO DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS QUE FORAM FATURADAS COMO NÃO TRIBUTÁVEIS (SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA OU ISENTAS)”, na qual estão identificadas por documento fiscal, período, produto, valor da operação, as diferenças de ICMS a recolher (fls. 14 a 25);
Depois de cientificada por via postal em 1 de fevereiro de 2018 (fls. 32), a autuada, por intermédio de seu procurador devidamente habilitado (fl. 40) ingressa com reclamação tempestiva (fls. 34 a 37) em 05/03/2018, contrapondo-se à acusação com as seguintes alegações:
- A autuada comercializa produtos tais como itens de colchoaria, material elétrico, metal, artefatos de higiene e toucador, além de ampla variedade de materiais de decoração - que se submetem à substituição tributária –– conforme Decretos 33.808/2013, 33.809/2013 e 34.709/2013, sendo que se verifica nestes normativos que seu campo de abrangência não se limitou ao disposto em suas ementas.
- Toda mercadoria submetida à ST tem como elemento de identificação a NCM, sendo que a Fiscalização não especificou os critérios adotados para distinguir quando a mercadoria reporta-se a essa sistemática e quando reporta-se à tributação normal.
- Destaque-se, também, que no início da vigência dos decretos 33.808/2013 e 33.809/2013 a impugnante recolheu ICMS de R$ 161.912,84 (conforme documento anexo) para atender a seguinte exigência neles presentes: “Os estabelecimentos atacadistas, distribuidores e varejistas, situados neste Estado, deverão relacionar, discriminadamente, o estoque de produtos, de que trata o Anexo Único, existente no dia 30 de junho de 2013, em seus estabelecimentos, valorando ao custo de aquisição mais recente e adotar as seguintes providências (...)”.
Por fim, a defesa demanda preliminarmente pela nulidade do libelo basilar e no mérito, sua improcedência.
Documentos instrutórios às fls. 13 a 25.
Com informação de inexistência de antecedentes fiscais (fls. 46), foram os autos conclusos (fls. 45) e remetidos à Gerência Executiva de Julgamento de Processos Fiscais, onde foram distribuídos ao julgador fiscal Francisco Nociti que exarou sentença considerando o auto de infração PROCEDENTE, conforme ementa abaixo:
INDICAR COMO NÃO TRIBUTADAS PELO ICMS OPERAÇÕES COM MERCADORIAS SUJEITAS AO IMPOSTO ESTADUAL. ACUSAÇÃO COMPROVADA.
- Não devem os documentos fiscais de saídas indicar como não tributadas operações sobre as quais deve recair o imposto estadual.
- Mercadorias submetidas à substituição tributária são aquelas que, cumulativamente, enquadram-se no código fiscal (NCM) e na descrição apresentada nos Anexos Único dos Decretos a elas relativos.
AUTO DE INFRAÇÃO PROCEDENTE
Cientificado da decisão de primeira instância administrativa via DTE em 13/11/2019 (fl. 57), o autuado, por meio de advogados legalmente habilitados (fls. 81), apresentou tempestivamente recurso voluntário ao Conselho de Recursos Fiscais em 12/12/2019 (fls. 59-80), nele, se insurgindo contra os termos da autuação com base nos seguintes argumentos:
1. Que algumas operações registradas pela fiscalização se tratam de operações de saídas de mercadorias da filial da empresa recorrente, sendo, portanto, meras transferências entre filiais da empresa, que não enseja fato gerador da exação de ICMS, como estabelece a Súmula nº 166 do Superior Tribunal de Justiça - STJ;
2. Defende que parte das mercadorias consignadas nos autos, foi firmado corretamente pelo contribuinte como ICMS-ST. Que a norma da substituição tributária deve ser interpretada na relação com o objeto da própria substituição, que é o produto, independente da atividade fim da empresa. A título de exemplo cita que o fiscal relacionou os produtos calha (NCM 6811), lixeira c/ tampa (NCM 3922), kit banheiro (NCM 3922), kit cozinha (NCM 3922), tecido plano (NCM 3922), copos (NCM 2201.10.00), tecidos (5903.90.00) e produtos plásticos e tubos (NCM`s 3917 e 3918);
3. Alega “bis in idem” em virtude de ter recolhido em 2013 a importância de R$ 161.912, 84 e uma diferença de R$ 4.634,54 a título de levantamento de estoque, conforme o Decreto nº 33.809/2013;
4. Por fim, aduz que a fiscalização ao considerar os produtos do contribuinte como sujeitos a tributação normal, deveria ter considerado o crédito de ICMS gerado na entrada delas, deduzindo do débito gerado nas saídas, sob pena da violação do princípio da não cumulatividade do tributo ICMS.
Diante das considerações apresentadas, a recorrente requer seja reformada a decisão singular, para que seja cancelada integralmente a exigência fiscal de ICMS.
Remetidos ao Conselho de Recursos Fiscais, foram os autos distribuídos a esta relatoria, segundo os critérios regimentais, para apreciação e julgamento.
Eis o relatório.
VOTO |
Trata-se de recurso voluntário, nos moldes do que apregoa o artigo 77 da Lei 10.094/2013, interposto contra decisão de primeira instância que julgou procedente o Auto de Infração de Estabelecimento n.º 93300008.09.00003126/2017-20 lavrado em 22/12/2017 (fls. 3-7) em desfavor da empresa J S TECIDOS LTDA, inscrição estadual nº 16.080.155-9, já devidamente qualificada nos autos.
Inicialmente, importa declarar que o recurso voluntário apresentado atende ao pressuposto extrínseco da tempestividade, haja vista ter sido protocolado dentro do prazo previsto na Lei nº 10.094/13.
Antes de qualquer análise do mérito da questão, determinante se apresenta a verificação dos aspectos de natureza formal do auto infracional. Com efeito, sabe-se que um ato administrativo só poderá ser anulado quando ilegal ou ilegítimo. O libelo acusatório trouxe devidamente a indicação da pessoa do infrator, a natureza da infração, não existindo incorreções capazes de provocar a nulidade, seja por vicio material, seja por vício formal.
Partindo para análise da infração de indicar operações com mercadorias sujeitas ao imposto estadual como não tributadas pelo ICMS, vislumbra-se uma repercussão tributária gerada pela auditoria nos documentos fiscais de saída do contribuinte, no qual se constataram registros fiscais de operações de saídas (venda, transferência, baixa de estoque) com mercadorias sujeitas ao ICMS, porém armazenadas ou lançadas com indicação de se tratarem de mercadorias não tributadas pelo imposto estadual, o que levou a propositura da exação fiscal sobre o montante real da repercussão tributária em face de ausência de débito do imposto nos livros fiscais próprios.
Ademais, o RICMS/PB dispõe hialinamente acerca da incidência do imposto, o fato gerador e os procedimentos de apuração do ICMS, demonstrando de forma induvidosa a obrigação do contribuinte de disponibilizar o valor do débito quando da saída de mercadorias tributadas, conforme se abebera na transcrição ipsis litteris das normas abaixo:
Art. 2º O imposto incide sobre:
I - operações relativas à circulação de mercadorias, inclusive o fornecimento de alimentação e bebidas em bares, restaurantes e estabelecimentos similares;
Art. 3º Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:
I - da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular;
Art. 52. O imposto é não-cumulativo, compensando-se o que seja devido em cada operação ou prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação com o anteriormente cobrado por este Estado ou por outra unidade da Federação, relativamente à mercadoria entrada ou à prestação de serviço recebida, acompanhada de documento fiscal hábil, emitido por contribuinte em situação regular perante e Fisco.
Parágrafo único. Para os efeitos deste artigo, considera-se:
I - imposto devido, o resultante da aplicação da alíquota cabível sobre a base de cálculo de cada operação ou prestação sujeita à cobrança do imposto;
II - imposto anteriormente cobrado, a importância calculada nos termos do inciso anterior e destacada em documento fiscal hábil;
Art. 54. O valor do imposto a recolher corresponde à diferença, em cada período de apuração, entre o imposto devido sobre as operações ou prestações tributadas e o cobrado relativamente às anteriores.
Art. 60. Os estabelecimentos enquadrados no regime de apuração normal, apurarão no último dia de cada mês:
I - no Registro de Saídas:
b) o valor total da base de cálculo das operações e/ou prestações com débito do imposto e o valor do respectivo imposto debitado;
III - no Registro de Apuração do ICMS, após os lançamentos correspondentes às operações de entradas e saídas de mercadorias e dos serviços tomados e prestados durante o mês:
a) o valor do débito do imposto, relativamente às operações de saída e aos serviços prestados;
b) o valor de outros débitos;
Por sua vez, a penalidade aplicada na inicial teve por fundamento o art. 82, IV, da Lei n° 6.379/96, alterada pela Lei nº 10.008, de 05.06.2013:
Art. 82. As multas para as quais se adotará o critério referido no inciso II, do art. 80, serão as seguintes:
Nova redação dada ao inciso IV do art. 82 pelo inciso XI do art. 1º da Lei nº 10.008/13 - DOE de 06.06.13 – REPUBLICADA POR INCORREÇÃO NO DOE DE 08.06.13. OBS: EFEITOS A PARTIR DE 01.09.13
IV - de 75% (setenta e cinco por cento) aos que indicarem como isentas ou não tributadas, nos documentos fiscais, as operações ou prestações sujeitas ao imposto:
Portanto, não precisa de maiores considerações epistemológicas a respeito do tributo para se chegar à conclusão de que, não havendo débito pelas saídas nas operações de vendas/transferências/baixa de estoque das referidas mercadorias vai, inexoravelmente, resultar em falta de recolhimento do tributo ou o recolhimento a menor. Disso não se pode extrair qualquer dúvida.
Em seu recurso perante este órgão colegiado, compareceu a recorrente suscitando a improcedência da infração, arguindo que:
1. Que algumas operações registradas pela fiscalização se tratam de operações de saídas de mercadorias da filial da empresa recorrente, sendo, portanto, meras transferências entre filiais da empresa, que não enseja fato gerador da exação de ICMS, como estabelece a Súmula nº 166 do Superior Tribunal de Justiça - STJ;
2. Defende que parte das mercadorias consignadas nos autos, foi firmado corretamente pelo contribuinte como ICMS-ST. Que a norma da substituição tributária deve ser interpretada na relação com o objeto da própria substituição, que é o produto, independente da atividade fim da empresa. A título de exemplo cita que o fiscal relacionou indevidamente os produtos calha (NCM 6811), lixeira c/ tampa (NCM 3922), kit banheiro (NCM 3922), kit cozinha (NCM 3922), tecido plano (NCM 3922), copos (NCM 2201.10.00), tecidos (5903.90.00) e produtos plásticos e tubos (NCM`s 3917 e 3918) como tributação normal;
3. Alega “bis in idem” em virtude de ter recolhido em 2013 a importância de R$ 161.912, 84 e uma diferença de R$ 4.634,54 a título de levantamento de estoque, conforme o Decreto nº 33.809/2013;
4. Por fim, aduz que a fiscalização ao considerar os produtos do contribuinte como sujeitos a tributação normal, deveria ter considerado o crédito de ICMS gerado na entrada delas, deduzindo do débito gerado nas saídas, sob pena da violação do princípio da não cumulatividade do tributo ICMS.
Antes de nos debruçarmos sobre a querela posta, nunca é demais relembrar que o fato gerador do ICMS é regido pela norma em vigor à data da prática do ato, tempus regit actum, ou seja, os atos jurídicos se regem pela lei da época em que ocorreram.
Também importante trazer a lúmen o art. 390, § 7⁰, in verbis:
Art. 390. Nas operações internas e interestaduais com os produtos constantes do Anexo 05, adotar-se-á o regime de substituição tributária, obedecendo-se aos percentuais nele fixados como índices mínimos de taxa de valor acrescido (TVA).
(...)
§ 7º Nas operações de que trata o “caput” deste artigo, é irrelevante para cobrança do ICMS a incorreta classificação das mercadorias constantes do Anexo 05, na Nomenclatura Comum do Mercosul NCM (Decreto nº 29.198/08).
Assim, em outras palavras, o dispositivo acima está a dizer que considera-se a mercadoria enquadrada no regime de substituição tributária, quando a sua NCM e a sua descrição convergem com a NCM e a descrição constante do anexo 5 do RICMS/PB. Existindo divergência entre a descrição do produto e o código na NCM/SH, para enquadramento no regime de substituição tributária, deve prevalecer a descrição do produto.
Pois bem, examinando as alegações consignadas pela recorrente, concluímos que as mesmas não prosperam pelas razões e fatos adiante aduzidos:
1. Operação de transferência – Súmula 166 do STJ
Não assiste razão a recorrente quando afirma que não incide ICMS em operações de transferência entre matriz e filial ou entre filiais da mesma pessoa jurídica, em virtude de não haver alteração de titularidade do mesmo, pois a legislação tributária é clara a respeito da autonomia dos estabelecimentos.
No que concerne à alegada Súmula 166 do STJ (Não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte), não se deve perder de vista que não é Súmula Vinculante – e que, em muito apertada síntese, as fontes formais do Direito Tributário encontram-se delineadas pelo art. 96 do Código Tributário Nacional, que assim dispõe:
Art. 96. A expressão "legislação tributária" compreende as leis, os tratados e as convenções internacionais, os decretos e as normas complementares que versem, no todo ou em parte, sobre tributos e relações jurídicas a eles pertinentes. (grifou-se)
Ou seja, da inteligência do preceptivo supramencionado, conjugado com entendimentos doutrinários, extrai-se que a legislação tributária congloba atos normativos primários (leis em sentido amplo, tratados e convenções e convênios do ICMS) e atos normativos secundários (decretos e normas complementares).
Como ato normativo primário, o melhor dispositivo a ser aplicado para o cenário em apreciação é a Lei Kandir (que deve ser observada por todos os Estados e o Distrito Federal, nos termos do art. 146, III, “a”, da Carta Política).
A propósito da Lei Kandir, assim dispõe seu art. 12, inciso I, verbis:
Art. 12. Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:
I - da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular; (grifou-se)
De igual modo, verifica-se o seguinte dispositivo na Lei nº 6.379/96 (Lei do ICMS/PB):
Art. 3º O imposto incide sobre:
(...)
§ 7º É irrelevante, para a caracterização da incidência:
(...)
IV - o fato de a operação realizar-se entre estabelecimentos do mesmo titular. (grifou-se)
Situação similar já foi objeto de outros julgados deste C. Conselho de Recursos Fiscais, a exemplo do recentíssimo Acórdão nº 48/2020, que abaixo transcrevo:
ACÓRDÃO Nº. 48/2020
SEGUNDA CÂMARA DE JULGAMENTO
Relatora: CONS.ª MÔNICA OLIVEIRA COELHO LEMOS
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS. TRANSFERÊNCIA. OPERAÇÃO TRIBUTADA ADOTANDO A ALÍQUOTA INTERESTADUAL DE 12% (DOZE POR CENTO). DENÚNCIA COMPROVADA. AUTO DE INFRAÇÃO PROCEDENTE. RECURSO VOLUNTÁRIO DESPROVIDO.
Constatada a falta de recolhimento do ICMS em decorrência de operações de transferência de bem do ativo imobilizado e de material de uso ou consumo para estabelecimento de mesma titularidade. Não acolhidas as razões de Defesa, posto que tais operações são normalmente tributadas, consoante se extrai das disposições contidas no inciso I do art. 12 da Lei Complementar nº 87/96 c/c art. 3º, § 7º, inciso IV, da Lei nº 6.379/96.
2. Que a norma da substituição tributária deve ser interpretada na relação com o objeto da própria substituição, que é o produto, independente da atividade fim da empresa. Defende que os produtos calha (NCM 6811), lixeira c/ tampa (NCM 3922), kit banheiro (NCM 3922), kit cozinha (NCM 3922), tecido plano (NCM 3922), copos (NCM 2201.10.00), tecidos (5903.90.00) e produtos plásticos e tubos (NCM`s 3917 e 3918), estão sujeitos a substituição tributária;
No que concerne a presente alegação, de pronto ver-se-á vários equívocos por parte da autuada, razão pela qual igualmente também não prospera.
Inicialmente, faz-se necessário esclarecer que para que um produto esteja sujeito a sistemática da substituição tributária, não basta apenas que o mesmo esteja relacionado no Anexo 05 do RICMS/PB. Em verdade, o que deve ser observado não é apenas o produto, e sim a operação como um todo (descrição da mercadoria, NCM, destinação do produto e o destinatário da mercadoria), face aos casos de inaplicabilidade da substituição tributária previsto no Convênio de normas gerais da substituição tributária e incorporado no RICMS/PB, em seu artigo 390, §4º.
Outrossim, importante registrar que a defesa cita trechos das legislações atuais, e não as vigente à época dos fatos geradores (2013 e 214).
Ademais, não é verdade que os produtos acima citados pela defesa estão enquadrados no regime da substituição tributária, senão vejamos:
- o produto calha só passou a ser incluído no regime da substituição tributária em 2019 pelo Decreto 39.212/2019, sendo o produto utilizado em telhados para escoamento de águas da chuva, com NCM 6811, nada tendo a ver com o produto CALHA ECP SLIM FLUOR 2X40W BR F200055, NCM 94051099, comercializado pela autuada;
- os produtos lixeira c/ tampa (NCM 3922), kit banheiro (NCM 3922), kit cozinha (NCM 3922), tecido plano (NCM 3922) comercializado pela autuada, não estão e nem estiveram regidos pela sistemática da substituição tributária. Em verdade, o que foi incluído no regime da substituição tributária em 2019 pelo Decreto 39.212/2019 foram os produtos banheiras, boxes para chuveiros, pias, lavatórios, bidês, sanitários e seus assentos e tampas, caixas de descarga e artigos semelhantes para usos sanitários ou higiênicos, de plásticos, NCM 3922;
- os copos (NCM 2201.10.00) comercializados pela autuada, também não estão regidos pela sistemática da substituição tributária. Em verdade, o que está incluído no regime da substituição tributária é a água mineral, que pode vir embalada em garrafa, garrafão e copo. Assim em nada tem haver com o produto comercializado pela autuada;
- os tecidos (NCM 161704123) comercializados pela autuada, é mais um dos produtos relacionados pela mesma que não estão regidos pela sistemática da substituição tributária no Estado da Paraíba. Em verdade, o que está incluído no regime da substituição tributária são os produtos tecidos impregnados, revestidos, recobertos ou estratificados, com plástico, sendo os mesmos considerados autopeças e utilizados em oficinas veiculares. Assim em nada tem haver com o produto comercializado pela autuada;
- por fim os produtos plásticos e tubos (NCM`s 3917 e 3918) só passaram ao regime da substituição tributária em 2019 pelo Decreto 39.212/2019, sendo o produto utilizado em construção, portanto, nada tendo a ver com os produtos comercializados pela autuada.
3. Alega “bis in idem” em virtude de ter recolhido em 2013 a importância de R$ 161.912, 84 e uma diferença de R$ 4.634,54 a título de levantamento de estoque, conforme o Decreto nº 33.809/2013;
É cediço que o bis in idem se caracteriza quando a pessoa jurídica de direito público tributa mais de uma vez o mesmo sujeito passivo, sobre o mesmo fato gerador. No caso em tela, a acusação é de falta de recolhimento do ICMS face à ausência de débito do imposto nos livros e documentos fiscais, em virtude de o contribuinte ter indicado operações com mercadorias tributáveis como sendo não tributadas pelo ICMS. De outra banda, o levantamento de estoque realizado e conseqüente recolhimento, teve por objetivo recolher o ICMS-ST de mercadorias adquiridas no regime normal de tributação e que passaram para o regime de substituição tributária, portanto, fatos geradores distintos, com fundamentos jurídicos também independentes e autônomos, razão pela qual não há no que se falar em bis in idem.
Ademais, uma das principais características da substituição tributária para frente é não permitir que o contribuinte utilize como crédito fiscal o valor pago a título de ICMS-ST, senão vejamos:
Art. 391. Fica atribuída a responsabilidade pelo recolhimento do imposto e respectivos acréscimos legais, na qualidade de sujeito passivo por substituição, ao:
(...)
§ 6º O recolhimento do imposto pelo regime de substituição tributária encerrará a fase de tributação e não dará ensejo a utilização de crédito fiscal pelo adquirente, ressalvado o disposto no art. 72, incisos II,V, VI e VII.
Portanto, incabível tal pretensão.
4. aduz que a fiscalização ao considerar os produtos do contribuinte como sujeitos a tributação normal, deveria ter considerado o crédito de ICMS gerado na entrada delas, deduzindo do débito gerado nas saídas, sob pena da violação do princípio da não-cumulatividade do tributo ICMS
Assim como as demais, tal argumentação não merece guarida.
No tocante a este ponto da defesa, destaco que inexiste previsão legal para tal procedimento. O princípio da não cumulatividade do imposto não obsta previsão de condições legais para que esse abatimento ocorra.
Ressalta-se que o art. 23 da Lei Complementar nº 87/96 condiciona o direito ao crédito à idoneidade da documentação fiscal e à sua escrituração.
Caso a recorrente não tenha levado a registro em seus livros fiscais os documentos relativos às entradas das mercadorias em seu estabelecimento, afigura-se descumprida a condição expressamente prevista no art. 23 da Lei Complementar nº 87/96 quanto à escrituração.
Registre-se que o contribuinte deverá observar também a Legislação do Estado da Paraíba pertinente ao assunto, mormente as disposições contidas nos artigos 77 e 84, do RICMS/PB, abaixo transcritos:
Art. 77. O direito de crédito, para efeito de compensação com débito do imposto, reconhecido ao estabelecimento que tenha recebido as mercadorias ou para o qual tenham sido prestados os serviços, está condicionado à idoneidade da documentação e, se for o caso, à escrituração nos prazos e condições estabelecidos neste Regulamento.
Art. 84. Também não é admitido o crédito fiscal destacado em documento que não tenha sido escriturado no Registro de Entradas, no prazo fixado neste Regulamento, exceto se:
I - houver comunicação escrita do contribuinte à repartição fiscal de seu domicílio, narrando as causas determinantes do lançamento extemporâneo, consignada na coluna "Observações" do Registro de Entradas;
II - for feita pelo Fisco a reconstituição da escrita.
Parágrafo único. A comunicação referida no inciso I, deverá ser lavrada em duas vias, uma das quais será devolvida ao contribuinte, devidamente visada, para comprovação junto ao Fisco, quando necessário.
Portanto, tal pretensão torna-se incabível, pois a Autuada é contribuinte do ICMS, enquadrada no regime de apuração normal, portanto, nos termos do art. 60 do RICMS/PB é atribuição do contribuinte a tarefa de apurar no último dia de cada mês, através da escrituração dos Livros de Entrada, Saída e Apuração do ICMS, o imposto devido pelo mesmo. É nesse momento, que o mesmo de posse das notas fiscais de aquisição faz o lançamento dos créditos que julga ter direito.
Sobre a questão, o Conselho de Recursos Fiscais já se manifestou em ocasião semelhante a que ora se nos apresenta para julgamento, a exemplo do recente Acórdão nº 407/2019, cuja ementa transcrevo a seguir:
ÔNUS DA PROVA. INVERSÃO. FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS. INDICAR COMO ISENTAS, NÃO TRIBUTADAS OU SUJEITAS À SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA, OPERAÇÕES DE SAÍDAS DE MERCADORIAS SUJEITAS À INCIDÊNCIA NORMAL DO IMPOSTO. DENÚNCIA CONFIGURADA. PROVAS ACOSTADAS AOS AUTOS EMPRESTAM CERTEZA E LIQUIDEZ AO CRÉDITO TRIBUTÁRIO LEVANTADO. AUTO DE INFRAÇÃO PROCEDENTE. MANTIDA DECISÃO RECORRIDA. RECURSO VOLUNTÁRIO DESPROVIDO.
A ausência de débito nas operações com mercadorias sujeitas à incidência do ICMS implica em falta de recolhimento do imposto devido ou em menor valor do que o exigível, caracterizando infração à legislação vigente. Nas acusações feitas através de auto de infração, cabe ao contribuinte a prova em contrário, invertendo o ônus da prova para aquele a quem ela aproveita.
Destarte, considerando que o procedimento fiscal fora realizado dentro dos contornos legais e tendo em vista que a autuada não logrou êxito em comprovar que as operações realizadas de fato não estavam submetidas a incidência do ICMS na forma estabelecida pela legislação tributária, ratifico a decisão proferida pela instância singular.
Com estes fundamentos,
VOTO pelo recebimento do recurso voluntário, por regular e tempestivo e, quanto ao mérito, pelo seu desprovimento, mantendo a sentença prolatada na primeira instância, declarando procedente o Auto de Infração de Estabelecimento n° 93300008.09.00003126/2017-20, lavrado em 22 de dezembro de 2017, contra a empresa J S TECIDOS LTDA, inscrição estadual nº 16.080.155-9, devidamente qualificada nos autos, impondo o ônus desta ação fiscal, imputando-lhe o crédito tributário no valor de R$ 171.251,45 (cento e setenta e um mil, duzentos e cinqüenta e um reais e quarenta e cinco centavos), sendo R$ 97.857,96 (noventa e sete mil, oitocentos e cinqüenta e sete reais e noventa e seis centavos) de ICMS, por infringência ao artigo 106 c/c o art. 52 e art. 2º, art. 3º, art. 60, I, “b” e III, “d” e “l”, todos do RICMS/PB e R$ 73.393,49 (setenta e três mil, trezentos e noventa e três reais e quarenta e nove centavos) a título de multa por infração, com fulcro no artigo 82, IV, da Lei nº 6.379/96.
Intimações necessárias a cargo da repartição preparadora, na forma regulamentar.
Primeira Câmara de Julgamento, sessão realizada por meio de videoconferência, em 29 de outubro de 2020.
Leonardo do Egito Pessoa
Conselheiro Relator
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